O
Primeiro-Ministro anunciou ontem, 18 de maio, a intenção do Governo de baixar substancialmente o IRC para empresas
instaladas no interior do país, podendo atingir uma “coleta
zero” em função do número de postos de trabalho criados.
Como
deixou entender, tal intenção insere-se no contexto da revisão do quadro fiscal
aplicável com vista ao reforço da discriminação positiva. Declarou, a este
respeito, o líder do executivo:
“Iremos
rever o quadro fiscal aplicável, reforçando a discriminação positiva do
interior. Entre outras medidas, tencionamos que as empresas dos territórios de
mais baixa densidade populacional possam beneficiar de reduções substanciais do
IRC, podendo chegar até a uma coleta zero, em função do número de postos de
trabalho.”.
Costa
falava na cerimónia de apresentação do relatório do MPI (Movimento pelo Interior), no antigo Museu dos Coches, tendo
a escutá-lo na primeira fila da plateia o Chefe de Estado, o Presidente da
Assembleia da República, bem como os líderes do PSD, Rui Rio, e do CDS-PP,
Assunção Cristas, o presidente da ANMP (Associação Nacional dos Municípios Portugueses), Manuel Machado, os Ministros da
Presidência, Maria Manuel Leitão Marques, das Infraestruturas e Planeamento,
Pedro Marques, Adjunto, Pedro Siza Vieira, e da Administração Interna, Eduardo
Cabrita.
A pari, o Chefe do Governo, na sua
intervenção, reiterou a crítica à intenção da Comissão Europeia de cortar
verbas ao fundo de coesão, ao passo que salientou a abertura do Governo para
ponderar as propostas do Movimento pelo Interior e avançou ainda com outras
medidas que o seu executivo tenciona adotar a curto prazo. Assim, anunciou:
“Vamos
lançar uma linha de crédito
no montante de 100 milhões de euros, destinada exclusivamente a
pequenas e microempresas situadas no interior, para financiamento de projetos de
criação, expansão ou modernização de unidades produtivas”.
Após
breves discursos proferidos pelos presidentes das Câmaras de Vila Real, o
socialista Rui Santos, e da Guarda, o socialdemocrata Álvaro Amaro, Costa fez
um balanço da atividade da Unidade de
Missão para o Interior nomeada pelo seu executivo em dezembro de 2015.
No
atinente ao processo de revisão do Programa
Nacional para a Coesão Territorial, que se concretizará na próxima semana,
o Primeiro-Ministro referiu que uma das linhas
centrais passará pela continuação da aposta “na atração de investimento criador de emprego, para assim fixar
população nos territórios do interior”. E adiantou:
“Na
reprogramação do Portugal 2020 – e no âmbito dos sistemas de incentivos ao
investimento empresarial exclusivamente dirigidos aos territórios do interior –
teremos um programa para apoiar investimentos de 1700 milhões de euros no
período de 2019 a 2021. Para além de incentivos ao investimento em capital
fixo, como no atual modelo, este programa apoiará igualmente a criação de
postos de trabalho, por forma a apoiar não apenas indústrias de capital
intensivo, mas também atividades mais associadas à criação de emprego no
interior.”.
Costa
sustentou que, desde o início de funções do seu executivo, os sistemas de
incentivos ao investimento empresarial em territórios de baixa densidade já atraíram 1840 milhões de euros de
investimento privado para os territórios do interior, criadores de 8500 postos
de trabalho, precisando que “apostámos na atração de investimento estrangeiro, com programas
específicos dirigidos ao interior, que já captaram 375 milhões de euros”.
E,
traçando uma linha de demarcação face ao anterior Governo, apontando que nos
últimos anos foram reabertos 20 tribunais e tomadas medidas na área da saúde e
da educação, enfatizou:
“Criámos
43 juízos de proximidade, beneficiando mais de 800 mil pessoas, criámos um
programa de atração de médicos para territórios carenciados, mantivemos abertas
400 turmas com menos de 21 alunos, aumentámos a oferta de vagas no Ensino
Superior no interior. Criámos dez lojas do cidadão e 215 espaços do Cidadão no
interior”.
***
Como foi referido, a cerimónia em que o Chefe do Governo
usou da palavra e anunciou algumas das intenções do executivo para o Interior
tinha como escopo, que foi alcançado, a apresentação do Relatório Final
do Movimento pelo Interior.
O relatório, como é natural, quer
mais do que o anunciado pelo Primeiro-Ministro. Defende, por exemplo, a
transferência de 25 serviços para o interior em três legislaturas e mais um
salário por ano para os funcionários que aceitarem ir para o interior, além de
outros incentivos para os funcionários, como a majoração do tempo de serviço
para efeitos de carreira e reforma.
A este
respeito, um dos mentores do movimento, José Silva Peneda, ex-presidente do
Conselho Económico e Social (CES) e antigo
Ministro do Emprego e da Segurança Social, disse à Lusa que se trata dum documento “propositadamente curto”, focado em
três áreas – a fiscal, a da educação, ciência e ensino superior, e a da
ocupação do território por serviços do Estado. E frisou que “cada área tem seis ou sete medidas, algumas
delas radicais, para ajudar ao desenvolvimento do interior do país”.
Impõe-se, na ótica dos mentores, a transferência de serviços da
Administração Pública para o interior, ao ritmo de dois por ano, “com o
objetivo de serem transferidos 25 serviços em três legislaturas”, mas também “devem
ser dados incentivos aos funcionários, pois à força ninguém vai”, como considerou
Silva Peneda.
Os
incentivos propostos pelo MPI passam pela atribuição de mais um salário por ano aos funcionários que
acompanhem a transferência dos serviços públicos e pela majoração do tempo de
serviço para progredir na carreira e para atingir a idade da reforma, bem como
pela melhoria do exercício dos direitos de parentalidade.
Silva
Peneda defendeu ainda que o Estado deve persuadir as grandes empresas a
investir no interior. Por isso, segundo o antigo
presidente do CES, o relatório do MPI defende que os investimentos superiores a
25 milhões de euros que contem com apoios do Estado devem obrigatoriamente
localizar-se no interior do país. É verdade que “as empresas é
que escolhem a sua localização, mas, se não forem para o interior, não devem
ter apoios do Estado”.
O
antigo Ministro do Emprego e da Segurança Social considerou que “a vida é muito
melhor nas cidades do interior e é mais económica, sobretudo para quem tem um
emprego qualificado, mas são sempre necessários incentivos para as pessoas
aceitarem a mudança”.
***
A predita
cerimónia estava agendada desde o passado dia 7, data em que foram antecipadas
a público as 24 propostas
que o MPI fez para ajudar a fixar mais pessoas nesta parte do país.
O programa, desenhado de modo a vigorar por três legislaturas, assenta em três pilares: política fiscal, coordenada pelo
antigo Ministro das Finanças, Miguel Cadilhe; política educativa,
organizada por Pedro Lourtie, antigo Secretário de Estado do Ensino Superior; e política de ocupação do território que está com Jorge
Coelho, antigo Ministro das Obras Públicas.
Com os olhos postos no Orçamento do Estado para 2019, os mentores do MPI
gostariam de ver no documento algumas das medidas que defendem, como por
exemplo a canalização de benefícios fiscais para potenciar o investimento
com vista à criação de emprego. Em causa estaria uma taxa de IRC de
12,5% que seria aplicada a todas as empresas do interior (aqui o
Governo parece ser ainda mais generoso) e que
eliminaria o atual limite de 15 mil euros de matéria coletável, mas também
restringir o acesso ao Regime Contratual de Investimento às empresas do
interior. Por outro lado, o movimento sugere um regime especial de IRS para
atrair cérebros para as regiões em causa, medida a que o Primeiro-Ministro não
se referiu.
Outra das dimensões passar por deslocalizar para o interior 25
serviços públicos, com pelo menos 100 funcionários cada, a partir de
2020, ao ritmo de dois por ano. Os funcionários públicos, por sua vez,
poderiam progredir mais depressa na carreira através da
majoração em 25% da contagem do tempo de trabalho e receberiam um subsídio equivalente a um salário anual, pago em
prestações ao longo de 5 anos consecutivos. E quem se mudasse para o interior
poderia reformar-se mais cedo, através da majoração em 10% da
contagem do tempo de serviço para efeitos de aposentação, durante o tempo de
prestação de serviço no interior.
Ao nível da educação é proposta a criação de “Escolas de
Pós-graduação” que envolvam várias instituições do ensino superior
e a redução o número de vagas nas universidades das principais cidades do país.
O Movimento sugere ainda alargar ao 2.º ciclo as bolsas que são hoje
atribuídas aos estudantes do 1.º ciclo, no âmbito do Mais Interior e lançar uma linha de financiamento do Banco Europeu de Investimento
(BEI) para capacitar unidades de investigação.
É de
recordar que o MPI foi criado
no final do ano passado com o objetivo de apresentar um conjunto de medidas
para corrigir os desequilíbrios estruturais do país, após o que se extinguirá.
Além
de Silva Peneda, o movimento integra o presidente da Câmara da Guarda e dos
Autarcas Socialdemocratas, Álvaro Amaro, o presidente da Câmara de Vila Real e
presidente dos autarcas socialistas, Rui Santos, o presidente do Conselho de
Reitores, António Fontaínhas Fernandes, o presidente do Conselho Coordenador
dos Institutos Politécnicos, Nuno Mangas, o presidente do Grupo Visabeira,
Fernando Nunes, e o fundador do Grupo Delta, Rui Nabeiro.
***
Toma-se
boa nota das medidas anunciadas pelo Chefe do Governo, mas fica-se sem saber se
as acolhe pela via do MPI ou se as acolhe do lado do trabalho da Unidade de Missão para o Interior. Por
outro lado, percebendo-se que não foram assumidas publicamente todas as
medidas, resta esperar pela revisão do aludido quadro fiscal com vista à
discriminação positiva para o Interior e pelos resultados do processo da revisão
do Programa Nacional para a Coesão
Territorial a concretizar na próxima semana.
Porém, o
Governo tem de saber gerir a conflituosidade que a discriminação positiva pode
induzir. Já foi dito que não se fazem reformas contra Lisboa, Porto e outros
grandes centros, como não se faz promoção do Interior esvaziando o Litoral.
Veja-se a crítica surgida pela medida de redução dumas vagas de acesso ao
ensino superior em Lisboa e Porto ou a celeuma criada pela notícia da
transferência da sede do Infarmed para a cidade do Porto!
Ora,
também é de pensar na disparidade resultante da beneficiação a empresas e a
funcionários que se desloquem para o Interior, sem dar um sinal de benefício
aos trabalhadores, aos empresários e aos cidadãos que ali resistiram e
continuaram a mourejar ou porque não tiveram outra hipótese ou porque adoraram
ficar, mesmo quando lhes tiraram à força serviços centrais de proximidade, os
empresários os abandonaram e os coletores do lucro os apertaram.
Será o
Governo hábil de Costa capaz de fazer de forma justa estas quadraturas do
círculo?
2018.05.19 –
Louro de Carvalho
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