Estabelece-o o texto da lei e, para que tal pudesse acontecer,
mais de um
mês após a sua aprovação na Assembleia da República (AR), o
Presidente da República (PR) recebeu o Orçamento do
Estado para 2021 (OE 21) em Belém e decidiu
promulgá-lo no dia 29 de dezembro, o Primeiro-Ministro assinou a referenda no
mesmo dia, a publicação em Diário da República, I Série, ocorrerá no dia 31 e o
diploma entrará em vigor no dia seguinte. Este é o último orçamento que Marcelo Rebelo de Sousa promulga neste
mandato dado que as eleições presidenciais, às quais se recandidata, estão
marcadas para 24 de janeiro.
E, como sucedeu com os quatro orçamentos anteriores que lhe passaram pelas
mãos, o Chefe de Estado promulgou a Lei do Orçamento para 2021 e a que
aprova as Grandes Opções do Plano (GOP) apresentando as
justificações por que o fez e deixando alguns reparos e avisos.
As razões da promulgação prendem-se com a “urgência do combate à pandemia e seus efeitos
comunitários, bem como à adequada receção das ajudas europeias”, ou seja, o
Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), ou seja, em concreto, motivaram a promulgação as medidas de compensação
da perda de rendimentos, sobretudo dos mais sacrificados, e do reforço da
saúde, cuja importância, na opinião do inquilino de Belém, recomenda que entrem
em vigor a 1 de janeiro, para que o Governo possa, desde logo, implementar as
respetivas medidas.
Contudo, Marcelo, reconhecendo as dificuldades encontradas para a viabilização
do OE 21, deixa reparos e avisos atinentes às “limitações” da parte social e o
“renovado não acolhimento de algumas pretensões empresariais”, mas sem
concretizar. É certo que a atenção dada às empresas tem sido um aviso constante
do Presidente ao longo dos últimos anos, bem como o combate à pobreza, designadamente
a atenção aos sem-abrigo. Por outro lado, a nota emitida pela Presidência da
República refere a “existência de soluções de caráter programático, na
fronteira da delimitação de competências administrativas”, no respeitante às
diferentes competências da AR e do Governo. Está, neste último caso, subjacente
o questionamento do PR à aprovação de algumas normas na especialidade por parte
dos deputados como, por exemplo, a avaliação de impacto ambiental ao aeroporto
do Montijo ou a renegociação das SCUTS, cuja competência é do Executivo.
E o PR, reconhecendo, como se disse, as “complexas condições que
rodearam a elaboração do OE 21, salienta a busca do equilíbrio para o controlo
do défice”. Na verdade, o OE 2021 contou com o voto contra do Bloco de
Esquerda, ao contrário dos anteriores, arriscando não passar no Parlamento e
criar uma crise política que era “indesejada”, nas palavras do Presidente
Marcelo Rebelo de Sousa.
É o seguinte o teor da Nota da Presidência da República:
“Presidente da República promulgou Grandes Opções do Plano e Orçamento
do Estado para 2021
“Apesar das limitações a maior ênfase
social, do renovado não acolhimento de algumas pretensões empresariais e da
existência de soluções de caráter programático, na fronteira da delimitação de
competências administrativas, considerando as complexas condições que rodearam
a sua elaboração e a busca do equilíbrio entre o controlo do défice, a adoção
de medidas relevantes em domínios como a saúde e os rendimentos dos mais
sacrificados, e, sobretudo, a óbvia importância de os portugueses disporem de
Orçamento de Estado em 1 de janeiro de 2021, atendendo à urgência do combate à
pandemia e seus efeitos comunitários, bem como à adequada receção das ajudas
europeias, designadamente, do Plano de Recuperação e Resiliência, o Presidente
da República promulgou o diploma da Assembleia da República que aprova o
Orçamento do Estado para 2021.
“O Presidente da República promulgou
igualmente o diploma que aprova as Grandes Opções do Plano para 2021.”
Entretanto, o Primeiro-Ministro publicou uma fotografia no Twitter, escreveu
que assinou, esta terça-feira a “referenda ministerial da Lei que
aprova o OE para 2021” e aduz que “é um Orçamento que combate a pandemia,
protege as pessoas e apoia a economia e o emprego”.
Depois de o PR ter promulgado o OE 2021, apesar das
reservas, o Ministro das Finanças, João Leão, gravou um vídeo a defender o
documento, sustentado que “este é um bom orçamento” e “o orçamento de que Portugal precisa para
conseguir superar esta crise”.
Parecendo responder ao Chefe de Estado no tocante à
limitações, o Ministro enumera as “prioridades” do OE 21, em termos de proteção
do emprego, recuperação económica e combate à pandemia. Enfatiza o reforço do
Serviço Nacional de Saúde (SNS) com mais de 1000 milhões de euros, o aumento do
salário mínimo nacional em 30 euros e a subida extraordinária das pensões em 10
euros para dois milhões de pessoas. E conclui que se trata de medidas que “vão dar um contributo
fundamental para uma forte recuperação da economia” e também “para
a redução do défice e da dívida pública”.
Antecipando um “inverno bastante exigente”, João Leão acredita que o
surgimento das vacinas contra a covid-19 permite “antecipar uma evolução
favorável da pandemia ao longo do próximo ano, o que cria as condições para uma forte recuperação da economia em 2021”,
pois, como sublinha, “já conseguimos ver a
luz ao fundo do túnel, mas ainda o temos de atravessar”.
Além disso, o OE 21 prevê o novo apoio social de até 501 euros incluindo
sócios-gerentes, informais e estagiários e os vários tipos de lay-off pagos a 100% a partir do próximo ano.
Recorde-se que o OE 21 foi aprovado a 26 de novembro
com o voto favorável do PS, a abstenção do PCP, PAN, PEV, Cristina Rodrigues e
Joacine Katar Moreira e o voto conta do PSD, Bloco de Esquerda – que
votou contra um OE pela primeira vez desde 2016 –, CDS, Chega e Iniciativa
Liberal. O número recorde de propostas de alteração (mais de
1.500) dificultou não só o processo de
votação, que decorreu em quatro dias, como a redação final do documento, como ocorrera
no OE 2020, em que houve mais de 1.300 propostas de alteração.
***
É óbvio que é importante o Governo dispor dum orçamento a partir de 1 de janeiro
para poder tomar as medidas nele previstas e mais adequadas a cada tema, circunstância
e setor, embora a gestão dos negócios do Estado em regime de duodécimos não
fosse uma tragédia.
O Presidente poderia ter-se dispensado, até porque é recandidato à eleição presidencial,
de justificar as razões da promulgação. Quanto às referidas limitações, penso
que não adiantaria nada opor-lhe o veto político, pois, daí não resultaria qualquer
mais-valia, quer no atinente à ênfase, quer no atinente às reivindicações empresariais
– teríamos numa eventual reapreciação parlamentar a dita esquerda e a dita direita
a puxar cada uma para o seu lado e, provavelmente, acrescida dificuldade em
reaprovar o diploma. E, no respeitante à “existência de soluções de caráter
programático, na fronteira da delimitação de competências administrativas”, se
tem dúvidas, pode suscitar junto do Tribunal Constitucional a fiscalização
sucessiva de tais normas.
Assim, é de referir que o PR não pode deixar que paire na mente dos cidadãos
a ideia de que o OE 21 pode ter normas inconstitucionais. Por outro lado,
justificando as razões por que promulga um diploma, o que não é necessário,
fica politicamente vinculado a ele. Por isso, querendo ou não, assume responsabilidades
que não lhe competem. E, quanto à interferência em matérias de outros órgãos, é
o escrutínio recíproco legítimo (sem abuso) que está em
causa.
2020.12.30 –
Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário