O Chefe de Estado, ouvido o Governo e sob autorização
do Parlamento, que a concedeu, decreta, nos termos da Constituição e da Lei (que
estabelece o regime do estado de sítio e do estado de emergência) o estado de emergência para todo o território nacional com a
duração de 15 dias, iniciando-se às 0,0 horas do dia 18 de abril e cessando às
23,59 horas do dia 2 de maio.
No plenário, PS,
PSD, BE, CDS-PP e PAN votaram a favor, enquanto o PEV e Chega se abstiveram; o PCP,
a deputada não inscrita e o líder da Iniciativa Liberal, votaram contra.
Em relação à
primeira renovação do estado de emergência, há duas semanas, mudaram o sentido
de voto o PCP e a deputada não inscrita, que se tinham abstido e, desta feita,
votaram contra; e PS, PSD, BE, CDS-PP e PAN votaram favoravelmente os três
pedidos de autorização ao Presidente da República para declarar o estado de
emergência.
***
O debate surgiu quando o crescimento exponencial da pandemia parece
afastado e o país se prepara para gradualmente reabrir a economia. E a vertente
política entrou sem contemplações na discussão parlamentar.
O Ministro da Administração Interna fez o balanço da aplicação do regime de
estado de emergência sublinhando os efeitos positivos das medidas de contenção,
elogiando o grande consenso parlamentar, político e social em torno da resposta
à crise sanitária.
O deputado do PSD André Coelho Lima garantiu o sentido de responsabilidade do
partido face às respostas do Governo à pandemia, mas sublinha que estará atento
às suas ações. Com efeito “qualquer uma das forças partidárias faria sempre o
melhor possível, mas cometeria erros”. Por isso, o PSD terá ação participativa
séria, mas “não calando as suas convicções”.
Por sua vez, o líder do PSD afirmou que “faz todo o
sentido prolongar o estado de emergência porque os resultados têm sido positivos”,
mas que é “indispensável o início do planeamento da abertura gradual” da
economia” e que só há uma forma de reabrir a economia em segurança, o uso generalizado
de máscaras, pelo que Rui Rio propôs a redução da taxa de 23% do IVA sobre as
máscaras e gel desinfetante para 6%. Além disso, por haver “alta probabilidade
de podermos ter uma segunda onda da pandemia no inverno”, instou o Governo a “preparar
o país para essa eventualidade”, através da organização do Sistema de Saúde
para esse efeito e da redução do IVA “para complementos suplementares que reforçam
o nosso sistema imunológico”.
O líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares notou
que, sendo a aplicação do estado de emergência momento excecional em
democracia, merece “fiscalização excecional”. Do que foi bem selecionou o
comportamento dos portugueses, tendo o povo estado “à altura do desafio”; do
que foi mal, frisou que o Governo ficou aquém em vários aspetos: devia ter
protegido o emprego duma forma que não protegeu, proibindo os despedimentos, mobilizando
os privados na saúde e criando o subsídio de risco para quem está na linha da
frente; e criticou medidas adotadas e dispensáveis, como a suspensão do direito
à greve, à resistência e à reunião.
A coordenadora do BE disse que o estado de emergência deve ser proporcional
e durante o tempo estritamente necessário, considerando que não deve
estender-se até ao próximo mês. Com efeito, o prolongamento dalgumas medidas de
contenção não precisa do estado de emergência; há outros mecanismos que, sem
ferir direitos constitucionais, são capazes e suficientes numa nova fase, disse
Catarina Martins, para quem é vital reforçar a capacidade de resposta do SNS e apoiar
os profissionais de saúde, responder à crise social e económica e defender o
emprego e o salário. E advertiu que o risco não vem dos trabalhadores, mas de patrões
irresponsáveis que usam a crise para despedir ou pôr a saúde dos trabalhadores
em risco, obrigando-os a trabalhar em condições inseguras, negando
teletrabalho, expondo trabalhadores de grupos de risco. Assim, defendeu que o
Governo deve ir mais longe no âmbito do exercício de poderes no estado de emergência,
apoiando mais os trabalhadores. E avisou:
“Que ninguém se engane: nada seria mais
catastrófico social e economicamente do que uma tragédia humanitária provocada
pela disseminação da doença. E, na doença como na economia, são sempre os mais
pobres que ficam mais desprotegidos. É para os proteger que deve servir o
estado de emergência.”.
O deputado do Chega, André Ventura, elogiou o sentido de civismo dos
portugueses, mas reiterou que as medidas do Governo pecaram por tardias. Disse
que o excesso de burocracia imposta às empresas e à libertação de reclusos são
aspetos negativos. Apontou várias críticas ao Governo: não resolveu as dívidas
aos fornecedores, tornando-se o “maior devedor líquido”; fornece testes à Covid-19
a outros países, quando “bombeiros e autarcas” têm falta deles; cobra o IVA pelos
materiais comprados pelas autarquias; usa a Força Aérea para transportar presos
no território nacional; tenta criar “festivais de cultura por 1 milhão de euros
quando os portugueses não têm dinheiro”. Por fim, criticou a celebração do 25
de Abril na Assembleia da República.
O deputado da Iniciativa Liberal, João Cotrim de Figueiredo, reiterou que
não era necessário o estado de emergência, pois foram tomadas antes várias
medidas de contenção e disse:
“A declaração do estado de emergência foi
uma decisão política do Presidente da República e do Governo para protegerem o
Estado à custa dos direitos dos cidadãos”.
Cotrim de Figueiredo disse que o estado de emergência é um instrumento de
defesa jurídica do Estado na resposta à Covid-19 e que vota contra porque “foram ultrapassadas várias linhas vermelhas nos direitos
dos portugueses” e o decreto abre tímida porta a alguns negócios.
A deputada não inscrita Joacine Katar Moreira
sugeriu que, a pretexto do estado de emergência, o Governo permite a “desproteção
absoluta a que estão sujeitos milhares e milhares de indivíduos”, um “alvará
para justificar despedimentos em massa” e “o uso abusivo do lay-off”.
Da parte d’ Os Verdes Mariana Silva questionou o estado de emergência e
apontou falhas à resposta do Governo: no mundo do trabalho, transformado numa
selva, no mau funcionamento dos transportes, nos problemas registados em
pequenas e médias empresas, na ausência de intervenção sobre os bancos ou na
resposta aos pequenos agricultores. E José Luís Ferreira anunciou que o partido
se abstém, frisando que as medidas de contenção dependem de tal instrumento e
não são necessárias restrições do ângulo das liberdades, direitos e garantias.
O deputado do PCP António Filipe enalteceu a postura dos portugueses, que
têm cumprido as recomendações da DGS, mas lamenta os abusos cometidos por parte
de empresas. E vincou:
“Há direitos fundamentais dos trabalhadores
que importaria acautelar. São necessárias medidas concretas que têm que ser
tomadas para acautelar esses direitos.”.
E João Oliveira aduziu que “eram justas e acertadas as
razões que levaram o PCP a afastar-se do estado de emergência”, resposta
“desnecessária e desproporcional” à pandemia, que serve “para impor aos
trabalhadores os mais diferentes abusos” e que está a “instalar o sentimento de
banalização do estado de emergência”. Mais: o Governo dirá que recusa a austeridade,
“mas ela está aí”, disse o comunista, referindo-se ao regresso do banco de
horas, aos despedimentos, à imposição de férias ou à ausência de intervenção do
Governo sobre a banca.
Inês Sousa Real, do PAN, embora aduzindo que a aplicação do estado de
emergência foi correta e contribuiu para a contenção da pandemia, apontou
falhas à ação Governo, pois devia, por exemplo, ter agido mais célere no
encerramento de fronteiras. E questionou o facto de não se ter antecipado face
à expectável escassez de equipamentos de saúde e à especulação do mercado.
E André Silva avisou que o regresso à normalidade possível tem de ser feito
de forma gradual, sem queima de etapas, pois “a pressa pode levar-nos a cometer
erros fatais”. E aduziu que, sem “planos de contingência adequados” e “uma rede
para monitorizar a evolução da doença na comunidade” todos os esforços dos
últimos meses podem ser postos em causa. Disse que “estamos longe do número
adequado de técnicos de saúde”, pelo que pediu a contratação de mais delegados
de saúde. Por outro lado, argumentando que todos os cidadãos devem ter acesso a
meios de proteção individual, como máscaras, apelou ao Governo a que responda à
escassez destes materiais e à especulação dos mercados e recordou a Rui Rio que
o PAN já apresentara a redução do IVA nas máscaras e resposta à especulação de
preços, tendo o PSD votado contra.
Telmo Correia, do CDS, demarcou-se do PSD, dizendo que “repetir o que diz o
Governo” implica tornar “inútil o papel dos partidos da oposição”. Recordando
que o CDS pediu a adoção de medidas mais cedo, nomeadamente o encerramento das
escolas a 10 de março, questionou se a resposta do Governo foi dada a tempo
útil. E, na mesma linha e face aos relatos já então conhecidos sobre a escassez
de material médico e de proteção individual, pediu uma resposta clara ao
Governo, perguntando “quando é que Portugal começou a adquirir equipamento”.
E João Almeida criticou a decisão da Conferência de Líderes de comemorar o
25 de Abril no Parlamento (eu concordo, pois está a funcionar e é liturgia democrática), em plena pandemia, declarando:
“É preciso haver credibilidade. Não se pode
proibir aquilo que as entidades públicas continuam a fazer. Não se pode proibir
a celebração da Páscoa, mantendo a celebração do 25 de Abril, que desrespeita
no Parlamento todas as normas das entidades públicas”.
Para este deputado, o estado de emergência só será eficaz se houver coerência
no discurso das entidades públicas, antecipando o alívio das medidas de
contenção a curto prazo, mas não se podendo “ouvir uma coisa num dia e outra no
dia seguinte”. E, dirigindo um agradecimento a todos os trabalhadores que
continuam a laborar na atual conjuntura, esclareceu:
“Há uma ideia muito citadina de que o país
está parado e não há fábricas a trabalhar. Esta é uma ideia citadina e errada,
há muita produção a acontecer no país, mas há muitas empresas.”.
