sexta-feira, 26 de abril de 2019

Nos 50 anos da Federação Bíblica Católica


Por ocasião do cinquentenário da criação da Federação Bíblica Católica, que foi inaugurada por São Paulo VI a 16 de abril de 1969, decorreu, em Roma, de 23 a 26 de abril, o seu Congresso Internacional sob o tema escolhido “A Bíblia e a vida: a inspiração bíblica de toda a vida pastoral e missão da Igreja (VD 73) – Experiências e desafios”.
A finalidade do encontro é a análise do trabalho e dos frutos da Federação durante os últimos 50 anos, a identificação dos desafios para a pastoral bíblica na atual realidade eclesial e a definição dos objetivos e prioridades para os próximos anos.
Na tarde do dia 23, tomaram a palavra os Cardeais Luis Antonio Tagle, Arcebispo de Manila (Filipinas) e presidente da Federação, e Kurt Koch, presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos. Entre os relatores de renome esteve Enzio Bianchi, fundador da comunidade monástica de Bose. E, no decurso do Congresso, realizaram-se workshops que trabalharam diversos aspetos críticos da pastoral, como Bíblia e família, juventude, liturgia, catequese, solidariedade e novas tecnologias.
***
Os participantes no Congresso foram recebidos pelo Papa Francisco no final da manhã de hoje, dia 26, tendo sido a partir do tema do Congresso, ou melhor, do binómio indissociável “Bíblia e Vida” que o Pontífice desenvolveu o seu discurso.
Que a Palavra de Deus está viva e dá vida, “não morre nem envelhece, permanece para sempre”, “permanece jovem diante de tudo que acontece e conserva do envelhecimento interior aqueles que a colocam em prática”, disse-o o Papa, que sublinhou, citando o Novo Testamento, que “a Palavra traz, de facto, ao mundo “o respiro de Deus e infunde no coração o calor do Senhor através do sopro do Espírito”.
Em contraponto à ideia de que a Bíblia seja apenas uma bela coletânea de livros sagrados a estudar, Francisco sustenta que é, antes, Palavra de vida a semear e que o trabalho dos académicos e todas as publicações sobre a Bíblia devem ter este fim.  Ora, como esta Palavra de Deus é uma insubstituível injeção de vida, presente que o Ressuscitado pede para receber e distribuir para que haja vida em seu nome, o Papa chamou a atenção para a relevância das homilias, que são fundamentais, no seu modo de ver. E avisou:
A pregação não é um exercício de retórica e nem mesmo um conjunto de sábias noções humanas: seria somente lenha. É, ao invés, compartilha do Espírito, da Palavra divina que tocou o coração do pregador, o qual comunica aquele calor, aquela unção.”.
No pressuposto de que, apesar dos gestos e de outras modalidades de expressão e comunicação o recurso à palavra é irrenunciável, o Pontífice verifica o acúmulo de informação que diariamente recebemos, mas assegura que “não podemos renunciar à Palavra de Jesus, à única Palavra de vida eterna de que necessitamos quotidianamente” e, citando a Evangelii gaudium, apontou que “seria belo que a Palavra de Deus se tornasse sempre mais o coração de toda atividade eclesial”. E vincou:
“É desejo do Espírito plasmar-nos como ‘formato-Palavra’: uma Igreja que não fale por si e de si, mas que tenha no coração e nos lábios o Senhor. Ao invés, a tentação é sempre a de anunciarmos a nós mesmos e de falar de nossas dinâmicas, mas assim não se transmite ao mundo a vida.”.
E, porque a Palavra ensina a renunciar a si mesmo para anunciá-La, leva a viver de modo pascal, não nos deixa tranquilos, mas coloca-nos em discussão, Francisco fala da relação de serviço da Igreja à Palavra:
A Igreja não se cansa de anunciar, não cede à desilusão, não se rende em promover em todos os níveis a comunhão, porque a Palavra chama à unidade e convida cada um a ouvir o outro, superando os próprios particularismos”.
Depois, formula a novidade discursiva ao proclamar que a Bíblia é “vacina contra o fechamento”. Com efeito, a Igreja, que se nutre da Palavra, vive para anunciá-La, lançando-se pelas estradas do mundo, até os confins da terra, não se poupa; e a Bíblia é a melhor vacina contra o fechamento e autopreservação da Igreja, porque “é a Palavra de Deus, não nossa, e nos preserva da autossuficiência e do triunfalismo.” E Francisco enunciou um facto efetivamente tão real como belo:
A Palavra de Deus tem uma força centrífuga e não centrípeta: não se volta para dentro, mas lança-se para fora, para aqueles que ainda não chegaram. Não garante seguranças, porque é fogo e vento: o espírito que inflama o coração e move os horizontes, dilatando-os com a sua criatividade.”.
Assim, concluiu a exortar:
Bíblia e vida: vamos comprometer-nos para que essas duas palavras se abracem, para que jamais uma fique sem a outra. Rezemos e trabalhemos para que a Bíblia não fique na biblioteca, mas corra pelas estradas do mundo. E faço votos para que vós sejais bons portadores da Palavra, com o mesmo entusiasmo que lemos nesses dias nas narrações pascais, onde todos correm: as mulheres, Pedro, João, os dois de Emaús... Correi para encontrar e anunciar a Palavra viva.”.
***
Este dinamismo bíblico é particularmente caro ao Papa argentino. A título de exemplo, recorde-se que, a 31 de outubro de 2018, enumerava três elementos que caraterizam as sagradas Escrituras e que as dotam do “poder de transformar a vida”: ser viva e eficaz; ser penetrante; e discernir os pensamentos e os sentimentos.
Foi num encontro no Vaticano com membros da Sociedade Bíblica Americana, por ocasião do retiro anual que esta organização realiza em Roma, que o Santo Padre comentou que a Palavra é viva e eficaz, é penetrante e discerne os pensamentos e sentimentos.
E explicou que a Bíblia é viva e eficaz porque, “de facto, desde o princípio, ‘Deus disse e fez-se’ e porque, “na plenitude dos tempos, Jesus nos deu palavras que ‘são espírito e vida’”.
Na verdade, dizia então o Papa, “com a Palavra, Ele deu nova vida a corações apagados, como o de Zaqueu e ao publicano Mateus”. E, quando o Senhor disse a essas personagens bíblicas “segue-me”, elas seguiram-No. Por isso, ressalta a eficácia das Escrituras: a sua leitura e a oração a partir de sua meditação “não ficam sem efeito”.
De facto, a Bíblia, “como palavra que, imbuída do Espírito Santo, que dá a vida, comunica-nos Jesus que é a vida e, assim, torna fecunda a nossa vida”; e “nenhum outro livro tem o mesmo poder” – diz o Pontífice que assegura:
Mediante a sua palavra, conhecemos o Espírito que a inspirou: de facto, só no Espírito Santo pode ser verdadeiramente recebida, vivida e anunciada, porque o Espírito ensina tudo e recorda o que Jesus disse”.
Em segundo lugar, como sublinhou, “a Palavra de Deus é penetrante”. E não só: se “é mel que dá a doçura consoladora do Senhor”, também “é espada que leva uma inquietude saudável ao coração. Com efeito, como observa Bergoglio, “penetra no mais profundo e leva luz às áreas de sombra da alma; cavando, purifica; e o duplo corte desta espada, em um primeiro momento, pode doer, mas na realidade é benéfico, porque amputa o que nos separa de Deus e do amor”.
Por último, “a Palavra divina discerne os pensamentos e os sentimentos”, assegurou o Papa, que explicitou:
O Verbo de vida também é a verdade e a sua palavra faz a verdade em nós, dissipando falsidades e duplicidades. As Escrituras impelem-nos continuamente a reorientar a rota da vida para Deus. Deixar-nos ler pela Palavra permite-nos, assim, tornarmo-nos ‘livros abertos’, transparências vivas da Palavra que salva, testemunhas de Jesus e anunciadores de sua novidade (…) De facto, a palavra de Deus traz sempre novidade, é incapturável, foge de nossas previsões e, com frequência, rompe os nossos esquemas.”.
***
A talho de foice, refiro que, há 519 anos, no dia 26 de abril de 1500 – domingo da oitava de Páscoa (Pascoela, domingo in albis) –, era celebrada a primeira Missa daquele que viria a ser o país com o maior número de católicos batizados no mundo, a Terra de Vera Cruz ou o Brasil.
A celebração foi presidida por Frei Henrique de Coimbra e acolitada por outros sacerdotes em Santa Cruz Cabrália, litoral sul da Bahia, sobre o ilhéu da Coroa Vermelha.
Em sua Carta do Achamento endereçada ao rei Dom Manuel, o cronista da viagem Pero Vaz de Caminha descreveu a celebração feita num “altar mui bem arranjado” e que, segundo observou, “foi ouvida por todos com muito prazer e devoção”.
Os portugueses chegaram ao Brasil em 22 de abril de 1500, nas 13 naus e caravelas lideradas por Pedro Alvares Cabral, o qual, avistando do mar um monte, o denominou de Monte Pascoal, por ser na oitava de Páscoa. E àquela terra, inicialmente, pôs o nome Terra de Vera Cruz.
Depois de desembarcarem em terra firme e terem os primeiros contactos com os índios, seguiram a bordo das suas embarcações para um lugar mais protegido, ancorando na praia da Coroa Vermelha, onde celebraram a Santa Missa. Terminada a celebração, como relata Pero Vaz de Caminha, o sacerdote subiu a uma cadeira alta e “pregou uma solene e proveitosa pregação, da história evangélica; e no fim tratou da nossa vida, e do achamento desta terra, referindo-se à Cruz, sob cuja obediência viemos, que veio muito a propósito, e fez muita devoção”. A relevância da Bíblia induzia a detalhada explicação da Palavra divina proclamada naquela Liturgia.
Segundo o relato, Caminha acreditava que a conversão dos índios seria fácil, pois demonstraram respeito pela religião. Neste sentido, pediu ao rei que enviasse logo clérigos para os batizar.
A representação mais famosa da celebração é o quadro “A Primeira Missa no Brasil”, feito em 1861 pelo pintor catarinense Victor Meirelles de Lima.
E a segunda Missa foi celebrada no dia 1 de maio, na foz do rio Mutarí. Passaram-se os anos e o Brasil tornou-se o país com o maior número de católicos batizados no mundo.
Segundo o Anuário Pontifício 2018 e o Anuário Estatístico da Igreja 2016, vivem no Brasil 173,6 milhões de católicos – 13,3% de fiéis do mundo e 27,5% da América do Sul.
***
Depois de tudo isto, importa dar voz ao esclarecimento que Luiz Fernando Menezes fez ontem, dia 25 de abril, no siteAos Fatos” (https://aosfatos.org/noticias/papa-francisco-nao-cancelou-biblia-e-propos-novo-livro/)
É falsa a notícia de que Francisco tenha cancelado a Bíblia por crer que estava “desatualizada” e que a Igreja deveria substituí-la por outro livro, a “Bíblia 2000”. A desinformação surgiu sob a modalidade de como piada  num site satírico dos EUA em 2018 e passou a ser difundida como verdade nas redes sociais, pelo que o Vaticano se viu na necessidade de negar categoricamente a veracidade dessa informação.
Denunciados por usuários do Facebook, posts com esse conteúdo enganoso já acumulavam, juntos, mais de 9.000 compartilhamentos na manhã do dia 25. As publicações foram marcadas por Aos Fatos com o selo FALSO na ferramenta de verificação disponibilizada pela rede social.
Segundo as publicações que circulam nas redes sociais, o Papa Francisco teria dito que a Bíblia era um documento “desatualizado” e que a Igreja deveria “reescrever a palavra de Deus”. O Vatican News, veículo oficial do Vaticano, contactado por Aos Fatos, negou dizendo:
Sabendo que o Papa Francisco sempre surpreende, atribuem-lhe as coisas mais absurdas possíveis. E o pior é que se propaga que nem fogo na palha.”.
A notícia falsa é reciclada e importada: já aparece nas redes sociais desde abril de 2018, quando foi publicada pelo site satírico americano There is News. O domínio, no entanto, deixava claro, na sua página, que se trata de um “site de humor cujo propósito é o entretenimento”.
***
É preciso estar precavido contra a falsa informação, que faz grandes estragos!
2019.04.26 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário