O Chefe
de Estado esteve hoje, dia 15 de abril, em reunião com especialistas para
analisar a situação epidemiológica em Portugal, acabando por sinalizar ajustes
na quase certa renovação do estado de emergência, para um terceiro período de
exceção até ao dia 1 de maio, sendo que tal renovação possa, nalgumas facetas,
não diminuir as exigências de abril relativamente à circulação das pessoas,
mas, por outro lado, apontar para o que vai ser a realidade de maio.
O
Presidente da República acrescentou que “é cedo para estarmos a falar do que
vai ser assunto a decidir no início de maio”, pois haverá uma reunião, proposta
pelo Primeiro-Ministro, a 28 de abril para ver os dados, a evolução e fazer o balanço
do que se passou em abril e decidir em relação ao futuro imediato”.
Minutos
antes daquelas declarações no Infarmed, Marcelo indicou que maio será um mês de
“transição progressiva”, frisando que, “se abril correr até ao fim, como
esperamos, os portugueses começarão a habituar-se à ideia de conviver com a
realidade dum vírus que foi vencido no que representava um risco grave e passa
a ser um dado da vida do dia a dia”. E, avisando que “esta é uma transição que
terá de ser feita com precaução”, elogiou as atitudes dos portugueses na seriedade
de proteção sanitária e no distanciamento no convívio com os outros, agora com
o horizonte de retoma progressiva da vida social e económica.
Nestes
termos, afirmou que tudo aponta para que “maio comece a ser progressivamente
diferente, uma razão de esperança para todos os que estão confinados, porque
representa a tal luz ao fundo do túnel de que falava o Primeiro-Ministro para
que se comecem a ver essas luzinhas na vida dos portugueses”.
Questionado
sobre as restrições a levantar gradualmente, comparando com outros países europeus,
o Chefe de Estado aproveitou para traçar as diferenças: “em Espanha, foram
levantadas as restrições nos setores da construção e da indústria”, quando em
Portugal estas atividades nunca estiveram sob restrição, à exceção do concelho
de Ovar; e “à indústria nunca houve restrições”, como declarou, depois, aos
jornalistas o Primeiro-Ministro, que sublinhou:
“Quando começarmos a eliminar as restrições, terá de ser sempre feito de
um modo gradual e progressivo. (…) Há um dado que sabemos: sempre que
retirarmos uma medida de restrição sem que haja tratamento, o número de
contágios vai aumentar. O que temos é de saber se quando esse aumento do risco
de contaminação é controlável ou não.”.
***
A 10 de abril, o Presidente da República já dava por garantida a renovação do estado
de emergência até 1 de maio, mas considerava prematuro pensar já numa renovação
até meados do mesmo mês, como deixou perceber o Primeiro-Ministro no dia 9.
Segundo Marcelo,
impunha-se “fazer o acompanhamento dia a dia, pois queremos que a nossa
recuperação seja contínua e não haja risco de recaídas, que são sempre mais
difíceis”.
O Chefe de
Estado, reiterando a ideia da necessidade de ganhar abril para haver uma luzinha
em maio, advertia:
“Se queremos perspetivas no mês de maio,
temos de garantir, até ao final de abril, um decrescimento em números absolutos
da infeção. (…) não podemos afrouxar nem baixar a guarda. (…) Estamos em
véspera de formalizar a [segunda] renovação do estado de emergência. Esperamos
e estamos a trabalhar para que corra o melhor possível, mas uma avaliação
realista só será feita no final [deste período].”.
E atirava
para este dia 15, depois de nova sessão técnica sobre o evoluir da situação portuguesa,
a audição ao Governo sobre a proposta de renovação do estado de emergência, que
terá de ser votada no Parlamento no dia 16 (amanhã). Em qualquer caso, considerava não haver necessidade
de “repetir restrições tão restritivas como na Páscoa” e agradeceu aos
portugueses a forma como estão a respeitar essas restrições, pedindo que o continuassem
a fazer até a dia 13. Quis também manifestar o seu apoio à solução
apresentada pelo Governo para resolver o ano letivo, considerando que
era “a solução possível, no meio de muitas incertezas” e “uma proposta
honesta para minorar custos”. E referiu que a solução de regresso às aulas
presenciais para o 11.º e 12.º anos, por serem os que têm exames, tem o dom
de “evitar as passagens administrativas, a pior solução”.
Não sei se a
sujeição desses alunos, e só desses, a exames nacionais (bem como a
dos alunos que estão fora do sistema formal de ensino) garante as suficientes condições de equidade (tão
propalada) em relação a
estes alunos, aos demais alunos do sistema e à missão da escola. Não será antes
uma sujeição ao posicionamento inerte das instituições do ensino superior e às
exigências e expectativas dos alunos que frequentam os colégios ou as escolas
públicas ditas de referência?
Marcelo,
depois de ter colocado, na página da Presidência, uma nota com o elenco de
crimes excluídos dos indultos e dos perdões excecionais de pena por causa
da pandemia, insistiu em clarificar que estas medidas, aprovadas no Parlamento
e já por si promulgadas, “não cobrem crimes especialmente graves” e, insistindo
em que os indultos ou perdão de penas acontece apenas “por razões éticas, humanitárias
e de saúde pública”, disse que “há uma razão específica” para estas medidas
excecionais “num quadro que não admite especulações com falsas notícias e
alarmismos injustificados”.
Garantiu, no
entanto, que indultará “caso a caso”, sempre excluindo os crimes mais graves,
como o homicídio, a violência sexual (incluindo a pedofilia), de género ou racial, bem como o roubo com violência,
o crime de incêndio, o tráfico de droga, a associação criminosa, o branqueamento
de capitais e a corrupção passiva ou ativa. Neste leque de exceções incluem-se
ainda crimes cometidos por alguém “enquanto titular de cargo político ou de
alto cargo público, magistrado judicial ou do Ministério Público, ou enquanto
membro das forças policiais e de segurança, das Forças Armadas ou funcionários
e guardas dos serviços prisionais” – esclareceu.
Interpelado sobre o acordo
alcançado no Eurogrupo, que disponibilizou um pacote de 500 mil milhões de
euros para fazer frente aos efeitos económicos da pandemia, Marcelo, mais
do que se mostrar satisfeito, deixou uma palavra dura:
“É um começo, mas a Europa tem a obrigação
de ir mais longe no futuro”.
Para o Chefe
de Estado, as medidas acordadas, além de modestas, pecam por tardias: “Seria grave que a Europa não se unisse
nestas circunstâncias; já devia ter sido” – vincou.
E, sobre os
4600 milhões de euros disponibilizados a Portugal, considerou que “é uma ajuda
para pagar os layoffs e os salários dos pais que ficam em
casa por causa dos filhos”, mas pouco mais. E sentenciou:
“A Europa vai ter de olhar com muita atenção
para aquilo que vai ser a necessidade de reconstrução europeia”.
***
Porque
os dados da situação económica são demolidores e sem economia é impossível
segurar a saúde, o Primeiro-Ministro ouviu especialistas em assuntos económicos
e sociais, que equacionam a questão em termos de a economia só reabrir se as pessoas
tiverem confiança para voltarem à rua para trabalhar e consumir sem correrem o
risco da Covid-19. E tornou-se esta a chave do plano que o Governo quer pôr no
terreno dentro de “algumas semanas” para o levantamento gradual das restrições.
No fim das reuniões que duraram o dia todo de 14 com mais de 20 economistas, o
Ministro da Economia não avançou com uma data para a reabertura da atividade
económica, nem antecipou se o próximo estado de emergência conterá medidas de
alívio ao confinamento, mas sinalizou que a saída do isolamento pode ser feita
através da utilização de máscaras comunitárias, “medida de proteção em grande
escala de que até ao momento não dispúnhamos verdadeiramente”.
Siza
Vieira, falando aos jornalistas em São Bento após uma reunião entre Governo,
economistas e entidades que fazem previsões para a economia portuguesa,
declarou:
“De uma maneira geral, há uma partilha importante da ideia de que temos
de ir construindo uma confiança coletiva na capacidade que tivermos de proteger
as populações, de proteger os elementos mais frágeis da população, à medida que
nos formos preparando para o levantamento das restrições à atividade económica
e à circulação dos cidadãos. Isso é uma componente muito importante da nossa estratégia
de transição.”.
O
governante frisou a necessidade de “criar na população, nas empresas, a
confiança de que estão reunidas as condições para o retorno da atividade gradual
progressiva” e referiu que, “daqui a algumas semanas, quando se começar a
equacionar o levantamento destas restrições, a mesma autodisciplina, a mesma
capacidade de gerir o risco” será pedida às pessoas e às empresas, que têm de
ter capacidade de assegurar um ambiente de trabalho em que as pessoas se sintam
protegidas duma possível contaminação. Sem entrar em detalhes sobre como isso
se fará, deixou alguns sinais ao destacar que foram conhecidas ontem, dia 14, normas
técnicas que permitem a construção de máscaras sociais com maior proteção e que
as empresas portuguesas já têm capacidade de as fabricar em grande quantidade,
podendo ser distribuídas pelos circuitos de comercialização. E salientou que as
decisões do Governo sobre a reabertura da atividade incidirão sobre as
atividades em que houve decisão administrativa de fecho, sendo que as restantes
(como
a indústria ou a hotelaria)
estão abertas e as que fecharam foi por falta de fornecimento ou de procura.
A
reunião de Costa com os economistas ocorreu no dia em que se conheceram as
previsões do FMI (Fundo Monetário Internacional), segundo as quais o PIB deverá
cair este ano 8% (e o défice de 7,1%), cenário mais pessimista que o
apresentado no final de março pelo BdP (Banco de Portugal), que apontava para a descida do
PIB até 5,7%. Um inquérito feito do BdP e do INE (Instituto
Nacional de Estatística)
mostra o impacto das medidas de isolamento: na semana antes da Páscoa, 82% das
empresas estavam a produzir ou a funcionar, mas mais de 1/3 com uma quebra de
produção superior a 50% na faturação. E os números vão ser “duros”, embora o
Ministro das Finanças tenha dito à TVI que a quebra anual do PIB não será
superior a dois dígitos.
Um dos
temas mais falados no encontro foi o da confiança. Segundo Susana Peralta,
professora na Nova SBE, esta crise deixa um lastro de desconfiança no sistema
e, portanto, “quando se fala em reativar a economia, tem de se perceber como é
que se transmite confiança”. E a ideia de que a causa da crise económica não
são as medidas de contenção, mas a pandemia, foi referida para clarificar que,
se o Governo optar por abrir demasiado cedo as atividades, isso só terá
resultado se as pessoas se sentirem confiantes.
A
professora, sustentando que deve aproveitar-se a oportunidade da
consciencialização entre os portugueses do que significa um risco sistémico,
para atacar outros problemas, defendeu que um eventual plano de relançamento
económico europeu poderia ser usado em Portugal para investir na orla costeira
e preparar as cidades para um sismo, por exemplo. E outra ideia referida pelos
economistas foi a de que se deve tentar “não fazer uma retoma baseada no
trabalho de má qualidade”, má organização e salários baixos e falta de formação
laboral e gestionária.
Enfim,
há que aprender com o confinamento e com a crise que se aproxima para a
ultrapassar.
2020.04.15 –
Louro de Carvalho
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