Apesar de ter vencido as eleições de 25 de outubro para
a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, tudo aponta para que o PS
não tenha condições para formar governo, uma vez que perdeu a maioria absoluta dos mandatos na Assembleia Legislativa, só
tendo conseguido eleger 25 deputados do total de 57 parlamentares, ao obter
39,1% dos votos, quando precisava de ter elegido 29 deputados – num cenário
eleitoral marcado pela segunda maior abstenção de sempre (54,58%), mas inferior à taxa de abstenção de há 4 anos.
Vasco Cordeiro, presidente
do PS/Açores, considerou “clara e inequívoca” a vitória,
mas, reconhecendo o novo “quadro parlamentar desafiante”, disse ter começado o
trabalho de, nos próximos tempos, o PS se constituir como o garante de
estabilidade e segurança, para que os açorianos possam sair da situação
complexa derivada da situação da pandemia.
O PSD, obtendo o segundo lugar com 33,74% dos votos,
garantiu 21 mandatos; segue-se-lhe o CDS-PP com 5,51%, que elegeu 3 deputados, além
de um outro em coligação com o PPM.
O Chega, que concorreu pela primeira vez às regionais dos Açores,
com 5,06% dos votos, elegeu 2 deputados, tal como o BE, que alcançou
3,81% dos votos. E o PPM obteve 2,34% dos votos, o que lhe deu um
deputado, além de um outro eleito em coligação com o CDS-PP.
A Iniciativa Liberal (IL), que também
concorreu pela primeira vez, conseguiu 1,93% dos votos) e elegeu um deputado,
assim como o PAN, que teve percentagem idêntica e só menos 8 votos.
Já o PCP ficou de fora, por não ter conseguido
eleger o único deputado que tinha.
O presidente do PSD, Rui Rio, destacou “o
resultado francamente positivo”, considerando que a perda da maioria
absoluta do PS mostra “um notório desgaste do governo regional” socialista, tal
como do executivo nacional.
Por sua vez, o presidente do CDS-PP, Francisco
Rodrigues dos Santos, defendeu que os resultados mostram que as notícias de
morte do partido foram “manifestamente exageradas” e representam uma
vitória da “direita moderada”.
O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, lamentou o resultado “particularmente negativo” do
partido, apontou o “descontentamento crescente” traduzido na perda de maioria
absoluta do PS e considerou que o resultado “não traduz nem a influência social
e política da CDU, nem o reconhecimento da sua intervenção na vida política
açoriana”.
O Bloco de Esquerda (BE) saudou o
“resultado extraordinário” do partido nas eleições regionais nos Açores e
disse estar disponível para acordos pontuais e ajudar a “construir
pontes” para uma maioria no Parlamento. Assim, Pedro Filipe Soares,
líder parlamentar e membro da direção do partido, afirmou que os bloquistas não vão apresentar uma moção de rejeição de um
programa do Governo do PS, nem votarão ao lado da direita para apoiar
uma moção desse tipo.
O dirigente bloquista sustentou que o PS deve “tirar as
consequências devidas” dos resultados, ou seja, do “descontentamento”, que
“decorreu das condições económicas e sociais dos açorianos e
açorianas”. E o BE, medida a medida, proposta a proposta, orçamento a
orçamento, analisará as soluções a encontrar numa geometria parlamentar que
alcance uma maioria.
***
Perante os resultados das eleições, desde logo foi equacionada a
possibilidade de formar na Região Autónoma, uma ampla coligação de direita que
teria de incluir CDS, Chega, IL e PPM, já que atingem os necessários 29 deputados
para uma maioria absoluta. Perante esta hipótese, o presidente do PSD/Açores anunciou que o partido tem “total disponibilidade
para o diálogo” e para a “concertação”, no cenário do atual quadro
parlamentar. E, questionado sobre a possível coligação à direita para poder
governar, José Manuel Bolieiro frisou não se comover por
“atitudes extremistas”, nem crer que interessam aos açorianos.
