sexta-feira, 13 de maio de 2016

Maio de 2016, dia 13: Fátima – espaço de acolhimento e festa

Muitos órgãos de comunicação social se referem às atividades do Santuário de Fátima, em especial as referentes aos dias 13 de maio a outubro. Penso que muitos têm o santuário e os peregrinos como centro de acumulação de capitais e pagadores de promessas, respetivamente.
Se os jornalistas e repórteres não tiverem capacidade da hermenêutica à luz da teologia e da psicossociologia da mobilidade, poderão renunciar a juízos de valor sobretudo atirando os seus comentários ou mesmo insinuações para as malhas da pena e do ridículo, julgando as pessoas amentes e a Igreja demasiado severa. Bem sei que é isto que vende e, se há manifestações desviantes e desproporcionadas do dado religioso, também sei – e os jornalistas deveriam tentar saber – que a orientação eclesial não é pelo sacrifício até ao esvaimento ou o acento do folclore da vela e da bandeira. De resto, fazem muitos, atirando o labéu subentendidamente para cima dos eclesiásticos, negócios com e a propósito de Fátima sem rei nem roque, sendo alguns deles marcado pela ilicitude e pela exploração. 
É confrangedor ver formadores da opinião pública limitarem-se a assinalar o “pagamento de promessas”. Poderiam dizer “cumprimento”, porque o povo simples ainda não se conspurcou com o hábito do político que promete e não cumpre: o povo cumpre se prometeu e até cumpre sem ter prometido. Mas dá-lhes jeito interpretar o ato religioso como simples relação comercial com a divindade ou com os e as que deram o exemplo de a bem servirem. Complementarmente, assinalam como excessivo qualquer ato de melhoria nos equipamentos de utilização coletiva, como se as autoridades fatimitas estivessem a esbulhar o erário público, a ofender a causa dos pobres ou os peregrinos não tivessem direito a um mínimo de comodidade e apoio e mesmo a ver o santuário a par dos ditames normais da arte e da cultura como suportes adequados da transmissão da mensagem e da celebração da fé. É certo que algumas atitudes de peregrinos fazem dor pelo espetáculo deprimente que mostram.
Todavia, duas coisas os líderes eclesiásticos têm de fazer: esclarecer a fé, para que as suas manifestações não se tornem absurdas e desumanas; e, até conseguirem isso, construir formas de amenizar os sofrimentos e fazer um acompanhamento razoável das pessoas que peregrinam. Mas referir, em abono da verdade, que muitos peregrinos que vão de longe a pé já fazem programação algo racional e equilibrada da caminhada, embora muito haja a conseguir ainda.
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A propósito da informação objetiva a que os meios de comunicação social se devem considerar vinculados, ocorre-me dar como exemplo o que se pode ler no Move notícias, um edição on line, que nos da conta de que “hoje, 13 de maio, passam 99 anos da primeira aparição de Nossa Senhora aos pastorinhos, como reconhece a Igreja Católica”. Depois, quanto à peregrinação, salienta que ela “começou oficialmente com uma saudação a Nossa Senhora” no dia 12, pelas 18,30 horas, na Capelinha das Aparições; e do programa destacou-se a recitação do rosário, seguido da procissão das velas, às 21,30”. Falando deste dia 13, respiga o acolhimento aos peregrinos no Santuário a partir das 9 horas, sendo que, pelas 10 horas, “a procissão segue para o altar, realiza-se missa e há a tradicional bênção dos doentes, a consagração [das dioceses de Portugal a Nossa Senhora, acrescento] e depois a procissão do adeus”.
Em termos de síntese, adianta que “esta é a última celebração [de maio] antes de se cumprirem os cem anos”. A contagem decrescente começou no dia 12, “com a inauguração do Relógio do Centenário” que se situa “numa das entradas do topo norte do recinto”. Este relógio marca hoje 364 dias e algumas horas – “o tempo que falta para os cem anos das aparições”.
