sexta-feira, 10 de setembro de 2021

O que muda com as novas tabelas da ADSE

 

Após ampla discussão e notórios atrasos e adiamentos, entraram em vigor, no passado dia 1 de setembro, as novas tabelas de preços do regime convencionado da ADSE. Trata-se dum total de 18 documentos, cujas principais mudanças abrangem as consultas e a medicina dentária, tal como os preços fechados e as regras que os médicos têm de seguir.

O grande escopo das novas tabelas foi a atualização dos preços e a adaptação à realidade do mercado, assim como a introdução de novos atos em todas as áreas. As tabelas agora incluem, conforme adianta a ADSE numa publicação da sua página, “a generalidade dos atos médicos que eram apenas comparticipados em regime livre, bem como os atos convencionados exclusivamente com alguns prestadores”.

No quadro das mudanças vêm as consultas de medicina geral e familiar e de outras especialidades, que passam a custar, para o beneficiário, 5,00 euros, “em vez de 3,99 euros, o que se traduz num aumento de 1,01 euros”; regista-se “uma diminuição de 30,00 euros no copagamento das diárias de internamento”; foram introduzidas as consultas de psicologia clínica, com o limite de 12 por ano; e, nestas alterações, a tabela da medicina dentária “resulta mais consentânea com a prática atual de mercado” e vindo a percentagem de copagamento dos beneficiários nesta área a diminuir de 33% para 25%.

Outro objetivo desta revisão das tabelas era acabar com os preços abertos, avançando-se, deste modo, para a “fixação de preços máximos de atos e cuidados que não estavam tabelados, principalmente em três áreas onde a imprevisibilidade da faturação aos beneficiários e à ADSE, é maior: medicamentos (oncológicos e outros), próteses intraoperatórias e procedimentos cirúrgicos”. Evitam estes tetos máximos “surpresas na faturação, o que possibilita um maior controlo sobre a despesa”

É ainda de sublinhar que a ADSE continua a financiar a 100% a quimioterapia, a radioterapia e todos os dispositivos médicos e próteses.

E, no atinente às regras, há mudanças que visam estabilizar o número de médicos convencionados, que têm de assumir um maior compromisso, já que “a dissociação de médicos cujos serviços passam, depois, a ser faturados pelo regime livre representa maiores custos para os beneficiários”.

Entretanto, a 2 de setembro, soube-se que as novas tabelas não estarão a 100% em todos os hospitais privados. O grupo Luz Saúde anunciou que decidiu retirar alguns serviços e atos clínicos da convenção, decisão que foi já replicada pela CUF. Em ambos os casos, foi criada uma tabela específica para os beneficiários do subsistema de saúde, para os atos excluídos da convenção. Já a Lusíadas Saúde diz estar ainda a fazer a sua análise, mas admite seguir os passos dos outros grupos.

A CUF, segundo se lê em seu comunicado, “vai continuar a garantir a prestação de cuidados de saúde ao abrigo do regime convencionado, com um corpo clínico dedicado e com uma grande abrangência de atos médicos, desde Consultas, Atendimento Permanente, Internamento, Cirurgias, Exames ou Tratamentos em áreas como Cardiologia, Medicina Interna, Oncologia, Ortopedia, Pediatria”. Não obstante, existem “algumas áreas, procedimentos e médicos que deixarão de estar incluídos na convenção”. Desta forma, como adianta, o grupo os beneficiários da ADSE e dos subsistemas IASFA, SAD PSP e SAD GNR “poderão optar pelo regime livre, acedendo a uma Tabela específica criada pela CUF para os mesmos, para que possam continuar a ter acesso a todos os médicos e cuidados de saúde para além da convenção”.

Com estas mudanças, a CUF decidiu avançar com um “período de transição” para a nova tabela. O objetivo é que “os atos médicos agendados até 31 de agosto – e que se realizam já depois da entrada em vigor da nova tabela a 1 de setembro – possam ainda realizar-se, sempre que possível, ao abrigo da convenção”.

Já a Lusíadas Saúde diz, em comunicado, estar ainda a “analisar o impacto e as respetivas implicações dos novos termos, condições e regras apresentadas”. Contudo, o grupo assegura que “vai continuar a garantir a generalidade da prestação de cuidados de saúde ao abrigo do regime convencionado”, mas admitindo que determinados procedimentos clínicos, especialidades ou médicos poderão deixar de estar incluídos na convenção.

Caso se verifique a exclusão de alguns atos, a Lusíadas Saúde “contactará proativamente os clientes beneficiários desse subsistema público no sentido de encontrar soluções que garantam a estabilidade e a continuidade dos seus cuidados clínicos”.

Para lá disso, prevê também, tal como os outros grupos, que os clientes Lusíadas Saúde que sejam beneficiários da ADSE e dos subsistemas IASFA, SAD PSP e SAD GNR “terão acesso a uma Tabela específica, criada pelo Grupo Lusíadas Saúde para os procedimentos clínicos e especialidades de saúde não convencionados”.

Perante esta decisão dos referidos grupos privados de saúde, a Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública disse, a 3 de setembro, rejeitar uma revisão completa, embora admita correções pontuais nas novas tabelas. No entanto, Alexandra Leitão tranquiliza os beneficiários e destaca que a nova tabela da ADSE traz diversidade de prestadores de atos médicos. Segundo a governante, como referiu em declarações à RTP3, “as tabelas que existiam estavam muito desatualizadas, eram omissas quanto a milhares de atos e dispositivos médicos, o que fazia com que houvesse uma grande disparidade nos preços que eram cobrados por diferentes prestadores”.

Na palavra de “tranquilidade” que deixou aos beneficiários, especificou que vai “existir melhor diversidade”, pois já surgiram cerca de 120 convenções pedidas de novos prestadores que a ADSE está a analisar para celebrar essas novas convenções e 80 mil pedidos de associação de novos atos, esperando-se que seja possível que “os prestadores possam, face às correções pontuais que possa haver, rever a sua posição”.

Por seu turno, a presidente do Conselho Diretivo da ADSE lamenta a situação, mas admite que ainda poderá haver alterações ao documento com base na avaliação das atuais reivindicações, pois é desejável “ter todos connosco com todos os atos convencionados mas também sabemos que é uma situação difícil, já não ocorria com a anterior tabela”, disse Manuela Faria, enquanto recordava que já havia prestadores que tinham tomado a iniciativa de ter uma tabela específica para certos atos. Ainda assim, garante que se irá “continuar a trabalhar com os prestadores”, olhando serenamente para as tabelas e vendo em conjunto com os consultores médicos “se as reivindicações dos prestadores têm razão de ser e se a ADSE tem capacidade de acomodar essas reclamações e pedidos de alteração de preços”.

Desta forma, poderão ainda “existir alterações pontuais, até porque agora com a entrada em pleno das tabelas” é que se vai monitorizando, aponta Manuela Faria. “As tabelas têm milhares e milhares de códigosnão quer dizer que não haja um lapso” ou até modificações que surgem com a entrada de novos medicamentos ou técnicas cirúrgicas.

No entanto, a ADSE ameaça denunciar as convenções se entender que os serviços e o corpo clínico disponibilizados pelos privados não são suficientes para garantir acesso dos beneficiários. Com efeito, não se admite que haja tratamento diferente para os beneficiários nem que as convenções resultem em acordos quase simbólicos.

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Sobre esta matéria, devo referir que hoje a ADSE nem é carne nem é peixe. Criada como instituto público para proteção dos funcionários do Estado em situação de doença, por decisões políticas além da troika, colocou-se de fora na comparticipação das despesas do SNS relativas aos beneficiários e transformou-se numa instituição de gestão participada. Não é um instituto público, mas também não é uma instituição privada. Tanto assim é que, além de representantes dos trabalhadores, há, na sua direção estratégica, representantes do Estado. Foi o Estado que decidiu a percentagem de descontos mensal por cada inscrito, foi o Estado que instituiu a inscrição facultativa dos funcionários públicos ou equiparados na ADSE (que era obrigatória), é o Estado que determina quais os inscritos que ficam isentos de descontar, mas não paga as suas inscrições com verbas do Orçamento do Estado, e é o Estado, vulgo Ministério das Finanças (embora não seja o Mistério das Finanças a tutelá-la), quem decide as grandes opções, nomeadamente contratuais e provisionais. No entanto, hipocritamente remete-a para a gestão autónoma, privada, participada ou não sei o quê.

Irrita e perturba abeirarmo-nos dum prestador privado que dispõe de convenção só para algumas valências e para alguns médicos, como é aberrante depararmo-nos, dum momento para o outro, com uma valência ou com um médico que deixou de estar convencionado.

E essa de os privados terem tabelas próprias para atos não convencionados para que os beneficiários dos ditos subsistemas possam continuar a usufruir é uma bizarrice ou uma subtil caça ao dinheiro por parte de quem arrisca não ganhar tudo de uma vez. Ora, se podem praticar os preços anunciados nessas tabelas privativas, porque não os aplicam a todos os clientes?

Obviamente, os prestadores privados estão mais interessados em lucrar do que em servir. Não haverá tabelas que os satisfaçam; e eles hão de sempre tentar fugir com o rabo à seringa. De tudo querem fazer negócio, nem que tenham de criar fundações para fugir de forma lega às poderosas garras do fisco. E nós vamos condescendendo… gemendo e protestando, mas sem resultados. E o Estado põe-se de fora na proteção dos seus servidores.

E é a nossa saúde que está em jogo!

2021.09.10 – Louro de Carvalho

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