O Ministro da Educação acredita que
Portugal atingirá a meta estabelecida pela UE (União Europeia)
de redução de abandono escolar, apesar de reconhecer que agora se trata de
“pescar à linha” os alunos com insucesso escolar. É uma
intenção divulgada pela agência Lusa
e replicada pelo “educare.pt” e pelo “24.sapo.pt”.
Segundo os dados disponíveis no INE (Instituto
Nacional de Estatística), que divulgou
ontem, 6 de fevereiro, a Taxa de Abandono
Precoce de Educação e Formação de 2018, o número de jovens que deixam a
escola antes do tempo voltou a diminuir no ano passado, para 11,8%. Portugal
fica, assim, a 1,8% da meta da taxa de abandono de 10% estabelecida pela UE
para 2020, um objetivo que o Ministro da Educação acredita que será possível
atingir.
Recordando que o abandono escolar atingiu, em 2018, o
valor mais baixo de sempre, tendo descido de 12,6% em 2017 para 11,8% em 2018,
o Ministro, em declarações à Lusa, afirmou:
“Acredito verdadeiramente que temos
condições para alcançar a meta 2020 e estamos no bom caminho”.
Brandão Rodrigues lembrou as melhorias registadas
desde o virar do século e a progressiva aproximação à média da UE. Com
efeito, em 2002, cerca de 45% (quase metade) dos alunos
abandonava a escola antes do tempo, uma realidade muito distante da média da UE
(17%); em 2011, mais de um em cada 5 jovens abandonavam a
escola antes de terminar os estudos (23%). Ou seja, em apenas 7 anos verificou-se uma redução de mais de 10 pontos
percentuais. Em 2018, “a média da UE é muito similar” aos valores nacionais. No
entanto, reconhece o governante, “é muito mais difícil passar de 11% para 10%
do que era passar de 45% para 30%”.
Em comunicado enviado para a Lusa, o ME (Ministério da Educação) congratula-se com este valor frisando que foi alcançado um “mínimo
histórico”, mas vincando que o trabalho do Ministério não estará acabado “enquanto houver jovens que abandonam a
escolaridade obrigatória”.
O ME recorda que o abandono escolar é uma das vulnerabilidades do sistema
educativo e, por isso, um dos principais objetivos da legislatura foi a redução
do abandono, pelo que, se, no início do século, algumas “medidas generalistas
tinham resultados mais ou menos imediatos e muito fortes”, agora as escolas têm
de fazer “um trabalho refinado, uma pesca à linha daqueles que têm abandono e
insucesso escolar para poder mitigar o problema”.
Para o responsável governamental, “as medidas
generalistas já não servem, têm de ser medidas específicas que vão ao encontro
de cada um dos nossos alunos em dificuldades”, até porque se sabe que “existem
grupos de estudantes mais vulneráveis”. É, de facto, entre os jovens de meios
socioeconómicos mais desfavoráveis que há mais insucesso e abandono. E há
diferentes realidades regionais: O Alentejo, por exemplo, é uma das regiões com
mais insucesso e, por isso, com mais abandono. Ora, sendo a retenção uma
das causas do abandono precoce, Tiago Brandão Rodrigues lembrou que o seu Ministério
tem trabalhado para reduzir este problema.
O Ministro lembrou alguns dos programas que a sua
equipa pôs em curso e aplaudiu o trabalho feito pelas escolas, mas também pelos
alunos que “não desistem de lutar”. Entre as medidas do Governo, Tiago Brandão
Rodrigues lembrou o “Programa Nacional de
Promoção do Sucesso Escolar” (PNPSE), centrado no trabalho em sala de aula e na deteção precoce de
dificuldades ou o “Apoio Tutorial
Específico” destinado a alunos em situação de insucesso e em risco de
abandono. Para isso, cada agrupamento de escolas e cada escola não
agrupada elaborou o seu Plano de Ação Estratégica, o famoso PAE, que foi
elaborado pelas respetivas estruturas pedagógicas e aprovado pelo conselho pedagógico
e que é objeto de assídua monitorização e avaliação com vista à introdução das
melhorias necessárias.
***
Por outro
lado, para puxar pelo sucesso e combate ao abandono escolar, o ME pretende introduzir
alterações no modelo de avaliação externa das escolas ou agrupamentos de
escolas. Nestes termos, a inclusão passará a
ser também um indicador da qualidade das escolas, a par de outros “indicadores
mas finos e centrados no que é a missão da escola”, não devendo ser
descurada a inserção comunitária e social dos alunos. São estas algumas das
novidades no 3.º ciclo de avaliação das escolas que se vai iniciar, a
concretizar com equipas com mais elementos. Recorde-se que o primeiro decorreu
de 2006 a 2011 e o segundo de 2012 a 2017.
A ideia não é olhar, segundo Sara R. Oliveira, no
“educare.pt”, a 1 de fevereiro, apenas para as classificações, médias –
resultados dos alunos –, mas analisar o trabalho feito nas escolas de forma
mais abrangente, para lá dos lugares dos rankings
publicados todos os anos.
É preciso, do meu ponto de vista, esclarecer que já
assim vinha sendo, mas agora introduziram-se mais indicadores. Recorde-se que
os próprios rankings passaram a
incluir outros elementos além das classificações, nomeadamente o atinente ao
trabalho que a escola faz pelo sucesso.
Certo é que a inclusão passará a ser mais um dos
indicadores para avaliar a qualidade dos estabelecimentos de ensino e não
somente no ensino público, mas também no particular e cooperativo. A novidade
foi dada na conferência de imprensa sobre o que há de novo no terceiro ciclo do
modelo de avaliação externa das escolas. A este respeito, referiu João Costa, Secretário
de Estado da Educação:
“Tenho dito, várias vezes, que os rankings não dizem rigorosamente nada
sobre a qualidade da escola: premeiam práticas de retenção para os alunos nem
sequer chegarem aos exames, premeiam práticas de seleção de alunos à entrada, e
dizem muito mais sobre a condição socioeconómica dos alunos, e sobre o contexto
em que a escola está inserida, do que propriamente sobre o trabalho que é feito
na escola”.
Por seu turno, Filinto Lima, professor, diretor do
Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, e presidente da ANDAEP
(Associação
Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas), concorda que, sendo a inclusão um indicador poderá
contribuir para uma avaliação externa mais justa, se tiver em conta a inclusão
de todos os alunos e se for conjugado com outros fatores, para lá dos
resultados escolares. Em seu entender, nessa avaliação externa das escolas, os
instrumentos de registo das equipas avaliativas devem ser universais,
uniformes, de fácil operacionalização, de forma a afastar o mais possível a
subjetividade de uma “avaliação que se pretende justa, credível e
proporcional”. Também este (E é diretor
e chefe de diretores!) deixa
subentendido que até agora a avaliação externa das escolas (que não das
disciplinas) se cingia ao
domínio dos resultados, quando estes, além dos números, eram analisados em
contexto e se procurava saber também dos resultados sociais (participação
na vida da escola e assunção de responsabilidades, cumprimento de regras e
disciplina, formas de solidariedade e impacto da escolaridade na vida dos
alunos) e do reconhecimento da comunidade
(grau de
satisfação, formas de valorização do sucesso e contributo da escola para a
comunidade envolvente). E havia
mais dois domínios: prestação do serviço educativo, com os subdomínios:
planeamento e articulação (com 5 indicadores), práticas
de ensino (com 7 indicadores) e
monitorização e avaliação do ensino e das aprendizagens (com 5 indicadores); e liderança e gestão, com os subdomínios: liderança
(com 5 indicadores), gestão (com 5 indicadores) e autoavaliação e melhoria (com 5 indicadores).
(cf http://www.ige.min-edu.pt/upload/AEE_2016-2017/AEE_16_17_(1)_Quadro_de_Referencia.pdf)
Porém, Filinto Lima referiu ao “educare.pt”:
“Parece-me que usar só uma fonte, porque
construído com base apenas na média dos resultados dos exames por escola,
ignorando critérios essenciais – rankings
– distorce a realidade e torna-se num instrumento perigoso e injusto para as
escolas – alunos, pais e professores – ludibriando-as, caso não percecionem a
limitação intrínseca desta falsa tabela classificativa”.
E sublinha que, do outro lado, em contraponto, estão
os Percursos Diretos de Sucesso, um
instrumento “mais justo e realista com enfoque preferencial nos progressos
efetivos no âmbito do trabalho das escolas, privilegiando outros fatores como o
perfil dos alunos e a sua evolução à saída da escolaridade obrigatória”.
Segundo o presidente da ANDAEP, essa tabela
classificativa – os conhecidos rankings
– mostra a qualidade dos alunos que fazem os exames, colocando-se os resultados
escolares na linha da frente, em detrimento da ação e do mérito da escola, mas
“não retrata a outra vertente (competências sociais) com que o aluno sai da escola”. E lembra que em muitos países, como nos
Estados Unidos da América, “o recrutamento para emprego já se faz pela leitura
do portefólio onde essas competências são valorizadas”, mais do que a performance
académica. E questiona:
“Neste contexto, não é correto concluir que
a escola que ocupa o primeiro lugar é a melhor e a que ficou em último é a
pior, independentemente de ser pública ou privada. Pergunto: Obteriam os alunos
da escola classificada em primeiro lugar uma classificação melhor se
frequentassem a escola classificada no último lugar? Conseguiriam os alunos da
escola classificada em último lugar ter uma classificação melhor se
frequentassem a escola classificada em primeiro lugar?”.
O presidente da ANDAEP refere que talvez fosse mais
interessante construir um ranking que
graduasse as escolas tendo em conta, pelo menos, dois fatores, ou seja, “as que
preparassem melhor os alunos para terem sucesso no Ensino Superior, e/ou as que
tivessem em linha de conta a evolução do aluno desde que entra numa escola (valor
acrescentado pela escola ao aluno durante o percurso escolar)”.
Embora pareça haver uma certa confusão entre a
avaliação da escola e a dos alunos, é de lembrar que as empresas, se quiserem
admitir ao emprego com base no desempenho curricular do ensino básico e do
secundário, poderão ter à disposição, se o Governo assim o entender, as
classificações nos diversos parâmetros de avaliação de que decorre, em cada
momento de avaliação sumativa, a classificação da respetiva disciplina
Por seu turno, Manuel Pereira, professor, diretor do
Agrupamento de Escolas de Cinfães, presidente da ANDE (Associação
Nacional de Dirigentes Escolas), lembra
que a inclusão é uma das grandes apostas das novas correntes pedagógicas a
nível europeu, pois, “de alguma forma, chama a atenção para a necessidade de dar
a mesma oportunidade a todos”. Assim, incluir é, na sua opinião, uma obrigação
das escolas, faz parte da sua própria missão.
Aliás, não é por acaso que o Governo, após um ano de
experiência lançada nalgumas escolas, fez publicar o Decreto-Lei n.º 55/2018,
de 6 de julho, que “estabelece o currículo dos ensinos básico e secundário e os princípios
orientadores da avaliação das aprendizagens”, generalizando a prática da
lecionação a partir do projeto de autonomia e flexibilização curricular, e fez
publicar o Decreto-lei n.º 54/2018,
de 6 de julho, que “estabelece os princípios e as
normas que garantem a inclusão, enquanto processo que visa responder à
diversidade das necessidades e potencialidades de todos e de cada um dos
alunos, através do aumento da participação nos processos de aprendizagem e na
vida da comunidade educativa”,
e “identifica as medidas de suporte à
aprendizagem e à inclusão, as áreas curriculares específicas, bem como os
recursos específicos a mobilizar para responder às necessidades educativas de
todas e de cada uma das crianças e jovens ao longo do seu percurso escolar, nas
diferentes ofertas de educação e formação”.
