segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Foi assassinado em El Salvador o reitor do Seminário Romero

 

Com o assassinato do Padre Ricardo Cortez, de 44 anos, pároco de San Francisco Chinamequita e reitor do Seminário Filosófico Santo Oscar Arnulfo Romero, perpetrado a 7 deste mês, depois de ter celebrado a Eucaristia, a terra de El Salvador, no coração da América Central, volta a ser, mais uma vez, banhada por sangue inocente. A Diocese de Zacatecoluca, sufragânea da Arquidiocese de San Salvador, exprimiu logo publicamente o seu pesar pelo homicídio deste “bom pastor”, que, ordenado sacerdote a 29 de maio de 2004, era o guia espiritual dos seminaristas que frequentam aquele Seminário e muito amado pela comunidade dos fiéis.

O homicídio ocorreu neste Ano Jubilar Martirial e em que se assinalou o 40.º aniversário do assassinato de Santo Oscar Romero. São efetivamente muitos os homens e mulheres que deram a vida para que neste pequeno país da América Central prevaleça a equidade, a justiça e a paz. Recordam-se em especial seis sacerdotes e duas colaboradoras, que devem permanecer na nossa memória. Na verdade, na noite de 16 de novembro de 1989, foram assassinados, no campus da Universidade Centro-americana, seis sacerdotes jesuítas e duas colaboradoras, Elba Ramos e sua filha Celina. Nesses dias desenrolava-se, na capital, uma ofensiva da guerrilha do FMLN contra o exército e o governo salvadorenho.

A propósito do homicídio do Padre Cortez, Gabriella Ceraso frisa ao Vatican News a inexplicabilidade deste ato “vil” e “crime execrável” contra a sua pessoa.

Mais diz que este sacerdote, um homem bom e afável, terá sido assassinado na manhã do dia 7, atingido por balas, enquanto conduzia o seu carro, a cerca de 80 quilómetros de Tecoluca, território de Ramón Grifal, em São Vicente. O seu corpo, já sem vida, foi encontrado ao lado do veículo estacionado à beira da estrada. A Polícia Nacional Civil e o Ministério Público já estão a investigar o caso que emocionou a Igreja católica salvadorenha.

A incredulidade pelo triste crime é expressa, em comunicado, que exprime as condolências do bispo, sacerdotes, religiosos e fiéis da diocese de Zacatecoluca: 

Padre Ricardo era um homem bom, afável, integrado em sua comunidade e dedicado à formação e ensino dos seminaristas, bem como aos cuidados dos fiéis diocesanos. Por isso, este assassínio é ‘inexplicável’.”.

O sangue inocente de um sacerdote bondoso” – lê-se na nota – “continua a ensanguentar a terra de El Salvador, sobretudo neste ano em que se celebra o Jubileu dos Mártires, a comemoração dos 40 anos do assassinato de Dom Oscar Romero e o aniversário do martírio do Padre Cosme Spessotto e outros irmãos(de relevar o assassinato de 4 missionárias norte-americanas e o massacre de Sumpul).

No mesmo comunicado a diocese agradecia aos que estão a investigar o caso e comunicava o programa das celebrações do último adeus ao “bom pastor” que todos conheciam como um homem totalmente “dedicado às suas ovelhas”.

O comunicado convidava “toda a Conferência Episcopal, o clero da Diocese e de outras Dioceses para a missa exequial do padre Ricardo Cortez na catedral de Zacatecoluca”, que se celebrou na manhã do dia 8 pelas 10 horas. O sacerdote foi sepultado no dia 9 às 11 horas no cemitério da sua localidade, só com a participação dos seus familiares.

