Há onze dias que o Governo da Bielorrússia enfrenta uma vaga de indignação sem precedentes na sequência das eleições presidenciais de 9 de agosto. Os manifestantes afirmam que o ato eleitoral foi marcado pela fraude.
No dia 17, o Presidente Alexander Lukashenko
deslocou-se a uma fábrica de tratores em Minsk, a capital, mas foi confrontado
com gritos de protesto de mais de 5 mil trabalhadores em greve, a que respondeu
– minimizando as greves, que diz serem insignificantes – prometendo novas
eleições depois da aprovação de outra constituição, necessária e que até a
oposição vai aceitar.
Disse que é preciso referenda-la porque a
constituição em vigor também foi aprovada num referendo; e que, nos termos da
nova constituição, se o povo quiser, serão realizadas novas eleições: para o
parlamento, para a presidência e para os órgãos dos governos locais.
Porém, a oposição e os observadores pensam
que se trata apenas de ganhar tempo.
No dia 18, à porta da prisão em Minsk, onde o opositor Siarhei Tsikhanouski passou
o dia de aniversário, a multidão pedia a liberdade. Nas fábricas, na televisão
estatal, no Teatro Nacional e locais por toda a Bielorrússia continuam as greves para
pressionar o reeleito a deixar o poder, pois consideram fraudulentas as
eleições presidenciais que lhe deram um 6.º mandato. Com
a TV em greve, o que os bielorrussos veem à hora do telejornal é um estúdio
vazio.
Sviatlana
Tsikhanouskaya, candidata derrotada e mulher de Siarhei, deixou uma mensagem de alento em
que refere:
“Esta flagrante injustiça e
impunidade mostram como funciona o sistema decadente que permite a uma pessoa
controlar tudo. Ele [o marido] e outros estão na cadeia. Mas pede que não
fiquem sentados e façam tudo para poderem viver neste país para o resto da vida.”.
E,
horas antes da reunião extraordinária do Conselho Europeu deste dia 19 de
agosto, em que as eleições do dia 9 foram consideradas fraudulentas por várias
capitais europeias e pela oposição bielorrussa, e a violência contra
manifestantes pacíficos está em cima da mesa, apelou a que os líderes europeus
não reconheçam o resultado das presidenciais, conforme vídeo hoje divulgado:
“As eleições de 9 de Agosto não foram justas
nem transparentes. Os resultados foram falsificados. As pessoas, que foram
defender os seus votos nas ruas das suas cidades por toda a Bielorrússia, foram
brutalmente espancadas, presas e torturadas pelo regime que se apega desesperadamente
ao poder (…) Peço que não reconheçam estas eleições fraudulentas. Lukashenko
perdeu toda a legitimidade aos olhos de nossa nação e do mundo.”.
Também
antes da reunião, o Grupo de Visegrado –Polónia, Hungria, República Checa e
Eslováquia – pediu em comunicado conjunto – uma solução política para a
Bielorrússia, assente no respeito pelos direitos humanos e liberdades
fundamentais e sem violência contra manifestantes pacíficos.
Josep Borrell, chefe da Diplomacia da UE, disse que os 27 Estados-membros
pretendem a sua “condenação e rejeição do regime de Lukashenko” que “não tem
legitimidade democrática”.
As manifestações pacíficas da semana
passada foram alvo de violência por parte da polícia, que deteve pelo menos
sete mil pessoas, tendo a repressão causado já três mortes (confirmadas) e centenas de feridos. E a pressão aumenta também da parte da comunidade
internacional e de governos como o da Alemanha face àquela que é considerada a
última ditadura da Europa. E a Comissão Europeia está a considerar o
alargamento das sanções que já impôs ao país.
Steffen Seibert, porta-voz da Chanceler
Angela Merkel apelou ao diálogo, observando:
“As autoridades devem evitar o
recurso à força contra manifestantes pacíficos. Em segundo lugar, os
prisioneiros políticos devem ser libertados imediata e incondicionalmente. Em
terceiro lugar, é necessário um diálogo nacional entre o governo, a oposição e
a sociedade a fim de ultrapassarem esta crise.”.
***
A União Europeia (UE) não reconhece os resultados das eleições e defende uma “transição
democrática”, condena a violência e garante que não estão em causa “questões
geopolíticas”, para afastar o cenário de intervenção de Moscovo. E Ursula von der Leyen, presidente da
Comissão Europeia, anunciou plano de 53 milhões de euros para ajudar sociedade
bielorrussa.
Por sua vez,
Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, disse
em conferência de imprensa transmitida virtualmente após a reunião
extraordinária, neste dia 19, que o povo bielorrusso quer decidir o seu futuro,
anunciou a solidariedade da UE com o povo bielorrusso e confirmou que Bruxelas
vai impor sanções a algumas figuras do regime responsáveis pela violência
contra manifestantes pacíficos. Com efeito, as eleições presidenciais “não
cumpriram os padrões internacionais”, pelo que a UE não pode reconhecer os seus
resultados.
A presidente da Comissão descriminou as finalidades do pacote de ajuda
financeira de 53 milhões de euros para apoiar o povo bielorrusso: dois milhões
para ajuda às “vítimas da repressão e da violência estatal inaceitável”, um
milhão para a “sociedade civil e para os media independentes”
e 50 milhões destinados para o combate à covid-19, nomeadamente para hospitais,
equipamento médico, grupos vulneráveis e serviços sociais.
Von der Leyen e Michel reforçaram a condenação da violência contra os
manifestantes bielorrussos, que não reconhecem a vitória de Lukashenko, e a
presidente da Comissão sublinhou que houve “apoio unânime” dos 27
Estados-membros na aplicação de sanções destinadas a “pessoas específicas”, que
deverão ser aplicadas “assim que possível”.
Os líderes europeus garantiram que a UE “está pronta para acompanhar a
transição democrática do poder na Bielorrússia” e defendeu o papel da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa), da qual fazem parte países europeus,
bem como a Rússia e a própria Bielorrússia, na monitorização das eleições. A
OSCE não esteve presente nas eleições de 9 de Agosto, por atraso de Minsk no
envio do convite a monitorizar a votação.
Angela Merkel, chanceler alemã e presidente em exercício da UE, numa
conferência de imprensa à parte, frisou a necessidade de a OSCE se envolver na
observação de eleições livres e no diálogo, pois “não pode haver interferências
exteriores no diálogo entre as partes na Bielorrússia”. E revelou que tentou
conversar com Lukashenko, mas não obteve resposta, pelo que não vê um papel
para si enquanto mediadora neste momento, uma vez que Lukashenko recusou falar
com ela, o que lamenta.
A
Chanceler alemã respondia assim ao repto de Sergei Lavrov, Ministro dos
Negócios Estrangeiros da Rússia, que, citado pela agência TASS, desafiou a UE a
fazer uma proposta de medição diretamente a Alexander Lukashenko, não “através de
microfones”, embora tenha considerado que não existe necessidade de mediação
externa na Bielorrússia, uma oferta feito pela Polónia e pela Lituânia.
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