Disse-o, citando Henri de Lubac, o Papa Francisco na homilia da Missa do Domingo
de Ramos e da Paixão do Senhor, a que presidiu na Praça de São Pedro.
No início da
celebração, o Pontífice deslocou-se ao centro da Praça, junto ao obelisco de
origem egípcia que ficava no antigo circo romano – onde morreu, crucificado de
cabeça para baixo por não se considerar digno de morrer como o Mestre, o
Apóstolo Pedro – e ali abençoou as palmas e os ramos de oliveira. Depois da proclamação
de apropriada perícopa do Evangelho de Lucas (Lc 19,28-40), presidiu à procissão para o altar, situado em frente à
fachada da Basílica, para a celebração da Missa.
***
Na homilia
sublinhou a notória contradição entre “as aclamações da entrada em Jerusalém e
a humilhação de Jesus”, os clamores de júbilo e festas seguidos do
encarniçamento feroz a exigir a crucifixão do Senhor. E vincou a necessidade
de, animados pelo Espírito Santo, obtermos o que se pede na oração: acompanhar
com fé o caminho do Salvador e ter presente o ensinamento da sua Paixão “como
modelo de vida e de vitória contra o espírito do mal”. Com efeito, o
Senhor ensina atitudinalmente “como
enfrentar os momentos difíceis e as tentações mais insidiosas, guardando no
coração uma paz que não é isolamento”, mas abandono confiante nas mãos do
Pai e entrega à sua vontade de salvação, de vida, de misericórdia. Apesar de se
ver, em toda a sua missão (“desde
o início, nos 40 dias no deserto, até ao fim, na Paixão”), “assaltado pela tentação de ‘fazer
a sua obra’, escolhendo Ele o modo e desligando-Se da obediência ao Pai”, Jesus
repele tal ideia-força e obedece confiadamente ao Pai.
Acentuou o
Papa:
“Agora,
o príncipe deste mundo tinha uma carta para jogar: a carta do triunfalismo. Mas
o Senhor respondeu permanecendo fiel ao seu caminho, o caminho da humildade.”.
E vincou:
“O
triunfalismo procura tornar a meta mais próxima por meio de atalhos, falsos
comprometimentos. Aposta na subida para o carro do vencedor. O triunfalismo
vive de gestos e palavras, que não passaram pelo cadinho da cruz; alimenta-se
da comparação com os outros, julgando-os sempre piores, defeituosos,
falhados... Uma forma subtil de triunfalismo é a mundanidade espiritual, que
é o maior perigo, a mais pérfida tentação que ameaça a Igreja (Henri de Lubac). Jesus destruiu o triunfalismo com a sua Paixão.”.
E, frisando
que Jesus Se alegrou com a iniciativa do povo e com os clamores dos jovens que
gritavam o seu nome, aclamando-O Rei e Messias, a ponto de retorquir a quem
desejava calá-los, que, se eles se calassem, gritariam as pedras (cf Lc 19,40), Francisco realça que “humildade
não significa negar a realidade, e Jesus é realmente o Messias, o Rei”. Não
obstante, segundo o Pontífice, o coração de Cristo estava no caminho santo que
só Ele e o Pai conhecem, o que vai da ‘condição divina’ à de servo, pois, “sabe
que, para chegar ao verdadeiro triunfo, deve dar espaço a Deus; e, para dar
espaço a Deus, só há um modo: o despojamento, o esvaziamento de si mesmo”, e “com
a cruz, não se pode negociar: abraça-se ou recusa-se”. Ora, pela
humilhação, Ele “quis abrir-nos o caminho
da fé e preceder-nos nele”. E, neste sentido da precedência de Cristo no
caminho da fé, o Santo Padre evocou o percurso de sua Mãe, Maria, a primeira
discípula, enfatizando que “a Virgem e os santos tiveram de padecer para
caminhar na fé e na vontade de Deus”. E explicitou, citando São João Paulo II,
Enc. Redemptoris Mater, 17:
“No
meio dos acontecimentos duros e dolorosos da vida, responder com a fé custa ‘um
particular aperto do coração’. É a noite da fé. Mas, só desta noite é que
desponta a aurora da ressurreição. Ao pé da cruz, Maria repensou as palavras
com que o Anjo Lhe anunciara o seu Filho: ‘Será grande (...). O Senhor Deus vai
dar-Lhe o trono de seu pai David, reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o
seu reinado não terá fim’ (Lc 1,32-33). No Gólgota, Maria depara-Se com o
desmentido total daquela promessa: o seu Filho agoniza numa cruz como um
malfeitor. Deste modo o triunfalismo, destruído pela humilhação de Jesus, foi
igualmente destruído no coração da Mãe; ambos souberam calar. [E], precedidos
por Maria, incontáveis santos e santas seguiram a Jesus pelo caminho da
humildade e da obediência.”.
Depois, em Dia Mundial da Juventude, lembrando os
inúmeros santos e santas jovens, especialmente os de ‘ao pé da porta’, pediu
aos jovens que não se envergonhem de manifestar o seu entusiasmo por Jesus, “gritar
que Ele vive, que é a vossa vida”, e que não tenham medo “de O seguir pelo
caminho da cruz”. E exortou-os ao seguimento de Jesus na total confiança no
Pai:
“Quando
sentirdes que vos pede que renuncieis a vós mesmos, que vos despojeis das
próprias seguranças confiando-vos completamente ao Pai que está nos céus, então
alegrai-vos e exultai! Encontrais-vos no caminho do Reino de Deus.”.
Salientando
que Jesus vence mesmo a tentação de responder, de ser ‘mediático’, observou:
“Nos
momentos de escuridão e grande tribulação, é preciso ficar calado, ter a
coragem de calar, contanto que seja um calar manso e não rancoroso. A mansidão
do silêncio far-nos-á aparecer ainda mais frágeis, mais humilhados, e então o
demónio ganha coragem e sai a descoberto. Será necessário resistir-lhe em
silêncio, ‘conservando a posição’, mas com a mesma atitude de Jesus.”.
Com efeito,
para Francisco, a guerra entre Deus e o príncipe deste mundo não se trava
empunhando a espada, mas permanecendo calmos, firmes na fé. Sendo a hora de
Deus, a “hora em que Deus entra na
batalha, é preciso deixá-Lo agir” e “o
nosso lugar seguro será sob o manto da Santa Mãe de Deus”. E o Pontífice
desafia todos os crentes cristãos:
“Enquanto
esperamos que o Senhor venha e acalme a tempestade (cf Mc 4, 37-41), com o
nosso testemunho silencioso e orante, demos a nós mesmos e aos outros a ‘razão
da esperança que está em [nós]» (1Pe 3,15). Isto ajudar-nos-á a viver numa
santa tensão entre a memória das promessas, a realidade do encarniçamento
palpável na cruz e a esperança da ressurreição.”.
***
Da mensagem homilética de Francisco, o Vatican News destaca a evidência da mundanidade
espiritual como forma subtil de triunfalismo a constituir “o maior perigo, a mais pérfida tentação que ameaça a
Igreja”; a destruição do triunfalismo por Jesus com a Paixão”; o convite aos
jovens, nesta Jornada Mundial da Juventude a nível diocesano, a não terem
vergonha de manifestarem o seu entusiasmo por Jesus.
Depois,
sobressai a antítese entre a carta do triunfalismo, jogada pelo maligno,
o príncipe deste mundo, e o caminho da humildade com que o Senhor
respondeu, o seu caminho, e em que permanece fiel. E, sendo verdade que Jesus
aceitou a iniciativa do povo e se alegrou com os gritos dos jovens, o seu
coração estava no caminho ditado pelo desígnio do Pai, o caminho da humilhação
até à morte e morte de cruz, num silêncio impressionante, só interrompido pelas
tradicionalmente conhecidas como as sete palavras de Jesus no alto da cruz:
- Pai, perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem (Lc 23,34).
- Ámen te digo: hoje mesmo estarás comigo no
Paraíso (Lc 23,43).
- Mulher, Eis aí o
seu filho...[ao discípulo]: Eis aí tua
mãe... (Jo 19,26.27).
- Meu Deus, meu Deus, para que me
desamparaste? (Elí, Elí, lama sabacthani? – Mt 27,46; ou Eloí, Eloí, lama
sabacthani? – Mc 15,34).
- Tenho sede (Jo 9,28).
- Está consumado (Jo 19,30).
- Pai, em tuas
mãos entrego meu espírito (Lc 23,46).
Referindo
que Jesus sabe dar espaço a Deus e que, para tanto, se exige
o despojamento, o esvaziamento de si mesmo, o Mestre soube e quis
abrir-nos o caminho da fé e preceder-nos nele”, no que foi
acompanhado pela Mãe e por muitos santos e santas, o Papa sublinhou que “no
Gólgota, Maria se deparou com a aparente negação total daquela promessa
davídica da anunciação: o seu Filho agoniza numa cruz como um malfeitor. Mas
destruiu assim, o triunfalismo.
Por fim,
explica o teor o triunfalismo no dizer do Papa:
“O triunfalismo procura tornar a meta mais próxima por meio de atalhos,
falsos comprometimentos. Aposta na subida para o carro do vencedor. O
triunfalismo vive de gestos e palavras, que não passaram pelo cadinho da cruz;
alimenta-se da comparação com os outros, julgando-os sempre piores, defeituosos
e falhos...”.
E reitera: “Uma forma subtil de triunfalismo é a
mundanidade espiritual, que é o maior perigo, a mais pérfida tentação que
ameaça a Igreja. Jesus destruiu o triunfalismo com a sua Paixão”.
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Celebrou-se
também, neste domingo, a 34.ª Jornada
Mundial da Juventude. Ora, as JMJ são realizadas anualmente no âmbito
diocesano, no Domingo de Ramos. Este ano, o tema da Jornada Mundial da
Juventude diocesana é “Eis aqui a serva
do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). A esse propósito o Papa disse na homilia:
“Queridos jovens, não tenhais vergonha de manifestar o vosso entusiasmo
por Jesus, gritar que Ele vive, que é a vossa vida. Mas, ao mesmo
tempo não tenhais medo de segui-lo pelo caminho da cruz. E, quando sentirdes
que Ele vos pede que renuncieis a vós mesmos, para vos despojardes das próprias
seguranças confiando completamente no Pai que está nos céus, então alegrai-vos
e exultai! Vós estais no caminho do Reino de Deus.”.
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À
recitação da oração mariana do Angelus,
no final da Missa celebrada na
Praça São Pedro, o Papa saudou todas as pessoas que participaram na celebração
eucarística e também as que a acompanharam pelos meios de comunicação. Ademais,
quis estender a sua saudação pastoral a todos os jovens que hoje, em torno dos
seus bispos, celebram a Jornada da Juventude em todas as dioceses do mundo e
convidou-os a todos a rezarem pela paz e a tornarem suas e viverem
quotidianamente as indicações da recente Exortação Apostólica Christus
vivit, fruto do Sínodo que também envolveu muitos dos jovens seus
coetâneos. Com efeito, segundo o Pontífice, cada um deles “pode encontrar inspirações fecundas para a sua vida e caminho de
crescimento na fé e no serviço aos irmãos”.
Também
Francisco ofereceu aos fiéis, na Praça São Pedro, um Terço de madeira de
oliveira feito na Terra Santa para a Jornada
Mundial da Juventude no Panamá, em janeiro passado, e para este Domingo de Ramos. E considerou:
“No contexto deste domingo, quis oferecer a todos vós reunidos na Praça
de São Pedro, um Terço especial. As contas desse Terço de madeira de oliveira
foram feitas na Terra Santa expressamente para o Encontro Mundial da Juventude
no Panamá, em janeiro passado, e para o Dia de Hoje. Por isso, renovo o meu
apelo aos jovens e a todos a que rezem o Terço pela paz, especialmente pela paz
na Terra Santa e no Oriente Médio.”.
Por fim, o
Papa pediu à Virgem Maria que nos ajude a viver bem a Semana Santa.
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Na verdade,
é conveniente que a vivência desta semana nos torne mais discípulos, mais
amigos do Senhor, mais irmãos dele e uns dos outros e mais apóstolos no sentido
de que a proposta de salvação chegue a toda a gente, sobretudo na promoção de
mais liberdade e dignidade para todos os seres humanos independentemente do
credo que professem, da cor étnica de que são portadores, da condição social
que lhes bateu à porta e da filiação ou da independência política em que fazem
questão de se abrigar. Porque o Senhor veio para que tenhamos vida e a tenhamos
em abundância. E nós somos vocacionados para este serviço à vida, à dignidade e
à liberdade de todos e de cada um. Sem isto, não há fraternidade e a igualdade estará
cada vez mais distante.
Temos, pois,
que ser contemplativos e ativos num doseamento adequado às nossas reais possibilidades
e às necessidades dos outros.
2019.06.14 – Louro de Carvalho
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