E, sobre a esperada visita do Papa Francisco, sublinha não haver ainda nenhuma informação oficial, embora Francisco já tenha manifestado “a intenção de estar em Fátima na peregrinação internacional do 13 de maio do próximo ano, vontade que foi transmitida aos bispos católicos de Portugal em setembro de 2015, no início da visita ad Limina”. Por fim, faz a contabilidade das visitas papais a Fátima, no quadro das visitas ao país: “Francisco será o quarto Papa a visitar Portugal, depois de Paulo VI em (13 de maio de 1967), João Paulo II (12 a 15 de maio de 1982; 10 a 13 de maio de 1991; 12 e 13 de maio de 2000) e Bento XVI (11 a 14 de maio de 2010).”.
A referida edição não diz tudo o que se passou, mas não se perde em considerações subjetivas de mau gosto ou reportagens parciais e achincalhantes, como alguns dos órgãos de comunicação social, cujo escopo é a guerra das audiências e a venda de papel, quando não a satisfação de um desviante desígnio ideológico.
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Fiquei admirado quando o Bispo de Leiria-Fátima, confessando que estávamos a saborear por antecipação a presença do Papa no Santuário em 13 de maio do próximo ano e pedindo ao Núncio Apostólico que se fizesse porta-voz desta vivência junto de Sua Santidade, disse que Francisco, na audiência geral do passado dia 11, se associara a esta peregrinação. Eu tinha lido o texto daquela catequese e das saudações na versão portuguesa no site da Santa Sé e não vi a referência. Mas a Rádio Vaticano tem a seguinte informação:  
“Nesta quarta-feira dia 11 de maio, na audiência geral na Praça de S. Pedro o Papa Francisco associou-se à celebração do 13 de maio, na Cova da Iria, recordando a devoção de S. João Paulo II por Nossa Senhora de Fátima. Foi na saudação aos peregrinos polacos presentes no Vaticano.”.
E transcreve:
“Sexta-feira celebra-se a memória litúrgica da Bem-aventurada Maria Virgem de Fátima. Nesta aparição, Maria convida-nos mais uma vez à oração, à penitência e à conversão. Pede-nos de não ofendermos mais a Deus; adverte toda a humanidade sobre a necessidade de abandonar-se a Deus, fonte de amor e de misericórdia. Com o exemplo de S. João Paulo II, grande devoto de Nossa Senhora de Fátima, metamo-nos em atenta escuta da Mãe de Deus e supliquemos a paz para o mundo.”
Fui verificar a versão italiana e lá vi a palavra papal referente à peregrinação de Fátima.
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Ontem referi-me a várias iniciativas que o Santuário de Fátima promoveu no sentido da melhoria do serviço ao mundo e aos peregrinos. Omiti o relógio de contagem decrescente, porque não me parece relevante, até porque o centenário das aparições não se marca com um dia (o próprio Papa designou o secretário de Estado cardeal Parolin para vir presidir à peregrinação do próximo 13 de outubro, como seu precursor) e, no início, meio e fim do verão de 1916, ocorreram as aparições do Anjo (de conteúdo trinitário, eucarístico e sacrificial pelos pecadores), pelo menos tão credíveis com as de Maria. Por outro lado, o relógio de contagem decrescente, apesar da sua utilidade na NASA e noutras instâncias técnico-científicas, em Portugal tornou-se um objeto de má memória pelo incumprimento dos objetivos do programa Pólis, sob a égide de Guterres, e da espera de limpa saída da troika, da iniciativa de Portas, então vice-primeiro-ministro.
Porém, o que marcou a peregrinação aniversária de 13 de maio deste ano foi o acolhimento, após a homilia do cardeal patriarca, da imagem peregrina da Virgem de Fátima no Santuário – saudada, chorada, cantada, aclamada, ovacionada pela multidão dos peregrinos e da clerezia presente na celebração eucarística – após o périplo, entre maio de 2014 e maio de 2015, pelas 21 dioceses do país, incluindo a diocese das Forças Armadas e de Segurança (que, sem estar prevista, foi rezada e aclamada junto de muitas unidades militares e policiais em diversos pontos do país) e pelos 35 mosteiros de clausura (entre 2014 e 2015). De igual modo, a peregrinação foi assinalada pela consagração das dioceses de Portugal ao Imaculado Coração de Maria (como há 85 anos), pronunciada, em nome dos bispos pelo cardeal patriarca de Lisboa (presidente da Conferência Episcopal dos Bispos de Portugal – não chefe da Igreja em Portugal, que não há, ao invés do que muitos pensam).
Devo acentuar que o texto, cujo conteúdo recordo ex auditu é modelar tanto no aspeto de ato de entrega confiante à proteção da Mãe de Deus como na respiração da fé profunda e arejada da Igreja, bem como pelas preocupações que a Igreja seleciona como prioritárias. Se o princípio lex orandi lex credendi for para valer, teremos em Portugal Igreja como tem de ser, embora haja ainda muito caminho por fazer.
E os atos da peregrinação ficaram concluídos, pelas 15,30 horas, com a entronização da imagem da Virgem Peregrina no presbitério da Basílica de Nossa Senhora do Rosário, “integrando a escultura do novo crucifixo do presbitério numa clara evocação do Evangelho de São João: Nossa Senhora aos pés do Filho”.
O padre Vítor Coutinho, vice-reitor do Santuário, disse a propósito, nesta cerimónia – presidida pelo Reitor do Santuário, padre Carlos Cabecinhas, com a presença dos responsáveis diocesanos pelo acolhimento da Imagem no último ano em cada uma das 21 dioceses do país – que a visita da Imagem da Virgem Peregrina às dioceses portuguesas é “o momento alto” da celebração do Centenário das Aparições da Senhora aos três videntes de Fátima. E especificou:
“Nesta visita tocamos aquilo que é central nesta celebração: reavivar a devoção a Nossa Senhora do Rosário e divulgar a mensagem que brota das aparições de Fátima. Com esta passagem da Imagem Peregrina, as comunidades ficaram em festa e entraram no espírito jubilar deste centenário, não por razões secundárias, mas pelo motivo principal: porque nos voltámos a dar conta de que a Mãe de Deus nos visitou e nos acolhe num coração que é conforto e refúgio. Visitou-nos para nos conduzir até Deus”.
No ato de entronização, usou da palavra também Marco Daniel Duarte, diretor do Serviço de Estudos e Difusão do Santuário de Fátima, que recordou a história da imagem, feita segundo indicações da própria Irmã Lúcia de Jesus e que, segundo José Manuel Tedim, foi ideia de um padre alemão para que a imagem como mensageira da paz visitasse dos territórios dos diversos beligerantes (tendo chegado à fronteira da Rússia). Este dirigente sublinhou a importância da Virgem Peregrina que “alargou a geografia de Fátima” e tem sido “um poderoso instrumento de evangelização e de afirmação do catolicismo”.
Por seu turno, a irmã Ângela Coelho, postuladora da Causa da Canonização dos beatos Francisco e Jacinta e vice-postuladora da Causa de Beatificação da irmã Lúcia, relembrou o périplo feito por esta imagem aos 35 mosteiros de clausura, salientando que, “apesar dos hábitos e dos carismas serem diferentes”, houve uma clara perceção do dom que foi receber esta imagem “que proporcionou um momento tão importante de oração mariana”.
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Retomando palavras do Bispo de Leiria Fátima, importa que, à sombra e sob a égide do Santuário, os católicos saibam levar a “ternura e misericórdia” de Deus a todas as periferias onde há “sofrimento” que necessite de “solidariedade”, de arrimo e de paz, estruturando a sociedade da ampla e aprofundada justiça social.

2016.05.13 – Louro de Carvalho

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