“Não
só de pão” é o título do pavilhão que marca a presença da Igreja institucional na EXPO 2015, em Milão, programada para o lapso de tempo
que vai do próximo dia 1 Maio até ao dia 31 de outubro.
Aquele pavilhão
da Santa Sé configura uma presença “sóbria”,
mas de alto nível ou, como explicitou a Sala de Imprensa do Vaticano, em 14 de
abril, é uma presença “sóbria” e “minimalista”, mas bastante simbólica.
A
estrutura física da representação da Igreja é promovida, implementada e gerida no regime de colaboração entre o Pontifício Conselho para a Cultura, a Conferência Episcopal Italiana (CEI) e a Diocese de
Milão. Cada uma destas três entidades contribuiu alocando 1.000.000 € cada.
A iniciativa
conta também com a contribuição do Pontifício
Conselho “Cor Unum”, com o Hospital
Menino Jesus e com a Universidade
Católica do Sagrado Coração, no papel de parceiros científicos.
O presidente
do Pontifício Conselho para a Cultura e Comissário da Santa Sé para a Expo 2015,
cardeal Gianfranco Ravasi, recorda que a exposição de Milão não é de todo a primeira
participação da Igreja numa exposição Universal, a ponto de que uma precedente
já remonta ao reinado do Beato Pio IX, quando a Igreja Católica esteve presente
na Expo em Londres em 1851.
***
Parece,
à primeira vista, que o escopo da participação da Igreja Católica – centrada, de
1 de maio a 31 de outubro, em Milão, no tema da
alimentação, para reafirmar o seu compromisso neste campo – contradiz o título
do pavilhão e o dito bíblico de Cristo no Evangelho de Lucas, “Nem só de pão vive o homem” (Lc 4,4), e no de Mateus, (Mt 4,4) “Nem só de pão vive o homem, mas de
toda a palavra que sai da boca de Deus”. Trata-se da resposta firme de Jesus
ao tentador, que, ao aperceber-se da fome de Jesus (que jejuara
durante quarenta dias e quarenta noites), o desafiou
ao milagre em proveito próprio: “Se és
filho de Deus ordena que estas pedras se convertam em pães (Mt 4,3; cf
Lc 4,3). Sem mais, Aquele que na própria
carne experimentara a fome respondeu com a palavra da Escritura referenciada no
Deuteronómio (Dt 8,3). Não era aceitável na perspetiva
de Deus a realização do milagre para proveito próprio, para fins meramente
ostensivos e, muito menos, a solicitação do diabo ou dos poderes de que ele é
autor, promotor ou porta-voz.
Não obstante,
esta cena evangélica não dispensa os discípulos de Cristo da preocupação pelo alimento
de cada um, em cada dia (já que pertence à condição, não só de homem, mas
também de discípulo alimentar-se, embora frugalmente). O próprio Senhor ensinou a rezar, “Dai-nos hoje o nosso pão de cada dia” (Mt 6,11; cf
Lc 11,3). Por outro lado, quando os discípulos,
ao verem o adiantado da hora e ao aperceberem-se de que a multidão estava faminta,
sugeriram ao Mestre que mandasse embora aquela gente, Ele esclareceu, “Não é preciso que eles vão”; e ordenou, “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16; cf
Mc 6,37; Lc 9,13). Também Jesus
manifesta a sua compaixão pela multidão que está faminta e declara que não quer
despedi-la sem a saciar, pois receia que desfaleçam pelo caminho (cf Mt 15,32;
cf Mc 8,2-3). Por isso,
exigindo que os discípulos colocassem à disposição o pouco de pão e de peixes
que possuíam, fez o milagre da multiplicação e as multidões comeram e ficaram
saciadas (5 mil pessoas – Mt 14,13-21; Mc 6,34-44; Lc 9,10-17; Jo 6,1-15. 4 mil
pessoas – Mt 32-38; Mc 8,1-10).
Finalmente,
o Senhor deu aos discípulos o mandato de irem por todo o mundo fazer discípulos
(Mt 28,19). Ora fazer discípulos implica a construção de perfis
humanos que digam e façam o que e como Cristo fez: anunciar o Reino de Deus, ministrar
e receber o Batismo, ensinar e, não menos importante, alimentar as pessoas.
***
Assim, o
pavilhão “Não só de pão” tem em vista o Evangelho na sua totalidade. Gianfranco
Ravasi explica o sentido da presença do pavilhão na Expo e a atividade a desenvolver
a partir dele. Num pavilhão com tamanho reduzido (cerca de 300
metros quadrados), a Santa
Sé ainda terá uma “presença de exceção”, não promovendo qualquer “produto
comercial”, mas transmitindo a sua mensagem de sempre, a partir da atenção aos
mais fracos e ao seu direito natural à nutrição.
Negando
qualquer envolvimento da Santa Sé nas investigações sobre o financiamento da
Expo, o cardeal Comissário da Santa Sé declarou o absoluto alinhamento com o
apelo à sobriedade do Papa Francisco, compartilhado por toda a equipa e seu
chefe. Segundo palavras do purpurado, o estilo do pavilhão, em sua “sobriedade”
e “essencialidade” levam a chancela e a “sigla do papado e da mensagem do Papa
Francisco.
A uma
pergunta de ZENIT – o mundo visto de Roma
– sobre a importância ‘missionária’ do Pavilhão da Santa Sé, o cardeal Ravasi
enfatizou que a sua mensagem não será apenas de “evangelização”, mas de “anúncio tout
court, do kerygma”, dirigido
também aos “não-crentes”, lidando com “temas universais que tocam as consciências
de toda a humanidade” (vd zenit.org,
14 de abril). O
pavilhão será também a sede do Pátio dos Gentios, iniciativa de que ele e o
Conselho que dirige têm sido os promotores, tornando-se, portanto, aquele
espaço um lugar de “diálogo inter-religioso”, “símbolo significativo que a
comida tem em todas as culturas religiosas, mesmo em sua negação”.
A presença da
Santa Sé na Expo 2015 será “essencialmente confiada às palavras”: nas paredes
dos painéis, de facto, nas várias traduções – judeu e grego bíblico incluídos –
figurarão as frases bíblicas: “Não só de
pão…” e “Dai-nos o nosso pão de cada
dia”.
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Por sua vez,
o secretário da Conferência Episcopal Italiana, Dom Domenico Pompili adiantou
que “a participação da CEI na Expo 2015, ao lado da Santa Sé e da diocese
ambrosiana, expressa um compromisso que vai além do tempo da próxima Exposição
Universal em Milão”.
Segundo Pompili,
um dos objetivos da Expo é “melhorar a segurança alimentar”, tendo também em
conta que, na Itália, 4 milhões de pessoas (mais de 7% dos cidadãos italianos) vivem abaixo da linha da pobreza, com um “número de
indigentes em contínuo aumento”. Face a esse fenómeno, a resposta da Igreja
está em “quase 15.000 estruturas de caridade territoriais que, por meio de
cestas básicas, cantinas ou outras formas de intervenção mais inovadoras oferecem
ajuda a quem precisa”.
Por sua
parte, o vigário da Arquidiocese de Milão para a cultura, Mons. Luca Bressan, falando
de iniciativas no tempo, recordou que a presença da Igreja na Expo será oficialmente
aberta com um “grande show”, na noite de 18 de maio. E informou que outro
momento importante será a festa do Corpus
Christi, justificando a modo de interrogação: “Que melhor momento para
testemunhar ao mundo que a nutrição e o futuro do homem e da criação são
guardadas e geradas por este pão que na verdade é o corpo e o sangue de Jesus
Cristo, morto por nós e ressuscitado, amor de Deus que se fez carne?”. Com efeito,
enquanto se trata da nutrição das pessoas, não se pode deixar no olvido a
mensagem de Crispo, o pão partido para a
vida do mundo inteiro, como era enunciado no lema do 42.º Congresso Eucarístico
Internacional, de 1981,em Lourdes.
Pode, com
efeito, ver-se no evento do Corpus
Christi o eco das palavras de Cristo no Evangelho de São João:
“Em verdade, em verdade vos digo: vós procurais-me, não por
terdes visto sinais miraculosos, mas porque comestes dos pães e vos saciastes. Trabalhai, não pelo alimento
que desaparece, mas pelo alimento que perdura e dá a vida eterna, e que o Filho
do Homem vos dará; pois a este é que Deus, o Pai, confirma com o seu selo”. Disseram-lhe, então: “Que
havemos nós de fazer para realizar as obras de Deus?”. Jesus respondeu-lhes: “A obra
de Deus é esta: crer naquele que Ele enviou.” (Jo 6,26-29).
O vigário da
Arquidiocese de Milão para a cultura releva também outra iniciativa para o mês de
setembro:
“Vamos estar
nas ruas de Milão para o trabalho de conscientização de que, a partir das
consequências visíveis desta gestão imatura e pecadora da criação (alterações
climáticas, migrações em massa das populações, como resultado dessas mudanças),
permite que todo o ser humano se sinta responsável pelo mundo que o gerou, o alimenta
e é o lugar da sua vida”.
A ação
eclesial, na fidelidade à Escritura, na valorização da Eucaristia e na sua
ligação com as necessidades matérias, culturais e espirituais dos homens deve
ser algo de agradável para o famoso Arcebispo de Milão, Santo Ambrósio.
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Trata-se
de uma iniciativa discreta, mas destemida e abrangente. Nem a arquidiocese de
Milão deixa se se afirmar como Igreja local viva e atuante, nem a conferência
episcopal italiana se abstém perante um evento de interesse para a Igreja em
Itália e no mundo, nem a Santa Sé deixa de propor aos crentes católicos, aos cristãos,
aos seguidores de outras religiões, aos não crentes e aos indiferentes a mensagem
do transcendente e de atenção ao humano.
Belo
exemplo de articulação de objetivos, vontades, presença e ação.
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