segunda-feira, 28 de março de 2016

Cúpula Mundial Humanitária 2016

Em conformidade com a informação de Ban Ki-moon, Secretário-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), à Assembleia Geral em fevereiro passado, vai realizar-se, em Istambul, na Turquia, nos dias 23 e 24 de maio próximos, a Cúpula Mundial Humanitária.
Trata-se da convocação da comunidade internacional, por parte do Secretário-Geral da ONU, para que “nenhuma pessoa que esteja em um conflito armado, nenhuma com pobreza crónica, nenhuma que viva com o risco de perigos naturais e do aumento do nível do mar fique esquecida”. Ou seja, a cúpula tem por objetivo reunir a comunidade internacional (sociedade civil, governantes, setor privado, representantes das missões de paz) para conceber novas políticas e estratégias de assistência humanitária nos países afetados.
Ao apresentar o informe ou relatório “Uma Humanidade: A Responsabilidade Compartilhada perante os delegados, Ban afirmou que a primeira Cúpula Mundial Humanitária “será o momento para nos unirmos na renovação de nosso compromisso com a humanidade”. No seu prefácio, o Secretário-Geral das Nações Unidas escreve:
“Peço aos líderes do mundo que venham à Cúpula Mundial Humanitária preparados para assumir as suas responsabilidades por uma nova era nas relações internacionais. Uma era na qual a salvaguarda da humanidade e a promoção do progresso humano impulsione a nossa tomada de decisões e medidas coletivas.”
Segundo o predito documento, a ONU precisará de mais de US$ 20 biliões para alimentar e cuidar de mais de 60 milhões de pessoas deslocadas dentro dos seus países ou que fugiram para outras terras convertendo-se em refugiados. Cerca de 40 dos 193 Estados membros das Nações Unidas (quase 21%) experimentam “crises e violência de nível, alto, médio ou baixo”.
De acordo com o texto do documento, em 2014, os conflitos armados e a violência obrigaram cerca de 42.500 pessoas a fugirem de suas casas a cada dia, o que resultou em mais de 60 milhões de pessoas deslocadas, refugiadas e solicitantes de asilo no primeiro semestre de 2015. Cerca de metade das meninas e dos meninos refugiados do mundo não estão a receber a educação primária e 75% não têm acesso à educação secundária. Atualmente, quase 1,4 biliões de pessoas vivem em situações de fragilidade, e estima-se que serão 1,9 biliões até 2030. Portanto, é fundamental que sejam adotadas medidas coordenadas para antecipar as crises, reforçar as instituições e os governos locais, aumentar a resiliência da comunidade e investir na análise de dados e riscos.
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Em certa medida, pode dizer-se, do meu ponto de vista, que as finalidades da ONU se vêm frustrando, uma vez que o seu principal objetivo é a construção da paz mediante a estratégia do desenvolvimento sustentável e no respeito dos direitos de cada pessoa. Isto não quer dizer que, se não fossem os esforços das Nações Unidas, a situação não seria pior ou que o esforço feito pela comunidade internacional, a diversos níveis e em diversos setores, não tenha sido positivo. Porém, a guerra de interesses económicos e o império do dinheiro e do negócio das armas, bem como diversas modalidades de fundamentalismos sobrepõem-se aos direitos, aos deveres e às demais vertentes da “humanitariedade” e todos se reclamam de humanistas e de cooperantes em ações de paz ou em ações humanitárias. É a hipocrisia reinante que leva os decisores ao excessivo calculismo para determinarem quando e aonde lhes dá jeito ir, sem se denunciarem quanto a iniciativas escusas de imposição larvada dos seus ditames políticos, militares e económicos à custa dos mais pobres.
Enquanto, se multiplicam os conflitos, as situações de pobreza e as ações de exploração organizada e/ou informal, os muros levantam-se e crescem; pululam as organizações políticas extremistas, xenófobas e racistas; muitos decisores políticos eternizam-se no poder, aduzindo as mais diversas formas de legitimação de tal postura; uns centros de poder trabalham na ambivalência; e outros, como a União Europeia, são inermes, inertes e sem voz.
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Ban Ki-moon, no entanto, não deixa de denunciar, com a autoridade moral e política que ainda se lhe reconhece, que “as atuais crises na nossa economia política mundial, junto com a mudança climática”, a violência extremista, o terrorismo, a criminalidade transnacional e a persistência de brutais conflitos armados vêm devastando as vidas de milhões de pessoas e provocando a desestabilização de regiões inteiras. Por isso, os desafios que hoje se colocam aos Estados são transversais, galgam as fronteiras dos povos, das etnias e dos continentes; e superam a capacidade de um país ou de uma instituição. Como receita, o homem forte da ONU urge a restauração da confiança na ordem mundial internacional e na capacidade das diversas instituições nacionais e regionais em enfrentar com eficácia esses graves desafios.
Um alto funcionário da ONU, que preferiu não se identificar, advertiu para o facto de o mencionado relatório conter “uma petição pessoal do secretário-geral” para “restaurar a humanidade” e assim se “garantir a dignidade e a segurança de todas as pessoas”, segundo a DUDH (Declaração Universal dos Direitos Humanos) e os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da Agenda 2030. Segundo o mesmo funcionário, a Cúpula Mundial Humanitária, de Istambul, visa mobilizar a comunidade internacional para a redescoberta da unidade e solidariedade mundiais e para conseguir o fim do sofrimento humano e da desigualdade.
A Cúpula Mundial Humanitária segue-se a muitos esforços que já vêm sendo feitos no sentido de preocupações que são objeto de muitas organizações não-governamentais.
Entre estas, destaca-se a oxfam (Oxford Commitee for Famine Relief, em português, Comité de Oxford de Combate contra a Fome). Esta ONG foi criada em Oxford, na Inglaterra, em 1942, por um grupo de intelectuais (religiosos, sociais e académicos), liderado pelo cónego Theodore Richard Milford (1942). O seu objetivo inicial era convencer o governo britânico a permitir a remessa de alimentos às populações famintas da Grécia, ocupada então pelas forças nazistas e submetida ao bloqueio naval dos aliados. Atualmente, porém, a organização opera em vários países e, além do combate à fome, atua nas seguintes frentes nevrálgicas: comércio justo; educação; saúde; SIDA/VIH; inclusão social; democracia e direitos humanos; guerras e desastres naturais.
No passado mês de janeiro, publicou um relatório de cujas conclusões se destacam as seguintes:
- A riqueza acumulada pelo grupo dos mais ricos, que representa 1% da população mundial, equivale à riqueza (aos bens) dos restantes 11% da população mundial;
- As 62 pessoas mais ricas do mundo têm o mesmo em riqueza que toda a metade mais pobre da população global.
Por conseguinte, o documento contém: um pedido aos líderes do mundo dos negócios e da política, então reunidos no Fórum Económico Mundial de Davos, para que tomem as medidas necessárias para enfrentar a desigualdade no mundo; e uma crítica da ação de lobistas – que influenciam decisões políticas que interessam a grandes empresas – e da quantidade de dinheiro em paraísos fiscais.
Por outro lado, de acordo com a informação de fonte não identificada da ONU, os fundos com fins “humanitários multiplicaram-se por completo até mais de 600% do que era preciso há dez anos e quase 80% mais de pessoal humanitário, bem como de forças de manutenção da paz e pessoas em missões políticas especiais estão envolvidos nessas situações prolongadas”. Assim se compreende que países e organizações da sociedade civil de todo o mundo tenham recebido bem a iniciativa de Ban Ki-moon.
Por seu turno, Charlotte Stemmer, representante da Oxfam, declarou:
“O sistema humanitário está esmagado pela magnitude de necessidades crescentes num mundo sacudido pelas crises e (os governantes) não se devem limitar às palavras; são necessárias medidas concretas com urgência. O maior legado da Cúpula Mundial Humanitária seria o compromisso real para mudar essa situação.”
O documento apresentado pelo Secretário-Geral da ONU preconiza que a humanidade compartilhe a responsabilidade da liderança política para evitar e terminar os conflitos armados. E, em vez de investir na assistência humanitária, a comunidade internacional deverá dar prioridade às soluções políticas, à unidade e à construção de sociedades pacíficas. Também deve aplicar e cumprir as leis internacionais de proteção da população civil, de respeito dos direitos humanos, de restrição do uso e da transferência de certas armas e munições, de cessação dos bombardeios e de fortalecimento do sistema de justiça internacional. E, ainda, recomenda que não se esqueça ninguém (este também é o tema central da Agenda 2030 de Desenvolvimento da ONU), que seja ajudada a população mais pobre e vulnerável nas zonas afetadas pela guerra ou por desastres naturais e que seja assegurada a proteção das mulheres e meninas e o exercício do direito de todos à educação.
O relatório da ONU também recomenda o investimento na humanidade. Ban Ki-moon exortou os doadores e as autoridades nacionais a mudarem a mentalidade para a “doação de fundos para financiamento” dos atores e instituições locais, uma vez que melhoram a rentabilidade e a transparência; e explicou que a cúpula de Istambul, que será organizada pelo Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU, oferecerá pela primeira vez a oportunidade de refletir sobre um novo contexto de ajuda humanitária.
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E há tanto que fazer, tanto caminho por desbravar. Não seria de ter mais em boa linha de conta a seguinte verificação papal Urbi et Orbi da Páscoa deste ano?
“O Cristo ressuscitado, anúncio de vida para toda a humanidade, reverbera através dos séculos e convida-nos a não esquecer dos homens e mulheres na sua jornada em busca de um futuro melhor; grupos cada vez mais números de migrantes e refugiados – entre os quais muitas crianças – que fogem da guerra, da fome, da pobreza e da injustiça social. Esses são nossos irmãos e irmãs, que nos seus caminhos encontram, com demasiada frequência, a morte ou, ao menos, a recusa dos que poderiam oferecer-lhes hospitalidade e ajuda.”
E bem oportuno é o seu voto pelo futuro próximo:
“Que a próxima rodada da Cúpula Mundial Humanitária não deixe de colocar no centro a pessoa humana com a sua dignidade e possa desenvolver políticas capazes de ajudar e proteger as vítimas de conflitos e de outras situações de emergência, especialmente os mais vulneráveis e os que sofrem perseguição por motivos étnicos e religiosos”.

2016.03.28 – Louro de Carvalho

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