Trata-se de uma doença rara, causada pelo vírus da varíola símia, que é
estruturalmente conexo com o vírus da varíola e causa doença semelhante, mas,
regra geral, mais leve.
Em razão da vacinação mundial, não ocorreu nenhum caso de varíola no mundo
desde 1977, pelo que a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou, em 1980,
a descontinuação da vacinação rotineira contra varíola, a qual já tinha cessado
nos EUA, em 1972. E, como os seres humanos são os únicos hospedeiros naturais
do vírus de varíola e este não pode sobreviver, no meio ambiente, mais que
dois dias, a OMS declarou erradicada a infeção natural.
Há, pelo menos,
duas cepas do vírus da varíola: a varíola major
(varíola clássica), a mais virulenta; e a varíola minor (alastrim), a menos virulenta.
A varíola,
altamente contagiosa, é transmitida de pessoa para pessoa, sobretudo, por
inalação de gotículas respiratórias ou, de forma menos eficiente, por contato
direto. E também podem transmitir a infeção vestuários ou roupas de cama
contaminados. A infeção é muito contagiosa nos primeiros 7 a 10 dias após o
aparecimento do exantema. Assim que se formam crostas nas lesões de pele, a
contagiosidade declina. A taxa de ataque é tão alta que 85% em pessoas não
vacinadas e casos secundários podem atingir de 4 a 10 pessoas para cada caso
primário. Entretanto, a infeção tende a disseminar-se de forma lenta e,
principalmente, entre contactos íntimos. O vírus invade a mucosa orofaríngea ou
respiratória e multiplica-se nos linfonodos regionais, causando subsequente
viremia. Localiza-se eventualmente em pequenos vasos sanguíneos da derme e na
mucosa orofaríngea. Porém, outros órgãos estão clinicamente envolvidos, de
forma rara, exceto ocasionalmente o sistema nervoso central, com encefalite.
Podem ocorrer infeções secundárias da pele, pulmões e ossos.
Agora,
está a alastrar pela Europa e pelo mundo a varíola do
macaco ou varíola símia, que pertence, aliás como a varíola, ao grupo dos ortopoxvírus.
Contudo, apesar da designação, os primatas não humanos não são reservatórios
destes vírus. E, embora o reservatório seja desconhecido, os principais
candidatos são pequenos roedores das florestas tropicais da África,
nomeadamente da África Ocidental e da África Central.
Esta doença ocorre
em humanos esporadicamente na África e em epidemias ocasionais. A maioria dos
casos foi notificada na República Democrática do Congo. Em 2003, ocorreu, nos
EUA, uma epidemia desta varíola, quando roedores infestados, importados da
África como animais de estimação, disseminaram o vírus para cães de estimação
que infetaram pessoas no Meio Oeste, dando origem a uma epidemia que teve 35
casos confirmados, 13 prováveis e 22 suspeitos em 6 estados, mas sem haver
mortes. Desde 2016, foram notificados casos confirmados na Serra Leoa, na
Libéria, na República Centro-Africana, na República do Congo e na Nigéria,
tendo esta sofrido o maior surto recente. Crê-se que o aumento recente de 20
vezes na incidência decorra da interrupção da vacinação contra a varíola em
1980; as pessoas que receberam a vacina contra a varíola, mesmo mais de 25 anos
antes, têm menor risco de varíola símia. Na África também estão a aumentar os
casos pelo facto de as pessoas estarem a invadir cada vez mais os habitats dos
animais que portadores do vírus. Entre os seus sintomas, contam-se as erupções
cutâneas, a febre alta, as dores musculares e as glândulas inchadas.
É transmitida
por contacto próximo, mas não necessariamente através de relações sexuais: é, provavelmente, transmitida de animais através de secreções fisiológicas,
como gotículas de saliva ou respiratórias ou contacto com exsudato de feridas.
A transmissão de um indivíduo para outro parece ocorrer principalmente por meio
de grandes gotículas respiratórias via contacto direto e pessoal prolongado. A
taxa geral de ataque secundário depois do contacto com uma fonte humana
conhecida é de 3%; foram relatadas taxas de ataque de até 50% em pessoas que
vivem com uma pessoa infetada pela varíola símia; e foi documentada transmissão
em ambientes hospitalares.
A maioria
dos pacientes são crianças. Na África, a taxa de casos fatais varia entre 4 e
22%.
Clinicamente,
a varíola símia é semelhante à varíola, mas as lesões cutâneas ocorrem com mais
frequência em surtos e a linfadenopatia ocorre na varíola símia, não na varíola
humana. E pode ocorrer infeção bacteriana secundária da pele e dos pulmões. Pode
não será fácil diferenciar clinicamente varíola do macaco, varíola e varicela
(herpesvírus, não vírus pox). O diagnóstico da varíola símia é por cultura, PCR
(polymerase chainreaction), exame imuno-histoquímico ou microscopia eletrónica,
consoante os tipos de testes disponíveis.
Não há
tratamento seguro e comprovado para infeção por vírus da varíola símia. O tratamento
é de suporte. E os fármacos potencialmente úteis incluem o fármaco
antiviral tecovirimat, aprovado pela US Food and Drug Administration
(FDA), para o tratamento da varíola, e o fármaco antiviral cidofovir ou
brincidofovir (CMX001). Todos esses fármacos têm atividade contra a varíola
símia in vitro e em modelos
experimentais. Mas nenhum deles foi estudado ou utilizado em áreas endémicas
para tratar a varíola do macaco.
Porém, foi
autorizada pela FDA, em 2019, a nova vacina contra varíola JYNNEOS, para a
prevenção tanto da varíola símia como da varíola, com base em dados sobre
imunogenicidade e eficácia obtidos de estudos com animais. O Advisory Committee
on Immunization Practices (ACIP) está a avaliar a JYNNEOS, que não está
disponível ao público, para a proteção daqueles que estão em risco de exposição
ocupacional ao ortopoxvírus.
Dados
prévios da África sugerem que tal vacina tem, pelo menos, 85% de eficácia
na prevenção da varíola símia, pois o vírus desta doença está intimamente
relacionado com o vírus que a causa.
***
Subiu
para cerca de uma centena o número de casos de infeção humana por vírus
Monkeypox em Portugal, como indicou a Direção-Geral da Saúde (DGS) no dia 27 de
maio, sendo Portugal o país que regista mais casos por milhão de residentes. A
maioria das infeções foram reportadas, até ao momento, em Lisboa e Vale do
Tejo, mas também há registo de casos nas regiões Norte e no Algarve. “Todas as infeções
confirmadas são em homens entre os 23 e os 61 anos, tendo a maioria menos de 40
anos”, lê-se
no comunicado da DGS, indicando que os novos casos foram confirmados pelo
Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA). E os britânicos
aconselham infetados com monkeypox a
evitar o contacto com animais de estimação. Não obstante, os epidemiologistas
pensam que é cedo, para se falar de epidemia e creem poder parar a transmissão fora dos países endémicos. E a OMS aponta que a varíola
símia pode ser a “ponta do icebergue”.
A
DGS refere que “os casos identificados se mantêm em
acompanhamento clínico, encontrando-se estáveis” e que a “informação recolhida através
dos inquéritos epidemiológicos está a ser analisada para contribuir para a
avaliação do surto a nível nacional e internacional”. Por outro lado, estuda a
necessidade de administrar a vacina a contactos de casos confirmados e a
profissionais de saúde e recomenda que as pessoas com “erupção cutânea, lesões
ulcerativas, gânglios palpáveis, eventualmente acompanhados de febre, arrepios,
dores de cabeça, dores musculares e cansaço, devem procurar aconselhamento
clínico”. Assim, “ao
dirigirem-se a uma unidade de saúde, deverão cobrir as lesões cutâneas”. Perante
os sintomas de suspeitas, devem ser reforçadas as medidas a implementar, como
evitar o “contacto físico direto com outras pessoas e a partilha de vestuário,
toalhas, lençóis e objetos pessoais, enquanto estiverem presentes as lesões
cutâneas, em qualquer estádio, ou outros sintomas. No seu relatório de 26 de maio, a
DGS fez saber que que Portugal está a diligenciar no sentido de “construir uma
reserva nacional de vacinas, através do mecanismo europeu”. E adiantou que, no
contexto deste surto “está a ser estudada”, por especialistas da Comissão
Técnica de Vacinação da DGS, “a eventual necessidade de administrar a vacina a
contactos de casos confirmados e a profissionais de saúde”.
Como foi dito,
a varíola dos macacos espalha-se
pelo mundo. E, em França, a
ministra da Saúde reuniu-se de emergência com cientistas de uma unidade de
investigação biológica no Instituto
Pasteur para discutir os sete casos confirmados no país. Porém, a
governante gaulesa considera:
“Esta doença é, maioritariamente,
benigna, e que as pessoas estão isoladas em casa, para prevenção. (...) Por
isso, é recomendado, de facto, que se fique em isolamento quando se está
afetado, mas é uma doença que em duas ou três semanas se desvanece.”.
E a OMS
avisou que é impossível “parar” a transmissão da doença entre as pessoas. No
entanto, serenou os ânimos, afirmando que esta doença é uma prima menos
perigosa da varíola que foi erradicada há cerca de 40 anos, e é endémica em 11
países da África Ocidental e Central.
(Além de vários
órgãos da comunicação social, foi tido em conta o teor do Manual MSD, Versão para Profissionais de Saúde, e Manual MSD, Versão Saúde para a Família).
***
Enfim,
SARS-CoV-2, gripe A, guerra na Europa, varíola símia! Não há mal que venha só.
2022.05.30 – Louro de Carvalho
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