quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Poderoso e Santo Natal de 2020, que nos dê e faça merecer a salvação

 

Não me incluo no quadro daqueles que pretendem salvar o Natal, que não carece disso, pois nós é que precisamos da salvação temporal da pandemia e da salvação total quando Ele quiser.

Percebo a sua intenção, intenção expressa no âmbito de pandemia que teima em não deixar esta humanidade que se habituara à hipocrisia da conveniente e distante proximidade, pautada pelos mecanismos do consumismo, da exploração e do descarte. Trata-se, antes, duma visão política, quiçá de boa vontade, que julga acudir ao descalabro económico levantando as medidas restritivas que têm sufocado a economia e a saúde dos mais débeis e pensa dar o belo tom da convivência social e da sustentação da convivência social harmoniosa, quando o vírus da indiferença e do egoísmo tem sido mais poderoso e perverso que o SARS CoV-2. Ademais, com o falso pudor de recomendar o distanciamento físico, acaba por sair o tiro pela culatra quando se recomenda o distanciamento social. Bem hajam, mas esse não carece de recomendação: já chega e sobra. O Natal é precisamente para esbater as barreiras sociais que resultam dos caprichos das abissais desigualdades económicas que geram e sustentam pesadas ostracizações políticas sobretudo através dum poder financeiro demolidor escondido nas dobras da capa da inevitabilidade e da viabilização económica.

No meio do afanoso “salve-se quem puder”, ressaltam persistentemente – na linha da frente, na retaguarda, na crista da onda ou ao lado de quem sofre – múltiplos e poderosos fenómenos humanos de entreajuda, generosidade, dedicação, dádiva e entrega da parte de crentes e de não crentes, que descobriram que a vida e a dignidade humanas estão acima de tudo. Esse crescente número de pessoas, grupos e comunidades merece a nossa saudação e o nosso elogio e aplauso, mas precisa sobretudo da nossa cooperação e apoio e da nossa adesão de acordo com as possibilidades de cada um.

Esses e essas não estão a querer salvar o Natal, que não precisa de ser salvo, mas estão a fazer Natal diariamente e a intensificar a sua ação bendizente, benevolente e benfazeja nesta quadra temporal em que a saudade, a solidão e o desamparo se tornam mais evidentes, lutando com mais afinco pela vida e dignidade humanas. Não se trata de contrapor ao vírus da pandemia o vírus do bem. Isso seria afrontar o bem, que não é vírico, pois “vírus” no latim era veneno, peçonha, humor, amargor, mau cheiro…

E os crentes em, com e por Jesus Cristo, o Senhor do Natal, sabem muito bem que o Natal é o primeiro passo de Deus na Terra para a Salvação de que os seres humanos carecem e que terá o seu ápice na Páscoa. Assim, o Natal de Cristo, tornado nosso Natal por dom e dádiva de Deus, que solicitamos, acolhemos e procuramos merecer, não precisa de ser salvo, mas salva e precisa, sim, que o celebremos, vivamos e estendamos a quantos e quantas nos estendem a mão carecida e suplicante. Ora, em vez de salvadores do Natal, teremos de ser discípulos do Natal junto da manjedoura, onde se reclina o menino envolto em panos exposto ternamente à nossa adoração, e apóstolos-missionários do Natal, de modo que a Salvação se apodere de todos os corações, molde todas as comunidades, chegue a toda a parte onde haja seres humanos e gere a ecologia integral. É, pois, necessário o presépio humano da integridade e da totalidade a modelar o presépio cósmico do limitado, mas infindo.

No sentido do Natal genuíno da fraternidade que nos considera a todos da casa, com a utilização frugal do comércio da época na medida do necessário e suficiente para a partilha, o Natal será vida. As medidas de profilaxia impostas ou recomendadas condicionarão o distanciamento físico, mas consolidarão a verdadeira aproximação familiar, esbaterão os fatores e os elementos de distanciamento social e, quanto possível, colocarão Deus e homem no centro das atenções de todos nós que, em vez de nos saudarmos com o acotovelamento, preferimos ter e mostrar ter no coração todos e cada um dos nossos semelhantes.

Nisto e por isto, antes de entrarmos nos dias litúrgicos das antífonas de “O”, desejo um “Santo e Poderoso Natal” para todos os familiares, amigos e amigas, bem como para quantos e quantas tive o ensejo de conhecer ao longo dos tempos! Belo e Santo Natal!

2020.12.16 – Louro de Carvalho

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