sexta-feira, 14 de julho de 2017

Festa Nacional de França teve como convidado Donald Trump


Ano de 2017, 14 de julho, no 228.º aniversário da tomada da Bastilha pelo povo – o símbolo maior da Revolução Francesa, iniciada com o assalto popular à conhecida fortaleza utilizada como prisão no tempo da monarquia absoluta. Elementos da Guarda Republicana francesa percorrem a avenida Champes-Élysées e suas imediações a partir do Arco de Triunfo, em Paris, no dia da Festa Nacional de França. Ao lado do novo Presidente francês, Emmanuel Macron, está o sucessor de Barack Obama na Casa Branca, Donald Trump; e, na memória coletiva dos franceses permanece o atentado terrorista cometido há exatamente um ano em Nice, de que resultaram 86 mortos e 450 feridos.
Trump está no devir do imaginário pela forma atrabiliária como venceu as eleições presidenciais norte-americanas e pelas polémicas medidas que implantou de forma efetiva ou na forma tentada; e o aludido atentado ocorreu em Nice, quando um jihadista atropelou a multidão com um caminhão, ato que foi reivindicado pelo grupo terrorista Estado islâmico (EI).
Agora, a segurança foi reforçada na capital francesa para receber, logo no dia 12, o Chefe de Estado norte-americano. Cerca de 11 mil policiais e gendarmes foram mobilizados para o evento desta sexta-feira, dia 14, na avenida Champes-Élysées (o Presidente americano voltou ainda hoje para os EUA). Quase cinco mil militares desfilaram nos campos Elísios; e, ao lado das tropas francesas, estiveram e desfilaram militares americanos.
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Porquê Trump em Paris este ano? Porquê os dois presidentes lado a lado e militares dos dois países desfilaram a par?
É que, neste ano, a data também marca os 100 anos do início da participação dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial. Mais de 126 mil soldados norte-americanos que perderam a vida no confronto mundial foram homenageados. Por isso, é que Donald Trump foi o convidado de honra para celebrar a efeméride centenária e franceses e americanos desfilaram garbosamente em homenagem aos que tombaram no teatro de operações bélicas.  Foi, sim, por esta razão que o Presidente francês dos Estados Unidos, Emmanuel Macron, Donald Trump, e o seu homólogo norte-americano, Donald Trump, participaram nesta sexta-feira (dia 14) na parada militar em Paris para comemorar o Dia da Bastilha, feriado nacional na França. 
Segundo a agência Efe, Em homenagem ao papel dos EUA na vitória dos Aliados na Primeira Guerra Mundial, a parada militar foi aberta por um grupo de militares norte-americanos.  
Logo após Emmanuel Macron ter inaugurado a cerimónia na famosa Avenida Champs-Élysées, oito caças norte-americanos – seis F16 (“Thunderbirds”) e dois F22 (patrulhas da Força Aérea) – sobrevoaram o céu da referida avenida Champes-Élysées, justamente após a passagem de nove Alphajet da Patrulha da França, e todos realizaram acrobacias aéreas que simbolizaram a cooperação entre os países no Oriente Médio e outras regiões do mundo.
No desfile de duas horas, os dois estadistas sentaram-se juntos numa plataforma aplaudindo, apontando e tocando-se no braço enquanto as preditas aeronaves militares cruzavam os céus. E, na sua alocução, o Presidente Macron aproveitou o ensejo para se virar para o convidado e dizer que, a partir de agora, nada os irá separar. Foi algo do que se ouviu no seu discurso de ocasião:
“A presença do senhor Trump ao meu lado é um sinal de uma amizade duradoura. Quero agradecer-lhe. Nada pode nos separar jamais, quero agradecer à América pela escolha feita cem anos atrás.”.
Depois da parada militar, os mandatários dos respetivos povos seguiram junto com as primeiras-damas para a Place de la Concorde, onde o hino nacional da França foi cantado. O evento encerrou a visita de Trump e Melania à França, que contou com um tour por Paris e um jantar num restaurante na Torre Eiffel. A este respeito, o líder norte-americano escreveu no Twitter:
“Ótima noite com o Presidente Emannuel Macron e sua esposa. Fomos à Torre Eiffel para jantar. Relação com a França mais forte do que nunca.”.
E Trump afirmou, ainda no Twitter, que foi “uma grande honra” representar os Estados Unidos na magnífica parada do Dia da Bastilha, feriado nacional que evoca o evento decisivo para o início da Revolução dos Direitos do Cidadão.
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Paralelamente às comemorações da tomada da Bastilha e do centenário da entrada dos EUA na Primeira Guerra Mundial, a visita de Trump, que oficialmente começou no dia 13, tinha outro escopo. Com efeito, iniciada com uma cerimónia militar no Hotel dos Inválidos, um encontro no Palácio do Eliseu e um jantar oferecido por Macron e sua mulher Brigitte, no prestigiado restaurante localizado no 2.º andar da Torre Eiffel, visava a abordagem do Acordo de Paris.
Na verdade, o Presidente francês afirmou, em entrevista coletiva após o encontro de quinta-feira, que os dois Chefes de Estado vão continuar a discutir o Acordo de Paris sobre as alterações climáticas, apesar das diferenças de postura de ambos os países. E declarou:
“Respeito a decisão do Presidente Trump. Desta forma, ele irá refletir e trabalhar de forma conveniente e que corresponde aos seus compromissos de campanha. Da minha parte, eu continuo comprometido com o Acordo de Paris.”.
Em junho, o líder norte-americano anunciou a saída dos EUA do dito acordo, aduzindo que o texto era desvantajoso para os americanos. Agora, em relação ao comentário de Macron, foi evasivo, dizendo apenas que “algo poderá acontecer” a respeito do Acordo de Paris.
Por outro lado, a visita a França deve ter contribuído para que o Presidente americano, de 71 anos, esquecesse por horas os seus problemas em Washington: o seu filho mais velho é indiciado de haver tido contactos com pessoas supostamente ligadas à diplomacia russa durante a campanha eleitoral de 2016, sendo que, no dia 12, a CNN divulgou um vídeo que mostra Donad Trump num jantar com figuras-chave do caso da suposta ingerência russa nas eleições. De facto, a possível influência da Rússia nas eleições americanas está sob investigação.
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Como foi dito acima, as expressões “tomada da Bastilha” ou “assalto e queda da Bastilha” dizem respeito ao evento de enorme significado simbólico, ocorrido em 14 de julho de 1789, num contexto de agitação política, social e económica em França.
A organização da sociedade francesa estribava-se rigidamente nos três estratos ou estados sociais: o primeiro estado era constituído pelo clero (alto e baixo, secular e regular); o segundo estado agrupava as famílias nobres, que se repartiam pela aristocracia palaciana e pela aristocracia agrária; e o terceiro estado era o povo, que abrangia todo o 98% restante da população, incluindo a burguesia, os comerciantes, os artesãos e, os mais pobres de todos, os camponeses. Num modelo tão hierarquizado, apenas o povo pagava impostos, tendo de arcar inclusive com taxas remanescentes do feudalismo. E, quando o Soberano convocava os Estados Gerais (as cortes), por força do voto orgânico, o povo saía sempre vencido, pois a nobreza e o clero votavam no mesmo sentido – situação política que só com a mudança de regime se alteraria, desde que o sistema de voto passasse a ser o quot capita, tot sententiae, o que, na prática, faria corresponder um voto a cada cidadão, na eleição dos deputados da nação, ou um voto a cada um dos representantes dos cidadãos constitucionalmente eleitos.
Entretanto, 1785 foi cenário da forte seca que dizimou grande parte dos rebanhos do país; três anos depois, viria a ocorrer uma grande seca, que teve como consequência o aumento drástico dos preços dos alimentos e a instalação da fome em larga escala. Numa situação em que o poder se defrontava com uma aguda crise financeira, a falta de alimentos para a população mais pobre acabou por conduzir paulatinamente o reino a uma grave crise política. Na tentativa de procurar resolver o problema, o rei Luís XVI (1754-93) convocou os Estados Gerais. Tratava-se do órgão consultivo composto por membros representantes dos três estados ou estratos da sociedade, que reunira pela última vez em 1614, ainda no reinado de Luís XIII. Evidentemente que, por exemplo, Luís XIV, que se intitulava de Rei Sol ou que garantia “L’ État c’ est moi”, no quadro do iluminismo filosófico-político, nunca abriria mão do absolutismo régio.
Ora, no dia da abertura dos trabalhos dos Estados Gerais, a 5 de maio de 1789, o terceiro estado solicitou que a contagem de votos passasse a ser feita por cabeça, e não por estado, como fora até então. Passou-se um mês com discussões sem resultado, até que o terceiro estado decidiu unilateralmente reunir-se em separado numa sala à parte. Por não conseguir dissolver aquela reunião do terceiro estado, o rei ordenou que os dois outros estados se juntassem ao terceiro. Assim, a 9 de julho, era proclamada a Assembleia Constituinte.
Porém, espalhou-se o boato, com razão ou sem ela, da hipocrisia do Soberano segundo a qual, apesar de ter assentido na reunião e ter dito que apoiava os deputados, secretamente Luís convocara o exército para a dissolver. A notícia, espalhada pela cidade, causou a consternação e a revolta da maioria da população. Nas primeiras horas do dia 14, a multidão – formada principalmente por operários, artesãos e pequenos lojistas – invadiu os arsenais do Estado e tomou posse de mais de 30.000 mosquetes, partindo a seguir em direção à fortaleza da Bastilha.
Com origens ainda no século XIV, aquela fortaleza funcionava também como prisão dos inimigos do rei, mas no século XVIII encontrava-se praticamente desativada, funcionando mais como depósito de armas do Estado. Tanto assim era que, na ocasião de sua tomada e queda, ela continha apenas sete prisioneiros.
Todavia, com pouco mais de 100 guardas para a sua defesa, a Bastilha tornou-se presa fácil para os milhares de pessoas que a invadiam. O governador ainda procurou negociar com a multidão enfurecida, mas acabou decapitado e com a cabeça espetada numa lança. Após algumas horas de combate, a Bastilha caiu nas mãos dos invasores populares, que pouco depois a incendiaram.
A notícia rapidamente se espalharia pelo reino, animando os insatisfeitos com o regime absolutista com a possibilidade de mudanças efetivas. Por isso, a queda da Bastilha, que só existe agora nos registos históricos e na literatura que a referencia, é considerada como o marco inicial da Revolução Francesa. Logo no ano seguinte, a data tornar-se-ia um feriado nacional, que se mantém nos dias de hoje.
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Aprazia-me terminar aqui. Não o faço sob pena de não fazer o que aqui e agora deve ser feito.
A tomada da Bastilha faz-me lembrar o assalto de Tancos a 28 de junho de 2017, há 16 dias. Não era Paris, mas era perto de Lisboa. Nos PNT não havia prisioneiros, ao passo que na Bastilha havia sete. O arsenal do reino francês tinha muito material de guerra para o tempo; em Tancos, o material estava quase todo fora de prazo de validade e, apesar de o seu valor ser 34 mil euros, a sua periculosidade não é muito preocupante – garanto que não estou a inventar. Por isso, enquanto a Bastilha, que era uma fortaleza-prisão, só estava guardada por pouco mais de 100 homens em regime de permanência, o arsenal de Tancos estava protegido por uma rede de arame e à guarda de apenas 11 bravos militares em sistema de ronda aleatória.
Assim, enquanto o rei francês caiu e a revolução se fez, em Portugal, os detentores dos cargos políticos mantêm-se de pedra e cal, após umas reuniões de alto nível, umas visitas ao local, umas declarações aos mais que eficazes representantes da nação, uns almoços, uns jantares e uns rigorosos inquéritos a investigar tudo, “doa a quem doer”, conforme disse o comandante supremo das forças armadas. A isto ajudou a posição tremendamente subserviente das tricas castrenses, com cinco exonerações temporárias, duas demissões e meia dúzia de declarações públicas entre o infeliz e o patético – ponto de vista pessoal, profissional e institucional. 
Espero que o 28 de junho nunca venha a ser decretado feriado nem festa nacional, até porque nada se comprovou ter sido assaltado e sobretudo porque nada nem ninguém caiu, graças a Deus!

2017.07.14 – Louro de Carvalho

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