E, reiterando que o estado de emergência não implica “unanimismo”, relevou a
pluralidade do debate político e da diferença de visões sobre as respostas à
pandemia.
O deputado do PS Pedro Delgado Alves, para quem só a declaração do estado
de emergência permitiu garantir com equilíbrio e proporcionalidade a proteção
de todos os portugueses face à pandemia, acusou o deputado do Chega de
sustentar mentiras perante a Covid-19, ao falar, por exemplo, de medidas sobre libertação de presos que “não são reais”.
E, desafiando Ventura para um debate sobre direitos fundamentais,
atirou:
“A verdade é fundamental neste momento, não
é com mentiras que construímos uma resposta à pandemia, nem assustando os
portugueses. Isso degrada a instituição parlamentar e a democracia. (…) Não estamos aqui num debate televisivo em que sai com palmadinhas
nas costas dos seus colegas depois do circo para entreter adeptos de clubes de
futebol. Aqui representamos os cidadãos com verdadeira seriedade.”.
E a líder parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, diz que só um Estado
Social forte, a mobilização dos portugueses e o reforço do investimento público
permitirão ao país ultrapassar esta crise. E apelou ao esforço dos portugueses
para cumprirem as recomendações da DGS durante este mês, pois, como referiu,
“ganhar em abril a liberdade futura é o propósito que nos tem que mobilizar”,
com vista, a curto prazo, à retoma a curto da normalidade da vida social. Segundo
a deputada, a pandemia demonstrou quão interligadas a liberdade e a
responsabilidade estão, não sendo com austeridade que se responde à crise, mas
com apoios às empresas e emprego. E a líder parlamentar do PS salientou que,
embora houvesse quem duvidasse da importância do SNS, a crise demonstrou que o
país tem “um dos melhores SNS do mundo com portas abertas a todos” e um “Estado
Social robusto” capaz de acudir a todos, sobretudo aos mais vulneráveis, e, deixando
uma palavra de agradecimento aos professores que iniciaram, no dia 14, o
arranque do 3.º período à distância, vincou:
“O que estes dias de emergência nos
trouxeram foi a certeza do empenho e da entrega dos professores que se
reinventaram e, mesmo à distância, se empenharam para não deixar nenhum aluno
para trás”.
Por último, Ana Catarina Mendes garantiu que esta emergência de saúde pública
exige novas medidas estruturais no pós-crise, como a exclusão digital de jovens
e o apoio a idosos.
É
ainda de referir que a Ministra da Saúde, em resposta ao BE, esclareceu que o Governo não recorreu aos privados porque o
SNS deu todas as respostas necessárias. E, sobre a compra de material médico,
questão levantada pelo CDS, Marta Temido informou que o Governo aderiu desde “o
primeiro momento às compras concentradas da União Europeia”.
***
Por fim, o Primeiro-Ministro, na sua intervenção, assumiu:
“Temos de viver ano, ano e meio, com a
ameaça deste vírus. Os próximos 15 dias são decisivos para preparar o nosso
próximo ano, ano e meio. Temos de aprender a convier com o vírus.”.
E prosseguiu:
“É fundamental dar confiança aos portugueses
para que possam sair de casa e para isso é preciso tornar abundante os meios de
proteção”.
Nesse sentido, anunciou que já estão aprovadas as “normas
que permitirão a massificação das máscaras comunitárias e de produção de gel desinfetante
no mercado português”. Por outro lado, alvitrou que, no regresso ao trabalho,
será importante “definir horários desencontrados” e “aumentar a oferta dos
transportes públicos”.
***
É de salientar que o
novo decreto presidencial repõe
a vigência do direito das comissões de trabalhadores, associações sindicais e
associações de empregadores à participação na elaboração da legislação do
trabalho, com exclusão de novas medidas excecionais quanto a cidadãos privados
de liberdade. E, considerando que ocorrerá o Dia do Trabalhador, as limitações ao
direito de deslocação aplicar-se-ão de modo a permitir tal comemoração, embora
com os limites expressos no decreto. Por outro lado, em função da evolução,
prevê-se a reativação gradual, faseada, alternada e diferenciada de serviços, empresas
e estabelecimentos, com horários adaptados, por setor de atividade, dimensão da
empresa, da área do estabelecimento comercial ou da sua localização geográfica
e com a adequada monitorização.
Ademais, o decreto deixa o seguinte recado ao
Governo: a execução desta renovação do
estado de emergência deve ser adequada ao momento atual e à nova fase da
mitigação em curso, sem ignorar os efeitos sociais e económicos que o
recolhimento geral necessariamente implica.
***
Temos que nos manter atentes e cooperantes, sem
acreditar demasiado que temos conquistado o milagre da vitória sobre o novo
coronavírus. Na verdade, sem saúde não há economia sustentável e sem economia sustentável
não há saúde sólida. Deus nos ajude com a sua indizível solidariedade!
2020.04.16
– Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário