sexta-feira, 14 de agosto de 2020

O que falta definir para 2020/2021 e o plano da FENPROF

 

Todos os alunos estarão nas escolas e as aulas começam entre 14 e 17 de setembro, sendo as primeiras 5 semanas para consolidação de aprendizagens. Responsáveis educativos pedem atenção ao número de estudantes por turma, à carga horária, ao plano curricular, ao apoio tecnológico e à contratação de mais professores. O apoio tutorial será alargado e com suporte na área, o Governo investirá 400 milhões de euros no ensino digital, está prevista a contratação de mais professores, embora se desconheça o número, e a educação pré-escolar terá 88 novas salas na rede pública, com mais 2200 vagas para crianças a partir dos 3 anos. Estas são as conhecidas indicações do ME (Ministério da Educação) quanto à organização próximo ano letivo.

Filinto Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas), prevê ano híbrido quanto ao local das aprendizagens e adaptação de rotinas e contextos, desejando que o processo ensino-aprendizagem não continue em casa de alunos e professores. Pensa que foi “plenamente superado” o regresso em segurança dos alunos do 11.º e 12.º anos à escola, mas considera que há perguntas sem respostas, por exemplo: “Quantos alunos podem estar numa sala de aula? Quantas pessoas podem, em simultâneo, usar a biblioteca, o bar, a cantina? Regressarão os horários duplos? Mantém-se a carga curricular?”. E, porque ‘mais vale prevenir que remediar’, espera que se dissipem as incertezas que pairam sobre o futuro da Educação. Assim, segundo este dirigente associativo, o Governo deve encontrar mecanismos e instrumentos para evitar todos os constrangimentos, resolver, para evitar desigualdades, a situação dos alunos que não têm computador e acesso à Internet, reforçar e apoiar (através do ME) o #EstudoEmCasa, aproveitar a oportunidade de criar um canal dedicado à Educação e fazer que a imprensa escrita (cada vez mais digital) dedique um espaço diário ao enfoque nas boas práticas das escolas. Na verdade, as escolas estão prontas para receber os alunos, os professores, e os funcionários; e os alunos perceberão quão importante é estar e aprender na presença dos colegas, partilhar, em colaboração e respeito, espaços coletivos, desenvolver atividades em grupo, brincar e até fazer pequenas traquinices. Os alunos apreciarão mais a escola, as dinâmicas de sala de aula, os professores e educadores, pois estes são “mestres presenciais, imprescindíveis na orientação e acompanhamento que prestam a todos e a cada um, não deixando ninguém para trás”.

Manuel Pereira, presidente da ANDE (Associação Nacional de Dirigentes Escolares), lembra as “alterações substantivas e radicais” com o fecho das escolas, que obrigou professores e alunos a “reinventar-se e a dar corpo a um novo conceito de escola” e que pôs a descoberto algumas das muitas limitações com que alguns se depararam como a falta de meios informáticos ou outros. Duvidando de que o ano comece em pleno no tempo anunciado pelo ME, dado haver alunos e professores envolvidos em exames e haver professores a gozar férias, pensa que há lições a colher: desde logo, garantir a igualdade de oportunidades para todos, em termos de equidade e justiça social. Propõe que se comece a trabalhar já num plano B porque, “previsivelmente, a situação sanitária não será diferente, em setembro, do que é hoje e as escolas não conseguirão ter as condições de distanciamento necessárias ao cumprimento das orientações da DGS (Direção-Geral da Saúde). Em sua opinião, havia que reduzir o número de alunos por turma, solução não viável mercê da exiguidade dos espaços físicos, pelo que admite um sistema dual enquanto durar a insegurança provocada pela pandemia. Esse sistema, como diz, “poderá passar pelo ajustamento da carga curricular das disciplinas, conjugando atividades presenciais e não presenciais”. Os alunos iriam à escola alguns dias da semana, o que levaria à redução do número de alunos em cada dia, garantindo maior segurança sanitária, mas implicaria que todos os alunos tivessem acesso a meios telemáticos como computador e Internet e que professores e escolas vissem os seus equipamentos atualizados e mais recursos humanos, capacitados para a utilização das novas tecnologias, de modo a implementar-se os apoios aos alunos que deles vão necessitar.

Porém, Manuel Pereira pensa que, na educação pré-escolar e no 1.º Ciclo deve haver atividades presenciais todos os dias, como entende que o processo de recuperação, nas primeiras semanas, de aprendizagens essenciais não trabalhadas ou não consolidadas é “complexo e exige recursos de que as escolas não dispõem”. Ademais, considera fundamental confiar mais nas escolas e reconhecer-lhes autonomia para decisões urgentes, independentemente das orientações da tutela, até porque não faz sentido, muito mais agora, que se deem orientações para o país inteiro quando as realidades são sempre diferentes.

A FNE (Federação Nacional da Educação) quer que a organização do próximo ano letivo seja negociada, reunindo-se à mesma mesa quem deve ser ouvido neste assunto e escutando-se os diferentes parceiros para a determinação de normas e orientações para um ano letivo atípico, mas muito exigente, quer em termos pedagógicos, quer em termos de condições de trabalho de docentes e não docentes. Por isso, devem ser adotadas orientações “diversas das habituais” na organização das turmas, nas cargas horárias e nos conteúdos programáticos e deve ser dado “aos docentes o tempo suficiente para que possam fazer a adequada preparação do próximo ano letivo, salvaguardando o imprescindível e inalienável direito a férias”.

A FENPROF (Federação Nacional dos Professores), tal como a FNE, reclamou uma reunião com a tutela para debater o despacho de organização do próximo ano letivo, pois “o ME tem obrigação democrática e legal de ouvir as propostas das organizações que representam os docentes e negociar” as matérias de caráter obrigatório, como a tem de procurar soluções de compromisso que projetem um clima de estabilidade e tranquilidade para o início do ano letivo, que poderá ocorrer em momento em que a situação epidemiológica do país se agrave.

Esta organização sindical defende que devem estar em perspetiva todas as possibilidades: a normalidade com todos os alunos em regime presencial; o cenário misto com aulas na escola e aulas à distância; e o encerramento das escolas se houver nova vaga epidemiológica.

Os partidos políticos procuram respostas concretas sobre o modo de funcionamento do próximo ano letivo. Por exemplo, o CDS-PP defende aulas presenciais a partir de setembro e perguntou à tutela se as escolas terão créditos horários para aulas de recuperação, se as medidas de educação inclusiva serão retomadas e quando é que as escolas e famílias serão envolvidas no plano de regresso à escola. O BE propôs a contratação de mais pessoal para as escolas e a redução do número de alunos por turma, que acabou por não passar no Parlamento. A IL recomendou o desenvolvimento dum plano de recuperação das aprendizagens. E o Primeiro-Ministro avisou, em meados de maio, que a comunidade educativa terá de conviver com o novo coronavírus no próximo ano letivo, até porque ainda não haverá uma vacina, e viu no regresso dos alunos do 11.º e 12.º anos uma forma de testar metodologias e verificar o que é de aperfeiçoar, tendo realçado a “grande capacidade de invenção e adaptação” dos professores.

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A FENPROF considera que as condições em que decorreu o ano letivo 2019/20 criaram défices e necessidades a que o próximo ano letivo deverá responder no próximo ano letivo. Os défices resultaram dum regime de trabalho de emergência, com limitações inultrapassáveis, se nos ativermos às dimensões da escola; e as necessidades dizem respeito à superação de tais défices e à garantia de adequadas condições de segurança sanitária para a escola não se constituir em espaço de transmissão do SARS-CoV 2, afetando profissionais, alunos e as famílias.

Por isso, deverá fazer-se tudo para que, desde o início do ano letivo, se garanta o regresso da comunidade escolar ao regime presencial, não facilitando nas condições de segurança sanitária, para que se gere um clima de confiança junto de docentes, trabalhadores não docentes, alunos e famílias. E a FENPROF entende que orientações da DGEstE e as orientações conjuntas da DGEstE, DGE e DGS são insuficientes, como vêm apontando representantes da comunidade educativa, não por falta de propostas apresentadas ao ME, mas por falta de capacidade e/ou vontade política “para manter linhas de diálogo e negociação efetivas”, para investir em condições de segurança sanitária” e para admitir que algumas soluções de ordem pedagógica devem ser decididas pela escola no quadro da autonomia, mais propalada que respeitada.

Face à iminente manutenção ou agravamento da epidemia no outono, à necessidade de retomar o ensino presencial e à insuficiência e/ou inadequação das orientações do ME, bem como à não autorização de soluções alternativas, a FENPROF apresentou um Plano para a Abertura Segura do Ano Letivo em regime presencial.

Os seus princípios são: garantia de condições de segurança sanitária; distribuição diária gratuita dos EPI (equipamentos de proteção individual) necessários a todo o exercício de funções; respeito pelas orientações da DGS para as escolas, sobretudo em relação ao distanciamento, constituição de grupos, uso de máscara e circulação nos espaços; gestão, pelas escolas, de espaços e horários das aulas; garantia de recursos para resposta adequada às necessidades identificadas pelas escolas; atribuição dos equipamentos necessários a alunos e docentes, em caso de ensino remoto; reforço de funcionários, para responder às exigências de higienização e controlo de espaços na escola; respeito pela posição das famílias de alunos com necessidades educativas especiais em caso de retorno total ou parcial ao ensino remoto, sem prejuízo de as escolas terem de manter organizada a resposta presencial; recuperação de défices educativos que resultam das condições anómalas em que decorreu o ano 2019/20, com base em plano a aprovar pelas escolas, em que se prevê a forma de organização dessa resposta.

As medidas de segurança sanitária são: rastreio à covid-19 para toda a comunidade escolar antes do início das atividades letivas; confirmação, pelas autoridades de saúde local, da existência de condições de segurança sanitária na escola para o regime presencial; criação dum observatório específico para a Educação, coordenado pela DGS, para identificar surtos de covid-19 que surjam na escola e a definir a intervenção adequada; distribuição de EPI a toda a comunidade escolar, que, além das máscaras, contemple outros equipamentos, nomeadamente na Educação Pré-Escolar e na Educação Especial (luvas, viseiras, máscaras transparentes, batas, proteção de cabeça e de calçado); criação de condições de segurança para docentes que tenham de se deslocar a domicílios; profusa distribuição de gel desinfetante pelos diversos espaços da escola; constituição de comissões de segurança e saúde no trabalho em todos os agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas; utilização obrigatória de máscara por toda a comunidade escolar, incluindo os alunos de todos os níveis e graus de ensino (no 1.º Ciclo do Ensino Básico, o uso de máscara será ainda mais importante se o Governo decidir não respeitar o distanciamento físico estabelecida pela DGS); garantia de distanciamento físico de 1,5 a 2 metros entre pessoas em salas de aula, laboratórios, bibliotecas, salas de informática, refeitórios, bares e outros espaços da escola; limite, na Educação Pré-Escolar, de 6 crianças por sala, podendo, excecionalmente, o limite chegar a 10; funcionamento dos estabelecimentos em regime duplo, permitindo reduzir as concentrações de alunos em cada turno e dividir as turmas em grupos de menor dimensão; reforço das respostas sociais, designadamente ao nível da ocupação de tempos livres, se as escolas funcionarem em regime duplo, bem como do serviço de refeições; arejamento frequente dos espaços utilizados pela comunidade escolar; gestão dos tempos letivos, no 1.º Ciclo, de forma a permitir tempos de permanência menos prolongados em espaço fechado; higienização dos diferentes espaços da escola entre cada utilização, incluindo instalações sanitárias; garantia de espaços adequados para o serviço de refeitório não podendo as refeições ser servidas na sala de aula ou de atividade; definição de circuitos de sentido único dentro do espaço escolar; criação de condições de segurança sanitária para a utilização de recintos desportivos, incluindo balneários, e para a prática de aulas ao ar livre; garantia de proteção acrescida, nomeadamente em relação a EPI e higienização de aulas em disciplinas como Educação Visual ou as que exigem atividade laboratorial; reforço do número de assistentes operacionais em cada escola para responder às exigências de segurança sanitária impostas pela covid-19; reforço do número de docentes, bem como de outros trabalhadores das escolas e agrupamentos; e proteção de todos os elementos da comunidade escolar que sejam de grupo de risco.

Outras medidas. A FENPROF considera erro a imposição de 5 semanas de recuperação das matérias do ano letivo 2019/2020, que poderia ter sido uma opção de escola, mas não do país. Com efeito, se há momento em que se justifica, da parte do ME, respeito pela autonomia da escola, é este: à escola competirá, no seu contexto e situações específicas, decidir sobre gestão de espaços, horários de funcionamento, pessoal não docente, definição de necessidades de pessoal docente, obviamente respeitando as normas legais em vigor. É o caso do reforço das equipas multidisciplinares das escolas com docentes e outros profissionais, de aumentar o número de horas de tutoria, de coadjuvações e de apoios a alunos que deles necessitem. E, ao ME compete garantir os recursos adequados à satisfação das necessidades das escolas.

E o plano continua com a exigência de garantia da igualdade e das boas condições de trabalho, por exemplo, com a distribuição gratuita de equipamentos a alunos e professores, a não sobrecarga dos docentes com regime presencial e ensino remoto, tempo para a direção de turma também na componente letiva, a contagem do intervalo do 1.º Ciclo (nunca inferior a 30 minutos) como tempo de serviço, a interrupção das aulas para as avaliações intercalares, a supressão dos bancos de horas e a suspensão das provas de aferição e das provas finais do 9.º ano. De resto, são de observar as demais orientações da DGEstE e as das DGEstE/DGE/DGS.

Diz a FENPROF que, num quadro económico global, sem a retoma esperada e com a situação económica de muitas famílias agravada, deverá haver um forte reforço da ação social escolar.

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Não é, pois, a falta de sugestões e de cooperação que inviabilizará o próximo ano letivo! Mas requer-se audácia e vontade política manifesta a tempo e horas.

2020.08.13 – Louro de Carvalho

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