O líder do CDS-PP/Açores, Artur Lima, reiterou que o partido só viabiliza compromissos eleitorais, mas não
deixará a região na situação de “ingovernabilidade” na próxima
legislatura. Com efeito, “o CDS sempre disse que viabiliza os seus compromissos
eleitorais e os compromissos com os açorianos”, pelo que, enquanto partido
responsável, “não deixará os Açores numa situação de ingovernabilidade”.
Porem, o líder nacional do Chega rejeitou qualquer acordo de coligação
que permita à direita governar os Açores, lembrando que foi o PSD
que se afastou do seu partido, pelo que “ou aceitam ceder e juntar-se a nós nestas convicções ou não aceitamos
vender-nos por lugares, nem por governabilidades, nem por chantagens” – disse.
***
Entretanto, após muitas declarações de exigências não acolhidas pelo PSD, o
Chega anunciou, em comunicado, neste dia 6 de novembro, que “vai viabilizar o
governo de direita nos Açores”, após ter chegado a um acordo com o PSD em
“vários assuntos fundamentais” para a Região Autónoma e para o país. De acordo
com o Chega, o futuro Governo regional “comprometeu-se
a alcançar as metas de redução significativa de
subsidiodependência na região e de criação de um gabinete regional de luta
contra a corrupção”, bem como a “desencadear, nos termos das suas
competências próprias, um projeto de revisão constitucional regional que
inclua, entre outros aspetos, a redução do número de deputados
na região autónoma dos Açores”. E, quanto à exigência
de que o PSD nacional participasse no processo de revisão constitucional
iniciado pelo Chega, diz ter obtido garantias para o futuro, podendo ler-se no
comunicado:
“Sabemos que o PSD nacional irá entregar na
Assembleia da República, ainda nesta sessão legislativa, um projeto de revisão
constitucional que compreenderá, não só o constante do seu programa eleitoral,
como alguns aspetos que são para nós fundamentais, tendo-nos sido dadas garantias de que contemplará, entre outros aspetos, a redução do
número de deputados e a vontade de fazer uma profunda reforma no sistema de
Justiça”.
O partido admite que “não são todos os pontos” que pretende numa revisão
constitucional, mas considera existir a garantia de que “um dos grandes
partidos” defenderá temas que considera essenciais. Por isso, informará hoje o
Representante da República na Região Autónoma de que “se encontra indisponível
para viabilizar um governo socialista na Região e, através dos seus deputados
eleitos, votará favoravelmente ao governo liderado por José Manuel
Bolieiro”.
É de referir que o Representante da República para a Região Autónoma, Pedro
Catarino, começou, neste dia 6, a ouvir os partidos que elegeram deputados,
tendo em vista a indigitação do futuro presidente do Governo Regional, pois a lei
indica que o Representante da República nomeará o presidente do Governo
Regional, “ouvidos os partidos políticos” representados no novo parlamento
açoriano (art.º 81.º
do EPARA). Ora, o PS, tendo elegido 25 deputados,
perdeu a maioria absoluta que detinha há 20 anos na região, pelo que, nesta
semana, PSD, CDS-PP e PPM anunciaram uma “proposta de governação profundamente
autonómica”, um “governo dos Açores para os Açores” e com “total respeito e
compreensão pela pluralidade representativa do povo”. Os três partidos têm em
conjunto 26 deputados regionais, a que se junta agora o apoio dos dois do
Chega, faltando só um voto para garantir a maioria absoluta de 29
parlamentares.
Perante isto, o secretário-geral adjunto do PS exigiu ao presidente do PSD,
“cabal esclarecimento” sobre tal solução governativa, virando as costas
ao PSD de Sá Carneiro:
“Hoje, confirmaram-se as piores suspeitas
que prevaleciam na opinião pública portuguesa: a suspeita de que o doutor Rui
Rio estava em negociações com o Chega, tendo como moeda de troca a revisão da
Constituição. Com esta negociação feita com a extrema-direita, o doutor Rui Rio
pisou a linha vermelha dos princípios e dos valores constitucionais e virou as
costas ao PPD/PSD de Francisco Sá Carneiro.”.
O secretário-geral adjunto socialista considerou que
Rui Rio deve aos portugueses “um esclarecimento cabal” e “não um esclarecimento feito no Twitter”. E
questionou “quais foram os princípios e os valores que o doutor Rui Rio deixou
cair relativamente à revisão constitucional para alcançar o poder na região
autónoma dos Açores”.
Na opinião de José Luís Carneiro, Rui Rio mostrou que “vale
tudo para alcançar o poder”, acrescentando que esta atitude “feriu a
dignidade de um processo de revisão constitucional”.
A contento do PS, o porta-voz do PAN/Açores, Pedro Neves, veio reiterar que o partido não viabilizará uma solução governativa na região,
que envolva o Chega, dizendo estar disponível para ouvir todos os partidos. E
disse aos jornalistas:
“Se o Chega tiver um acordo com a coligação
[PSD/CDS/PPM)], nós dizemos não, porque não vamos obviamente normalizar um
partido que não respeita a Constituição portuguesa e não respeita os açorianos quando as
negociações estão a ser feitas na Assembleia da República”.
O porta-voz do PAN falava à saída de uma audiência com o representante da
República para a Região Autónoma dos Açores, Pedro Catarino, em Angra do
Heroísmo. Pouco antes, o Chega anunciava que “vai viabilizar o governo de
direita nos Açores”, após ter chegado a um acordo com o PSD em “vários assuntos
fundamentais” para a Região Autónoma e para o país.
Pedro Neves, que anunciara a sua posição no dia 5, em conferência de
imprensa, disse estar disponível para “fazer compromissos”, desde que não
existam “egos políticos” de outros líderes partidários, e garantiu que
não vai “voltar atrás”, independentemente do que seja acordado entre a
coligação e o Chega. E, questionado sobre a viabilização dum programa de
governo do PS, estar aberto a ouvir “todos os partidos” e que será a comissão
regional do partido a decidir.
E o líder do Iniciativa Liberal/Açores, Nuno Barata, admitiu vir a fazer
acordo de incidência parlamentar com a coligação e, frisando que ainda não há um acordo fechado, declarou:
“Não há acordos, não há negociações, o que
há são conversações. Nós, a devido tempo, anunciaremos o que é possível. Apresentámos ao PSD 12 pontos que entendemos que devem e têm de
estar num programa de governo a quatro anos. Se o PSD aceitar, nós
estaremos no parlamento a fazer oposição construtiva, sempre oposição, mas uma
oposição construtiva, mas com soluções para mudar um paradigma de governação
dos Açores, que permita sair do quadro socioeconómico que nós estamos tínhamos
em 2019, que era lamentável.”.
***
É óbvio
que uma coligação à direita nos Açores pode constitucionalmente inviabilizar um
governo minoritário do PS. Resta saber as garantias que o Representante da
República exigirá.
Porém,
dadas as indicações programáticas do Chega, o que se passa no Açores é mau
sinal para a saúde da democracia, sendo que esta não tem cuidado de si, pela
tolerância de ideias e atitudes radicais, como a xenofobia, o racismo, a
discriminação, a ânsia da excessiva penalização criminal, as desigualdades, o
ataque ao emprego e às condições de trabalho estável e condigno.
Por
outro lado, concede favores desmedidos e injustificados a determinados grupos
sociais e económicos, permite a promiscuidade entre Estado e empresas (sobretudo
a banca), tolera a
corrupção, cava o divórcio entre a política e o povo e tem uma justiça que não
funciona.
E quer
uma revisão constitucional para reduzir o númeno de deputados e reformar a
justiça? Não é preciso, já está previsto. Que se entendam a fazer lei para
termos só os 118 deputados, o mínimo previsto na CRP, e que façam funcionar a justiça
alterando os respetivos códigos e formando corretamente os magistrados!
2020.11.06 –
Louro de Carvalho
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