Um
método para o ensino formal e direto da leitura é essencial para estruturar e
sistematizar o processo de aquisição desta competência. Por isso, abordar os
diferentes métodos de ensino de leitura e escrita implica debruçarmo-nos sobre
os métodos em si (procedimentos, estratégias, materiais,
etc…) e sobre o
papel do professor. Na verdade, ensinar implica, além da transmissão de algo a
alguém, a sadia relação interpessoal do docente com os ensinandos. E, para o
desenho correto do processo, deve definir-se objetivo, conteúdo e forma,
garantindo eficácia e resultados, de forma que ao ato de ensinar corresponda
uma efetiva aprendizagem.
Antes
de mais, importa apurar o conceito de método. Pode afirmar-se que um método é um
conjunto de ações sistemáticas destinadas a alcançar o objetivo pretendido.
Ora,
para o ensino da leitura e da escrita no 1.º Ciclo do Ensino Básico, há
diversos métodos. Cada um é distinto, pois trabalha o que acha mais correto. Os
mais utilizados são os métodos globais ou analíticos, os métodos sintéticos ou
fónicos e os mistos que juntam o analítico e o sintético. A escolha e a
utilização do método, feita pelo docente, auxiliarão na organização e
orientação da prática pedagógica a desenvolver no processo de ensino-aprendizagem;
e a utilização dos diferentes métodos pedagógicos favorecerá a aprendizagem de
modo a estimular o aluno a adquirir as aprendizagens planeadas para o ensino
adequado ao seu nível etário. Não obstante, o docente não pode deslumbrar-se
com o método. Deve ter em conta que não há um método totalmente eficaz para
todos os alunos e que todos os métodos podem ajudar na aprendizagem. Há vários
métodos para a alfabetização, aprendizagem das letras e junção das mesmas, mas
são escassos os livros de alfabetização com uma organização metodológica a fim
de orientar professores e crianças envolvidos no processo.
No
ensino da alfabetização, os professores adaptam métodos e ferramentas, devendo
dispor de várias ferramentas para ensinar os alunos a ler e a escrever, da
palavra à letra, da letra à palavra, passando pela sílaba, chegando à
construção de frase e texto para aquisição dos conhecimentos necessários. Neste
processo, os conhecimentos e requisitos do docente são fundamentais pois, cada
professor adota um método, introduzindo nas suas metodologias algumas diferenças
por crenças pessoais ou em função de variáveis que surjam na prática
pedagógica. É, pois, fundamental que, na formação (inicial
e contínua), o
professor tenha direito a formação específica no ensino da leitura de leitura e
escrita, com base na teoria escrita e através da experimentação para que lhe
seja possível percecionar e sustentar as suas opções metodológicas.
Para
que o processo de ensino-aprendizagem seja positivo, o docente deve ter a noção
concreta dos diferentes métodos de iniciação à leitura e à escrita e das
estratégias indicadas para cada um. É ainda imprescindível ter em conta o grupo
de alunos, a individualidade e singularidade de cada um, pois a criança tem uma
vida psicológica assinalada por determinadas experiências, vive num meio que
desempenha um papel importante na motivação da aprendizagem, tem, no seu plano
intelectual, um número de possibilidades mais ou menos elevado. E qualquer
método está apto a ser utilizado no ensino-aprendizagem da leitura e da escrita
com todas as crianças, pois elas são flexíveis e adaptáveis e qualquer criança
com aptidões e capacidades ditas normais pode aprender a ler independentemente
do método de aprendizagem utilizado. Assim, ao invés da aceitação duma
psicologia da leitura, há que afirmar que cada método pedagógico cria um
conjunto de situações provocadoras de reações psicológicas, que métodos
diferentes dão origem a problemas psicológicos diferentes e que os hábitos adquiridos
pelas crianças, bem como as consequências nos planos escolar e intelectual,
dependem da escolha feita pelo educador.
Em
todo o caso, pode falar-se de duas grandes linhas de orientação do processo de
ensino-aprendizagem da leitura. Uma das conceções de ensino-aprendizagem da
leitura considera a aprendizagem dos símbolos fonéticos, a identificação dos
seus valores e a associação mecânica desses valores entre si, conduzindo à
constituição de palavras, enquanto a outra valoriza a associação entre a
leitura e o sentido e entre o pensamento escrito, a que se tem acesso através
da leitura, e as suas próprias vivências. Contudo, é evidente que estas
conceções são ambas úteis e se complementam, pelo que devem ser tidas em conta
para que a aprendizagem se faça corretamente e leve as crianças a compreender o
que leem.
As
diferentes metodologias do ensino da leitura devem constituir a operacionalização
das conceções sobre o ato de ler e ter como suporte os diferentes modelos de
leitura. Contudo, é de advertir que, muitas das vezes não é o programa que
determina a prática e o método utilizado pelo professor, mas o manual escolar,
que se torna instrumento poderoso que influencia a prática pedagógica a seguir,
tornando o seu conteúdo a única realidade do aluno.
O
grande debate dos métodos está presente no país há mais de um século,
baseando-se nas duas posturas históricas que dizem respeito à iniciação da
leitura e da escrita: os métodos sintéticos e o método analítico ou global.
Apesar da diversidade de processos e métodos da aprendizagem de leitura e
escrita, há duas grandes formas de abordagem para a aquisição destas
competências da língua portuguesa. A primeira centra-se em efetuar sínteses
sucessivas a partir dos elementos mais simples (letras e sons) até às combinações mais complexas
(processo
sintético). A
segunda parte de um todo conhecido – frase, texto ou história –, em que,
através de análises sucessivas, se torna possível a descoberta dos elementos
mais simples (processo analítico ou global). E é a partir destes que têm surgido
e desenvolvido outros métodos no decurso dos últimos 50 anos.
Derivados
dos métodos principais (sintético e global), surgiram o método Jean-Qui-Rit,
o método das 28 palavras, o método natural, entre outros, que com as bases
teóricas dos existentes já foram concebidos, mas não publicados, sendo
utilizados pelos criadores apenas nas instituições onde foram criados. Referem-se
ainda os métodos mistos, que resultam da combinação dos outros dois com vista a
melhorar a aplicação de qualquer deles.
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O método
sintético, que é o mais antigo, tem vindo a ser utilizado desde a
antiguidade clássica e consiste no ensino partindo da letra (abstrato), passando para as sílabas,
palavras isoladas, seguindo para a frase (concreto) chegando ao texto. É seguido por
um processo de decifração em que os alunos, após o reconhecimento das
correspondências grafema/fonema, são capazes de fazer o encadeamento das letras
para formar sílabas, das sílabas para formar palavras e dessas palavras formar
frases. Pode ser dividido em três tipos: o alfabético, o fónico ou fonético e o
silábico. No alfabético, o aluno conhece e aprende as letras, depois forma as
sílabas juntando as consoantes com as vogais, para, depois, formar as palavras
que constroem o texto. No fónico, o aluno parte do som das letras, unindo o som
da consoante com o da vogal, pronunciando a sílaba formada. E, no silábico, o
estudante aprende primeiro as sílabas para formar as palavras. É neste método
que se utiliza a cartilha para orientar alunos e professores na aprendizagem,
apresentando um fonema e seu grafema correspondente, evitando confusões
auditivas e visuais. A sua aplicação não apresenta grande dificuldade, pois é
simples e segue uma estrutura lógica, pois as sílabas nas palavras são lidas
como elementos simples e não compostos. Porém, exige ao aluno um esforço de memorização,
o que pode redundar numa perda de interesse, pois é repetitivo e não dá
oportunidade de criação à criança.
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O método
João de Deus apresenta uma forma progressiva e correta do ponto de vista
pedagógico das dificuldades do português. Apoiado pelo suporte físico conhecido
Cartilha Maternal, de João de Deus,
está dividido em várias lições, estando representada, em cada uma, uma letra
consoante com os diferentes valores, sendo ensinadas primeiro as que correspondem
foneticamente às que só têm uma leitura, um valor, um som. Esta metodologia estimula
a criança, já que parte do mais simples para o mais complexo. Inicialmente, são
apresentadas as vogais e, em seguida, as consoantes “certas”; e, só após o
domínio destas, são apresentadas as consoantes “incertas”, o que permite
relacionar conhecimentos anteriores e descobrir por si que a posição da letra
na palavra, ou a sua envolvência, determina o seu valor sonoro, que a
diferencia duma parecida, mas não igual. O método tem a palavra como unidade
principal da leitura, como elemento estruturante, numa atitude construtivista
de descoberta de valores e regras conducente à descodificação e à compreensão
leitora, de forma consciente e significativa. A apresentação das palavras na
cartilha é feita de forma segmentada silabicamente, recorrendo ao uso do
preto/cinzento para dividir a palavra, mas sem quebrar a sua unidade, recusando
tratar as sílabas independentemente das palavras em que estão inseridas e ensinando
o código alfabético em contexto de leitura com significado. Esta técnica e o
uso das mnemónicas com palavras e frases em verso são duas das principais
linhas que caraterizam o método, que segue em forma de jogo e progride de forma
construtivista.