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Afetuoso e comovido, o Padre Rafael Sanchez, sacerdote da Diocese de Zacatecoluca, residente em Itália há 4 anos, falou, aos microfones do Vatican News, das virtudes do Padre Cortez, com quem compartilhou anos de trabalho pastoral em El Salvador, vincando o vazio que a sua morte deixa na Igreja e na sociedade. No seu testemunho, sintoniza com Monsenhor Bolaños, o Bispo diocesano, quando diz que era um “homem afável devotado ao seu rebanho, bem como à formação dos seminaristas, os futuros pastores. Porém, acrescenta que “era um homem muito alegre, ameno nas conversas, muito próximo, muito sensível aos pobres, muito amigo” e que gostava muito de participar nos encontros fraternos dos sacerdotes.  Embora pendente dos jovens no seminário, integrava a equipa da pastoral vocacional da diocese, manifestando a sensibilidade de acompanhar a caminhada dos jovens.

Refere que o Padre Ricardo era muito inteligente e bem formado. Tendo feito a licenciatura em filosofia na Universidade Lateranense, entre os anos 2006 e 2008, em Roma, viveu e trabalhou na paróquia de Mandela, da diocese de Tivoli, em Itália, nas cercanias de Roma, onde o Padre Rafael agora trabalha.  Regressado a El Salvador em 2008, o Padre Ricardo, incorporou-se no trabalho formativo no seminário.  Esteve como formador no Seminário de Filosofia desde 2010, tendo nos últimos 3 anos assumido a tarefa de reitor. Por isso, pode dizer-se que era um homem que deixou um grande vazio na Diocese, nas gerações de jovens que se estavam a formar para o sacerdócio e nas paróquias onde colaborava na pastoral.  

Sacerdote há 16 anos, trabalhara como pároco numa paróquia muito pobre da diocese antes de ir estudar para Roma e fazer a licenciatura em filosofia. E, quando regressou a El Salvador, dedicou-se quase totalmente à formação no seminário como formador e professor.  Nesse tempo de formador, colaborou pastoralmente com muitas paróquias. Na paróquia, onde o Padre Rafael esteve de 2013 a 2016, colaboraram juntos durante 3 anos completos e ali fizeram, juntos, projeções pastorais: ele, como filósofo era muito perspicaz no seu jeito de entender os processos pastorais e insistia sempre na busca da verdade da conversão, na transformação da realidade, em dar o sentido verdadeiro a tudo o que faziam. Muito propositivo a nível pastoral e espiritual, era um excelente diretor espiritual, pois, quando conversava com as pessoas era muito atento, gostava de mergulhar no mistério da pessoa humana e, como filósofo, estava muito atento às palavras, às ideias, à história das pessoas. Deixa, pois, um grande vazio o Padre “Ricardito”, como lhe chamavam por ser de pequena estatura.

E o Padre Rafael sublinha que, em El Salvador, o sangue dos mártires que se recordam desde os anos ‘70’ e ‘80’ palpita e grita ao céu, porque muitos sacerdotes foram mortos e continuam a sê-lo. Assim, a 29 de março de 2018, foi morto o Padre Walter Osmir Vásquez Jiménez, da Diocese de Santiago de Maria; a 18 de maio de 2019, foi assassinado o Padre Cecilio Perez, da Diocese de Sonsonate. E agora, no dia 6 deste mês de agosto, foi assassinado o Padre Ricardo Cortez, um jovem de 44 anos, da Diocese de Zacatecoluca. E, porque a Igreja em El Salvador está a enfrentar este tipo de acontecimentos que deixam feridas muito dolorosas na comunidade eclesial, pede ao Senhor misericórdia para os irmãos sacerdotes e também pede justiça para que estes casos se esclareçam e se possa caminhar sempre na verdade.

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Nas exéquias do Padre Ricardo, os bispos salvadorenhos reiteraram “do modo mais enérgico” a condenação deste terrível crime e exigem que “se esclareça a verdade dos factos e se faça justiça”. E, por carta ao Episcopado de El Salvador, o Conselho Episcopal Latino-americano, CELAM, exprime a sua repulsa e solidariza-se com a Igreja salvadorenha.

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Porque mataram este padre? Por formar padres segundo o Evangelho dos pobres?

2020.08.09 – Louro de Carvalho

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