sábado, 29 de agosto de 2020

Escolas podem reabrir, mas teletrabalho deve continuar

 

Como refere a edição online do Dinheiro Vivo, deste dia 29 de agosto, o ECDC (Centro Europeu para Prevenção e Controlo das Doenças) – sediado na Suécia, com a missão de ajudar os países europeus a dar resposta a surtos de doenças –, considera que as escolas podem reabrir em setembro na Europa, pois não se registaram nelas muitos surtos, mas aconselha as empresas a manterem o teletrabalho. E Piotr Kramarz, seu chefe-adjunto do programa de doenças, disse, em entrevista à Lusa, que, “tendo em conta os dados disponíveis, as crianças e as escolas não são as maiores fontes de propagação desta pandemia”.

No entanto, o cientista sugere a adoção de algumas medidas, “que devem ser coerentes com as restantes regras da comunidade, como tentar aumentar o distanciamento físico entre alunos”.

Estando vários países europeus, incluindo Portugal, a preparar o regresso físico às aulas e ao trabalho presencial, que estiveram substituídos por trabalho à distância durante vários meses devido às regras de contenção mercê da covid-19, Kramarz defende que “o teletrabalho é uma medida que deve continuar a ser considerada nos próximos tempos”, sobretudo “agora que estamos a assistir a aumentos nos números”.

Porém, Kramarz sustenta que é diferente a situação dos estabelecimentos de ensino, pois, como observa, “embora haja bastante incógnitas, não houve muitos surtos em escolas, talvez porque as crianças não ficam frequentemente doentes”, o que mostra que “esta não é a maior fonte de propagação da pandemia e, por outro lado, fechar as escolas teve graves consequências no desenvolvimento das crianças, não só em termos de aprendizagem, mas também na dimensão social”. Por isso, adverte para o cumprimento de algumas regras que passam, além do máximo distanciamento físico possível, pela introdução de “horários específicos [para cada ano] para que as aulas não terminem ao mesmo tempo e o intervalo também não seja ao mesmo tempo”. Diz que “algumas escolas estão a pensar apelar a que os alunos almocem no exterior, se o tempo assim o permitir”. E, no atinente à proteção individual, frisa que “tem de haver materiais para a frequente higienização das mãos” nas salas de aula, salientando que poderá ser considerada a imposição de máscaras faciais para os estudantes mais velhos, como especifica:

O tempo também demonstrou a eficácia das máscaras faciais em evitar a propagação do vírus, mas esse é um desafio nas escolas. Há países que estão a considerar a imposição de máscaras nalguns locais das escolas, mas talvez não para os mais pequenos, mais para os mais velhos e para os funcionários e professores”.

Contudo, apesar de considerar que, adotando estas medidas, “as escolas não serão a maior origem de propagação”, assegura a constante atenção do ECDC.

Já no respeitante aos restantes locais de trabalho, nomeadamente escritórios, Kramarz entende que se torna mais difícil “aumentar o distanciamento físico”, pelo que sugere a manutenção do trabalho remoto (impossível na agricultura e pecuária). Todavia, pondera contextualizando:

Mas claro que depende muito das condições em que as pessoas trabalham […]. No caso das fábricas, [depende] se existe uma ventilação eficaz nos locais de trabalho. E depende de qual é a situação dos transportes públicos em autocarros, metro, etc., [na deslocação para o (e do) trabalho], tudo isto tem de ser tido em conta.”.

No entanto, insiste:

Consideramos o teletrabalho como uma opção que deve continuar a ser usada para reduzir a transmissão”.

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Já a FENPROF, considerando que todos defendem ensino presencial, mas o Governo não parece interessado em garantir as condições necessárias, aponta o dedo ao ME e à DGS que persistem em desvalorizar preocupações e ignorar pedidos de reunião, pelo que  irá expor a situação à AR (Assembleia da República), organizações internacionais e, se necessário, recorrer aos tribunais. A esse propósito, nos primeiros dias de setembro reunirão os órgãos de direção da FENPROF para decidir a abordagem ao início das aulas, caso continuem por garantir as adequadas condições de prevenção e segurança sanitária e os docentes de grupo de risco não sejam protegidos. 

Efetivamente, a FENPROF tem instado com a Diretora-Geral da Saúde e os responsáveis do ME para uma reunião com vista à discussão e revisão de algumas orientações sobre medidas de segurança sanitária enviadas às escolas em julho. Isto, a par da recusa de soluções pretendidas pelas escolas, como o regime duplo para o 1.º CEB, que obrigaria a maior despesa na organização duma resposta social, com atividades seguras de ocupação do tempo livre na outra parte do dia. Insiste na necessidade de rastreio prévio à covid-19, envolvendo toda a população escolar, e da garantia do distanciamento físico em sala de aula, o que obriga à constituição de pequenos grupos de alunos, como recomenda a DGS. E considera necessária a revisão da idade a partir da qual é obrigatório o uso de máscara em espaço fechado, (os estudos dão conta dos níveis infeciosos que podem atingir as crianças) e a definição das medidas de proteção de docentes que integram grupos de risco, bem como de alunos e trabalhadores não docentes.

Porém, a DGS e o ME opta por não responder aos insistentes pedidos de reunião, limitando-se alguns responsáveis do Governo a afirmar que as escolas não são local de contágio e que as medidas previstas são suficientes para garantir o regresso ao ensino presencial. Ao invés de procederem de modo responsável dialogando, ouvindo preocupações e corrigindo medidas, preferem fechar-se sobre si mesmos, ignorando estudos mais antigos, como o divulgado pelo Washington Post, ou recentes, como o de investigadores do Hospital Pediátrico e do Hospital Geral de Massachusetts, que sustenta que as crianças têm um papel muito mais relevante do que se pensava na propagação da covid. E não parecem atentos ao que sucede noutros países, como a Alemanha, nem parecem atender às preocupações e recomendações da OMS. 

Há muito tempo a FENPROF vem manifestando preocupações em relação às normas divulgadas pelo ME sobre a organização do próximo ano letivo, pelo que, desde o início de julho, tenta reunir com a DGS e com responsáveis do ME, a propósito das condições de segurança sanitária previstas para o funcionamento das escolas, mas sem êxito, apesar de o Secretário de Estado Adjunto e da Educação ter assumido, a 24 de junho, que seria marcada nova reunião sobre o tema e de, um mês depois (24 de julho), a DGS ter informado que marcaria reunião. E refere que “são a falta de condições de segurança sanitária e a fuga ao diálogo que, por exemplo, em Espanha, já levaram as organizações sindicais de docentes a convocar greve para a abertura do ano letivo e, em outros países, estão a merecer forte contestação, expressa em tomadas de posição, protestos e recursos à justiça”. 

Por isso, insistiu a 21 de agosto, junto da DGS e do ME, para que se realizem as reuniões pretendidas. E garante que, a confirmar-se que essas entidades se recusam a dialogar, as preocupações de professores e educadores seriam expostas junto de todos os grupos parlamentares, a quem se solicitaria a iniciativa de assegurar o que o Governo não garantiu. Além disso, manifestará, junto de OMS, OIT, UNESCO, Internacional de Educação e OCDE, as suas preocupações e denunciará a postura dos governantes, contrária ao interesse de saúde pública e violadora dos princípios de diálogo social, interesse e princípios defendidos por aquelas organizações. E recorrerá aos tribunais, caso se justifique pela insuficiência das medidas tomadas que origine eventuais problemas de saúde e vida dos professores. 

Com efeito, “o regresso tranquilo e em segurança ao ensino presencial é muito importante”, embora, apesar do discurso, pareça “não ser essa a intenção dos governantes, pois as medidas que preveem são frouxas e não garantem as condições de segurança sanitária indispensáveis”.

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Por sua vez, a FNE (Federação Nacional da Educação) exige ao Governo confiança nas escolas e seus profissionais e pede condições sanitárias, materiais e humanas para retomar as aulas presenciais. E, querendo que o impacto do encerramento das escolas seja devidamente avaliado, observa:

É essencial retomar a escola presencial e que ela possa abranger todos os alunos. Não podemos prolongar por mais tempo este distanciamento das crianças e dos jovens em relação ao ambiente escolar, aos seus professores, aos seus colegas.”.

Por isso, pedindo atenção a estes aspetos, exige ao Governo confiança na comunidade escolar e todas as condições para que as aulas presenciais comecem a partir de setembro. E promete verificar, no início do ano letivo, se o número de docentes e não docentes, como psicólogos e assistentes operacionais, é adequado ou insuficiente.

Referindo que é necessário alargar o tempo de funcionamento da escola, retirar das salas de aula mobiliário dispensável, clarificar o distanciamento físico mínimo, organizar e definir os movimentos no espaço escolar, arejar as salas com frequência, atribuir duas máscaras por dia a cada professor e restantes profissionais, alterar os horários das cantinas e implementar o take-away, rever os horários dos transportes escolares, determinar regras especiais na utilização dos equipamentos informáticos, musicais e desportivos, bem como nos desportos que implicam contacto, define oito eixos que devem ser tidos em consideração na preparação do próximo ano letivo, a começar pela aposta na autonomia da escola, dando-lhe acesso aos recursos indispensáveis a vários níveis, seja para proteger a saúde, seja para garantir medidas de apoio essenciais. Depois, vêm a flexibilidade no desenvolvimento curricular e organização pedagógica da escola, a confiança nos profissionais do setor, dar tempo e condições adequadas para a formação tecnológica dos professores, como outros pontos considerados fundamentais.

Mais refere a FNE que é preciso, no início do ano, identificar fragilidades detetadas e acumuladas, superar obstáculos, recuperar o ritmo do processo de ensino-aprendizagem. E diz:

Estas medidas não se compadecem com prazos estabelecidos administrativamente, como o Ministério da Educação quer fazer crer ao determinar que as primeiras cinco semanas do novo ano letivo servirão para a sua concretização. (…) A ação pedagógica tem as suas especificidades e não se resume a orientações burocráticas.”.

Professores e alunos devem ter equipamentos informáticos para o ensino à distância, as férias dos docentes e não docentes devem ser inteiramente respeitadas e a escola deve ter condições físicas e materiais para a proteção da saúde de todos e todos os que pertençam a grupos de risco devem ter essa situação acautelada. Devem ser realizados “testes serológicos e de diagnóstico a docentes e não docentes ao longo do ano e, além das medidas sanitárias, são necessárias “medidas de ordem educativa, medidas sobre gestão dos recursos humanos e materiais e também medidas organizacionais” – devendo em cada escola os profissionais adaptar tais medidas à sua realidade concreta “em diálogo com as respetivas comunidades, no quadro genérico que deve ser estabelecido centralmente”.

Em setembro, a FNE lançará três manifestos para melhoria do sistema educativo e valorização dos docentes e pessoal não docente; no 1.º período, promoverá consulta nacional sobre o ensino à distância e teletrabalho no setor educativo para apresentar propostas ao Governo. Até fins de outubro, fará um estudo sobre a situação dos trabalhadores não docentes. E até ao fim do ano, marcará evento comemorativo do 30.º aniversário do Estatuto da Carreira Docente.

2020.08.29 – Louro de Carvalho

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