Manuel Pereira diz que “as escolas têm a obrigação de
criar as medidas e as estratégias para dar a todos as mesmas oportunidades”, numa
perspetiva de igualdade e de equidade. Mas é preciso saber se na avaliação das
escolas também será tido em conta se as escolas têm as mesmas oportunidades e
não apenas as mesmas obrigações, se têm os recursos e os meios necessários,
físicos e humanos, de que necessitam para essa inclusão. Mais sustenta que “a avaliação é importante, se dessa avaliação
se fizerem as extrapolações necessárias para que as escolas tenham recursos e
meios necessários para essa igualdade de oportunidades”, até porque,
repara, “as escolas são todas diferentes,
nem todas têm os mesmos recursos e meios”.
***
A inclusão, como indicador de avaliação, passa
abranger as escolas privadas com financiamento estatal e as de ensino profissional,
e não apenas as públicas. Por outro lado, a equipa dos avaliadores, que
integrava dois inspetores da IGEC (Inspeção-Geral da Educação e Ciência) e um perito do Ensino Superior, terá novos
elementos, ou seja, “pessoas de reconhecido mérito, que tiveram funções na
escola para trazer conhecimento de terreno ao processo avaliativo”, segundo o
Secretário de Estado da Educação, que acrescenta: “É importante ter quem sabe como funciona uma escola a avaliar aquilo
que nela se faz”.
O 3.º ciclo do modelo de avaliação externa das escolas
começará em maio deste ano. A uma análise quantitativa, junta-se uma componente
qualitativa. E João Costa, parecendo ignorar a componente qualitativa já
existente, sublinhou, na aludida conferência de imprensa:
“Introduz-se a inclusão como avaliação-chave
do que é uma escola de qualidade, ou seja, o que estamos a dizer é que uma
escola não é boa apenas por um resultado. E esse resultado, às vezes, nem é
conseguido na escola, é conseguido num centro de explicações. Assim, avalia-se
o trabalho que a escola faz no progresso de cada aluno, na mobilidade social de
cada aluno, e no trabalho que faz com cada aluno que tem mais dificuldades.”.
O ME pretende analisar, nesta nova fase de avaliação,
os resultados escolares e os resultados sociais e espera que as escolas estejam
recetivas a novas práticas pedagógicas, quando nem tudo corre bem. Com este
discurso até parece dar a entender que este Ministro descobriu a pólvora, dando
a entender que não conhece o atual quadro de referência presente na IGEC desde
2012. E o Secretário de estado da Educação, que acha que os centros de explicações
trazem qualidade às aprendizagens (Ironia ou
desconhecimento?), quer a aposta
em indicadores mais finos e que pretendem abranger todas as dimensões do que é
a missão da escola. E diz:
“Uma escola TEIP [Territórios de Intervenção
Prioritária], num contexto muito desfavorecido, com problemas sociais à volta
muito complicados, quando consegue garantir a empregabilidade de alunos, a sua
inserção comunitária e social, fez muito mais do que algumas que aparecem no
topo da escala dos rankings”.
***
Bem eu
me fio que, a ignorar o que vem sendo feito, que a situação se venha a
modificar substancialmente. No modelo atual já era possível fazer melhor, se a
avaliação externa não constituísse um ensaiado ato de cosmética de que resulta
a crónica diferenciação entre escolas boas e escolas sofríveis, sendo que nunca
se retirará da avaliação escolar o elemento subjetivo. É preciso considerar a
mudança como um processo difícil e paciente, como diz o Papa Francisco.
2019.02.07 –
Louro de Carvalho
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