quinta-feira, 23 de maio de 2019

O Parlamento aprovou alterações ao regime da educação inclusiva



O regime jurídico da educação inclusiva em vigor foi estabelecido e regulado pelo Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, que deu origem à publicação “Para uma Educação Inclusiva – Manual de Apoio à Prática cuja finalidade é “apoiar os profissionais na implementação do novo regime jurídico da educação inclusiva, assim como apoiar os pais/encarregados de educação na sua colaboração com a escola”.
É certo que a educação inclusiva, como desígnio nacional já vem de há muito tempo em democracia. Recorde-se que, antes do diploma em referência, o regime estava em prática à luz do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, alterado pela Lei n.º 21/2008, de 12 de maio, e da Portaria n.º 201-C/2015, de 10 de julho, que ficaram revogados por este ordenamento. E, já antes, vigorava o  Decreto-Lei n.º 174/77, de 2 de maio, que definia o regime escolar dos alunos portadores de deficiência física ou psíquica, e o Decreto-Lei n.º 84/78, de 2 de maio, que aplicava ao ensino primário os princípios definidos no Decreto-Lei n.º 174/77, de 2 de maio – aos quais sucedeu o Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de agosto.
Porém, havia que seguir com um regime que tivesse em linha de conta a posição sobre a matéria por parte da UNESCO, em 2009, que assume “o compromisso com a educação inclusiva enquanto processo que visa responder à diversidade de necessidades dos alunos, através do aumento da participação de todos na aprendizagem e na vida da comunidade escolar” – compromisso que o Governo adotou como prioridade política para “concretizar o direito de cada aluno a uma educação inclusiva que responda às suas potencialidades, expectativas e necessidades no âmbito de um projeto educativo comum e plural que proporcione a todos a participação e o sentido de pertença em efetivas condições de equidade, contribuindo assim, decisivamente, para maiores níveis de coesão social” (vd preâmbulo do DL n.º 54/2018, de 6 de julho).
A este desígnio nacional veio responder o Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, e o predito “Manual de Apoio à Prática”
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Entretanto, no passado dia 15 de maio, a Assembleia da República aprovou alterações ao regime jurídico da educação inclusiva, na sequência dos pedidos de apreciação parlamentar do BE e do PCP, que alegadamente traz mais direitos para os pais e respostas às necessidades de cada criança. Por exemplo, o PCP refere que, apesar das “muitas expectativas criadas com a publicação do decreto-lei” que substituiria o anterior regime, de 2008, o novo diploma acabou por suscitar “profundas preocupações” ao partido. E o BE refere que o decreto-lei publicado em julho de 2018 teria efeitos já no ano letivo 2018/2019, “um aperto de prazos” que, para o partido, “parece ser um convite a que não corra bem”. Por isso, ambos os partidos pediram a apreciação parlamentar e o texto final acabou aprovado com abstenção do PSD e do CDS e o voto a favor dos restantes partidos.
As presentes alterações, resultantes dos projetos da Apreciação Parlamentar n.º 67/XIII/ (BE) e da Apreciação Parlamentar n.º 68/XIII/ (PCP), trazem, segundo dizem, entre outras, mais direitos para os pais e educadores que passam a poder participar na equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva como elemento variável e a poder participar na elaboração e na avaliação do relatório técnico-pedagógico e do plano individual de transição, além do programa educativo individual (este último já o prevê o atual regime). Nesse sentido, podem igualmente pedir a revisão do relatório técnico-pedagógico e do plano individual de transição e não só do programa educativo individual. E, em caso de mudança de escola, o aluno tem direito a levar o relatório técnico-pedagógico consigo. Por sua vez, as escolas têm de definir indicadores para avaliar a eficácia das medidas através das tais equipas multidisciplinares. Por outro lado, sempre que o aluno tenha um programa educativo individual, este tem de ser complementado com um plano individual de transição de modo a promover a transição para a vida pós-escolar e, sempre que possível, para uma atividade profissional ou para a continuação dos estudos além da escolaridade obrigatória. E os alunos apoiados pelos centros de apoio de aprendizagem têm prioridade na renovação da matrícula, independentemente da sua área de residência.
Estas alterações obrigam o Governo a garantir os meios necessários para que todos os trabalhadores tenham formação específica gratuita de apoio à aprendizagem e à inclusão (esta é, a meu ver, a grande novidade que espero ver concretizada). A expectativa é a de que estas alterações entrem em vigor no próximo ano letivo, mas está dependente da publicação da regulamentação a que o Governo deve proceder no prazo de 30 dias a partir da publicação do normativo.
Na reunião plenária de 15 de maio foram votados outros projetos de partidos em matéria de direitos das crianças, mas todos eles foram rejeitados. Eram eles:
- O projeto de resolução do CDS-PP a recomendar ao Governo o alargamento do âmbito e das competências da atual Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens;
- O projeto de resolução do BE para a criação de um Comité Nacional para os Direitos da Criança;
- E o projeto de lei do PCP para a criação da Comissão Nacional dos Direitos das Crianças e Jovens, assim como o projeto para a criação de um Observatório para monitorizar a aplicação da Convenção dos Direitos da Criança.
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O texto final configura uma lei, em 5 artigos, que procede à primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, que ‘estabelece o regime jurídico da educação inclusiva’ e dá nova redação aos seus artigos 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 21.º, 25.º, 27.º, 28.º, 32.º, 33.º, 36.º e 37.º.
Assim, a alínea b) do seu artigo 2.º define como “adaptações curriculares não significativas”:
As medidas de gestão curricular que não comprometem as aprendizagens previstas nos documentos curriculares, podendo incluir adaptações ao nível dos objetivos e dos conteúdos, através da alteração na sua priorização ou sequenciação, ou na introdução de objetivos específicos que permitam atingir os objetivos globais e as aprendizagens essenciais”.
A alínea e) do art.º 3.º considera a flexibilidade como:
A gestão flexível do currículo, dos espaços e dos tempos escolares, de modo que a ação educativa nos seus métodos, tempos, instrumentos e atividades possa responder às especificidades (em vez de singularidades) de cada um”.
As alíneas a), b) e c) do n.º 2 do art.º 4.º têm a seguinte redação:
“a) Participar na equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva, na qualidade de elemento variável;
“b) Participar na elaboração e na avaliação do relatório técnico-pedagógico, do programa educativo individual e do plano individual de transição, quando estes se apliquem;
“c) Solicitar a revisão do relatório técnico-pedagógico, do programa educativo individual e do plano individual de transição, quando estes se apliquem”.
O n.º 4 do art.º 5.º passa a ter a seguinte redação:
As escolas devem, ainda, através das equipas multidisciplinares, definir indicadores destinados a avaliar a eficácia das medidas referidas no número anterior”.
O art.º 7.º passa a ter um n.º 5 que estipula:
As medidas previstas nos artigos seguintes não prejudicam a consideração de outras que, entretanto, possam ser enquadradas”.
O n.º 3 do art.º 8.º passa a ter a seguinte redação:
As medidas universais, incluindo apoio tutorial preventivo e temporário, são mobilizadas para todos os alunos, incluindo os que necessitam de medidas seletivas ou adicionais, tendo em vista, designadamente, a promoção do desenvolvimento pessoal, interpessoal e de intervenção social”.
E é acrescentado um n.º 4 ao mesmo art.º 8.º, que estipula:
A aplicação das medidas universais é realizada pelo docente titular do grupo/turma, e sempre que necessário em parceria com o docente de educação especial, enquanto dinamizador, articulador e especialista em diferenciação dos meios e materiais de aprendizagem e de avaliação”.
O n.º 3 do art.º 9.º passa a ter a seguinte redação:
A monitorização e avaliação da eficácia da aplicação das medidas seletivas é realizada pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva, de acordo com o definido no relatório técnico-pedagógico".
E é acrescentado um n.º 6 ao mesmo art.º 9.º, que estipula:
A aplicação das medidas seletivas é realizada pelo docente titular do grupo/turma, e sempre que necessário em parceria com o docente de educação especial, enquanto dinamizador, articulador e especialista em diferenciação dos meios e materiais de aprendizagem e de avaliação”.
Os n.os 6, 7 e 8 do art.º 10.º passam a ter a seguinte redação:
“6. A monitorização e avaliação da eficácia da aplicação das medidas adicionais é realizada pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva, de acordo com o definido no relatório técnico-pedagógico.
“7. As medidas adicionais são operacionalizadas com os recursos materiais e humanos disponíveis na escola, privilegiando-se o contexto de sala de aula, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
“8. Quando a operacionalização das medidas previstas no número 4 implique a necessidade de mobilização de recursos adicionais, estes devem ser garantidos pelo Ministério da Educação, após pedido fundamentado do diretor da escola”.
É acrescentado um n.º 6 ao art.º 11.º, que estipula:
“Compete ao Governo garantir os meios necessários para habilitar, com a formação específica gratuita de apoio à aprendizagem e à inclusão, todos os trabalhadores”.
É acrescentado um n.º 4 e um n.º 5 ao art.º 12.º, que estipulam, respetivamente:
“4. Os elementos definidos no número anterior podem ser reforçados de acordo com as necessidades de cada escola.
“5. São elementos variáveis da equipa multidisciplinar o docente titular de grupo/turma ou o diretor de turma do aluno, o coordenador de estabelecimento, consoante o caso, outros docentes do aluno, assistentes operacionais, assistentes sociais e outros técnicos que intervêm com o aluno.”.
O n.º 6 é o anterior n.º 5, o n.º 7 é o anterior n.º 6, o n.º 8 é o anterior n.º 7, o n.º 9 é o anterior n.º 8 e a sua alínea c) tem a seguinte redação: 
Acompanhar, monitorizar e avaliar a aplicação de medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão”.
O n.º 10 é o anterior n.º 9.
É acrescentado ao art.º 13.º um n.º 8, que estipula:
No sentido de concretizar a constituição, as funções e a abrangência do centro de apoio à aprendizagem, a Escola deverá estabelecer, em sede de Regulamento Interno, entre outros aspetos, no seu quadro de autonomia, o seguinte:
“a) Constituição e coordenação do Centro de Apoio à Aprendizagem (CAA);
“b) Local e horário de funcionamento do CAA;
“c) Recursos humanos e materiais existentes;
“d) Formas de concretização dos objetivos específicos, de acordo com os pontos 2 e 6;
“e) Formas de articulação com os recursos humanos e materiais, dos saberes e competências da escola, designadamente no que respeita ao apoio e à avaliação das aprendizagens.
“f) Para o efeito das alíneas anteriores pode ser elaborado um regimento próprio, onde também constem as formas de medição do impacto do CAA na inclusão e aprendizagem de todos os alunos.”.
É acrescentado ao art.º 21.º um n.º 2, que estipula:
Em caso de mudança de escola o relatório técnico pedagógico acompanha a criança ou o aluno”.
O n.º 3 é o anterior n.º 2, o n.º 4 é o anterior n.º 3, o n.º 5 é o anterior n.º 4, o n.º 6 é o anterior n.º 5, o n.º 7 é o anterior n.º 6, o n.º 8 é o anterior n.º 7, o n.º 9 é o anterior n.º 8, o n.º 10 é o anterior n.º 9 e o n.º 11 é o anterior n.º 10.
O n.º 1 do art.º 25.º passa a ter a seguinte redação:
Sempre que o aluno tenha um programa educativo individual deve este ser complementado por um plano individual de transição destinado a promover a transição para a vida pós-escolar e, sempre que possível, para o exercício de uma atividade profissional ou possibilitando o prosseguimento de estudos além da escolaridade obrigatória”.
É acrescentado ao art.º 27.º um n.º 4, que estipula:
Os alunos apoiados pelos centros de apoio de aprendizagem têm prioridade na renovação de matrícula, independentemente da sua área de residência.
Acrescentam-se ao n.º 5 do art.º 28.º as alíneas d) e e), que incluem, no âmbito das adaptações ao processo de avaliação: “d) a transcrição das respostas; e) a leitura de enunciados”. A alínea f) é a anterior alínea d), a alínea g) é a anterior alínea e) e a alínea h) é a anterior alínea f).
Ao art.º 32.º é acrescentado um n.º 3, que estipula:
O manual de apoio a que se refere o número anterior deve ser um documento passível de atualizações, que resultem da inclusão de novo conhecimento em função da experiência da aplicação do disposto neste mesmo decreto-lei”.
Ao art.º 33.º é acrescentado um n.º 4, que estipula:
Caberá igualmente à Inspeção-Geral da Educação e Ciência avaliar as condições físicas e todos os tipos de recursos de que as escolas dispõem para a aplicação deste decreto-lei, designadamente para dar cumprimento ao disposto nos artigos 9.º e 10.º”.
O n.º 5 é o anterior n.º 4 e o n.º 6 é o anterior n.º 5.
E acrescentam-se ao mesmo art.º 33.º os n.os 7 e 8, que estipulam:
“7. Sem prejuízo do disposto no número anterior, o Ministério da Educação promove a avaliação da implementação do presente decreto-lei no prazo de dois anos após a sua entrada em vigor, tornando públicos os seus resultados.
“8. O Governo compromete-se, no prazo de 90 dias, à publicação de uma portaria que regulamente o conjunto de indicadores estatísticos com base nos quais, ainda que de forma não exaustiva, se caraterizem e avaliem as medidas e os resultados da política de inclusão na educação, para a qual o presente decreto-lei concorre.”.
Ao art.º 36.º é acrescentado um n.º 3 que estipula:
Da aplicação do previsto na presente lei não pode resultar perda de direitos e de apoios a todas as crianças e jovens, salvaguardando sempre o superior interesse da criança e jovem”.
Os n.os 1 e 2 do art.º 37.º passam a ter a seguinte redação:
“1. As condições de acesso, de frequência e o financiamento dos estabelecimentos de educação especial são definidos por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da educação, a publicar no prazo de 30 dias.
“2. Até à publicação da regulamentação referida no número anterior, mantém-se em vigor a legislação aplicável.”.
As alterações inseridas no decreto-lei em causa, submetido à apreciação parlamentar, são regulamentadas pelo Governo no prazo de 30 dias após a publicação da lei que as estabelece, com vista à sua aplicação a partir do ano letivo 2019-2020.
É republicado, em anexo à lei que o alterou e da qual faz parte integrante, o Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, com a redação atual.
A lei que estabelece as preditas alterações entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
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Contam-se, pelo menos 15 normas com alterações e 16 normas novas – o que não é pouco. Mas não se pode dizer em absoluto que os pais tenham conseguido mais direitos ou menos. A sua participação e as possibilidades de sua exigência estabelecidas resultam simplesmente da coerência dos mecanismos estabelecidos para concretizar o desígnio da educação inclusiva.
Por outro lado, parece terem ficado mais circunscritas algumas responsabilidades e alargadas outras e especificadas mais algumas tarefas – tudo em nome da coerência sistémica. Mas não há dúvidas de que o papel da escola ficou reforçado e aumentadas as tarefas dos seus trabalhadores.
É de esperar que tudo resulte, embora se duvide do êxito real do conceito de inclusão que obrigue à ocupação permanente, por todos, do mesmo espaço e do mesmo tempo e só variando o número e volume de agentes. Mas os políticos sabem tudo ou quase tudo…  
2019.05.22 – Louro de Carvalho 

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