segunda-feira, 2 de maio de 2016

Santa Sé apresenta testemunho de perseguição de minorias religiosas

No passado dia 28 de abril, foi promovido um debate sobre liberdade religiosa no Conselho Económico e Social das Nações Unidas, em Nova Iorque. Este debate foi iniciativa da Missão permanente da Santa Sé na ONU, em parceria com outras organizações não-governamentais que atuam na promoção e defesa dos direitos humanos, prosseguiu até ao passado dia 30 e pôde ser acompanhado no Twitter.
O debate, repartido por três sessões, começou pela proteção das vítimas de perseguição e pela promoção da liberdade religiosa no mundo inteiro; depois, foram apresentadas vítimas e testemunhas oculares da perseguição aos cristãos e outras minorias religiosas por parte do autoproclamado Estado Islâmico (EI), na Síria e no Iraque, e pelo grupo Boko Haram, na Nigéria.
A última sessão sobre liberdade religiosa apresentou, na ONU, “em detalhes”, o sofrimento e os abusos sexuais a mulheres e meninas da minoria yazidi no Médio Oriente.
Sobre o objeto da última sessão, o observador permanente da Santa Sé na ONU, D. Bernardito Auza, considerou que, embora não seja possível “falar sobre tudo o que precisa ser dito, num evento de três horas” e “fazer justiça a cada grupo étnico e religioso alvo de expulsão e extermínio”, todavia, esperamos, “por meio das particularidades”, “examinar, consciencializar para este sofrimento onde quer que ele ocorra”.
O Arcebispo Bernardito Auza, que assumiu a coordenação das sessões, destacou a necessidade de se promover continuadamente o debate sobre a perseguição religiosa e sobre as situações dramáticas que ela origina.
Assim, ressoaram no Conselho Económico e Social das Nações Unidas os testemunhos dos pais de um operador da Caritas síria assassinado pelo autoproclamado Estado Islâmico (EI), de um sacerdote católico caldeu sequestrado pelo EI, de uma religiosa missionária na Síria e de uma mulher iezite sequestrada pelo EI.
Foram denunciadas situações verdadeiramente dramáticas – trabalhos forçados, sequestro, violação, tortura, morte – que constituem um verdadeiro genocídio com base em motivação religiosa, mais concretamente visando o cristianismo.  
A este respeito, o Padre Douglas Al Bazi, sacerdote católico caldeu, que também foi sequestrado pelo EI, denunciou o genocídio em curso contra os cristãos no Iraque:
“Em 2003, éramos mais de 1,5 milhão de cristãos no Iraque. Hoje somos apenas 300 mil, talvez somente 200 mil. Muitos deles vivem em campos no Curdistão, com poucas esperanças. Eu sei o que as pessoas que vivem nos campos passaram: assim como eles, eu fui sequestrado e torturado por terroristas simplesmente porque sou cristão. Todos os dias eu olhava para a cela ensanguentada onde fui colocado.  Não quero mais ver o sangue do meu povo”.
E Dom Auza encerrou o debate recordando a carta que o Papa Francisco enviara aos cristãos do Oriente Médio no Natal de 2014, com palavras de gratidão, estímulo e encorajamento:
“A vossa presença é preciosa para o Oriente Médio. Vós sois um pequeno rebanho, mas com uma grande responsabilidade na terra onde nasceu e de onde irradiou o cristianismo. Sois como o fermento na massa. A maior riqueza para a região são os cristãos; sois vós. Obrigado pela vossa perseverança!”.
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A perseguição contra os cristãos no mundo não acontece apenas no Médio Oriente e não é facto recente. Começou logo no princípio do cristianismo e foi atravessando toda a História da Igreja, obviamente sob modalidades diversas, mas com motivações semelhantes.
Porém, segundo dados da World Watch List 2016, publicada pela organização Open Doors, cresceu 2,6% em 2015. Entre novembro de 2014 e novembro de 2015, foram assassinados 7.100 cristãos, contra 4.344 no ano precedente. Também cresceu o número de igrejas atacadas: foram mais de 2.400, contra 1.062 em 2014.
E não são apenas os cristãos. Também judeus e muçulmanos sofrem perseguição. Têm em comum, apesar das diferenças, o fundamento no Livro e a adoração de um só Deus.
Um estudo do instituto norte-americano Pew Research Center conclui que, embora se tenha registado um decréscimo global da hostilidade religiosa, a perseguição aos judeus atingiu em 2013 o mais alto nível dos últimos sete anos.
Na Europa, foram registadas formas de perseguição a judeus, por parte de indivíduos ou de grupos sociais, em 34 dos 45 países do continente europeu (76%).
Cristãos e muçulmanos – que juntos representam mais de metade da população global – foram alvo de perseguição, respetivamente, em 102 (os cristãos) e 99 (os muçulmanos), dos 198 países analisados no estudo.
De acordo com os dados da Comissão dos EUA sobre Liberdade Religiosa Internacional, mais de 120 cristãos morreram no ano de 2013 em resultado de violência religiosa no Paquistão.
No relatório daquela Comissão refere-se que a violência contra as comunidades cristãs aumentara substancialmente nos últimos meses daquele ano. Sete cristãos foram mortos em ataques entre Junho 2012 e Junho de 2013, enquanto nos últimos 12 meses foram já 128.
Aquele aumento exponencial deve-se sobretudo ao ataque à Igreja de Todos os Santos, em Peshawar, em setembro de 2013, em que, pelo menos, 119 pessoas morreram quando dois bombistas suicidas realizaram um ataque no decurso de uma celebração eucarística na igreja, tal como a Fundação AIS (Fundação à Igreja que sofre) noticiara na ocasião.
O grupo extremista islâmico TTP Jundullah, com ligações aos talibãs afegãos, reivindicou a responsabilidade por aquela explosão, o mais mortífero ataque contra os cristãos na história do país. 
Não obstante, o grupo religioso mais visado no Paquistão não são os cristãos, mas os muçulmanos xiitas, pois mais de 220 ​​xiitas foram assassinados por via de atentados, tiroteios e ataques contra a comunidade.
O relatório da referida Comissão dos EUA concluía que  os atentados contra “grupos religiosos” permanecem  a um nível “alarmante” no Paquistão, “com pouca ou nenhuma resposta eficaz por parte do governo a nível federal, estadual ou local”.
Segundo os relatores, “enquanto o governo não tomar medidas contra os autores da violência religiosa, protegendo os mais vulneráveis, a situação continuará a deteriorar-se”.
O Paquistão é considerado um dos 10 países no mundo onde a comunidade cristã é mais violentamente perseguida por causa da fé, registando-se um elevado grau de impunidade para com os perseguidores, salientando-se os casos das conversões forçadas ao Islão e da lei da blasfémia, ambas responsáveis pelo aumento da tensão religiosa. 
É de recordar o caso mundialmente conhecido de Asia Bibi, que, tal como a Fundação AIS tem acompanhado, foi parar à prisão desde 2010, condenada por blasfémia.
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O estudo acima referido do Pew Research Center, que se realiza, desde 2007, com periodicidade anual, mostra que a hostilidade social explicitamente relacionada com a religião registou um declínio em 2013, depois de se ter verificado o maior nível de sempre no ano anterior, tal como as restrições à religião impostas pelos governos.
Nos termos do estudo, o número de países com níveis altos ou muito altos de hostilidade religiosa caíram de 33%, em 2012, para 27%, em 2013, enquanto os países com restrições graves e muito graves à religião passaram de 29 para 27%, no mesmo período.
A hostilidade social referida materializa-se em atos que vão do vandalismo de propriedade religiosa e profanação de textos sagrados até aos ataques violentos que redundam em abusos sexuais, ferimentos e mortes, ao mesmo tempo que as restrições governamentais à religião incluem tentativas de controlo de pessoas ou de grupos religiosos pela via de registos obrigatórios, políticas discriminatórias e restrição total de algumas religiões.
Globalmente, o nível de restrições era alto ou muito alto em 39% dos 198 países e territórios analisados no estudo, que estima que 5,5 mil milhões de pessoas (77% da população mundial) vivam em países que restringem e perseguem por motivos religiosos.
Em 2012, a percentagem de população a residir nestes países era de 76% e, em 2007, de 68%. Entre os 25 países mais populosos, o maior nível de restrições foi registado na Birmânia, Egito, Indonésia, Paquistão e Rússia, onde quer a sociedade quer os governos impõem numerosas limitações às crenças e à liberdade religiosa.
A China registou o maior nível de restrições governamentais, em 2013, e a Índia, o maior índice de hostilidade social. O Médio Oriente – onde tiveram origem o judaísmo, o cristianismo e o islamismo – continua como a região do mundo com mais restrições e tensões religiosas.
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Depois, verifica-se a hipocrisia com que se assinam os tratados internacionais de promoção e defesa dos direitos humanos e das liberdades, com relevo para a liberdade religiosa. E, por ironia dos factos, embora a perseguição possa ter acusado algum decréscimo, recrudesce nalguns lugares. É óbvio que raramente são explicitamente invocados fundamentos religiosos, mas habitualmente razões de segurança do Estado ou ação e associação criminosa.
Resta acrescentar que, além da perseguição religiosa explícita, se promove a encapotada ação laicista ou a chacota e a subestimação das ideias e praticas religiosas consideradas ultrapassadas ou alienantes. Por outro lado, entendem alguns que as práticas religiosas constituem falta de respeito para com aqueles que as não querem observar e as ideias religiosas configuram atos de manipulação das mentes e das consciências. Enfim tanta forma de julgar mal e de fazer mal!
Até quando reinará a intolerância seja ela explícita, seja ela encapotada?

2016.05.02 – Louro de Carvalho

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