sábado, 11 de abril de 2015

O Interesse Público do Complexo Europarque – no Estado e no Município

O n.º 69 do Diário da República, 1.ª série, do passado dia 9 de abril, publicou o Decreto-Lei n.º 46/2015, de 9 de abril que “reconhece o interesse público do conjunto patrimonial designado por Complexo Europarque”, estabelece os termos da sua “integração no domínio privado do restado” e disciplina pormenorizadamente “a cedência da sua utilização ao Município de Santa Maria da Feira” (cf art.º 1.º/1.2.).
A razão do reconhecimento do interesse público deste conjunto patrimonial funda-se no facto de, no entender do Governo, constituir “um equipamento estratégico âncora da região norte no âmbito do Plano Estratégico do Turismo de Negócios do Porto e Norte de Portugal”, configurando uma “infraestrutura que contribui para a afirmação da região norte do País como polo de referência do empreendedorismo e da atividade empresarial” (vd art.º 1.º/1.).
O motivo por que o Complexo Europarque é integrado no domínio privado do Estado (vd art.º 3.º), através de dação em cumprimento para a regularização de parte da dívida da titular do imóvel, a associação Europarque – Centro Económico e Cultural, perante o Estado, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 121.º da Lei n.º 82 -B/2014, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento para 2015), segundo a qual o Governo fica autorizado à “aceitação, como dação em cumprimento, de bens imóveis, bens móveis, valores mobiliários e outros ativos financeiros”.
Por que razão a gestão do património em causa fica entregue ao município de Santa Maria da Feira, em princípio, por 50 anos?
O n.º 2 do art.º 1.º aduz o interesse público associado à utilização do equipamento. Porém, o preâmbulo do decreto-lei sustenta-se na explícita identificação do Município de Santa Maria da Feira “como a entidade pública com vocação e condições para assegurar a sua exploração direcionada, contribuindo assim para o desenvolvimento sustentado da economia e para a manutenção das externalidades positivas para a região norte do País, reunindo as condições para assumir a prossecução destes mesmos fins”.
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Quais são as peças que integram, segundo mencionado normativo legal, o património do Complexo Europarque? São as descritas no seu anexo II, conforme determina o n.º 2 do art.º 2.º: o Edifício técnico; o Edifício Administrativo; o Pavilhão de Exposições; o Centro de Congressos; o Auditório; o “Restaurante do Lago”; os Arranjos Exteriores e Parque de Estacionamento; e o Heliporto.
Ficam de fora os terrenos anexos, que continuam a pertencer à Associação Empresarial de Portugal (AEP), entidade que criou, em 3 de abril de 1992, a associação Europarque — Centro Económico e Cultura, vulgarmente designada por Associação Europarque ou apenas Europarque, a qual mandou construir o complexo em referência e contraiu 3 empréstimos na Banca com os avales do Estado (agora, acrescidos de juros, totalizam € 34 915 853).
Refere o preâmbulo do mencionado decreto-lei que, “em 22 de junho de 2010, para contragarantia da prestação dos referidos avales, a Associação Europarque constituiu uma hipoteca voluntária a favor do Estado sobre o Complexo Europarque, e os empréstimos concedidos foram prorrogados e os respetivos planos de reembolso ajustados mediante sucessivos despachos de manutenção das garantias pessoais do Estado”.
Como a predita associação não cumpriu com o pagamento dos empréstimos, o equipamento foi entregue ao Estado pelo valor de € 21 400 000, livre de ónus ou encargos (vd preâmbulo e art.º 3.º/2.).
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De acordo com o art.º 5.º do decreto-lei, na data da celebração do auto de dação, pelo qual se torna efetiva a transferência do Complexo Europarque para o domínio privado do Estado, a utilização do mesmo é cedida ao Município de Santa Maria da Feira, pelo prazo de 50 anos, regressando o referido Complexo à posse do Estado, na totalidade, caso seja alterada a finalidade, ainda que parcialmente, dos usos associados ao reconhecimento do seu interesse público, ou caso o mesmo Complexo seja alterado de forma significativa sem o consentimento prévio e expresso do Estado, através da Direção-Geral do Tesouro e Finanças (vd n.º 1).  
Como contrapartida pela predita cedência, o Município de Santa Maria da Feira assume a responsabilidade integral pelos investimentos necessários para que o Complexo Europarque continue a ser utilizado no âmbito dos fins de interesse público a que se destina, como polo de desenvolvimento da região, e a de suportar todas as despesas e encargos de conservação e de manutenção do Complexo Europarque pelo período da cedência, nos termos legais (vd n.º 2).
Quer dizer: o município gere o Europarque durante 50 anos, período após o qual, o Complexo regressa ao regime de utilização por parte do Estado. O decreto-lei não prevê renovação do período de cedência de utilização nem prorrogação do prazo. Por outro lado, o período de 50 anos parece demasiado se o mesmo servir apenas para testar a capacidade do município.
Todavia, o Complexo regressará à posse do Estado se for alterada a finalidade total ou parcial da utilização associada ao interesse público dos equipamentos ou se o conjunto patrimonial for significativamente descaraterizado, sem autorização da entidade governativa a quem compete a administração do património.
Ademais, é de perguntar se o município tem efetiva capacidade de planeamento, organização e agendamento de eventos que garantam a manutenção a custo zero das instalações e espaços exteriores do Complexo, capacidade que a AEP de todo não manifestou, deixando mesmo que o empreendimento acuse visível degradação.
Depois, vai o município, através dos seus serviços, assumir as ações de investimento e a gestão do empreendimento e a organização dos eventos a que se destina ou irá alocá-lo, no todo ou em parte, por concurso a alguma entidade privada?
Finalmente, em que medida os encargos com a manutenção do Complexo Europarque se vão refletir na bolsa dos munícipes, já que, dada a situação financeira da autarquia, os seus clientes são abrangidos por taxas de IMI, IRS (na parte que compete ao município) e outras no máximo previsto legalmente? Diga-se que o município, se dispõe de uma considerável oferta cultural, não dispõe de uma rede viária desenhada em termos de adequação aos tempos de hoje, apresentando-se a existente com visíveis sinais de degradação generalizada, com destaque para o mau estado do pavimento e, em imensos troços, para a excessiva sinuosidade e estreiteza de perfil transversal. E vê degradar-se o porque empresarial como insigne e qualificado espectador!

Em suma, Quo vadis, Europarque neste município e nesta região? Que economia? 

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