sábado, 13 de junho de 2020

Fátima incrementa a fé e deixa recados ao mundo dos homens


Celebrou-se, nestes dias 12 e 13 de junho, sob a presidência de Dom Américo Aguiar, Bispo de Dagno e Auxiliar de Lisboa e coordenador geral do Comité Local da Jornada Mundial da Juventude que se realizará em Lisboa em 2023, a primeira peregrinação aniversária com a presença física de peregrinos, cuja alegria, vida e fé o Cardeal António Marto, Bispo de Leiria-Fátima, sublinhou ainda que meio ocultas pelas máscaras. Evocou-se a 2.ª aparição de Maria, que assegurou que o seu Coração Imaculado triunfará e que os desvalidos encontrarão refúgio nele. Por outro lado, assinala-se o centenário da entronização da imagem original da Virgem de Fátima na Capelinha das Aparições, que ali se venera e que figurou face a face com os peregrinos, entre as 14,30 horas e as 20 horas deste dia 13, na exposição temporária “Vestida de Branco”, no Convívio de Santo Agostinho, no piso inferior da Basílica da Santíssima Trindade.

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Na noite do dia 12, o presidente da Peregrinação, na sua alocução homilética da Celebração da Palavra subsequente à Procissão de Velas (modelo celebrativo inaugurado em maio e que o Santuário pensa manter na noite de cada dia 12 em vez da Missa da Vigília), declarou que “não podemos abandonar o nosso próximo” e desafiou os cristãos a serem mensageiros do amor de Cristo. Com efeito, considerando que a pandemia da Covid-19, que nos atravessa e nos condiciona, “mais do que nunca, exige-nos a nossa identidade cristã” e, por consequência, postula que não abandonemos “o nosso próximo”, Dom Américo Aguiar disse que ninguém pode ficar para trás depois deste caos sanitário que transformará para sempre as nossas vidas. E lembrou que “estamos juntos no combate a esta pandemia” ou “estamos todos no mês barco”, como dizia o Papa Francisco em 27 de março, e, por isso, o que se exige é que “transformemos a sua inevitabilidade numa oportunidade: que cada pessoa seja mais humana e os cristãos mais autênticos”. E, retomando o clamor que “os pobres não podem esperar”, de Dom António Francisco dos Santos, que foi Bispo do Porto, declarou que “nenhum de nós, crente ou não crente, pode dormir descansado se sabe que à sua beira existe uma família que passa fome”. E desenvolveu:
A pandemia recordou-nos a nossa identidade genética: somos frágeis e mortais. A pandemia confirmou a nossa identidade social: já não pertencemos à nossa pequena comunidade local, mas somos membros de uma comunidade mundial interligada entre si. A pandemia potenciou até uma renovada identidade eclesial, uma Igreja mais doméstica, mais laical e capaz do digital.”.
E, no quadro das 14 obras de misericórdia que aprendemos na catequese da infância, destacou a que “se tornou urgente e imprescindível a todos nós, que é: dar de comer a quem tem fome” e, reforçando o valor da dimensão caritativa da ação da Igreja, “o seu maior poder”,  sobretudo nestes tempos difíceis, vincou:
O alimento é expressão mais básica da nossa cultura humana: é comprado pelo trabalho, é preparado para nos dar forças e é consumido na partilha da mesa. A falta de alimento significa quase sempre falta de emprego e as consequências estão à vista de todos.”.
Evocando o tem do Santuário para 2019/2020 “Tempo de graça e misericórdia: dar graças por viver em Deus”, frisou que, “mais do que nunca, este é um tempo de misericórdia”. E, centrado no mandamento do amor, a maior herança de Jesus e que só se aprende no “colo de uma mãe”,  garantiu que “ser cristão hoje é mais uma questão de amor do que um assunto doutrinal”, pois “o mandamento do amor é o único capaz de salvar a humanidade” e “esta é a grande sabedoria que aprendemos nesta ‘escola do amor’, que o colo de Nossa Senhora de Fátima tão bem nos ensina!”. Com efeito, “se hoje estamos aqui, é porque reconhecemos que este colo maternal da Senhora de Fátima continua a ser para nós uma autêntica escola do amor” – disse.
“Este é o segredo do mandamento do amor, o sinal da nossa identidade. Este é o pedido do Senhor Jesus” – observou pedindo aos cristãos para afinarem o sentido de comunidade.
Vincando a grande atualidade da Mensagem de Fátima, que não é só uma história do passado que nos comove, mas sobretudo uma mensagem que hoje nos desafia, garantiu:
Jesus precisa de cada um de nós! Cada um, com a sua história de vida, com as suas qualidades e fragilidades, com os seus projetos e sonhos, é precioso aos olhos de Jesus!”.
E afirmou que o tema deste Ano Pastoral em Fátima – “Dar graças por viver em Deus” – “educa-nos para esta relação entre a ‘graça’ de Deus e a ‘liberdade’ da nossa ação”.
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No dia 13, na homilia da Missa internacional, o Bispo auxiliar de Lisboa assegurou que o grau de civilização duma sociedade se mede pela sua capacidade hospitaleira e, por isso, a solidariedade europeia que a pandemia postula não pode ser apenas “uma urgência pandémica, mas uma marca da sua identidade”. E pediu à Europa que retome a matriz cristã e ponha em prática “a gramática da hospitalidade”. E, a este respeito, enfatizou:
A nossa União Europeia terá de perceber que já não basta ser aquela original comunidade económica e política, mas terá de dar o passo seguinte: ser uma verdadeira comunidade humana, mais hospitaleira, determinada no combate solidário às consequências económicas e sociais desta pandemia, decidida no acolhimento de todos e apostada no respeito pela casa comum que todos habitamos”.
Considerando que “a ajuda entre povos e países europeus” não deve resultar do “medo provocado por um vírus”, mas ser “um ímpeto do humanismo e da matriz cristã que carateriza o velho continente” a nível identitário, disse que esta é uma das grandes lições que a humanidade aprendeu com a covid-19, e que “só com essa determinação asseguramos o nosso futuro e o das gerações vindouras, feito cada vez mais do encontro entre povos, culturas e religiões”. E, a este respeito, lembrou:
Os nossos pequenos gestos podem ter uma consequência, não só em relação a quem está próximo, mas também comunitária e mesmo até universal. Perante isto, todos teremos de reaprender a ‘gramática da hospitalidade’: somos responsáveis pela saúde, o bem-estar, a alegria e a salvação dos outros!”.
Ensinando que “a hospitalidade é um ato racional permanente de acolhimento do outro” e que “o grau de civilização de uma sociedade pode medir-se precisamente em função da sua hospitalidade”, recuperou a ideia deixada pelo Cardeal José Tolentino Mendonça, no passado dia 10 de junho, da necessidade do reforço do “pacto intergeracional”, para fortalecer o pacto comunitário. E assegurou:
Hoje, aquilo que certamente Deus nos pede para esta nova fase da humanidade, a pós-globalização, é somente isto: acolher com hospitalidade o outro, vítima do efeito socioeconómico desta pandemia”.
Evocando a história de vida de Lúcia, afirmou que “somos convidados a valorizar a importância e urgência de uma relação intergeracional” e, rejeitando a fatiação da sociedade, apelou:
Não permitamos que nos dividam entre novos e velhos, pobres e ricos, brancos e pretos, do norte e do sul, azuis ou vermelhos (…) não deixemos que a nossa velha Europa se queira esquecer, arrancar-se das suas raízes”.
E, neste contexto, apontou que “talvez possamos entender melhor a urgência de uma economia nova, de Francisco, que não mate”, que não descarte, que não deixe ninguém para trás.
Dom Américo Aguiar, “emocionado” por regressar ao Santuário e presidir à celebração do recomeço (é a primeira vez que preside a uma peregrinação em Fátima), anos depois de ter participado, como seminarista, no programa ‘Um dia como peregrino’, deteve-se ainda em considerações sobre a santidade para todos (sobretudo a dos santos da porta, acessível a todos, como redescobriu o Vaticano II e em que insiste o Papa Francisco), tema do ano pastoral em Fátima, lembrou a peregrinação das Crianças que este ano foi cancelada devido à pandemia, saudou os amiguitos e amiguitas do Cardeal Marto, ali presentes, e invocou a proteção de Nossa Senhora de Fátima para as crianças e os adultos, para os “jovens e para os idosos”, para “os pobres e os abandonados”, para os que “perderam o emprego”, os “refugiados ou vítimas da guerra”, entre outros. E exclamou:
É o mundo inteiro que celebra aqui connosco esta Eucaristia, de mãos dadas com Maria”.
Convicto de que estava a cumprir a promessa de Dom António Marto em 13 de maio e desejando que o próximo ano seja de enchente, recordou o “Voltaremos, sim, voltaremos … para Te cantarmos: Aqui vimos, Mãe querida, consagrar-Te o nosso amor”. E, expressando a confiança em Maria e lembrando o que dizia o Papa há três anos “Temos mãe”, explanou: 
E aqui chegamos, hoje… voltando, regressando…desconfinando…enchemos com as nossas preces este Altar do mundo, dirigimos o nosso olhar à imagem de Nossa Senhora de Fátima que completa cem anos de existência e vemos duas crianças, os santos Francisco e Jacinta Marto com quem temos tanto para aprender”.
De facto, a Mãe de todos ensina que não podemos armar-nos em doutores do quer que seja, mas estar disponíveis para aprender com todos, incluindo as crianças. E Dom Américo Aguiar recordou as palavras da carta do Papa Francisco no passado dia 13 de maio, que nos tranquilizava no sentido de assegurar que Nossa Senhora não nos abandona, mas está connosco.
E o Bispo auxiliar de Lisboa quis lembrar, na celebração, as “autoridades do Estado, autarcas, profissionais de saúde, os dos lares, IPSS e Misericórdias, as famílias e cuidadores informais”, pessoas que “na linha da frente e de forma anónima” cuidam dos irmãos, e também os “concidadãos que faleceram”: “1505 nossos concidadãos que partiram no contexto desta pandemia e os sacerdotes que hoje estão na casa do Pai”.
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Na mensagem que encerrou a Peregrinação, o Cardeal Dom António Marto agradeceu “de todo o coração “a presença, a presidência e a mensagem “bela e terna de hospitalidade” que Dom Américo Aguiar trouxe à Cova da Iria e partilhou os motivos de alegria que esta Peregrinação lhe deu. E, deduzindo a reação de agradecimento e confiança dos peregrinos, disse:
Esta peregrinação reveste-se de uma particular alegria… Primeiro, porque é a primeira peregrinação aniversária, deste ano, com a presença física dos peregrinos, que traz ao nosso Santuário a vida, o calor e o afeto dos vossos corações (…), que transbordam de alegria. O segundo motivo é o centenário da chegada ao Santuário da Imagem de Nossa Senhora, que se tornou no símbolo de Fátima e que nos lembra que os peregrinos de Fátima encontram aqui um memorial da presença de Deus e a experiência do acolhimento incondicional, através do colo materno de Maria.”.
E prosseguiu:
Por tudo isto, o peregrino traz aqui duas palavras: ‘obrigado’ e ‘confio’. Obrigado, meu Deus, pela ternura que nos fazes chegar pelo coração materno de Maria; e confio-me ao Teu Imaculado coração, para que ele seja o caminho que me conduz até Deus. Eis a beleza desta peregrinação: ternura e cuidado, de uns pelos outros e pela nossa casa comum!”.
Como é habitual, o cardeal português deixou ainda uma palavra às crianças e uma “saudação afetuosa” aos peregrinos que acompanharam as celebrações através dos órgãos de comunicação social, em particular os doentes e os idosos, para quem pediu uma salva de palmas.
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Enfim, uma peregrinação com menos peregrinos e mais distantes já dá outro brilho ao Santuário, que se afirma na continuidade da confissão da fé, do crescente aprofundamento da espiritualidade, da dignidade da celebração litúrgica e das mensagens pertinentes ao mundo.
2020.06.13 – Louro de Carvalho  

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