O conselho
de Ministros do passado dia 11 de junho aprovou a alteração do diploma que
estabelece as normas sobre o recrutamento para as equipas de zona de vigilância
nas escolas, alargando a base de recrutamento de chefes e elementos das equipas
de zona de vigilância das escolas a militares das forças armadas na reserva.
Tal alteração tem incidência sobretudo nos artigos 6.º e 7.º do Decreto-Lei n.º
117/2009, de 18 de maio.
Nestes termos e de acordo com a explicação fornecida pelo Ministério da
Educação e Ciência (MEC), os militares das Forças Armadas na reserva vão fazer vigilância dentro das
escolas, designadamente nos recreios, com missões como impedir agressões entre
elementos da comunidade escolar, bem como nas zonas de acesso aos
estabelecimentos escolares e junto às imediações das suas vedações.
O objetivo é a facilitação na contratação de elementos para o desempenho
das funções de chefes equipas de zona e de vigilantes para integrarem as
equipas de vigilância e permitir a renovação das comissões de serviço, por
forma a assegurar a continuidade da atividade de vigilância nas escolas.
Os militares na reserva vão fazer – como já o faziam os vigilantes até
agora recrutados, exclusivamente, de entre os aposentados e reservistas fora da
efetividade de serviço, ou equiparados, das forças de segurança ou dos órgãos
de polícia criminal – a segurança escolar no interior das escolas e terão
funções complementares ao trabalho que é atualmente desenvolvido pela PSP. Assim,
não se substituem aos elementos do Programa Escola
Segura, vindo, antes, complementar o trabalho de outrem.
Os vigilantes serão colocados, segundo o MEC, nos estabelecimentos escolares
que, “devido à sua localização, população, dimensão e problemáticas associadas,
necessitem dos mesmos para garantir a tranquilidade da comunidade escolar”.
As principais missões serão, a título exemplificativo: zelar pelo
cumprimento dos regulamentos das escolas, “requerendo o auxílio de forças de
segurança, sempre que for justificado”; sensibilizar os alunos para a
conservação e gestão dos equipamentos das escolas; “impedir a prática de
qualquer tipo de agressão, verbal ou física, entre os membros da comunidade
escolar”; e “fiscalizar e informar do estado de conservação das infraestruturas e equipamentos da escola, sempre que
verifique que o mesmo se encontra deteriorado, danificado ou a funcionar
defeituosamente”.
O MEC sublinha que as escolas poderão contar com os militares para “defender
os direitos das crianças e jovens da escola onde prestam serviço, protegendo-as
de qualquer forma de abuso” e para detetar ilegalidades e infrações às regras
da escola.
Fonte do
Ministério da Defesa Nacional explicou tratar-se de uma alteração ao diploma
que estabelece as normas de recrutamento e alarga as bases desse recrutamento a
elementos das Forças Armadas que se encontrem na reserva, portanto, fora da efetividade
de serviço.
Segundo as
palavras do MEC, as comissões de serviço podem ser renovadas “até ao limite de
duas vezes”.
Até agora
estas funções estavam reservadas, como se referiu, exclusivamente a “aposentados
e reservistas fora da efetividade de serviço, ou equiparados, das forças de
segurança ou dos órgãos de polícia criminal”, segundo o n.º 1 do art.º 7.º do
mencionado diploma legal, que enquadra o funcionamento das equipas de
vigilância nas escolas.
As comissões
de serviço, com a duração de três anos, renováveis até agora por uma única vez,
passam a ser renováveis por duas vezes.
De acordo
com o estabelecido legalmente, “aos chefes de equipa de zona e aos vigilantes é
mantida a respetiva pensão ou remuneração na reserva, sendo-lhes abonada uma
terça parte da remuneração que compete às respetivas funções”.
***
Porém, a solução não é consensual. A Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP) criticou, logo no dia 16, a presença de militares na reserva na
vigilância das escolas, considerando que o Governo devia reforçar o Programa Escola Segura, com investimento em meios
materiais e humanos. Por isso, na sua perspetiva sindical, o recurso aos
militares para garantia da segurança pública é um caminho grave que tem de ser
combatido sob pena de se cair num retrocesso de décadas nesta matéria.
Em seu comunicado,
a ASPP refere, contra a gravidade da banalização do recurso aos militares para garantia da segurança pública,
que, “se o Governo pretende mais e melhor patrulhamento junto das escolas, deve
investir em meios materiais e humanos, coisa que não fez, abandonando projetos
como o do policiamento de proximidade”.
Assim, a ASPP defende que o projeto Escola Segura, desenvolvido pela PSP e
GNR, deve ser reforçado com recurso a profissionais preparados e “não com
homens e mulheres atirados para uma função para a qual não têm competência nem
motivação”. Por outro lado, esta associação sindical considera que a vigilância
das escolas é uma competência das forças de segurança, sublinhando que a
separação entre defesa e segurança interna tem de “ser efetiva e clara”, mas o
Governo, “de tempos a tempos, tem tendência a confundir os dois conceitos”. E acrescenta:
“As limitações às funções das Forças Armadas, instituição que merece o
maior respeito e admiração, estão bem explícitas na Constituição da República e
no próprio estatuto dos militares das Forças Armadas, que restringe a sua ação
no campo da segurança interna”.
Com efeito, em relação às forças
armadas, a quem incumbe a defesa militar da República (vd CRP, art.º 275.º/1.), o n.º 6 do art.º 275.º da CRP estabelece, naquilo que parece mais
próximo da segurança interna:
“As Forças Armadas podem ser incumbidas,
nos termos da lei, de colaborar em missões de proteção civil, em tarefas
relacionadas com a satisfação de necessidades básicas e a melhoria da qualidade
de vida das populações, e em ações de cooperação técnico-militar no âmbito da
política nacional de cooperação”.
Por seu
turno, o PCP – no que é acompanhado pela ANS (Associação
Nacional de Sargentos),que
não foi tida nem achada na matéria, sem qualquer explicação – alertou já esta
semana para a eventual inconstitucionalidade da decisão governamental, não
tanto no aspeto material, mas do ponto de vista formal, já que se trata de uma
decisão governamental sem anúncio prévio e sem explicações justificativas.
Parece
que, embora as forças armadas possam ter a incumbência de colaboração em
missões de proteção civil atinentes às necessidades básicas e melhoria da qualidade
de vida, a decisão deve revestir a forma de lei e fundamentar-se na manifesta e
insolúvel insuficiência das forças de segurança por um curto lapso de tempo,
não podendo nunca exercer funções de polícia nem a situação ser passível de
renovações automáticas. Depois, os militares reservistas não perdem as
condições de tratamento em razão do seu posto, sendo que, nestas condições, não
podem estar sujeitos a comando da parte de inferiores hierárquicos. Por outro lado, no apoio à escola e no
desempenho das missões específicas, eles não dispõem de meios dissuasores nem de
enquadramento orgânico ou mesmo de fardamento. Ademais, cria-se o ambiente
propício à rarefação de meios humanos com aptidão para a vigilância e a
segurança escolares e paraescolares.
Todavia,
o Presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos
e Escolas Públicas)
não discorda da ideia, desde que “obedeça a regras estritas”, exigindo que não
façam parte do rácio de funcionários e que tenham formação prévia para
trabalhar com crianças.
É óbvio,
do meu ponto de vista, que o diploma legal garante que os militares reservistas
não integrarão o rácio de funcionários nas escolas nem se substituirão aos
elementos do Programa Escola Segura. No
entanto, a prática mostra que, muitas vezes, os extra são obstáculo duradouro à reposição dos quadros. Quanto à necessidade
da formação, penso que sim, mas torna-se complicado fornecer formação
pedagógica a pessoas já fortemente desgastadas pelo exercício de profissão de
risco e de entrega total.
E a
propósito, porque é que a ANDAEP não fez as mesmas exigências de não integração
do rácio e de formação no caso dos chefes de
equipa de zona e dos vigilantes até ao presente recrutados, exclusivamente, de
entre aposentados e reservistas fora da efetividade de serviço, ou equiparados,
das forças de segurança ou órgãos de polícia criminal, nos termos do DL
n.º 117/2009, de 18 de maio?
O Presidente da ANDE (Associação Nacional de
Dirigentes de Escola) mostrou-se complacente na convicção de que a alteração do
diploma em causa apenas estende o recrutamento a militares reservistas. Parece minimizar
a questão do rácio e a da formação.
Quanto ao presidente da ANS, lamento discordar da sua posição.
Não aceita que o Governo possa determinar o recrutamento de militares para o
efeito, mas concorda que eles possam requerer esse tipo de ocupação por
necessidade de aumentar o seu rendimento.
Quanto a este aspeto, embora o problema do rendimento tenha
de ser equacionado, mas não por esta via (se os
efetivos são necessários, tem de se aumentar o número de funcionários e os
elementos do Programa Escola Segura e
não atamancar o problema), a bondade ou maldade do diploma legal não depende do facto
de a iniciativa caber ao Governo ou ao potencial requerente reservista. A confusão
entre segurança e defesa manter-se-ia, não?!
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