terça-feira, 9 de junho de 2020

Programa de Estabilização Económica e Social e Orçamento Suplementar


O combate à pandemia da Covid-19 provocada pelo SARS-CoV-2 impôs a elaboração de dois documentos cruciais de curto prazo. Assim, com um horizonte temporal até ao fim de 2020, o Conselho de Ministros (vd Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho) aprovou, no dia 4 de junho, o PEES (Programa de Estabilização Económica e Social) e, neste dia 9, a Proposta de Lei do Orçamento Suplementar para 2020 (vd Comunicado do Conselho de Ministros de 9 de junho de 2020).
São 4 os eixos em que assenta o PEES: o relacionado com a manutenção do emprego e a retoma progressiva da atividade económica; o incidente em temas de cariz social e apoios ao rendimento das pessoas, sobretudo as que foram mais afetadas pelas consequências económicas da pandemia; o centrado no apoio às empresas; e o de matriz institucional.
No documento, o Governo estima uma queda do PIB de 6,9% este ano e um crescimento de 4,3% em 2021, e uma taxa de desemprego de 9,6% em 2020 e de 8,7% no ano seguinte.
Passada que foi a fase aguda da pandemia, o Governo, recalibra as medidas de apoio para incentivar o “regresso paulatino da atividade profissional”, aumentando o número de horas de trabalho e o rendimento auferido; e, para dinamizar o emprego, procederá ao lançamento dum “vasto conjunto de pequenas obras, de execução célere e disseminada pelo território, que possam absorver algum do impacto da crise económica provocada pela pandemia”.
A compensar a quebra de rendimentos, agora reforçam-se e alargam-se diversas prestações sociais e são criados novos instrumentos como complemento de estabilização para quem tenha estado em ‘lay-off’ ou um apoio social específico para os profissionais das artes do espetáculo. São ainda reforçados alguns elementos-chave do Estado Social, como o SNS, “capacitando-o para melhor responder ao atual desafio pandémico, a escola pública” (com relevo para o ensino superior), “modernizando-a para a era digital, ou o acesso a habitação a custos acessíveis”.
No atinente às empresas, “são instituídos diversos mecanismos de apoio quer à liquidez, quer à capitalização do tecido empresarial”. Em apoio à liquidez vem “a extensão da moratória ao crédito bancário, o lançamento de novas linhas de crédito com garantia pública ou a possibilidade de ajustamento dos pagamentos” por conta do IRC “até ao final do ano”; na capitalização empresarial, destaca-se a criação dum banco de fomento, “associado à constituição dum fundo de capitalização de empresas, a par de outras medidas de incentivo à concentração e consolidação de pequenas e médias empresas ou à sua colocação no mercado de capitais”.
Para concretizar estas medidas de estabilização económica e social, impõem-se diversas alterações de natureza institucional com o objetivo de “simplificar e agilizar a atuação da Administração Pública e dos tribunais em tudo o que seja necessário para debelar os efeitos da pandemia e acelerar a retoma económica”.
O programa é sustentável e proporcionado às necessidades. Importa que haja vontade política de o executar e que as diversas instituições públicas e provadas se empenhem na concretização deste desígnio nacional, não faltando obviamente o apoio esperado da UE.
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Na sequência da publicação do PEES, em anexo à predita resolução e numa brochura de 113 páginas, o Conselho de Ministros de hoje, dia 9 de junho, aprovou a Proposta de Lei que altera a Lei do Orçamento do Estado para 2020 – conhecida por Orçamento Suplementar –, apresentado esta tarde por Mário Centeno. Como era de supor, a seguir ao PEES, tem de seguir-se uma alteração orçamental, permitindo a materialização do programa em causa, já que o Orçamento do Estado para 2020 foi gizado para um cenário macroeconómico e social totalmente diverso do atual. Assim,
- Alteram-se os limites máximos de concessão de garantias pelo Estado e outras pessoas coletivas de direito público e atualizam-se os limites de endividamento autorizados pela AR;
- Autoriza-se o aumento do endividamento líquido das Regiões Autónomas, visando a cobertura de necessidades excecionais de financiamento para obviar aos efeitos da pandemia de Covid-19, e suspendem-se os limites ao endividamento estabelecidos na Lei das Finanças Regionais;
- Estabelece-se um regime especial de dedução de prejuízos fiscais;
- Quanto aos pagamentos por conta (em sede de IRS e de IRC), procede-se a ajustamento das regras e formas de pagamento relativas aos pagamentos devidos no período de tributação de 2020;
- Cria-se um adicional de solidariedade sobre o setor bancário, cuja receita visa contribuir para suportar os custos da resposta pública à atual crise, através da sua consignação ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social;
- Reinstituiu-se o Crédito Fiscal Extraordinário de Investimento (CFEI II), criando uma dedução para as despesas de investimento realizadas entre 1 de julho de 2020 e 30 de junho de 2021, com a obrigação de manutenção de postos de trabalho durante um período de três anos;
- Prevê-se um regime excecional de pagamento em prestações para dívidas tributárias e dívidas à Segurança Social;
- Prevê-se a dispensa de visto prévio do Tribunal de Contas para os procedimentos cujo valor dos contratos seja inferior a 750 000,00€;
