O Índice da Transparência
Internacional (CPI,
na sigla inglesa), criado em 1995 e cuja metodologia foi
revista em 2012, coloca, em 2024, Portugal na 43.ª posição entre os 180 países
avaliados, nove lugares abaixo da 34.ª posição de 2023, com 57 pontos numa
escala de zero a 100, em que zero significa Estado altamente corrupto e 100 significa
elevada integridade do Estado, no combate à corrupção. O país tem, assim, o pior
resultado de sempre e um dos piores resultados da Europa Ocidental, num contexto
de declínio desde 2015.
O CPI é uma referência na análise do fenómeno da corrupção,
a partir da perceção de especialistas e executivos de negócios sobre os níveis
de corrupção no setor público. É um índice anual composto, isto é, resulta da combinação de várias
fontes de análise de corrupção desenvolvidas por outras organizações
independentes, e classifica de zero (percecionado como muito corrupto) a 100 (muito
transparente) 180 países e outros níveis de território.
Em 2012, a Transparência
Internacional (TI) reviu a metodologia usada para construir o índice, de forma
a permitir a comparação das pontuações de um ano para o seguinte.
No CPI 2024, Portugal, que
é avaliado no conjunto dos países da Europa Ocidental e da União Europeia (UE),
obteve 57 pontos, fixando-se na 43.ª posição em 180 países, posição que partilha
com o Botswana e com o Ruanda, mas ficando mais bem colocado do que alguns parceiros europeus, como a Espanha
e a Itália.
Portugal obteve 64 pontos, em
2015 e em 2018; 61, em 2020 e em 2023; 62, em 2013, em 2016, em 2019, em 2021 e
em 2022; 63, em 2012, em 2014 e em 2017.
O seu desempenho regista uma queda de quatro pontos,
em relação a 2023, e a perda de nove posições no ranking global. Este é o pior resultado desde 2012 e
reflete um declínio contínuo desde 2015, um declínio impulsionado pela
deterioração das avaliações de várias fontes utilizadas no cálculo do CPI e,
particularmente, pela perceção de abuso de cargos públicos para benefícios privados
e por fragilidades nos mecanismos de integridade pública, para evitar esse
abuso.
Portugal ficou ainda abaixo da média da UE, no
atinente à perceção da integridade no setor público. Escândalos recentes, como
a “Operação Influencer”, são apontados como um dos fatores que contribuíram
para o aumento da perceção de corrupção, na ligação entre política e negócios.
Entre os principais fatores identificados para o
declínio no país, sobressaem: a avaliação negativa da eficácia do combate à corrupção e do
funcionamento das instituições públicas, configurando problemas de aplicação da
lei; as fragilidades na implementação de política anticorrupção e na supervisão
do setor público, incluindo lacunas na prevenção de conflitos de interesse e na
declaração de bens por políticos; e a avaliação negativa, devido a nepotismo, a
favoritismo político e a financiamento partidário pouco transparente.
A queda de Portugal no CPI reflete fragilidades
persistentes na luta contra a corrupção e na transparência das instituições
públicas. Apesar da criação de novos mecanismos legais, a perceção
internacional aponta que a implementação e a fiscalização continuam aquém do
necessário. Há falhas reconhecidas na implementação da estratégia anticorrupção
pelo governo, bem como falta de recursos para o monitorizar. Portugal tem, pois, o desafio de mostrar
progressos concretos na implementação de reformas, para evitar que a sua
posição continue a deteriorar-se nos próximos anos e para recuperar a confiança
internacional na integridade do setor público.
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A
Transparência Internacional Portugal (Transparência e Integridade, Associação
Cívica) é a representante portuguesa da TI, coligação global anticorrupção presente
em mais de 100 países, que se dedica à investigação, à advocacia e à sensibilização
sobre as causas e sobre as consequências da corrupção e da má governação.
Segundo a Transparência Internacional Portugal (TI Portugal), entre os
fatores que contribuíram para a degradação da posição de Portugal conta-se a
avaliação negativa da eficácia do país no combate à corrupção, no funcionamento
de instituições públicas e na aplicação da lei. Outros fatores são a frágil aplicação da lei anticorrupção, a frágil supervisão
do setor público, “incluindo lacunas na prevenção de conflitos de interesse e
na declaração de bens por políticos”, e situações de nepotismo, de favoritismo
político e de falta de transparência no financiamento partidário.
A TI Portugal
aponta ainda a classificação “abaixo da média europeia”, no respeitante à
perceção de corrupção no setor público, e refere “escândalos recentes”, para
justificar “o aumento da perceção de corrupção nas ligações entre política e
negócios”. Além disso, assinala “fragilidades persistentes na luta contra a
corrupção” e adverte que, apesar de novos mecanismos legais, “a perceção
internacional indica que a implementação e fiscalização continuam aquém do
necessário”. “Há falhas reconhecidas na
implementação da estratégia anticorrupção do governo, bem como falta de
recursos para monitorizar o executivo. Portugal tem agora o desafio de
demonstrar progressos concretos na implementação de reformas, para evitar que a
sua posição continue a deteriorar-se nos próximos anos e para recuperar a
confiança internacional na integridade do seu setor público”, lê-se no
comunicado da TI Portugal.
Para Margarida
Mano, presidente da representação portuguesa da TI, os resultados do
CPI 2024 “servem de alerta para o dano reputacional que Portugal está a sofrer,
por não ter uma ação eficaz na luta contra a corrupção”; o resultado em causa “deve-se,
em primeiro lugar, a uma componente cumulativa”, ou seja, Portugal tem “problemas
estruturais que não vêm a ser corrigidos, com impacto e com desgaste, ao longo
do tempo, revelando falta de compromisso político e baixa eficácia nas ações
desenvolvidas”; e há circunstâncias conjunturais, como a “Operação Influencer”,
com impacto na perceção da integridade no setor público. Assim, “o caminho para
melhorar a reputação de Portugal no combate à corrupção é só um: assumir o
compromisso efetivo e agir. A TI Portugal esteve, está e estará ao lado dos que
querem efetivamente assumir esse compromisso, sustenta Margarida Mano.
A TI Portugal, sustentando que “falta clareza e compromisso político” na
estratégia anticorrupção, que “carece de metas concretas, convicção e empenho político”,
e que falta celeridade na justiça, apela à aceleração processual, à
simplificação de megaprocessos e ao combate a expedientes dilatórios e à
prescrição por atrasos processuais. Considerando que falta fiscalização, pede ferramentas para maior transparência
e escrutínio no setor público. Entende que falta regulamentar o “lobbying”, uma
medida que está prevista no âmbito da agenda anticorrupção do atual executivo.
E defende que organismos, como a
Entidade para a Transparência e o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC),
devem ter um reforço financeiro e autonomia orçamental que garanta uma atuação “eficaz
e independente”.
“Por fim, o controlo de património e rendimentos dos políticos deve ser
mais rigoroso. Para evitar conflitos de interesse e garantir uma administração
pública íntegra, é essencial fortalecer o regime de impedimentos, aumentar a
transparência nos critérios de seleção para cargos públicos e combater o
fenómeno das ‘portas giratórias’ entre setores políticos e privados”, lê-se no
comunicado da TI Portugal.
***
A nível global, o CPI 2024
revelou uma tendência preocupante de estagnação e de retrocesso, no combate à
corrupção. A média global dos 180 países em causa manteve-se baixa (43), com
mais de dois terços dos países a registarem pontuações abaixo de 50 (numa escala
de zero a 100, onde zero representa um nível extremamente elevado de corrupção
percebida e 100 indica um setor público altamente íntegro). O ranking é liderado pela Dinamarca, que
atingiu a pontuação de 90 pontos, seguida da Finlândia (88) e de Singapura (84)
e da Nova Zelândia (83).
Países
com democracias frágeis ou com regimes autoritários continuam a apresentar as
piores classificações, mostrando a forte correlação entre corrupção, falta de
transparência e ausência de instituições democráticas robustas. Alguns países
do Golfo Pérsico, como o Bahrein, Omã e a Arábia Saudita, registaram melhorias
significativas, nomeadamente, devido à implementação de reformas de governança
e à digitalização de processos públicos.
Com
64 pontos de pontuação média, a Região da Europa Ocidental e da UE continua a
ser a mais bem pontuada no ranking.
Todavia, em 2024, esta região apresenta cerca de um terço dos seus 31 países
com reduções de pontuação iguais ou superiores a três, refletindo generalizada degradação
das pontuações nos países europeus, pelo segundo ano consecutivo, e onde apenas
a Islândia, a Eslovénia, o Luxemburgo e Chipre se destacam pela positiva. Malta
e a Eslováquia, com menos cinco pontos, foram os países da região com maior
degradação na sua pontuação. Portugal é um dos cinco países com quedas de
quatro pontos.
Aponta-se o retrocesso em grandes economias europeias, como a França (-4
pontos), a Alemanha (-3 pontos), a Espanha (-4 pontos) e a Itália (-2 pontos), que
evidenciam falhas nos mecanismos de integridade e aplicação da lei. Salienta-se
a existência de desafios na transparência dos contratos públicos, onde
continuam a surgir casos de favoritismo e de corrupção, em grandes projetos de
infraestrutura. A queda de vários países europeus é também atribuída a desafios
na implementação de medidas anticorrupção e na fiscalização de crimes
financeiros e empresariais.
Em face da forte
sensibilidade do ranking relativo à
pontuação, pela existência de muitos países com pontuações semelhantes, a queda
de quatro pontos na pontuação de países, como Portugal e a Espanha,
traduziram-se em downgrade de nove e
10 posições no ranking,
respetivamente. É de realçar o caso italiano, onde uma perda de dois pontos deu
lugar a um downgrade de 10 posições. A
Espanha e a Itália, com 56 e 54 pontos, respetivamente, continuam a ocupar, no ranking, uma posição pior que Portugal,
46.ª e 52.ª, respetivamente.
***
Face a estes resultados, a TI Portugal salienta as seguintes
áreas de ação prioritária para reforçar a transparência e para recuperar a posição
e credibilidade do país, no contexto internacional da luta contra a corrupção:
1. Fortalecimento da implementação da estratégia nacional
anticorrupção, garantindo com vista à identificação e à correção das falhas que
persistem, bem como à definição de metas objetivas e de métricas claras que
permitam avaliar progressos anuais, até 2030, alinhadas com recomendações
internacionais;
2. Reforço das entidades responsáveis pelo combate à
corrupção, como a Entidade para a Transparência e o MENAC, com recursos
financeiros e autonomia orçamental adequados, permitindo-lhes atuar, de forma
eficaz e independente, no cumprimento da sua missão;
3. Aprovação de legislação para o lobbying, segundo as melhores práticas internacionais, criação de
um Registo de Transparência da Representação de Interesses e obrigatoriedade de
publicação de pedidos de escusa por parte de membros do governo, devido a
conflitos de interesse;
4. Reforço urgente, no setor judicial, da eficácia da
aplicação da lei no combate, à corrupção, pela adoção de novo quadro legal e
operacional que permita acelerar investigações e julgamentos de crimes
económico-financeiros, eliminando a complexidade dos megaprocessos, combatendo
expedientes dilatórios e reduzindo o risco de prescrição por atrasos
processuais;
5. Consecução de melhorias significativas em transparência
na administração pública, pelo desenvolvimento de ferramentas digitais acessíveis
à sociedade civil, permitindo um escrutínio independente e informado do
funcionamento das instituições públicas e promovendo uma cultura de
responsabilização; e
6. Maior rigor no controlo de património e de rendimentos
dos políticos, para evitar conflitos de interesse e para garantir uma
administração pública íntegra, o que implica fortalecer o regime de
impedimentos, aumentar a transparência nos critérios de seleção para cargos
públicos e combater o fenómeno das portas giratórias entre setores políticos e
privados.
***
A corrupção é flagelo que eiva a política e a administração
pública, com a cumplicidade generosa ou interesseira dos setores privado e
social. Impressiona a corrida a cargos públicos, nem sempre bem pagos. Porém,
se falássemos do setor privado e do social, o compadrio e a endogamia não
seriam em menor escala. Enfim, a cultura da corrupção é factual e o pior é que
não é preocupação habitual das pessoas, como referiu António Costa, quando chefiava
o governo.
2025.02.11 –
Louro de Carvalho
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