Há nove anos a esta parte, Portugal promoveu o
estabelecimento de parcerias entre três universidades americanas e empresas
portuguesas.
O balanço que hoje se faz dessas parcerias
resume-se em dois pontos: tiveram um impacto reduzido na ligação da
investigação científica à economia nacional; e criaram projetos de investigação
(sendo esta sua mais-valia).
Sendo assim, os responsáveis pela avaliação concluem que, apesar de tudo, o
balanço é “claramente positivo”.
***
Efetivamente, o Público de hoje, dia 29 de junho, num pequeno trabalho de Samuel
Silva, veicula as conclusões produzidas por uma investigação sobre a matéria
levada a cabo pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.
Os acordos de parceria celebrados, em 2006, com
o MIT (Massachuset-ts Institute of
Technology), a Carnegie Mellon University e a
Universidade do Texas, sob a égide do então Ministro da Ciência, Tecnologia e
Ensino Superior, José Mariano Gago, representaram um investimento nacional de
150 milhões de euros até 2012.
Segundo as conclusões do ISCTE, as empresas
tiveram um papel “utilitário” nas parcerias que foram constituídas e os
cientistas recorreram sobretudo a parceiros com que já tinham relações
anteriores. No ano de 2012, com as severas críticas veiculadas pela Comunicação
Social – a qual, em 2006, deu ao evento um enorme relevo –, a parceria foi
renovada pelo Governo, mas com uma redução de verbas.
Dado que “um dos objetivos era a criação de novas
ligações entre o tecido científico português e as empresas”, procedeu-se –
dizem – a uma definição restritiva dos critérios de candidatura. Assim, a
constituição dos consórcios de projetos que podiam candidatar-se a
financiamentos no quadro destas parcerias tinha de visar a integração de um
parceiro empresarial. Obviamente que, na ótica dos investigadores responsáveis pelo
balanço, esta opção iria obter resultados limitados.
De acordo com as palavras de Teresa Patrício,
a coordenadora do estudo, das parcerias resultaram colaborações em “áreas
científicas onde já havia colaborações anteriores e que têm uma aproximação às
empresas”. Por outro lado, no relatório final, apresentado hoje no ISCTE, pode
ler-se que, além de se limitar a “ativar colaborações anteriores”, foram
envolvidos na iniciativa “atores isolados, sem grandes interesses em comum”.
Quanto aos parceiros empresariais, tiveram,
como já se disse, um papel “utilitário”, observando os critérios da candidatura
a financiamento e/ou disponibilizando recursos, “mas sem um envolvimento ativo
em dinâmicas de produção de conhecimento”.
Não obstante, o relatório elenca várias
consequências “muito positivas” das parcerias, designadamente: uma atratividade
grande para alunos que vêm do estrangeiro, que permitiu a criação e
desenvolvimento de novos projetos de investigação; um aumento da produtividade
científica; o incremento da mobilidade de alunos, professores e investigadores;
e o alargamento da internacionalização das universidades portuguesas para além
da Europa.
Por tudo isso, Teresa Patrício conclui que “o
balanço é claramente positivo”.
***
Sobre este facto, convém referir, segundo o
que nos foi dado ler, que aquele estabelecimento de parcerias não constituiu um
enorme desperdício, como alguns afirmavam no primeiro consulado de Sócrates, de
quem hoje se diz as últimas, enquanto se dizem maravilhas do seu ministro da
tutela. Também não constituiu uma ação inovadora, porquanto já havia vários
mecanismos de internacionalização das universidades e de mobilidade dos
estudantes. No entanto, configurou outro momento de internacionalização das
universidades e empresas portuguesas, com os resultados indicados, embora com
as limitações que os acompanharam.
Quanto à ligação da investigação científica à
economia, há que dizer que, se essa esperança foi depositada em demasia, era
expectável que os resultados não seriam visíveis em tão pouco tempo. Todos
sabemos que a educação e o ensino são o motor fundamental do desenvolvimento e
da valorização da dignidade da pessoa humana. No entanto, também sabemos que os
seus efeitos na transformação das mentalidades, na expressão de atitudes e
comportamentos que significam e veiculam valores e na mudança das estruturas
sociais e económicas se sentem a longo prazo. Também sabemos que muitos
projetos de investigação científica só dão resultados palpáveis depois de
passados muitos anos de trabalho, testagem e consolidação.
Dizem que as revoluções operam enormes
transformações políticas e induzem grandes mudanças socioeconómicas. Todavia,
muitos dos esquemas mentais sobrevivem no período pós-revolucionário e mesmo,
passados anos, da revolução já pouco resta, porque o que vence é a acomodação.
Por fim, duvido de que seja inteiramente
sensato esperar da inter-relação empresas-universidades um efeito económico
relevante. Penso que esse não deve ser o objetivo dessa interação. As empresas
podem servir para validar na prática alguns dos conhecimentos produzidos e manifestados
nas universidades e induzir o aumento da produção de conhecimento por parte
destas. Porém, esta vertente pode até acarretar custos de produção, cuja compensação
as empresas poderiam e deveriam dispensar às universidades no quadro da sua
dimensão cultural e social.
É certo que que a Universidade deve haurir do
tecido empresarial e da malha social todo o tipo de conhecimento que estes lhe
possam fornecer; também é certo que a Universidade pode e deve prestar serviços
relevantes ao mundo empresarial e prestar-lhes a informação científica de que
dispõe – na linha de que o saber não se esconde e na do contributo para o progresso
técnico e tecnológico –, mas não deverá concorrer indevidamente com outros fornecedores
de bens e outros prestadores de serviços ao mundo empresarial.
Por seu turno, as empresas devem interagir com
a Universidade e apoiá-la, na observância do princípio da função social e
cultural da empresa e não por mero capricho mecenatista.
À Universidade e aos outros centros de
investigação cabe a procura do conhecimento, a produção do conhecimento e a
ministração e a divulgação do conhecimento; e à empresa cabe maximizar e
otimizar a produção e a transformação e promover a circulação de bens, de modo
que o máximo de beneficiários usufrua dos bens e serviços disponíveis. Por
isso, a empresa que apoia a Universidade, não deverá interferir nos mecanismos
da concretização da missão da Universidade e na direção executiva desta, como
não pode nem deve a Universidade passar a dirigir a empresa ou o organismo
social com que interage.
E, já agora, o Governo, em vez de solicitar a
prestação extremamente dispendiosa de serviços a gabinetes privados (de juristas, economistas, engenheiros,
arquitetos, gestores…), deveria solicitar preferencialmente a
colaboração das universidades e institutos, renunciando ao emagrecimento atroz
do financiamento a estas instituições públicas.
A política é feita de opções, não?!
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