Neste
dia 19 de dezembro, para
recordar alguns “princípios teológicos, celebrativos e pastorais acerca da
Palavra de Deus proclamada na Missa” (mas válidos também,
para toda a celebração litúrgica: Sacramentos, Sacramentais, Liturgia das Horas), a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos
Sacramentos publicou uma nota, datada do dia 17, sobre o “Domingo da Palavra de Deus”, que Francisco instituiu em 30 de
setembro de 2019 pela Carta apostólica, em forma de Motu proprio “Aperuit illis” como dia dedicado à
celebração, reflexão e propagação da Palavra do Senhor e que é celebrado no 3.º
domingo do Tempo Comum, que, em 2021, ocorrerá a 24 de janeiro.
Com
o predito documento, dividido em
dez pontos, o
Dicastério liderado pelo Cardeal Robert Sarah pretende contribuir para despertar a consciência sobre a
importância da Sagrada Escritura para a vida dos fiéis, sobretudo na Liturgia,
“que leva ao diálogo vivo e permanente com Deus”. E sublinha que o “Domingo da Palavra de Deus” é “uma boa
oportunidade para reler alguns documentos eclesiais”, de modo especial, a
Praenotanda do Ordo Lectionum Missae, com muitas orientações para a
celebração. Por outro lado, considera que deve ser momento privilegiado para a
celebração comunitária das Laudes e das Vésperas, como uma “ocasião propícia
para aprofundar o nexo entre a Sagrada Escritura e a Liturgia das Horas, a
oração dos Salmos e Cânticos do Ofício com as leituras bíblicas”. Nestes termos,
em observações, vem a seguinte transcrição do n.º 140 da Institutio
generalis de Liturgia Horarum:
“A leitura da Sagrada
Escritura, que por tradição se faz publicamente na liturgia, não apenas na
celebração eucarística, mas também no Ofício divino, deve ser tida em máxima estimativa
por todos os cristãos, porque é proposta pela própria Igreja, não segundo os gostos
e inclinações particulares, mas em ordem ao mistério que a Esposa de Cristo “desenvolve
no transcurso do ano […] . Ademais, na celebração litúrgica, a leitura
da Sagrada Escritura sempre vai acompanhada da oração.”.
Na verdade, por meio das leituras bíblicas
proclamadas na Liturgia, Deus fala ao seu povo e o próprio Cristo anuncia o seu
Evangelho, pois Cristo é o centro e a plenitude de toda a Escritura: Antigo
e Novo Testamento. Por isso, a escuta do Evangelho, ponto culminante da
Liturgia da Palavra, é assinalada por veneração particular expressa não
só em gestos e aclamações, como também no próprio livro dos Evangelhos.
Assim, a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos propõe como
“uma das modalidades rituais próprias para este domingo” a procissão de entrada
com o Evangelho ou, na impossibilidade, a sua colocação sobre o altar.
Ao mesmo
tempo, tendo em conta que o dinamismo celebrativo da palavra de Deus não se
esgota nesta efeméride e porque “a proclamação dos textos do Lecionário
constitui um vínculo de unidade entre todos os fiéis que os escutam”, o documento
esclarece que não devem ser substituídas ou suprimidas as leituras bíblicas
dispostas pela Igreja no Lecionário e que devem ser utilizadas as versões da Bíblia
aprovadas para uso litúrgico. E recomenda o canto do Salmo responsorial, como
resposta da Igreja orante com elementos da própria Palavra de Deus, para o que
se deve incrementar o serviço de salmista em cada comunidade.
A respeito
da homilia, convidam-se os Bispos, presbíteros e diáconos a explicarem e
permitirem que “todos compreendam a Sagrada Escritura, tornando-a acessível à
própria comunidade”, desempenhando o seu ministério “com especial dedicação, tirando
partido dos meios propostos pela Igreja”. E destaca-se a importância do
silêncio na ação litúrgica, porque, “ao favorecer a meditação, permite que a
Palavra de Deus seja acolhida interiormente por quem a escuta”.
