O Santuário
de Fátima assinalou, a 4 de abril, o centenário da morte de São Francisco Marto
com um programa especial, um programa intenso marcado pela memória e pela
oração.
As celebrações
começaram no dia 3, com uma vigília de oração, iniciada às 21,30 horas, com a
recitação do terço, na Capelinha das Aparições, seguida de procissão para a
Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, onde teve lugar a veneração do
túmulo de São Francisco Marto.
No dia 4 de
abril, rezou-se o terço, às 10 horas, na Capelinha das Aparições, seguindo-se a
procissão, às 10 e 45, para a Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima,
com o ícone do Santo, para a celebração da Missa Votiva dos Pastorinhos de
Fátima. Às 14 horas, procedeu-se à leitura, na mesma Basílica, da Quarta
Memória das Memórias da Ir. Lúcia. E, uma hora depois, houve
adoração eucarística no mesmo local. Às 16,30 horas, foi lida a referida Quarta
Memória no Recinto de Oração. E, uma hora depois, celebraram-se vésperas
solenes na Capela do Santíssimo Sacramento.
Também a
Fundação Francisco e Jacinta Marto assinalou a efeméride com a iniciativa
intitulada “Entre-Luz – Encontros de
espiritualidade e cultura na Casa das Candeias”, inspirada na experiência
dos Pastorinhos na aparição de maio. O primeiro encontro cultural e de
aprofundamento da espiritualidade de Fátima e dos Santos Francisco e Jacinta,
com uma abordagem multidisciplinar, realizou-se às 21 horas do dia 4, com os
oradores a Irmã Ângela de Fátima Coelho (médica e religiosa da Aliança de
Santa Maria) e o Doutor
Pedro Valinho Gomes (responsável pelo Departamento para Acolhimento de
Peregrinos) e teve como mote “O que se ouve no silêncio?” e refletiu
sobre a vida de Francisco Marto.
E a paróquia
de Fátima assinala este centenário de forma especial com a promoção de um
evento pela paz no mundo. No dia em que se recorda o centenário da morte do
pastorinho, várias comunidades católicas de todo o mundo se unem para um
momento de Adoração, oração do Santo Rosário e Consagração ao Imaculado Coração
de Maria. A iniciativa faz parte do projeto ‘Mater Fátima’ e visa celebrar o centenário da morte de Francisco
Marto, a 4 de abril de 2019, e de Jacinta Marto, a 20 de fevereiro de 2020,
unindo o mundo em oração pela paz.
A partir do
dia 4 e até ao fim deste ano pastoral, passou a ser distribuída, exclusivamente
na casa do Francisco e da Jacinta, em Aljustrel, a pagela comemorativa do
centenário da morte do Francisco, disponível nos sete idiomas oficiais do
Santuário de Fátima. Nesse dia, os peregrinos que passaram pelo quarto do
vidente tiveram a oportunidade de escutar o trecho com a narração da morte do
Francisco, retirado das Memórias da Irmã Lúcia. E, até ao final do ano pastoral,
estará sinalizado de forma especial o túmulo do santo pastorinho.
E, no dia 7,
a Basílica de Nossa Senhora do Rosário acolherá, em regime de entrada livre, pelas
15,30 horas, o Concerto Comemorativo “Inspiração do Canto Gregoriano” no Centenário da Morte de Francisco Marto, pelo Grupo
Vocal ensemble LUSIOVOCE, com
acompanhamento ao órgão de Sérgio Silva e com
direção de Clara Alcobia Coelho.
***
O cardeal Dom António Marto, Bispo de Leiria-Fátima, que presidiu à
recitação do terço e à celebração da Eucaristia no dia 4, invocou a intercessão
de São Francisco Marto para curar as feridas da humanidade, “dilacerada por tantas formas de violência”
e reparar a Igreja “tão dolorosamente abalada
pela corrupção e pelos escândalos”.
Socorrendo-se
das palavras dirigidas pelo Senhor a São Francisco de Assis, afirmou:
“Vai Francisco e repara a minha Igreja.
Também nós invocamos São Francisco Marto para esta hora dolorosa da Igreja:
Ajuda-nos a ser cristãos mais fiéis ao Evangelho e a Jesus; ajuda-nos a
descobrir o encanto da beleza de Deus; a unir-nos cada vez mais a Jesus na
Eucaristia e a sermos seus colaboradores para repararmos os pecados do mundo e
da Igreja.”.
O prelado,
cuja homilia se centrou na história de vida desta criança, uma das duas primeiras
não mártires a serem canonizadas na história da Igreja Universal (juntamente com a irmã Jacinta), referiu-se ao vidente como “um
exemplo de grande atualidade”, sobretudo para os adultos de hoje.
Evidenciando as
dimensões contemplativa e reparadora de Francisco Marto, que soube cultivar uma
relação de grande cumplicidade com Deus pela Eucaristia, Dom António Marto
vincou:
“Francisco
lembra-nos a devoção eucarística como o lugar onde alimentamos a nossa fé e,
depois, vem lembrar-nos a atualidade da missão reparadora para curar as feridas
do mundo e da humanidade, dilacerada por tantas formas de violência e reparar
também a própria Igreja do Senhor, hoje tão dolorosamente abalada pela
corrupção de alguns escândalos de responsáveis que ferem a nossa alma e a
qualidade da nossa fé e a imagem e confiança na Igreja”.
E, sublinhando
a amizade e a intimidade que Francisco tinha com Deus como a chave de leitura
da sua santidade, afirmou:
“É
necessário reparar os estragos para reconstruir; reparar os estragos provocados
pelos escândalos e reerguer comunidades que sejam fiéis ao Evangelho, com a
confiança de que nas horas mais obscuras da história, pelas quais a Igreja já
passou, o Senhor nunca nos abandonou”.
Mais adiante
frisou que Francisco “foi introduzido no
mistério de Deus por Nossa Senhora que, cheia de luz, o levou a saborear e a
gostar do próprio Deus como o mais belo da sua vida e da existência humana”.
Com efeito, como bem observou o cardeal português, “a confissão íntima do afeto
e da beleza de Deus, porque se sentia por ele habitado e iluminado”, despertou
nele um impulso missionário para “o irradiar e contagiar aos outros”.
Ora, como
disse o eminentíssimo prelado do Lis, “este testemunho do encanto e do fascínio
por Deus, do gosto gozoso e alegre de Deus presente nele é de uma atualidade
premente” e talvez seja hoje “o mais importante e essencial para viver a fé”
para que não se reduza “a um conjunto de verdades e preceitos”, mas redunde na “comunhão
viva de afetos e de relação com Deus”.
E o cardeal
alertou, por contraste, para o crescente esquecimento ou subvalorização de
Deus:
“Vivemos
a indiferença para com Deus. Deus é apenas uma palavra com quatro letras, vazia
de conteúdo, que já não diz nada; para [uns] é um ser supremo longínquo e
distante que pôs em marcha o universo, mas que não se interessa por nós nem nos
desperta interesse. Outros, ainda, afirmam que acreditam em Deus mas
esquecem-No muitas vezes.”.
Neste
sentido, em jeito de interpelação aos peregrinos que encheram por completo a
Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, onde se concentravam todas as celebrações
agendadas para aquele dia no Santuário em memória de São Francisco Marto,
inferiu que, ao invés do pastorinho, nós não saboreamos Deus “nem sentimos o
gosto da Sua presença, do Seu amor, do Seu perdão, da Sua misericórdia, do Seu espírito,
da Sua força e da Sua luz”. E apontou:
“Neste
momento de indiferença, não há fé que se aguente se não se viver com a
experiência e o gosto do sabor de Deus na nossa vida. Por isso, somos
convidados a interrogarmo-nos a nós mesmos sobre o modo como vivemos a nossa
relação com Deus; é a questão mais séria da missão evangelizadora da Igreja e
dos cristãos: levar o coração de Deus aos outros e vivê-lo, com afetos e ações
concretas” (ao jeito de Francisco).”.
Como afirmou
o purpurado fatimita, Francisco “é muito atual para os adultos” no consolar a
Deus, dar alegria a Deus e unir-se no afeto grande a Ele através de Jesus
escondido na Eucaristia”. E Dom António Marto enalteceu o exemplo, para nos, desta
criança que “penetra neste mistério admirável da nossa fé, Jesus presente
na Eucaristia, que é Deus connosco, para nós, por nós” – sublinhando:
“Não
se trata de celebrar uma data, um dia em que ele partiu para o Céu, mas de
olhar para esta data da morte como a síntese de uma vida, que nos deixa um
legado, pelo qual lhes estamos gratos. E eu, particularmente, que tanto me
ajudou a descobrir a beleza e o amor de Deus e a unir-me com mais afeto e
empenho à missão.”.
Eis um grande
exemplo para hoje, bastante esquecido ou só lembrado pela infância em si!
***
A música
selecionada para o predito concerto, assenta em três pilares significativos: a destacada
predominância de textos de devoção mariana; a simplicidade e ancestralidade do
canto gregoriano como símbolo direto da infância e inocência do Francisco; e a
inclusão de música deste século, como sentida homenagem dos fiéis do nosso
tempo.
O Lusiovoce,
que neste concerto se apresenta maioritariamente na sua formação de vozes
femininas, tem direcionado a sua atividade para a interpretação de música
moderna. Executa programas dedicados a temas específicos, no âmbito da
composição portuguesa moderna e contemporânea, das diversas expressões da relação
entre música e literatura e da contraposição entre novo e antigo. Colabora em
alguns dos principais festivais de música nacionais, como o Festival Cistermúsica de Alcobaça, o Festival de Vila do Conde, o Festival de Órgão de Santarém, o Festival Estoril Lisboa, o Festival de Órgão da Madeira e na
temporada de concertos da Basílica de Mafra – sendo ainda de destacar execuções
de repertório sacro, como a Cantata St.
Nicholas, de Benjamin Britten, e obras de Händel e Vivaldi no Teatro São
Carlos.
Sérgio Silva – docente de órgão no Instituto Gregoriano de
Lisboa e na Escola de Música Sacra de Lisboa – é organista titular da Basílica
da Estrela e da Igreja de São Nicolau, em Lisboa, e mestre em música pela Universidade
de Évora. Estudou órgão no Instituto Gregoriano de Lisboa, sob a orientação de
João Vaz, na disciplina de órgão, e de António Esteireiro, em acompanhamento e
improvisação. Como concertista, apresenta-se tanto a solo como integrado em
diversos agrupamentos nacionais de prestígio, tendo atuado em Portugal,
Espanha, Itália, Inglaterra, França, Alemanha e Macau. E, como investigador,
tem feito transcrições modernas de música antiga portuguesa.
A maestrina
Clara Alcobia Coelho, que dirige o Coro Tejo e o Ensemble Lusiovoce desde
2010, fez os estudos superiores em Formação Musical (2000) e Direção Coral (2005) na
ESML (Escola Superior de
Música de Lisboa), onde
é docente desde 2001, bem como na Academia Nacional Superior de Orquestra.
Concluiu o mestrado em Direção Coral (2010)
no Instituto Piaget. Foi responsável pela preparação musical de programas com o
Coro Gulbenkian. No Festival “Les
Musicalles de Grillon”, foi maestrina do Coro de 2006 a 2016. Com
agrupamentos da ESML, dirigiu a ópera Páride
ed Elena, de Gluck, no Teatro São Luís,
e muitos outros concertos e audições de música coral e vocal de câmara. Integra
o Coro Gulbenkian desde 1997 e colaborou com outros agrupamentos. E destaca-se-lhe
a direção da estreia de Hummus (em versão encenada), de Zad Moultaka, em Lisboa e Londres,
com a companhia Opera Lab Europe, e a
direção do concerto de Laureados e Gravação do Prémio MUSA – Concurso de Composição.
***
Pedro
Valinho Gomes (teólogo e antigo assessor da Postulação para a Causa da Canonização do
Francisco e da Jacinta),
responsável pelo Departamento para
Acolhimento de Peregrinos, em declarações à Sala de Imprensa do Santuário
de Fátima, considerou que, “100 anos depois da morte do Francisco, recordá-lo
tendo em conta que foi canonizado em 2017 é recordar à Igreja uma caraterística
fundamental da santidade cristã, que é a abertura ao absoluto”, pois, como
disse, “o Francisco era um menino do absoluto, centrado naquilo que é o
essencial da vida”.
O Francisco
não ouvia o que dizia Nossa Senhora e o Anjo, no entanto, “aposta toda a sua
breve vida na entrega total ao Criador”. E, depois das aparições, “compreende
perfeitamente que a vida que tem lhe é dada para ser gasta numa relação que
valha a pena” e encontra-a na “relação com Deus”, pelo que “procura o silêncio”:
é um “menino contemplativo”, tem “uma relação especial com a criação, porque na
criação ele encontra o Criador, no silêncio ele encontra aquilo que se lhe
revelou em silêncio”. Neste sentido, Valinho Gomes sustenta:
“Assinalar esta data é assinalar o seu
segundo nascimento, o nascimento definitivo para o absoluto, e é recordar à
Igreja isto mesmo, que podemos fazer muito, porque podemos e devemos apostar
tudo o que somos na entrega aos outros, mas isto só faz sentido na medida em
que na base tem de estar uma relação com Deus e é isto que o Francisco nos
ensina”.
Assegurando
que o Santuário tem a responsabilidade de “oferecer aos peregrinos o conteúdo
catequético da mensagem aqui deixada aquelas três crianças”, e que essa
mensagem não é só o resultado do que ouviram, “é também o seu exemplo de vida”,
Valinho Gomes conclui:
“Podemos aprender e viver esta mensagem
através do programa celebrativo preparado especialmente para este dia, um
programa para olhar o Francisco, mas olhar através do Francisco”.
São
Francisco Marto, cuja iconografia o apresenta de carapuço na cabeça e jaleca
curta, com o cajado e o saco do farnel ao pescoço, nasceu a 11 de junho de 1908
e foi batizado a 20 de junho na Igreja Paroquial de Fátima. Com apenas 8
anos de idade, começou, com a sua irmã Jacinta, a pastorear o rebanho dos pais
pela zona da Cova da Iria, local onde, com a prima Lúcia, viriam a testemunhar
as Aparições, durante as quais podia apenas ver, sem ouvir ou falar.
Levado pelo
desejo íntimo de consolar o coração de Jesus, pois afirmava querer dar alegria
a um Deus triste com os agravos ao Seu coração, viveu intensamente a oração
contemplativa, passando horas seguidas em oração frente ao sacrário na Igreja
Paroquial de Fátima, enquanto a prima e a irmã iam para a escola.
A 18 de
outubro de 1918, Francisco adoeceu, vítima da epidemia da gripe pneumónica ou gripe
espanhola, que assolou o país e que chegara a Portugal no meio desse ano e
em pouco tempo causou a morte de dezenas de milhares de pessoas. A 2 de abril
do ano seguinte, confessou-se e recebeu a comunhão pela última vez “com uma
grande lucidez e piedade”, como escreve o pároco de Fátima no Livro de Óbitos,
ao registar a sua morte, em 4 de abril, acrescentando: “E confirmou que tinha visto uma Senhora na Cova da Iria e Valinhos”.
Foi
sepultado no cemitério de Fátima, de onde os seus restos mortais foram exumados
a 17 de fevereiro de 1952 e trasladados para a Basílica de Nossa Senhora do
Rosário de Fátima a 13 de março de 1952, repousando no braço direito do
transepto.
Francisco e
a irmã Jacinta foram canonizados no Santuário de Fátima, a 13 de maio de 2017,
na Missa da primeira Peregrinação Internacional Aniversária do Centenário das
Aparições, presidida pelo Papa Francisco, tornando-se assim num dos dois mais
jovens santos não mártires da história da Igreja Católica. A canonização tinha
sido aprovada a 23 de março, quando o Vaticano anunciou que o Papa reconhecera
o milagre atribuído a Francisco e Jacinta, última etapa do processo, iniciado
há 65 anos.
O
reconhecimento dum milagre realizado por sua intercessão depois da beatificação
é um processo da competência da Congregação para a Causa dos Santos, regulado
pela Constituição Apostólica Divinus
Perfectionis Magister, promulgada por João Paulo II em 1983.
No processo
de Francisco e Jacinta Marto, foi aceite como milagre a cura milagrosa de
Lucas, uma criança brasileira de cinco anos, que caiu duma janela, à altura de
6,5 metros no dia 3 de março de 2013, ficando em coma, com perda de tecido
cerebral no lóbulo frontal direito. A oração da família e das irmãs do Carmelo
de Campo Mourão, pedindo a intercessão dos dois Santos, resultou na cura total
de Lucas, facto que os médicos não conseguem explicar. E ficou com uma nova
vida, imagem da vida com que somos cumulados pela graça divina.
2019.04.05 –
Louro de Carvalho
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