terça-feira, 7 de abril de 2020

Coordenação supramunicipal do estado de emergência


Pelo seu despacho n.º 4235-B/2020, de 6 de abril, e com efeitos a partir da data da sua assinatura, o Primeiro-Ministro nomeou cinco secretários de Estado para assegurarem a coordenação regional do combate à pandemia, coordenação feita por aqueles membros do Governo no regime de proximidade a cada região tendo por referência as NUTS 2. 
Esta medida está prevista no art.º 7.º do Decreto n.º 2-B/2020, de 2 de abril, que regulamenta a prorrogação do estado de emergência decretado pelo Presidente da República, estabelecendo:
O Primeiro-Ministro procede à nomeação das autoridades que coordenam a execução da declaração do estado de emergência no território continental, a nível local, nos termos do n.º 4 do artigo 20.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, na sua redação atual”.
O n.º 4 do art.º 20.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, estabelece:
Sem prejuízo das atribuições do Governo da República, a execução da declaração do estado de emergência no território continental, a nível local, é coordenada pelos governadores civis, na área da respectiva jurisdição”.
Ora, como o XIX Governo Constitucional, embora não tenha acabado com os distritos, esvaziou-os das suas competências e acabou com os governadores civis. Em teoria, manteve o princípio organizativo plasmado no art.º 291.º da Constituição, que estabelece:
“1. Enquanto as regiões administrativas não estiverem concretamente instituídas, subsistirá a divisão distrital no espaço por elas não abrangido. 2. Haverá em cada distrito, em termos a definir por lei, uma assembleia deliberativa, composta por representantes dos municípios. 3. Compete ao governador civil, assistido por um conselho, representar o Governo e exercer os poderes de tutela na área do distrito. 4. Compete ao Presidente da República e ao Governo praticar todos os atos necessários à realização dos objetivos expressos no número anterior.”.
Com a declaração do estado de emergência, nota-se a leveza desse esvaziamento do distrito, que ficou com a coordenação supramunicipal da proteção civil e a capacidade de círculo eleitoral para eleições legislativas, ficando desprovido de autoridade global de tutela administrativa.
Não obstante, como refere o preâmbulo do despacho em referência, as NUTS II já são a área territorial consolidada da generalidade dos serviços desconcentrados da administração central ou compreendem os serviços que ainda se organizam na base distrital. Por isso, os preditos secretários de Estado são tidos “como autoridades que vão coordenar a execução da declaração do estado de emergência no território continental, ao nível local”, mas “sem prejuízo das competências dos presidentes das câmaras municipais, como autoridades municipais da política de proteção civil, nos termos do artigo 35.º da Lei de Bases de Proteção Civil”. Isto, porque se considera imprescindível “assegurar uma melhor coordenação dos serviços da administração central de nível regional ou distrital e a devida articulação supramunicipal”.
E, como “não é este o momento para a institucionalização de novas instâncias” e como “devem antes aproveitar-se as estruturas existentes”, a coordenação respeitará a divisão geográfica das NUTS 2 do Continente: Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve.
Assim, a coordenação regional do Norte será assegurada pelo Secretário de Estado da Mobilidade, Eduardo Pinheiro; a do Centro pelo Secretário de Estado do Desporto, João Paulo Rebelo; a de Lisboa e Vale do Tejo pelo Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro; a do Alentejo pelo Secretário de Estado da Defesa Nacional, Jorge Seguro Sanches; e a do Algarve pelo Secretário de Estado das Pescas, José Apolinário.
A escolha destes nomes obedeceu a alguns pressupostos. Por um lado, são pessoas que têm relação de proximidade com as respetivas regiões que vão coordenar, tendo eles todos desempenhado funções de Estado ou de direção intermédia do PS nessas suas regiões. Com efeito, Duarte Cordeiro foi vereador na Câmara Municipal de Lisboa e preside à Federação da Área Urbana de Lisboa; José Apolinário liderou a federação do Algarve e foi presidente da Câmara Municipal de Faro; Eduardo Pereira foi presidente da Câmara de Matosinhos e desempenhou vários cargos de gestão nesse município e no Grande Porto; João Paulo Rebelo foi vereador da Câmara Municipal de Viseu; e Jorge Seguro Sanches foi presidente do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano. Por outro lado, não integram a “linha da frente” do Governo para o combate à pandemia de Covid-19. Daí que não tenham sido escolhidos secretários de Estado do Ministério da Saúde ou da Economia. Depois, a decisão de escolher secretários de Estado para esta tarefa deve-se à perceção de que nomear novas personalidades poderia gerar ruído e até incompreensão, mas, ao integrarem já o Governo estão dentro dos procedimentos e práticas do exercício do poder executivo.
Como foi referido, o objetivo desta medida é implementar uma coordenação horizontal de todas as entidades e serviços desconcentrados do Estado que, em cada região, estão envolvidos neste combate durante o período de crise, garantindo resposta agilizada às necessidades, por exemplo, a ligação entre os serviços de saúde e os lares, bem como assegurar a articulação entre as autarquias e as entidades do setor social, como as IPSS e as Misericórdias.
Porém, é de clarificar que, embora tenham funções de desempenho da autoridade do Estado na coordenação do combate à pandemia de Covid-19, estes coordenadores regionais não são equiparáveis aos antigos governadores civis, até porque desempenharão esta função temporariamente enquanto for necessário agilizar a resposta à pandemia. Isto “sem embargo de, em situações de calamidade pública, a coordenação mencionada ser assegurada pelos comandantes operacionais distritais de operações de socorro, na área da respectiva jurisdição”.
O decreto do estado de execução do estado de emergência criou esta figura de autoridades por região, que na verdade vão servir para “coordenar” todos os organismos estatais a nível regional, para facilitar e tornar mais eficiente a execução do estado de emergência. Está em causa a coordenação dos serviços de saúde, de Segurança Social ou de apoio a empresas. Por exemplo, se houver uma necessidade de fazer testes num determinado local, estas entidades poderão agilizar a situação, ou, se necessário for, poderão chamar as forças armadas.
No seu despacho, o Primeiro-Ministro especifica as competências destes coordenadores:
- Coordenação horizontal das entidades, organismos ou serviços de âmbito regional ou distrital da administração direta e indireta do Estado, necessários no combate à pandemia de Covid-19, promovendo a articulação de todas as estruturas desconcentradas do Estado existentes na respetiva NUT II que se devam mobilizar na execução do estado de emergência; 
- Articulação e interlocução com as autarquias locais e as diversas entidades dos setores social e económico na respetiva NUT II; e
- Articulação com a Estrutura de Monitorização do Estado de Emergência, coordenada pelo Ministro da Administração Interna, prevista na alínea b) do art.º 30.º do Decreto n.º 2-B/2020, de 2 de abril, para acompanhamento e produção de informação regular sobre a situação local. 
***
Só me pergunto porque não se fez isto na 1.ª edição do estado de emergência. Nem o Governo, que escuta e decide, nem a sociedade civil, que sugere e exige, previram tal necessidade? Seja como for, esperamos que isto resulte na máxima minimização dos efeitos nefastos da pandemia.
Deus adiuvet!
2020.04,07 – Louro de Carvalho

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