quinta-feira, 17 de maio de 2018

Coitados dos novos Mártires da Pátria!


Foi publicado, no passado dia 15 de maio, o Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15 de maio, que estabelece as normas de execução do Orçamento do Estado para 2018, aprovado pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro.
Nos termos do art.º 147.º do predito decreto-lei, ficam revogadas, na sua substância, as leis n.os 47/2010, de 7 de setembro, e 52/2010, de 14 de dezembro, pelo que os membros dos gabinetes dos membros do Governo e de outros órgãos de soberania, bem como das autarquias, vão ver os seus salários aumentados através do fim progressivo dos cortes de 5%.
De igual modo, de acordo com outras normas do decreto-lei de execução do Orçamento do Estado, para as chefias intermédias do Estado, os gestores públicos e membros de conselhos diretivos de alguns institutos, terminarão dos cortes em causa.
Esta eliminação dos cortes no vencimento tem efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2018 e é faseada, à semelhança do que sucedeu para a eliminação dos cortes salariais dos trabalhadores em funções públicas, nos termos do n.º 8 do artigo 18.º da Lei do Orçamento do Estado.
Porém, deste regime de eliminação de cortes nos vencimentos são excluídos os titulares de cargos políticos, pois, como refere o Ministério das Finanças, não está nos planos do Governo acabar com a redução salarial dos políticos este ano e no próximo. Assim, os políticos serão os únicos a não ter recuperação de rendimentos – o que significa que, no final desta legislatura, os políticos serão os únicos que não recuperaram as reduções remuneratórias impostas com a crise.
Já, na conferência de imprensa que se seguiu ao Conselho de Ministros, no passado dia 26 de abril, em que o Governo procedeu à aprovação do decreto-lei de execução orçamental, a Ministra da Presidência, Maria Manuel Leitão Marques, tinha sinalizado que o Executivo tinha mantido o corte dos salários dos políticos, apesar de ter decidido retirar a redução sobre os membros dos gabinetes.
Esta posição acontece numa altura em que se levantam alguma vozes em defesa da valorização da classe política, na sequência de casos de suspeita de corrupção ou de acusações de falta de ética na utilização de dinheiros públicos.
Mais, no discurso que proferiu na cerimónia comemorativa do 25 de Abril, o Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, sustentou que deve ser avaliada “seriamente a possibilidade do âmbito da limitação de mandatos e das acumulações de cargos e ponderar incentivos eficazes à dedicação exclusiva no Parlamento”.
No decreto-lei de execução orçamental, que estabelece um conjunto de regras para pôr o Orçamento do Estado para 2018 no terreno, o Governo acaba com várias restrições existentes ao nível das remunerações, mas não dá resposta às indicações de Ferro Rodrigues, nem as podia dar por decreto-lei no atinente à questão da limitação de mandatos ou dos incentivos à dedicação exclusiva no Parlamento, já que estas têm a ver com a limitação de direitos, liberdades e garantias – matéria sobre a qual é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar, salvo autorização ao Governo (cf al b do n.º 1 do art.º 165.º da CRP).
Segundo esclarece o Ministério das Finanças “os efeitos temporários das normas e medidas constantes em alguns diplomas e cuja vigência dependia da manutenção do procedimento por défice excessivo ou do PAEF (Programa de Assistência Económica e Financeira) são progressivamente eliminados aplicando-se o faseamento previsto no n.º 8 do artigo 18.º da Lei do Orçamento do Estado”, destacando-se esta como uma das principais alterações introduzidas pelo diploma.
Assim, o decreto-lei confirma que a redução do vencimento mensal ilíquido dos membros das Casas Civil e Militar do Presidente da República, dos gabinetes dos membros do Governo, dos gabinetes dos Governos Regionais e dos gabinetes de apoio pessoal dos presidentes e vereadores de câmaras municipais é progressivamente eliminada de acordo com o critério geral de ‘descongelamento’ que resulta da Lei do Orçamento do Estado. E, como foi referido, estas medidas de recuperação de rendimentos têm efeitos retroativos a janeiro de 2018, altura em que serão devolvidos 25% dos cortes e a, partir de 1 setembro, mais 25%. Em maio de 2019 receberão outros 25% e, a partir de 1 de dezembro de 2019, o salário será pago por inteiro.
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Como se deixou dito, o decreto-lei recentemente publicado, foi aprovado no Conselho de Ministros de 26 de abril, para complemento do OE 2018, tendo o Presidente da República instado, a 24 do mesmo mês, a aprovação de tal diploma (com normas relevantes para a sua aplicação), referindo que pretendia vê-lo em vigor ainda neste mês de maio – vontade que pressurosamente o Executivo cumpriu.
A Ministra da Presidência, na acima referida conferência de imprensa, desvalorizou a demora na aprovação do decreto-lei de execução orçamental, declarando não haver nenhum inconveniente significativo em aprovarmos um pouco mais tarde do que o costume”, até que “tem sempre havido algum atraso”.
Interpelada sobre as cativações de despesa feitas através deste decreto-lei, a governante afirmou que “não há alterações”. E outra fonte do Governo precisou aos jornalistas que no Orçamento do Estado estavam previstas cativações para o Fundo para a Modernização da Justiça e a Lei de Programação Militar que no decreto-lei de execução orçamental deixam de estar previstos. Nos restantes casos manteve-se o previsto na mesma proporção, acrescentou a mesma fonte.
É ainda de referir que a aprovação deste decreto-lei acontece numa altura em que o Executivo reviu em baixa a meta do défice para este ano, de 1,1% para 0,7% no Programa de Estabilidade.
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O atraso na entrada em vigor do Decreto-Lei de execução Orçamental deixou em dúvida quais as regras em vigor para as cativações, se as de 2017, mais elevadas, se as do Orçamento de 2018. Caso, seja a primeira hipótese isso permite ao Executivo cativar mais verbas nestes primeiros quatro meses do ano e assim ter um controlo mais apertado das contas públicas.
Marcelo, a 24 de abril, dizia esperar que o Decreto-lei de Execução Orçamental – que deveria ter sido publicado até ao fim do mês seguinte ao da entrada em vigor do Orçamento do Estado, ou seja, no final de fevereiro – estivesse em vigor em maio. Em declarações aos jornalistas, à saída de uma cerimónia na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, o Chefe de Estado referia que este decreto “é muito importante para a aplicação do Orçamento de 2018”.
O documento que define as normas de aplicação do Orçamento estava, na agenda do Conselho de Ministros do passado dia 19 de abril, mas não foi aprovado naquela sessão, pois o Ministro das Finanças estava fora do país. O documento regressou à mesa da Gomes Teixeira no dia 26 e foi então aprovado.
O Presidente sublinhava que este decreto-lei “tem, em pontos fundamentais, aquilo que é a regulamentação para o Orçamento poder ser cabalmente aplicado”, pelo que esperava que, em maio, já tivéssemos o documento. E agora já temos tudo o que é necessário para a plena aplicação do decreto e do Orçamento.
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Os deputados voadores deixaram recentemente de poder auferir em duplicado proventos pecuniários de viagens feitas ou não feitas. Isso acontecia aos deputados das Regiões Autónomas, por questões de insularidade, e àqueles que, no Continente, auferiam de reduções por motivos como a idade superior aos 65 anos – a que se acrescentava uma boa quantia fixa para pelo Parlamento por viagem, independentemente de ter sido ou não feita. Além do fim dessa duplicação, os deputados só receberão o reembolso pela quantia efetivamente paga por eles por viagem e contra a apresentação do conveniente comprovativo, como ditam as normas da contabilidade pública, o que não estava a ser seguido.
Agora, ficam a saber que ficam excluídos do sistema de eliminação dos cortes salariais decretados em 2010, irmanados com os membros do Governo e eleitos regionais e locais.
São os novos Mártires da Pátria, a quem devemos o reconhecimento da devotação e do sacrifício até às últimas. Coitados! Deixam tudo pelo interesse público… E recebem um ordenado mensal tão mísero e mesquinho que têm de ser compensados só por irem trabalhar no Parlamento e no círculo eleitoral por que foram eleitos. São os inúmeros subsídios que os sustentam. À moda antiga dir-se-ia que vivem de esmolas.
A sério. Porque não se pensa em dar aos deputados um salário decente (por exemplo, calculado num múltiplo de salários mínimos nacionais), alojá-los em Lisboa e pagar-lhes só ajudas e deslocações por diligências feitas e devidamente comprovadas, acabando com toda essa fantochada de subsídios ou esmolas?
E, já agora, porque parece anedota, vem à baila um episódio de hoje conhecido quando estava a confiar ao papel invisível estas laudas.        
Os deputados estavam a discutir o primeiro ponto da ordem de trabalhos, antes da audição da inspetora-geral da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), Luísa Guimarães. Eis quando se deram conta da presença duma barata na sala onde estava reunida a comissão parlamentar do trabalho e segurança social, que se preparava para ouvir predita inspetora-geral, pelo que se procedeu à suspensão dos trabalhos. Os deputados ainda tentaram prosseguir, mas, minutos depois, começaram a surgir mais baratas, considerando os deputados não haver então condições para continuarem os trabalhos naquela sala do piso 0 da Assembleia da República.
Entretanto, a comissão mudou-se para outra sala para que os deputados pudessem, então, ouvir a inspetora-geral do trabalho sobre a situação dos trabalhadores da Somincor – Sociedade Mineira de Neves Corvo, uma audição pedida pelo PCP.
Fontes parlamentares disseram à Lusa que a situação deverá estar relacionada com uma desinfestação de baratas, feita na Assembleia da República, no último fim de semana.
Quer dizer: não bastava os representantes do povo andarem a viver de esmolas ou alegadamente a servir de pombos-correios de poderosos interesses económicos (São terríveis as más-línguas!) para vir, a seguir, o martírio das baratas. Coitados! Mas é para verem o que passam os utentes das escolas secundárias de Camões, Alexandre Herculano e José Falcão…
2018.05.17 – Louro de Carvalho   

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