Em relação
aos que proclamam a Palavra de Deus na assembleia, a nota aponta que se requer
“preparação interior e exterior específica, familiaridade com o texto a
proclamar e prática necessária no modo de proclamá-lo”. A este respeito,
em observação é registada a seguinte transcrição do n.º 8 da Carta Apostólica “Aperuit
illis”, articulada com o n.º 25
da Constituição “Dei Verbum”,
sobre a Revelação Divina, do Concílio Vaticano II:
“É necessário, pois, que todos os clérigos,
sobretudo os sacerdotes de Cristo e os demais que, como os diáconos e
catequistas se dedicam legitimamente ao ministério da Palavra, mergulhem nas
Escrituras com assídua leitura e estudo diligente, para que nenhum deles se
torne um ‘pregador vazio e supérfluo da Palavra de Deus que não a escuta em seu
interior’, uma vez que deve comunicar aos fiéis que lhes foram confiados, sobretudo
na Sagrada Liturgia, as imensas riquezas da divina Palavra. De igual forma,
o sagrado Concílio exorta com veemência todos os cristãos, em particular os
religiosos, a que aprendam ‘o sublime conhecimento de Jesus Cristo’, com a leitura
frequente das divinas Escrituras, visto que o desconhecimento das Escrituras é desconhecimento
de Cristo’ (Fl 3,8).”.
E considera a
nota subscrita por Robert Sarah que é necessário especial cuidado com o ambão,
donde se proclama a Palavra de Deus, se pronuncia “a homilia, as intenções da
oração universal e o precónio pascal, mas que não deve ser usado para fazer
comentários, avisos, dirigir cantos”.
Na verdade, pelo valor que da Palavra de Deus,
a Igreja convida a cuidar do ambão, que não é um móvel funcional, mas o lugar adequado
à dignidade da Palavra de Deus, em correspondência com o altar: a mesa da Palavra
de Deus e do Corpo de Cristo, em referência tanto ao ambão como, sobretudo, ao
altar. De facto, Cristo é a Palavra e é Carne da nossa carne (no
mistério do pão e do vinho).
Assim,
a nota apela à dignificação do material
necessário para a celebração litúrgica e ao bom uso dos “livros que contêm as
passagens da Sagrada Escritura”, definindo como “inadequado o uso de folhetos,
fotocópias, e outros subsídios para substituir os livros litúrgicos” e propondo
o uso da Bíblia, lecionários, livro das intenções da oração universal e o missal
(este no
altar e na sede da presidência). Com efeito,
os livros que contêm
os textos da Sagrada Escritura hão de despertar a veneração pelo mistério de
Deus, que fala ao seu povo. E, sendo de rejeitar qualquer tipo de improviso ou alteração
aos textos, é possível e conveniente introduzir as letras com breves e
adequadas admonições.
E, para que a
Sagrada Escritura e seu valor nas celebrações litúrgicas sejam mais conhecidos,
a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos convida à elaboração
dum poster que espelhe o valor da Palavra
de Deus nas celebrações litúrgicas e à promoção de encontros formativos, antes
ou depois do Domingo da Palavra de Deus,
para, por exemplo, ilustrar mais detalhadamente “os critérios de distribuição
litúrgica dos vários livros bíblicos, no decorrer do ano e em seus respetivos
tempos, a estrutura dos ciclos dominicais e semanais das leituras da Missa” –
pois a compreensão da estrutura e da finalidade da Liturgia da Palavra ajuda a assembleia
dos fiéis a receber de Deus a palavra que salva. Na verdade, como salienta a
nota, “a Palavra de Deus escutada e celebrada, sobretudo na Eucaristia, alimenta
e reforça interiormente os cristão e capacita-os para um autêntico testemunho
evangélico na vida quotidiana”.
Por fim, a
Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos conclui
sugerindo que, de entre os numerosos santos e santas – todos verdadeiras testemunhas do
Evangelho de Jesus Cristo –, “seja
proposto São Jerónimo como exemplo pelo grande amor que nutria pela Palavra de
Deus”, pois, na Carta Apostólica “Scripturae
sacrae afetus”, do passado dia 30 de setembro, por ocasião do XVI
centenário da morte do Santo, o Papa recordou que “ele foi um incansável
estudioso, tradutor, exegeta, profundo conhecedor e apaixonado divulgador da
Sagrada Escritura” e que, ao meditá-la, encontrou-se a si mesmo, o rosto de
Deus e dos seus irmãos, aprimorando a sua predileção pela vida comunitária.
***
É de recordar
que, nós, os cristãos, somos um povo que peregrina na história, fortalecido pela
presença do Senhor no meio de nós, que nos fala e nos alimenta. Por isso,
o dia dedicado à Bíblia não há de ser “uma vez ao ano” ou “uma vez para todo o
ano”, por via da necessidade que temos de familiaridade e intimidade com a
Sagrada Escritura e com o Ressuscitado, que “não cessa de repartir a Palavra e
o Pão na comunidade dos crentes”. Para tanto “necessitamos de entabular constante
trato de familiaridade com a Sagrada Escritura, caso contrário o coração torna-se
frio e os olhos permanecem fechados no meio de inumeráveis formas de cegueira”.
2020.12.19 –
Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário