O consórcio
internacional Madoquapower 2x formalizará, a 22 de abril, o anúncio do
investimento de 1,3 milhões de euros numa unidade de hidrogénio verde e amónia
verde na Zona Industrial e Logística de Sines, gerida pela AICEP Global
Parques, o que será o primeiro grande investimento no hidrogénio e amónia verdes
em Portugal, uma solução tecnológica que vem facilitar os problemas de
transporte do hidrogénio enquanto combustível usado nos transportes.
É um consórcio formado por três empresas: A Madoqua Renewables, companhia
especializada em desenvolvimento industrial de descarbonização da economia; a
Power 2X, empresa com sede na Holanda que desenvolve projetos de consultoria e
gestão na transição climática; e a CPI (Copenhagen Infrastructure Partners), sociedade que gere um fundo de investimento em
projetos industriais na transição climática e nas energias renováveis.
A reserva do direito de superfície na zona industrial de Sines foi
realizada em março e o projeto, classificado como PIN (Projeto de
Interesse Nacional), dará um contributo significativo para cumprir as ambições do
Plano Nacional do Hidrogénio Verde e para entregar amónia verde a compradores
europeus nas áreas da agricultura e indústria. Segundo informação dos
promotores, o hidrogénio poderá ser usado nas redes existentes e a amónia verde
será transportada por ‘pipeline’ para o Porto de Sines com destino à
exportação.
O projeto não beneficiará de subsidiação pública no âmbito da Estratégia
Nacional do Hidrogénio Verde. No plano, aprovado em 2020, está previsto um “mecanismo de apoio, transparente e concorrencial, à produção de
hidrogénio verde com o objetivo de apoiar a produção de hidrogénio verde no
período 2020-2030 através da atribuição dum apoio que cubra a diferença entre o
preço de produção do hidrogénio verde e o do gás natural no mercado nacional,
que não terá tradução nas tarifas pagas pelos consumidores”. Porém, o
projeto avançará, com ou sem este mecanismo de subsidiação. Parte significativa da amónia verde é para exportação, pelo que
não é elegível para este mecanismo, que se destina a apoiar a indústria e
transportes nacionais no processo de descarbonização. E os leilões
a que o mecanismo se refere têm como destinatário os consumidores finais e não
os produtores, sendo, assim, um mecanismo indireto de apoio aos produtores.
O projeto Madoquapower 2X é um dos mais relevantes já projetados para
Sines. Recorde-se que, em sede de discussão do Programa de Governo, o Ministro
da Economia e do Mar defendeu as virtudes de Sines, sustentando que “Sines pode ser um dos grandes polos de desenvolvimento do país
para o futuro, podemos ter em Sines não uma, mas duas ‘Autoreuropas’ no futuro”
Recentemente, Filipe Costa, presidente do Conselho de Administração da
Aicep Global Parques desde 2018, revelou, em entrevista à “TSF” e ao “Dinheiro Vivo”,
os projetos para Sines, referindo que, “neste momento, excluindo
investimento público, os dados somados de projetos em curso, confirmados e
potenciais – muitos em que ainda concorremos com outras geografias – ascendem a
17 mil milhões de euros”. Falou na duplicação do atual terminal de
contentores e do futuro segundo terminal, em que só na componente privada são
940 milhões. No vertical que referia de tecnologia – o Sines TechInnovationand
Data Centre Hub –, a perspetiva no horizonte 2030, é de 3.555 milhões em
projetos de estações de amarração de cabos marítimos de telecomunicações e
centros de processamento, computação e armazenamento de dados; e, no outro
vertical, ou seja, a Energia Sul, que junta todo o hub energético de Sines com
as indústrias intensivas do ponto de vista energético é de um total de 12.679
milhões, dos quais cerca de 5 mil milhões são reinvestimento de empresas já
presentes, como Galp, EDP Produção e Repsol Polímeros. E há mais 7.500 milhões
de investimentos por novos players que
estão a olhar para Sines para entrar.
***
A AICEP
Global Parques é a empresa do Setor Empresarial do Estado especialista em
gestão de parques empresariais e na prestação de serviços de localização para
investimento nos setores da indústria, energia, logística e serviços
em Portugal. O presidente, na entrevista, além de negar que Sines seja um
elefante branco, classificou-o como grande hub logístico, energético e cada vez
mais tecnológico em Portugal, estando os parceiros do Porto de Sines em
franco crescimento em roll on-roll off e “nós na zona logística a crescer muito
nas empresas instaladas”, muitas das quais a investir fortemente, a acrescentar
investimentos a setores como a energia e indústrias intensivas em energia, a
logística e agora ainda o novo setor das infraestruturas tecnológicas.
A estratégia
passa pelo desenvolvimento dos três verticais de negócios.
O primeiro é
o da logística, acompanhando o Porto de Sines, que está a tornar-se o grande
porto de mercadorias, contando com um terminal de contentores com capacidade de
handling de 2 milhões de contentores por ano, agora em duplicação, que se
concretizará até 2025. Da capacidade de 2,3 milhões de TEU (contentores de 20 pés) passará para 4,1 e pode crescer mais
um pouco com automações e otimizações. Seguir-se-lhe-á um segundo terminal,
cujos termos de concurso já estão aprovados pelo Governo e que será lançado em
breve e irá acrescentar mais 3,5 milhões de contentores por ano. Assim, até
2030 quadruplicará a atual capacidade de movimentação de contentores para perto
de 8 milhões de contentores. A isto acresce, dos parceiros do Porto de Sines,
uma reorientação do terminal de carga a granel sólida – o terminal
multipurpose, que foi desafetado do carvão e que tem nova concessão à procura
de cargas: minérios, agro, equipamentos ou eventualmente roll on-roll off para
automóveis. Na retaguarda destes terminais de mercadorias, está a desenvolver-se
a zona de atividade logística. E lançou-se um concurso para um estudo de
viabilidade económico-financeira, plano de pormenor, de loteamento, projeto de
infraestruturação e avaliação de impacto ambiental. Nesta zona de atividade
logística de Sines, acabou de se lançar um estudo de 2 milhões de euros que
será cofinanciado a 50% pelo Connecting Europe Facility e que se
prevê esteja concluído em 2024.
Questionado se Portugal vai
terminar mesmo com o ciclo do carvão, desenvolveu:
“Isso
é matéria do Porto de Sines, mas o cliente do carvão – a central termoelétrica
da EDP Produção – está na nossa zona industrial e logística e já não há
movimentação de carvão há algum tempo. O terminal está completamente desafetado
e a ideia agora, com nova concessão, é que esse terminal multipurpose, que
sempre foi de carga geral e podia já fazer outras coisas, mas acabava por fazer
95% de carvão, não tendo essa carga, faça outras.”.
E enfatizou a
aposta no desenvolvimento de contactos para que se olhem para este terminal
como um hub para entrada de produtos agro exportados pelo Brasil e outros
países da América do Sul para a Europa, o Médio Oriente e o Norte de
África.
Sobre a questão se os projetos em
curso têm alavancagem orçamental, referiu que, neste momento, excluindo
investimento público, os dados somados de projetos em curso, confirmados e
potenciais ascendem a 17 mil milhões de euros. Tirando uma pequena parte que
são projetos agroindustriais, quase todos os investimentos são da lógica da
descarbonização, de transformação do ativo num green energy hub, de introdução
de produção de combustíveis alternativos, projetos para a mobilidade que não
vai ser eletrificada num futuro próximo e portanto precisará de combustíveis
líquidos – transporte aéreo, marítimo e rodoviário pesado.
Tendo estas áreas de energia
impacto grande no ambiente, está acautelado o passivo ambiental dessas
unidades. Assim, por exemplo, a EDP Produção tem um plano de desativação que acautela todas
as questões ambientais e é um passo de sustentabilidade, porque deixamos de ter
uma central a carvão e passamos a ter um hub de energia verde com produção de
fontes renováveis – eólica, fotovoltaica, eletrólise para o hidrogénio verde e
amónia. Depois, o reinvestimento da Repsol em duas novas fábricas de
polímeros, matérias-base acabadas para a indústria transformadora, está
acompanhado dum projeto de ecofábrica para reciclagem química para produção de
etanol circular, biometanol. Também há espaço para a
aquacultura: está previsto um investimento de 80 milhões para produzir salmão e
bacalhau. Mais uma vez, é um investimento que aproveita algumas
das infraestruturas do complexo. Temos duas de tomada e rejeição de água do mar
– a da central da EDP Produção e a da infraestrutura do terminal de gás natural
– que podem ser partilhadas e são muito atrativas para a aquacultura. E podem
ser encontradas sinergias.
No atinente aos empregos que
Sines poderá representar, diz que no total serão muitos, mas não tantos quanto se esperaria,
dado o montante de investimento em logística, energia, indústria e tecnologia.
São investimentos muito intensivos em capital – grandes unidades de refinação,
petroquímica, química – mas a perspetiva no contexto de menos desemprego, sobretudo
na região, é que haja um exercício de apreciação de salários, uma dinâmica de
diminuição de desemprego e de valorização salarial. Para o presidente da
AICEP, a questão da mão-de-obra não é recorrente em Sines, pois os promotores destes projetos muito
intensivos em capital, de logística, energia, indústria verde e tecnologias de
informação e comunicação, não apresentam essa dificuldade. E, porque são muito
intensivos em capital, estão dispostos a pagar o que for necessário para atrair
o talento de que precisam.
As questões mais levantadas são as do ordenamento
do território, do que se relaciona com licenciamentos, urbanismo, etc., dado o volume
de negócios da AICEP Global Parques, implicando o arrendamento de mais
terrenos para instalação de investimentos estratégicos. Além destas, vem a questão
infraestrutural: os acessos rodo e ferroviários e marítimos na logística, até
pela indústria, e as interligações elétricas. Diz o presidente que as acessibilidades
terrestres existiam já, mas, antes do terminal de contentores e
deste desenvolvimento industrial, resumiam-se ao pipeline de distribuição
multiusos para produtos refinados até Aveiras, e ao gasoduto até Setúbal.
Com o desenvolvimento dum terminal de contentores, a possibilidade dum novo,
uma reorientação do terminal multiusos pós-carvão, desenvolvimento da zona de
atividades logísticas e o complexo industrial, o objetivo é que os novos
produtos feitos em Sines venham abastecer em proximidade, segurança
de fornecimento, preço e qualidade a indústria nacional. Isso implica melhoria
de acessibilidades de e para o complexo de Sines. E aí está a ser feito um
trabalho muito forte pelo Governo, através da IP. Está em curso o investimento
nas acessibilidades calculado em cerca de 480 milhões de euros: por exemplo, 60
milhões para ligar Sines à A2 em autoestrada até 2026, com ligação em Grândola
Norte; 28,5 milhões para reforço da ligação ferroviária entre a linha de Sines
e a do Sul até 2023; e mais 321 milhões no corredor internacional Sul, troço Évora-Elvas,
até fevereiro de 2024. É tudo alinhado com o prazo de conclusão do Terminal XXI
e o lançamento do Vasco da Gama, o desenvolvimento da logística e o início do
output dessas matérias finais com grande relevância no complexo petroquímico,
em particular a entrada em operação das novas fábricas da Repsol Polímeros no
verão de 2025.
Sobre o facto de o concurso do
Terminal Vasco da Gama ter ficado deserto, diz que “isso é do Porto de Sines”, que fez um
excelente trabalho. Mas é inegável que a crise pandémica gerou grande disrupção
logística e adiou decisões de investimento.
Admite que a
guerra veio agravar a disrupção logística e a crise energética, o que apresenta
desafios. Mas também há o reverso: uma dinâmica grande de reforço de capacidade
logística, energética e até tecnológica da UE. E o Governo português, mais
que acompanhado, tem liderado esta dinâmica no Conselho Europeu. Nós
sentimos esse interesse, uma vez que estamos na frente atlântica, no lado
oposto ao conflito. E, quando se fala em diversificação do fornecimento
energético, em trazer mais energia dos EUA, de África, do Médio
Oriente e evitar ou não depender só da que vem por terra ou gasoduto do
Leste, ou quando se fala em aumentar capacidade logística da Europa,
nomeadamente a intercontinental, está a dar-se relevância a Sines, tal como “quando
se fala em soberania europeia, resiliência, capacidade no que respeita à futura
economia digital, na estação de amarração de cabos submarinos de
telecomunicações e de estações de tratamento de dados”. O objetivo ali é ter as
grandes estações de amarração de cabos, os grandes centros de processamento e
armazenamento de dados, as grandes infraestruturas que venham beneficiar de
termos terra disponível, água de uso industrial disponível, acesso a água do
mar, morfologia e jurisdição portuária para amarração segura de cabos,
intensidade energética, capacidade de interligação elétrica em alta e muito
alta tensão.
É um ecossistema da economia de
dados. E vamos ter nesse âmbito o Equiano da Google, o 2 África do
Facebook e o Medusa do operador de Telecom da AFR-IX, que se juntaram ao
cabo de dados de fibra ótica Ella Link, que liga a Europa à América do Sul
(Sines-Brasil) até 2025. Alinhamos Sines com as redes transeuropeias – de
transportes, a de energia e de telecomunicações – e queremos ser esse hub de
estações de amarração de cabos submarinos de telecomunicações e centros de
processamento e armazenamento de dados.
À objeção de que estamos a ir
mais depressa no digital do que no rodoviário, quando o hinterland ibérico
ainda não está ligado, responde que “são questões distintas”. O calendário está bem
afinado porque há uma relação ideal de calendário quando pomos, de um lado, as
ligações ao hinterland, rodo e ferroviárias e, do outro, o desenvolvimento de
terminais da zona de atividades logística e do output industrial de Sines.
O importante é que os cabos amarrem em Portugal e o split seja feito
ali numa estação onde o cabo amarra. Depois, é a lógica de hub. Os grandes
centros de dados querem estar perto dos centros de amarração de
telecomunicações onde é feito o split do cabo, as estações também querem estar
ao pé dos grandes data centres.
Quanto à deficiente ligação rodoviária
de Sines a Beja e à não existência da A26, refere que a IP relançou a ideia da ligação
Sines-A2, não o traçado do IP8 até Beja, mas o do IP33. Portanto, a
ligação Sines-Grândola Norte em autoestrada, investindo 60 milhões até 2026, é
um indicador de que Sines não é um elefante branco. No transporte rodoviário,
há duas preocupações: a de que é necessário esta ligação em autoestrada
para Sines ser mais competitivo; e a adicional de que muito do
trânsito é de pesados, alguns a transportar mercadorias perigosas. Ora, o Governo
e a IP foram muito sensíveis às duas questões, competitividade e segurança, e
não só retomaram o projeto de ligação de Sines à A2 como o retomaram com muito
empenho, força e rapidez.
A AICEP Global também
gere os 56 ha do Parque Empresarial da Península de Setúbal, o BLUEBIZ. Esse parque é
a antiga fábrica da Renault, que tem sobretudo instaladas indústrias de
componentes aeronáuticos, metalurgia de precisão. Há expansão sobretudo na área
das indústrias químicas porque o parque tem vantagens: possibilidade de uso
industrial, fornecimento elétrico favorável e estação de tratamento de águas
residuais que o torna apetecível para as químicas.
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É desta vez
que vamos? E vamos a tempo? Os PIN não estão desacreditados?
2022.04.18 – Louro de Carvalho
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