Recentemente
alguns politólogos anotavam o crescimento da abstenção em eleições autárquicas
desde 2009 e teciam várias considerações sobre o fenómeno.
Ora,
já sabemos que a população não tem em grande consideração os políticos e está
distanciada dos assuntos políticos. Por um lado, tem-se desinvestido na formação
política, salvo honrosas exceções e de predominância político-partidária; e, por
outro, o aparelhismo partidário tem-se absolutizado eclipsando o valor dos cidadãos
e deixando de parte a ideologia que inspira os partidos, parecendo até que a
não politização é uma vantagem social.
Nestes
termos, em vez da política, muitos fazem questão de intervir eufemisticamente
no âmbito da cidadania e os partidos tornam-se, também eufemisticamente, paladinos
dos pragmatismos.
É
óbvio que a política entendida no sentido clássico não esgota o viver e
intervir em cidadania, mas também estamos fartos dos que intervêm politicamente
e se dizem não políticos, como estamos saturados dos políticos que se perdem,
não tanto em chorudos ordenados, mas em esquemas para obterem mais-valias em
arrecadamento de receitas próprias, no capital de relação e na satisfação do
ego pessoal – isto para não falar em casos de corrupção, promiscuidade entre público
e privado e quejandos
Em
relação às autarquias locais, costuma dizer-se que os leitores votam nas
pessoas ficando os partidos secundarizados. A
pari, ao invés do que se passa em eleições legislativas, europeias e
regionais, em que a corrida eleitoral é reservada aos partidos isoladamente ou
em coligação, podendo as listas partidárias integrar ou não cidadãos independentes,
mas propostos e enquadrados pelos partidos, nas eleições autárquicas a corrida
eleitoral está aberta a grupos de cidadãos constituídos para o efeito.
Assim,
apesar de as eleições autárquicas constituírem o campo privilegiado da relação
de proximidade entre os eleitores e os eleitos, o desinteresse pelo ato
eleitoral vem crescendo.
E
há várias explicações para isso.
Tal
como um recandidato a Presidente da República – como os outros candidatos, independente,
mas não raro apoiado por grandes partidos – tem, à partida a reeleição
garantida pelo desempenho do primeiro mandato, também os autarcas em exercício
na crista do poder autárquico têm a seu favor o obra feita e a obra propagandeada,
os serviços prestados e a prestar. Isto desmobiliza as oposições e aqueles que lhes
poderiam confiar o voto. E só por manifesta incompetência na gestão da coisa
pública da parte dos autarcas em exercício na crista do poder ou perante uma
vaga de fundo que se constitua em sentido contrário é que se verifica alteração
na gestão autárquica.
Também
sucede que os dinossauros das autarquias têm apostado no alargamento da rede de
dependências, privilegiando “os nossos” e tentando atrair os opositores mais
indecisos ou que venham a precisar do benefício legítimo da autarquia, por
vezes com o semicompromisso de facilidades, incluindo um emprego público.
A
este respeito, recordo casos não raros de quem paga deslocação e outras facilidades
para que venham votar “em nós”. Garanto que, se me viessem a abordar nesse sentido,
das duas, uma: ou recusava por considerar infame tal atitude; ou aceitaria, mas
não votaria no partido ou grupo em causa e, se não encontrasse partido que me
agradasse no círculo eleitoral a que pertenço, votaria nulo.
E
sobram outras razões, de que relevo: a maioria dos independentes é feita por dissidentes
de partidos que lá deixaram de ter lugar ao sol, pelo que a sua independência é
de índole duvidosa; e outros mudam de partido conforme as conveniências de
momento, remetendo para as calendas gregas a ideologia e os pragmatismos, a não
ser os dos interesses pessoais ou familiares.
Por
fim, vem, com não menor gravidade, o procedimento que a famigerada lei de limitação
de mandatos permite: um presidente de câmara pode candidatar-se a uma câmara
diferente daquela que acabou de gerir, pode candidatar-se em segundo lugar à
mesma câmara, pode voltar a candidatar-se a presidente, passado um ou dois
mandatos; a mesma coisa se pode passar com um presidente de junta, que pode,
além disso, candidatar-se a uma união de freguesias que a freguesia que acabara
de gerir passou a integrar.
Acresce
que, para se cumprir o preceito das quotas de sexo, em muitos lugares há mulheres
que integram as listas de candidatura, mas que desistem a seguir, sabe-se lá
porquê.
E
querem que abstenção não aumente!
Contudo,
é preciso ir votar no dia 26 de setembro. O voto continua a ser uma poderosa
arma.
2021.09.08 – Louro de Carvalho
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