Refere o Público
on line que os atentados
do Sri Lanka –
com 290 mortos e 500 feridos, segundo o mais recente número oficial –
que pode ainda aumentar – entram para o lote dos piores de que há registo,
embora ainda estejam no topo da lista os ataques da Al-Qaeda em território
norte-americano em 2001, os piores de sempre, em que morreram 2977
pessoas.
Com efeito,
os ataques deste domingo de Páscoa – em igrejas cristãs e no centro de Colombo,
a capital – mataram pelo menos 290 pessoas e fizeram mais de meio milhar de
feridos, entre os quais cerca de três dezenas de estrangeiros, um dos quais era
um português de Viseu, que ali estava em lua-de-mel (ficando uma
viúva precoce) e três
filhos do homem mais rico da Dinamarca.
De acordo
ainda com a AFP, citada pela revista Time,
em janeiro passado, a polícia daquele país apreendeu explosivos e detonadores e
deteve quatro elementos do NTJ (National Towheed Jamath). E, segundo a Reuters,
vários muçulmanos do Sri Lanka juntaram-se ao ISIS, na Síria.
O Governo pensa que o NTJ, grupo terrorista islâmico recém-criado, será o autor dos ataques e confirma que os serviços
secretos tinham sido avisados 14 dias antes da Páscoa. Nesse sentido, vinha a
informação da AFP (a Agência France-Presse) segundo a qual um grupo recém-formado de extremistas
islâmicos estaria há vários dias sob vigilância das autoridades cingalesas, que
temiam atentados suicidas contra igrejas católicas por parte do NTJ.
Como refere Valentina
Marcelino, do DN, as autoridades anunciaram a detenção de 7 suspeitos, mas não foi confirmada
ainda a ligação àquele grupo. O Governo apenas confirma que são extremistas
religiosos, para evitar que haja reações contra a comunidade em causa.
Entretanto, o Conselho Muçulmano do Sri Lanka – duma comunidade que
representa menos de 10% da população, que tem uma maioria budista, com cerca de
70% – condenou os atentados “contra os irmãos e irmãs ‘cristãos’ na celebração
da Páscoa”, bem como nos hotéis em Colombo, e exprimiu pesar pela perda de “vidas
inocentes devido a elementos extremistas e violentos que querem criar divisões
entre religiões e grupos étnicos para marcar a sua agenda”.
O Sri Lanka
declarou estado de emergência em 2018, depois de multidões de budistas terem atacado
mesquitas, casas e propriedades muçulmanas na cidade de Kandy. Estes ataques
terão sido a retaliação a um espancamento de um budista por um muçulmano.
Entretanto,
nova explosão foi hoje, dia 22, registada no Sri Lanka, na cidade de Colombo,
perto da igreja de St. Anthony, local de culto já tinha sido afetado nos
ataques do passado domingo – conta a NBC News. O jornalista do The Guardian Michael Safi partilhou um
vídeo onde se veem várias pessoas a fugir, em pânico, e o próprio alega ter
havido uma “pequena explosão”.
E Azzam Ameen,
repórter da BBC, publicou um tweet onde afirma que a explosão terá
ocorrido quando as autoridades estavam a tentar desativar um novo engenho
explosivo localizado dentro dum veículo. Publicou também, mais tarde, uma
imagem da zona onde se deu a nova explosão. Ainda não há relatos de baixas.
Como recorda
a já mencionada Valentina Marcelino, durante 30 anos, uma guerra civil sangrenta assolou o
Sri Lanka, tendo morrido mais de 70 mil pessoas (o Vatican News fala em 80
mil mortos). A maioria budista levantou-se contra
os tâmiles do norte, que reivindicavam um Estado independente, até que, em
2009, a vitória governamental contra os rebeldes, os ditos Tigres Tâmil, criou
a expectativa de paz no país. Porém, os ódios religiosos e étnicos parecem
continuar a marcar aquele território.
***
Em outro
artigo no DN, a predita jornalista
faz um apontamento sobre a História e a Geografia do Sri Lanka. Começa por
relacionar a forma lacrimal da ilha com a história recente do país, marcada por
banhos de sangue e muitos ódios entre a maioria cingalesa (comunidades
budistas), hindus, muçulmanos e os tâmiles (hinduístas e
católicos).
Assinala a
edificação da fortaleza de Galle pelos portugueses liderados pelo navegador
Lourenço de Almeida, que lá chegou em 1505, arrastado por uma tempestade e
relaciona com Sri Lanka (antigo Ceilão) a
“Taprobana” (nome romano) de que
fala Camões na 1.ª estância da sua epopeia. Foram efetivamente os portugueses
os primeiros europeus a desembarcar, em 1505, na ilha de aparência paradisíaca
e território mítico, há séculos, na Europa pelas suas especiarias, sobretudo a
canela.
Depois,
evoca o santo lá canonizado pelo Papa Francisco em 2015: São José Vaz, nascido
em 1651, na localidade indiana de Benaulin, em Goa, na época território
administrado por Portugal, foi ordenado sacerdote na Congregação de São Felipe
Neri. Enviado ao Sri Lanka, em 1687, como missionário para minorar a forte
pressão que budistas e calvinistas exerciam contra a Igreja Católica, ali fundou
mais de 15 Igrejas e 400 capelas, traduziu o Evangelho nos dois idiomas do
país, o tâmil e o cingalês e morreu em Kandy (Sri Lanka), a 16 de janeiro de 1711
Releva que dos tempos de
presença portuguesa ficou uma pequena comunidade cristã e uma cidade/fortaleza,
Galle, nome cuja origem estará nos galeões portugueses ou nas “galés”, ou ainda
no “galo” português, que os holandeses vieram a utilizar como símbolo no local.
A
fortificação portuguesa, sob a invocação da Santa Cruz, foi erguida junto com
uma capela franciscana e, mais tarde, serviu de prisão para cingaleses que se
opuseram ao domínio português. Nos 150 anos de colonização portuguesa, foram
criadas importantes feitorias: além de Galle, surgiram Colombo, Jafanapatão,
Negumbo, Baticalo e Tricomalee. Mas os vestígios mais nítidos da presença
portuguesa veem-se nos apelidos de mais de metade da população, como Perera,
Fernandes, Sousa, Silva, ou Fonseca.
Sarath Fonseka
é o nome do mais famoso general do país e que foi o arquiteto da estratégia do
Governo que venceu os tâmiles em 2009, ano da morte do “Tigre” desta minoria
que lutava por um estado independente no norte do país.
A guerrilha
dos “Tigres de Libertação do Eelam Tâmil” (TLET) desferiu inúmeros ataques suicidas e outros atentados contra alvos civis e
militares. Entre as vítimas, conta-se Rajiv Gandhi, ex-primeiro-ministro
indiano, atingido por uma “mulher-bomba” em 1991.
Em mais de
três décadas de conflito, não há inocentes, pois os rebeldes e o Exército
Cingalês são acusados de violação dos direitos humanos e abusos vários por
organizações como a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch.
A derrota
dos tâmiles levou o país a uma fase de aparente acalmia, só interrompida por
ataques esporádicos dos maioritários budistas contra mesquitas e propriedades
muçulmanas. No entanto, tais ataques levaram à declaração do Estado de
Emergência em março de 2018, com o país a preparar-se para as legislativas de 2020.
E o presidente Maithripala Sirisena anunciou, este ano, a retoma da pena de
morte num país cuja última execução dum prisioneiro remonta a 1976.
Hugo Cardoso,
investigador da Faculdade de Letras de Lisboa, em recente estudo, identificou no
Sri Lanka uma comunidade de milhares de falantes de crioulo, que tem como
origem a presença dos portugueses. Diz o linguista:
“A língua é muito opaca, conseguimos imediatamente identificar algumas
palavras, mas só depois de nos habituarmos à fonética é que começamos a
reconhecer muitas mais palavras. Percebemos que o léxico é quase todo
português, com transformações interessantes, com alguns arcaísmos e influência
do holandês, do inglês e do tâmil. Mas, continua a ser fundamentalmente
português.”.
Esta
comunidade identifica-se como sendo a dos burghers
– termo que significa “cidadãos” em holandês e que passou a designar todos os
que tivessem ascendência euro-asiática (incluindo os portugueses e os
holandeses) no Sri Lanka.
Na sua pesquisa,
divulgada em março, Hugo Cardoso descobriu que a “Baila”, um estilo de música
muito popular no país, tem também raízes portuguesas. E explicou:
“Baila é um estilo de música do Sri Lanka, extremamente popular no país
ao ponto de ser considerada a música nacional e que tem as suas raízes, tal
como o nome indica, na presença portuguesa e nas tradições musicais destas
comunidades burghers. Existe a baila
cantada em crioulo português, mas também é cantada em tâmil ou cingalês.”.
Em 2014, Pedro
Passos Coelho, então Primeiro-Ministro, esteve com elementos desta comunidade
num orfanato apoiado pela AMI, cerca de 70 km a sul da capital, onde plantou
uma mangueira (árvore nativa da Ásia), descerrou
uma placa alusiva à sua visita, içou uma bandeira portuguesa e ofereceu às
crianças uma bola da Federação Portuguesa de Futebol.
A Igreja
Católica Romana no Sri Lanka tem origem na chegada dos portugueses àquele país,
em 1505, na altura designado Taprobana. Os católicos representam atualmente cerca
de 7% da população de 21 milhões de habitantes. Em 2015, como ficou dito, o
Papa Francisco canonizou São José Vaz, missionário do século XVI.
***
De acordo com o Público on line, o Sri Lanka entra na lista dos atentados mais
mortíferos desde o 11 de Setembro. Na
verdade, a série de
atentados contra igrejas e hotéis de luxo que se verificou no Sri Lanka no
domingo de Páscoa é um dos piores ataques terroristas de sempre.
Segundo uma
contabilidade feita pelo The Guardian, está em segundo lugar um ataque
do Daesh a 12 de junho de 2014 contra a Academia da Força Aérea na cidade de
Trikrit (Iraque), cujo nome oficial era Camp Speicher, em que foram
raptados e mortos no deserto mais de 1500 cadetes, 1500 xiitas e não
muçulmanos.
Cerca de 600
pessoas morreram e mais de 300 ficaram feridas a 14 de Outubro de 2017, quando foi
provocada a deflagração dum camião cheio de explosivos no centro de Mogadíscio,
capital da Somália. A explosão detonou um camião de combustível que estava
perto, criando uma imensa bola de calor que incinerou pessoas e edifícios.
Em dezembro
de 2008, o Exército de Resistência do Senhor, uma milícia ugandesa, atacou
várias aldeias, na República Democrática do Congo, cercando pessoas que
celebravam o Natal. De acordo com vários relatos nos media, foram
mortas mais de 620 pessoas.
Em agosto de
2007, pelo menos 500 pessoas morreram e pelo menos 1500 ficaram feridas em
ataques com carros armadilhados contra a comunidade yazidi perto de Mossul (Iraque) e haveria, mais tarde, mais mortos, bem como perseguidos
e expulsos das suas casas, por obra do Daesh.
A 1 setembro
de 2004, um comando (com membros das repúblicas islâmicas russas da
Inguchétia e da Tchetchénia), enviado
por Shamil Basaev (líder separatista tchetcheno), ocupou uma escola em Beslan (da Ossétia
do Norte, região do Cáucaso). No 3.º
dia do bloqueio (com 777 reféns), as forças
de segurança russas invadiram o edifício e usaram gás venenoso. Morreram 334
pessoas além dos terroristas.
Em julho de
2016, pelo menos 340 pessoas foram mortas e centenas ficaram feridas numa série
de ataques bombistas coordenados no distrito de Karrada, em Bagdad, habitado
maioritariamente por xiitas – ato reclamado pelo Daesh.
Em maio de
2014, militantes do Boko Haram – que reivindica ser o Estado Islâmico na África
Ocidental – atacaram as cidades de Gamboru e Ngala no Norte da Nigéria, matando
mais de 300 habitantes locais em meio dia. A violência desta organização
jihadista afetou a Nigéria, o Chade, o Níger e o Norte dos Camarões.
Pelo menos
258 pessoas morreram em Julho de 2018, na cidade de Sweida, no sudoeste da
Síria, numa ofensiva do Daesh. Antes da guerra, a zona era habitada pela
minoria druza, e é uma área que se tem mantido sob controlo do Governo do
Presidente Bashar Al-Assad.
Cerca de 40
homens armados atacaram, em novembro de 2017, uma mesquita perto da cidade
egípcia de Bir al-Abed, matando 200 pessoas – o pior atentado terrorista no
Egito.
A 11 de março
de 2004, perto das eleições legislativas, explosões quase simultâneas nos
comboios de Madrid mataram 193 pessoas e feriram cerca de 2000 pessoas. E a
teoria, ativamente encorajada pelo Governo de José Maria Aznar, do PP (Partido
Popular), de que a responsabilidade era da
organização terrorista ETA, não de radicais islâmicos, contribuiu para a
reviravolta eleitoral que levou ao poder o PSOE, de José Luis Rodríguez
Zapatero.
***
O Papa
Francisco, após ler sua mensagem de Páscoa Urbi
et Orbi, condenou os atentados:
“Recebi
com tristeza e dor a notícia dos graves atentados que, precisamente hoje, no
dia da Páscoa, levaram luto e dor a algumas igrejas e outros locais de encontro
no Sri Lanka. Desejo manifestar a minha afetuosa proximidade à comunidade
cristã, atingida enquanto estava reunida em oração e a todas as vítimas de tão
cruel violência. Confio ao Senhor os que morreram tragicamente e rezo pelos
feridos e por todos aqueles que sofrem por causa deste acontecimento dramático.”.
E hoje,
dia 22 e segunda-feira de Páscoa, aquando da recitação do Regina Coeli, Francisco reexpressou a sua proximidade ao povo do
Sri Lanka ferido pelos atentados no domingo de Páscoa e assinalou o facto de
ter havido uma explosão nesta segunda-feira. Disse o Pontífice:
“Expresso novamente a minha
proximidade espiritual e paterna ao povo do Sri Lanka. Estou muito próximo ao
meu querido irmão, o cardeal Malcolm Ranjith Patabendige Don, e a toda a Igreja
arquidiocesana de Colombo. Rezo pelas numerosas vítimas e feridos, e peço a
todos para que não hesitem em oferecer a esta querida nação toda a ajuda
necessária. Espero também que todos condenem estes atos terroristas, atos
desumanos, não justificáveis.”
A seguir, o
Papa convidou os fiéis presentes na Praça São Pedro a rezarem uma Ave-Maria
pelo Sri Lanka.
Também o Governo português
condenou os ‘cobardes atentados’ no Sri Lanka. Assim, o Ministro dos Negócios Estrangeiros (MNE) lamentou, no dia de Páscoa, a morte de um português nos
atentados em igrejas e hotéis no Sri Lanka, sublinhando a “determinação em
combater o terrorismo sob todas as formas”. Lê-se num dos
três ‘tweets’ do MNE:
“Lamentamos
profundamente a morte de um cidadão português no Sri Lanka, que se encontra
entre as vítimas dos atentados ocorridos hoje nesse país. Expressamos as nossas
condolências à sua família.”.
O MNE
afirma também que a solidariedade do Governo “está com as vítimas, o povo e as
autoridades”, pois “a nossa determinação é combater o terrorismo sob todas as
formas”. E exprime sem equívocos o teor da condenação dos atos terroristas:
“O
Governo português condena nos termos mais veementes os cobardes atentados que
atingiram, hoje, igrejas e hotéis no Sri Lanka, causando a morte a muitas
dezenas de pessoas”.
***
Enfim,
a fúria terrorista continua a destruir bens e a ferir e matar pessoas
indistintamente! Porquê e para quê?
2019.04.22 – Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário