Os arqueólogos fizeram uma grande descoberta sob um edifício de escritórios,
em Londres, no n.º 85 da Gracechurch Street: nada mais, nada menos do que os restos
da primeira basílica romana da cidade, o que foi descrito como um dos achados
arqueológicos mais significativos dos últimos anos, na capital britânica.
A este respeito Theo Farrant, em texto publicado pela Euronews, a 14 de fevereiro, sustenta que, “datada de há cerca de
2000 anos, do final dos anos 70 ou do início dos anos 80 d.C., a basílica fazia
parte do fórum romano, o centro administrativo e social de Londinium”.
“Londinium” é o nome latino de Londres. Aliás, como em todas as regiões
abrangidas pelo império romano, também nas Ilhas Britânicas se falava o Latim,
se construíam infraestruturas à maneira de Roma e se introduziam, paulatinamente,
as leis e os procedimentos romanos.
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É de clarificar que a basílica romana não tem a ver com o significado que
assumiu no cristianismo.
O termo “basílica”, em Latim, “basilica”,
resulta de dois elementos gregos: “basileús”, que significa “rei”, e o
sufixo adjetivo feminino -ikê. A expressão grega completa é “basilikê oikía”, que se traduz como “salão
real”. Era um lugar onde o rei (ou seus representantes) concedia audiências
públicas, ministrava justiça e servia como um local para assembleias públicas.
O conceito está relacionado com a “stoá” grega, espaço público coberto
projetado para abrigar várias atividades das intempéries. Com o tempo, a “stoá” adquiriu
uma função mais especializada, como a “stoá basileia”, em Atenas, que
servia como sede do arconte-rei. Essas estruturas tinham, normalmente, uma
entrada fechada, na parte de trás, por uma parede sólida e aberta para o espaço
público (a “agorá”) na frente, apresentando um pórtico com
colunata.
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Continuando com Theo Farrant, diremos que “os vestígios escavados em
Londres consistem nas fundações, em calcário de Kentish (Kent), de uma enorme
basílica romana de dois andares, onde os [altos] funcionários teriam tomado
decisões políticas e jurídicas importantes”. “O significado deste local é que a
basílica romana era, realmente, o centro comercial, social e económico de
Londres”, explicou Andrew Henderson-Schwartz, responsável pelo impacto público
do Museu de Arqueologia de Londres (MOLA), em conversa com a Euronews Culture.
Era ali que se tomavam as grandes decisões e se faziam os grandes negócios,
se resolviam litígios sob um magistrado, se discutia o tipo de decisões que
podiam afetar as mudanças que aconteciam em Londres e na Bretanha romana.
O que foi descoberto, até agora, são as fundações surpreendentemente
intactas de um edifício de dois andares, quase do tamanho de uma piscina
olímpica. Construída entre 78 e 84 d.C., a estrutura foi erguida, apenas
algumas décadas depois de as tropas romanas terem invadido a Grã-Bretanha e
cerca de 20 anos após a destruição de Londinium pelas forças da rainha
guerreira celta Boudicca ou Boadiceia, que liderou os Icenos, juntamente com
outra tribos, como trinovantes, num levantamento, nos anos 60 ou 61, contra as
forças romanas do imperador Nero.
Além das muralhas, as escavações revelaram vários artefactos, incluindo uma
telha com a marca de um funcionário da antiga cidade.
O promotor, Hertshten Properties, que é proprietário do local e tem autorização
de planeamento para nova torre de escritórios, comprometeu-se a incorporar os
vestígios antigos no projeto do edifício e a apresentá-los num centro público
para visitantes. Tal exposição deverá ter chão de vidro, permitindo aos
visitantes ver as paredes da basílica por baixo, e incluirá espaço para bancas
de comida e para mercados. “Penso que é importante preservar o passado.
Obviamente, Londres é uma cidade em rápido desenvolvimento, e é ótimo que
estejamos a crescer tão rapidamente com tanto desenvolvimento a acontecer. Mas
ter estas ligações tangíveis ao passado ajuda-nos a lembrar de onde viemos e
dá-nos a sensação de ligação aos que vieram antes de nós”, considera
Henderson-Schwartz.
Com mais escavações no horizonte, a equipa arqueológica espera responder a
várias questões, como a razão pela qual o fórum original só foi utilizado,
durante 20 anos, antes de ser substituído por um muito maior, que serviu a
cidade até ao colapso do domínio romano, três séculos depois.
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No mesmo dia 14 de fevereiro, a BBC News, pela pena de Rebecca Morelle e Alison
Francis, sob o título “O
tesouro de dois mil anos escavado no porão de escritório em Londres” refere que
“uma descoberta sob o porão [cave] de um prédio comercial foi
descrita como uma das peças mais importantes da História romana
encontrada na cidade de Londres” e, mostrando a imagem de um trecho de alvenaria
romana sob o piso, em betão, do escritório, considera que “os arqueólogos
encontraram uma parte significativa da primeira basílica da cidade antiga, um
edifício público de dois mil anos, onde importantes decisões políticas, económicas
e administrativas eram tomadas”.
Até agora, a escavação revelou trechos do muro de pedra que formava a base
da basílica, que teria dois andares e meio de altura. O sítio arqueológico, que será aberto ao público,
em devido tempo, faz luz sobre os primórdios da cidade. “Isso é tão significativo – é o coração
da Londres romana”, diz Sophie Jackson, do Mola, que revelou a nova descoberta
com exclusividade à BBC News,
vincando: “Este edifício dir-nos-á muito sobre as origens de Londres, por que Londres
cresceu e por que foi escolhida como a capital da
Grã-Bretanha. É simplesmente incrível.”
O sítio arqueológico foi descoberto no número 85 da Gracechurch Street, um
prédio comercial que está prestes a ser demolido e reconstruído. Investigações
arqueológicas anteriores haviam revelado a localização aproximada da antiga
basílica. Então a equipa criou vários pequenos poços de teste, para ver o que
estava escondido sob o piso de betão. Na
terceira tentativa, ao cavar entre os armários de arquivos do escritório, os arqueólogos
tiveram sorte. “É possível ver um grande
pedaço de alvenaria romana, e é incrível que tenha sobrevivido tão bem. Estamos
absolutamente radiantes com o facto de haver tanto disso aqui”, diz Jackson.
O muro é feito de um tipo de pedra calcária de Kent, condado do Sudeste da
Inglaterra, e formava uma construção imponente. A basílica teria cerca de 40
metros de comprimento, 20 metros de largura e 12 metros de altura.
Segundo a BBC News, também foram
encontrados outros artefactos, incluindo uma telha impressa com o carimbo de
uma autoridade da cidade antiga, tal como referiu Theo Farrant.
Diz a BBC News que a basílica
fazia parte do fórum de Londres, um centro social e comercial “com um pátio do tamanho
de um campo de futebol”. E especifica: “A basílica é a prefeitura e, em frente
a ela, havia uma grande praça de mercado aberta com vários comércios e
escritórios na parte externa.”
Sophie Jackson, em tom coloquial, como se estivéssemos ali, naquele tempo,
explica: “É o lugar onde você vinha fazer negócios, resolver o seu processo no
tribunal, onde as leis eram feitas e onde as decisões eram tomadas sobre
Londres, mas também sobre o resto do país.”
Sophie Jackson, considerando que a basílica foi edificada por volta de 80
d.C., apenas algumas décadas depois de os romanos terem invadido a Grã-Bretanha
e fundado Londinium (nome romano da cidade), sustenta que a primeira basílica e
o fórum foram usados apenas durante aproximadamente 20 anos, por terem sido
foram substituídos por um segundo fórum muito maior, refletindo a rapidez com
que a cidade crescia em tamanho e em importância.
A descoberta implicou a mudança nos planos dos proprietários do edifício, a
Hertshten Properties. As ruínas romanas, que vão ser totalmente escavadas, serão
incorporadas nos novos escritórios – o projeto está pendente de aprovação – e
abertas ao público. E, para os arquitetos,
redesenhar um edifício em torno de um sítio arqueológico comporta alguns desafios
técnicos.
“O projeto foi amplamente adaptado”, apontou James Taylor, do escritório de
arquitetura Woods Bagot, explicando: “Coisas simples, como as colunas, tiveram de, literalmente,
mudar de posição, para que não se destruíssem todas essas pedras especiais que
encontramos no solo.”
Também, para não interferir no que está lá, serão instalados menos
elevadores, o que significa que a equipa teve de reduzir a altura do edifício.
Porem, no dizer de James Taylor, o esforço vai valer a pena. “Ver as pessoas, realmente, a usar e a aproveitar o
espaço, passando pelo salão público e descendo para ver as ruínas, vai ser
absolutamente incrível”, discorreu.
Este é o mais recente pedaço da História romana a ser descoberto sob as
ruas do centro financeiro de Londres. E há um esforço cada vez maior para
encontrar maneiras inovadoras de mostrar esses locais ao público, tal como
sucede com partes
de um anfiteatro que estão em exibição sob um piso de vidro na Guildhall Art
Gallery e, nos escritórios da Bloomberg, onde as pessoas podem visitar o Templo
de Mitra, que ganhou vida com uma instalação imersiva de som e de luz.
Christopher Hayward, da City of London Corporation, diz querer ver mais
pessoas a vivenciar a conexão entre o passado e o presente. “O facto de que a Londres
romana está sob os seus pés é, francamente, uma emoção extraordinária de se
vivenciar”, relevou, discorrendo em tom coloquial: “Você pode, realmente, ver e
visualizar como a Londres romana teria sido naquela época. E, então, pode sair
e dizer: ‘Agora, olhe para os arranha-céus, agora olhe para os prédios
comerciais’, isso é progresso, mas, ao mesmo tempo, progresso combinado com
preservação.”
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Sobre o tema, também será de relevar o que diz a Artnet News.
Os arqueólogos encontraram os vestígios da
primeira basílica da cidade sob a cave de um edifício de escritórios que será
demolido. Trata-se de “o coração pulsante da Londres romana”, uma das descobertas
mais importantes da História romana da cidade.
Acredita-se que o fórum que alberga a basílica se
localizava num ponto alto da cidade, para enfatizar o poder e a autoridade do
governo. Com o tamanho de um campo de futebol, servia de local para
administração e comércio e albergava um pátio para atividades comunitárias.
Pesquisas anteriores tinham determinado uma
localização aproximada para a antiga basílica, embora os arqueólogos não
tivessem a certeza de quanto sobrevivido do edifício. Começaram a cavar poços
de teste e tiveram sorte, à terceira tentativa, depois de escavarem entre uma
secção de arquivos. Até agora, escavaram secções do muro de calcário que
formava a base da basílica de dois andares. “Pode ver-se um grande
pedaço de alvenaria romana, e é incrível que sobreviva tão bem. Estamos
absolutamente emocionados por haver tanto disto aqui”, disse Sophie Jackson.
De acordo com o MOLA, acredita-se que as fundações
do edifício se encontram numa área da basílica conhecida como Tribunal, onde os
líderes políticos tomavam decisões sobre o governo de Londinium numa plataforma
elevada. Além da base do edifício, a equipa desenterrou artefactos, incluindo
uma telha com o carimbo de um antigo oficial impresso. “Esta é uma das
descobertas mais significativas feitas na cidade nos últimos anos”, disse
Jackson, em comunicado, explicando: “É como descobrir o lugar do presidente da
Câmara e a câmara da Câmara dos Comuns, dois mil anos, no futuro. Os níveis de
preservação da Basílica superaram, largamente, as nossas expectativas, e temos
possivelmente a parte mais importante do edifício.”
Apesar da sua importância como centro social e
comercial, a basílica e o fórum de que fazia parte foram utilizados só durante
20 anos. Foram logo substituídos por um fórum com cerca de cinco vezes o
tamanho do original, que foi concluído em 120 d.C., quando o primeiro foi
demolido.
“A revelação da primeira basílica romana de
Londres contribui para a paisagem histórica diversificada e rica de Londres”,
disse Chris Hayward, em comunicado, frisando:
“A basílica ajuda a unir os marcos arqueológicos existentes na cidade,
mostrando como a nossa cidade foi moldada, e continua a ser moldada, pela nossa
história única.”
Com a descoberta, a Hertshten Properties,
proprietária do edifício de escritórios que se ergue sobre o local da
escavação, e o gabinete de arquitetura Woods Bagot estão a atualizar os seus
planos para o local. Em parceria com o Museu de Londres, a nova proposta
pretende incorporar as ruínas da basílica num espaço expositivo para oferecer
ao público um vislumbre da Londres romana primitiva. “A Basílica Romana
será incorporada como uma experiência pública de classe mundial, através de
atualizações no design proposto do
empreendimento, mesmo na sua localização original”, disse Ron Hertshten, CEO da
Hertshten Properties, em comunicado, vincando: “Com a expertise [mestria,
competência, Know-how] do MOLA, do Museu de Londres e do Woods Bagot, o espaço
expositivo será a única exibição pública do primeiro Fórum Romano.”
O pedido atualizado será enviado na primavera. Se
as autoridades o aprovarem, novas escavações no local revelarão mais completamente
a estrutura, dando mais informações aos investigadores sobre os interiores e sobre
a construção. “É emocionante”, observou Sophie Jackson, “que apenas
arranhemos a superfície do potencial deste local, através das nossas
investigações iniciais”.
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É um bom exemplo do diálogo construtivo que deve
existir entre as autoridades, os arqueólogos (e outros investigadores), os
arquitetos (e engenheiros) e os promotores imobiliários ou outros. O património
histórico não deve impedir o progresso, nem este deve impedir a preservação do
passado relevante – em prol de um devir consolidado e solidário.
2025.02.23 – Louro de Carvalho
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