- Inclui-se uma autorização legislativa para o Governo poder criar um apoio extraordinário à retoma progressiva de atividade em empresas em situação de crise empresarial, a definir em função da quebra de faturação e permitindo a redução de período normal de trabalho, com limitações aos despedimentos e à distribuição de dividendos.
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Também no quadro do PEES o Conselho de Ministros aprovou diplomas que concretizam várias medidas previstas, nomeadamente:
- Um decreto-lei que altera medidas excecionais de proteção dos créditos das famílias, empresas, instituições particulares de solidariedade social e demais entidades da economia social, bem como um regime especial de garantias pessoais do Estado, no âmbito da pandemia de Covid-19. As principais linhas orientadoras da atualização deste diploma passam pela extensão da vigência da moratória, pelo alargamento do universo de potenciais beneficiários e pelo alargamento do âmbito das operações de crédito que à mesma poderão ficar sujeitas.
O prazo de vigência das moratórias é prorrogado, de forma genérica, até 31 de março de 2021, abrangendo automaticamente as entidades beneficiárias que a ela tenham aderido, exceto quando comuniquem a sua oposição até ao dia 20 de setembro de 2020. O regime é aplicável também a cidadãos que não residam em Portugal, abrangendo assim os cidadãos emigrantes.
O pedido de novas moratórias tem como data limite 30 de junho de 2020, data a partir da qual o regime fica fechado às moratórias pedidas até essa data.
Além disso, o decreto-lei estabelece que os fatores de quebra de rendimentos podem verificar-se no mutuário e em qualquer dos membros do seu agregado familiar, prevendo novo fator de elegibilidade associado à quebra comprovada de rendimento global do agregado de pelo menos 20%, de forma a proteger mutuários não enquadráveis noutras situações já estabelecidas.
A atualização do diploma prevê ainda a ampliação da moratória a todos os contratos de crédito hipotecário, bem como ao crédito aos consumidores para finalidade de educação, incluindo a formação académica e profissional.
- Prorrogação, até 31 de dezembro de 2020, do prazo dum regime excecional de medidas aplicáveis às autarquias locais no âmbito da pandemia de Covid-19 e alteração das regras sobre endividamento das autarquias locais para os anos de 2020 e 2021.
As medidas constantes desta Proposta de Lei pretendem a agilização de procedimentos de caráter administrativo, bem como a simplificação do regime financeiro das autarquias locais e das entidades intermunicipais, para que a resposta à pandemia não comprometa o esforço de consolidação orçamental promovido por estes entes públicos.
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Só falta, para o conjunto de medidas para atacar a crise socioeconómica, que está em marcha e cujo volume se adivinha gigantesco, ficar completo, que seja dado à luz o trabalho de António Costa e Silva que já começou no âmbito da coordenação dos trabalhos preparatórios de elaboração do Programa de Recuperação Económica e Social 2020-2030, a qual se encontra formalizada pelo despacho n.º 6033-B/2020, de 3 de junho, dos Gabinetes do Primeiro-Ministro, do Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital e do Ministro do Planeamento, sendo que o nomeado não aufere qualquer remuneração ou abono pelos ditos trabalhos.
Foi ultrapassada a situação propalada inicialmente, não sendo o conselheiro a liderar as conversas com os partidos nem com os parceiros sociais, compreende-se a opção do Governo explicada no preâmbulo do susodito despacho:
- A situação económica e financeira mundial gerada pela pandemia de Covid-19 e os seus reflexos e consequências na sociedade, os quais têm implicado a adoção de diversas medidas a nível nacional e no plano da UE;
- A orientação da UE no sentido de a estratégia de recuperação económica assentar em planos de recuperação nacionais, alicerçados no investimento e nas reformas prioritárias, no quadro do Semestre Europeu, alinhados com os programas operacionais e os planos nacionais de energia e clima e da transição digital;
- O entendimento do Governo de que tal estratégia deve ser trabalhada em torno da elaboração dum plano específico que verse transversalmente a recuperação do tecido económico e social, de forma articulada com a resposta imediata da UE a esta crise económica, financeira e social, bem como com o próximo quadro financeiro plurianual 2021-2027;
- A importância de, face à conjuntura gerada pela pandemia de Covid-19, as medidas estruturais, nomeadamente o Plano Nacional de Energia e Clima 2021-2030, a Estratégia Nacional para o Hidrogénio, o Programa Nacional de Investimentos 2030 e o Plano de Ação para a Transição Digital, carecerem de reavaliação e reorientação estratégicas;
- A necessidade de, após o PEES, de se projetar uma estratégia nacional de recuperação económica através dum plano estrutural defina as políticas públicas para a próxima década; e
- O facto de, apesar de tal plano ter natureza temporária e excecional, constituir uma prioridade para o XXII Governo Constitucional.
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Oxalá que não falhe a vontade política e que tudo resultem em prol do país de modo que ninguém fique para trás.
2020.06.09 – Louro de Carvalho

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