Os
dados do “Estudo sobre Consumos de Álcool, Tabaco, Drogas e outros Comportamentos
Aditivos e Dependências – 2015”
apresentado, no dia 3 de março, pelo SICAD (Serviço de Intervenção nos
Comportamentos Aditivos e nas Dependências) permitem-me
a interrogação sobre o mérito da educação que estamos a dar aos adolescentes e
jovens. Com efeito, há toda uma política de restrições da parte da família, da
escola e da opinião pública no atinente ao consumo de álcool, que em si mesma é
de aplaudir, mas cujos efeitos práticos se revelam muito aquém do desejável. Nas
escolas é proibida a ingestão de bebidas alcoólicas aos alunos – crianças,
adolescentes e jovens – como o consumo de drogas e tabaco. E, em regra, a
família fá-lo.
Porém,
facilmente o consumo de álcool fica associado ao consumo de vinho, até porque
se difundiu o consumo de cerveja sem álcool (?!). Por outro lado, foi
criminalizado o tráfico de drogas, que não o consumo; o tabaco, apesar dos malefícios,
surge em muitos ambientes como sinal da assunção da personalidade perante os outros;
e as bebidas brancas são consideradas ao alcance de pessoas ou da alta
sociedade ou da arraia-miúda. E, se muitos não aspiram a ser da alta-roda, também
não querem ser conotados com os estratos mais baixos da sociedade.
Acresce que –
e este pode ser um fator de “deseducação” – a estas crianças, adolescentes e jovens
se ministra a proibição em vez do esclarecimento, provavelmente sem a pedagogia
da diferenciação e sem medidas eficazes de prevenção e acompanhamento. Recordo que,
a este propósito, nos era referida muitas vezes a insuficiência de idade, que
teríamos direito a determinadas coisas mais tarde e quando adquiríssemos outro
estatuto social. De há uns tempos a esta parte, o igualitarismo tem imposto que
aquilo que é proibido a crianças, adolescentes e jovens o seja inexoravelmente
aos adultos, mesmo que as situações sejam diferenciadas.
Ora, o
igualitarismo é muito interessante, mas somente quando não bate à nossa porta. E
os jovens facilmente se dão conta da quebra do igualitarismo por parte dos
adultos, sobretudo quando ela acontece às escondidas. É ainda de referir como
fator importante para o insucesso da educação a mentalidade e o interesse do empresário
que, mais do que a finalidade de família ou de escola, almeja o lucro, mediante
a saída dos seus produtos, mesmo que para tal necessite de utilizar o disfarce
e a dissimulação sob a capa da publicidade. Tanto assim é que junto das escolas
não raro se instalam cafetarias, cafés e snack-bares e raramente há evento
desportivo, cultural ou festivo que não conte com a bebida, que não é água ou
leite. E é de perguntar por onde param as entidades reguladoras e fiscalizadoras.
***
O site
da DGE (Direcção-Geral
da Educação) tem disponível
um documento intitulado “Consumo de Substâncias Psicoativas
e Prevenção em Meio Escolar”
(2007), resultado de um trabalho coordenado por Maria Isabel Machado Batista e Ângelo
de Sousa, do NES (Núcleo de Educação para a Saúde) da antiga DGIDC (Direção-Geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular). O estudo tem ainda a colaboração da DGS (Direção-Geral
de Saúde) e do IDT (Instituto
da Droga e da Toxicodependência).
Na referida
publicação, de 106 páginas, as “notas de abertura”, de Luís Capucha
explicitam:
“Se
há crianças e jovens que fumam, que consomem álcool ou outras substâncias psicoativas,
então estamos perante um problema grave face aos dias que hão de vir para esses
jovens e crianças e para o futuro da sociedade”.
A seguir às notas de abertura, vêm: “Introdução – Reflexões
sobre o Papel da Escola”; “Promoção da Saúde – O papel da Escola e da
Comunidade Educativa”; “Tabaco e Saúde”; “Problemas ligados ao Consumo de
Bebidas Alcoólicas”; e “Prevenção do Consumo de Substâncias Psicoativas”.
É
relativamente abundante a bibliografia referenciada para cada um dos temas: tabaco;
álcool; drogas; e promoção e educação para a saúde.
Por
fim, regista-se um conjunto alargado de endereços úteis, designadamente em páginas
web.
Por
outro lado, quase todas as escolas desenvolvem projetos de educação para a saúde
ou similares, com a colaboração assídua das unidades de saúde de expressão
local.
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Por contraste,
os dados de 3 de março vêm no alinhamento de dados de estudos anteriores, mas
com forte agravamento. O estudo baseia-se em 6 amostras, distribuídas por
distritos, que pretenderam cobrir toda a realidade nacional. Na totalidade,
terão sido considerados cerca de 18 mil alunos e uma média 3000 alunos por cada
grupo etário, dos 13 aos 18 anos. Assim:
As estatísticas
revelam que, no geral, os jovens consomem mais bebidas brancas que
cerveja.
O
estudo sobre consumos e comportamentos aditivos dos jovens portugueses, na
faixa etária dos 13 aos 18 anos, refere que as bebidas destiladas, conhecidas
como “bebidas brancas”, excedem a cerveja e que são as jovens quem mais
contribui para esta realidade, considerada nova.
Nos últimos 30 dias à data da realização do inquérito,
as bebidas alcoólicas que estavam no topo do consumo entre jovens eram bebidas
como gin e vodka, a perfazer 31% dos consumos, contra os 30% atribuído à
cerveja e os 22% ao vinho.
Os dados recolhidos por diferenciação com base no sexo
evidenciam que os rapazes preferem a cerveja e as raparigas optam preferencialmente
pelas bebidas destiladas. 36%
dos jovens bebeu cerveja e 30% bebidas destiladas. Entre as raparigas, a ordem
é outra: 25% para a cerveja e 32% para as bebidas de nível alcoólico mais
elevado.
O estudo revela também que 5,3% dos rapazes dos 13 aos
18 anos consomem apenas bebidas espirituosas, enquanto mais do dobro das
raparigas (11%) o faz.
Outros dados mostram que o primeiro contacto com o
álcool começa aos 13 anos
para 31% dos jovens; e que, aos 18 anos, são poucos os que nunca o
experimentaram – 91% já o fez.
Também esta pesquisa, que integrará
um estudo que abrange 40 países, revela “a tenra idade com que se começa a
beber “shots” de enfiada, o que tecnicamente se designa por “binge drinking” e
que, na prática, corresponde à ingestão de cinco ou mais doses de bebidas numa
só ocasião. Por esta experiência passaram 4% dos miúdos com 13 anos nos últimos
30 dias, sendo que ela foi uma realidade, aos 18 anos, para 36%. Há também mais
raparigas a começar mais cedo este tipo de consumo intensivo de álcool. Aos 13
anos, 4% já o fizeram.
Genericamente e considerando
todos os alunos (é óbvio que estamos a falar de pessoas em idade escolar) considerados
entre os 13 e os 18 anos, continuam a ser os rapazes quem mais bebe segundo
este método.
As conclusões
permitem dizer que “apanhar uma bebedeira acontece bem antes da idade legal
para adquirir e consumir álcool. A experiência de embriaguez foi mencionada por
2% dos jovens com 13 anos e por 22% dos que atingiram 18 anos – isto no último
mês.
Apesar de
tudo e tendo em conta os dados de 2011 (o estudo tem-se realizado a de 4 em 4 anos), o SICAD faz saber que houve uma
diminuição da embriaguez registada em todos os grupos etários, à exceção dos
jovens com 18 anos, que estabilizou. Exemplo disso é o facto de 10% dos rapazes
e 3% das raparigas terem consumido álcool vinte ou mais vezes nos últimos 30
dias.
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Passando aos dados sobre consumo de sedativos e
tranquilizantes, verifica-se que “uma em cada cinco raparigas com idades entre os 13
e os 18 anos toma tranquilizantes ou sedativos, a maioria com prescrição médica”
– realidade a preocupante na ótica das autoridades de saúde.
De acordo com Fernanda Feijão, coautora do estudo,
importa perceber “como é que há uma percentagem tão elevada de raparigas a
precisar de medicamentos”, sabendo-se que este é um indicador em que “costumamos
estar acima da média europeia”.
O subdiretor geral do SICAD, Manuel Cardoso, explicou
aos jornalistas que ainda não há uma explicação para estes consumos, mas
considerou que 20% “é um valor muitíssimo alto” e que esta “questão tem de ser
estudada”.
Fernanda Feijão sustenta que “há um problema no
feminino que deve ser investigado e sobre o qual a saúde se deve debruçar” – problema
no feminino que se estende a outras áreas, como o consumo de bebidas
alcoólicas, em que as raparigas levam a dianteira sobre os rapazes, no que
respeita às bebidas espirituosas, como já foi referido.
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No atinente à droga, o estudo indica que só aumentou a
experimentação na faixa etária entre os 13 e 18 anos.
Ainda entre os jovens de 18 anos se verificou que 10%
(cerca de 10
mil jovens) revelaram ser consumidores
frequentes de álcool, droga e tabaco. Segundo Fernanda Feijão, este é também um
grupo de consumidores “que deve ser objeto de especial preocupação”.
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O estudo do SICAD também faz estatística sobre apostas desportivas entre
os adolescentes e jovens. Assim, as apostas online são apenas uma das modalidades,
sendo que as lotarias têm maior expressão: 12% dos rapazes com 13 anos jogou na
lotaria tradicional; e, aos 18 anos, a experiência foi relatada por 28% dos
ouvidos.
Também o uso intensivo da internet apresenta
uma percentagem significativa de jovens que já ali faz as suas compras ou vende
os seus produtos: 14% exerceu estas atividades recorrendo ao computador aos 13
anos; e a percentagem sobe para os 29% aos 18 anos.
O uso da internet nos últimos 7 dias, muito similar
por géneros, está nos 92% aos 13 anos e nos 98% aos 18 anos, sendo. O uso das
redes sociais está em 82% para os que têm 13 anos e nos 95% para os que possuem
18. Porém, há mais raparigas a participar nas redes sociais do que rapazes: 87%
das raparigas, aos 13 anos, contra 77% dos rapazes, aos 13 anos.
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Perante os efeitos da crise e a falta de expectativas
de muitos (nomeadamente a falta de emprego e de interesses válidos), parece que tem de rever-se a perspetiva
educacional, o empenhamento de todos, a prevenção, regulação e fiscalização e a
remediação e recuperação – para que a juventude seja efetivamente o futuro que
esperamos!
2016.03.04 –
Louro de Carvalho
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