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O método
Jean-Qui-Rit (método corporal e gestual), que se insere no âmbito dos
métodos sintéticos, utiliza os gestos e o movimento ritmado do corpo para
ajudar a desenvolver a pronúncia e a memorização das letras e tornar viva e
dinâmica a leitura da frase. Surgiu nos fins do século XIX e foi introduzido
por Pape-Carpentier. Aquando da introdução, baseava-se em movimentos mímicos feitos
pelo aluno para a ilustração de cada som. O ritmo, o gesto e a palavra constituem
os seus princípios; e recorre aos sentidos visuais, auditivos e tácteis e
articula-se em dois tempos (do gesto à letra).
Este
método é explorado a partir de 4 elementos: formação
do gosto e do ritmo, já que, pelo gesto e o canto, se investe na
psicomotricidade para desenvolver a maturação do campo sensorial da criança, o
domínio do movimento e a harmonização do gesto; fonomímica, recorrendo à utilização do gesto até à aquisição das
letras; ditado, pois as crianças,
após ouvirem a palavra ditada pelo professor, fazem o gesto correspondente à
letra (ou
letras) formando a
palavra; e escrita, pois, para a
aprendizagem da forma e inter-relação entre as letras da sílaba, são chamados
gestos, ritmo e canto, que irão contribuir para esta aprendizagem.
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O método
analítico ou global parte da palavra, frase ou conto, sendo estes
considerados como unidade que será dividida em elementos mais básicos. Utiliza
uma pedagogia ativa, sendo a criança o principal agente da aprendizagem. Pode
ser dividido em palavração, sentenciação e global. Na palavração, parte-se da
palavra. O primeiro contacto é com os vocábulos numa sequência que engloba
todos os sons da língua, e, após a aquisição dum certo número de palavras,
inicia-se a formação de frases. Na sentenciação, a unidade inicial da
aprendizagem é a frase, que é dividida em palavras, donde são extraídos os
elementos mais simples: as sílabas. E, no global, há várias unidades de leitura
com início, meio e fim, ligadas por frases com sentido para formar enredo de
interesse para a criança.
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O método
das 28 palavras, considerado um método analítico, parte da palavra como
um todo, sem analisar previamente os seus elementos. São apresentadas 28
palavras, que seguem uma ordem lógica e vão sendo lidas e escritas pelos alunos
e, mais tarde, são analisadas apenas até à sílaba. Posteriormente, a palavra é
dividida em sílabas; e, a seguir, os alunos reordenam as sílabas, de modo que
as palavras fiquem na forma original. E, estando os alunos familiarizados com
as três primeiras palavras, cabe ao professor decompô-las para chegar às
vogais. O método é bastante produtivo e eficaz, quando os alunos revelam
dificuldades na aprendizagem, pois as palavras são de uso do quotidiano da
criança, partindo do concreto que ela já conhece.
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O método
natural pertence à categoria de método global, levando a considerar, na
aquisição da leitura, três fases: perceção global, análise e síntese. Na
iniciação à leitura e escrita, não são usados os livros com histórias, mas
frases que vão sendo escritas no quadro pelo professor, de acordo com os interesses
dos alunos e recolhidas em conversas espontâneas entre os mesmos. A partir
destas conversas, surgem atividades como: ilustrações, diálogos, uso do
dicionário, entre outras. Daí resultam pequenos textos que formam o livro que será
objeto de estudo da turma. É dos mais educativos, pois permite que a criança
aprenda a ler a seu jeito, através de experiências pessoais, que a levam a
utilizar diretamente na vida o que lê e escreve.
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Os métodos
mistos surgiram pela incerteza de que a aplicação dum método puro seria
o ideal e pela verificação das diferentes características dos alunos e das
turmas. Contudo, verifica-se que o aluno que utiliza o processo analítico para
a análise duma palavra deve saber como utilizar as novas letras que descobriu,
de forma a conseguir formar novas palavras. Contrariamente ao processo
analítico, o aluno que aprendeu a sintetizar as sílabas de modo a conseguir
formar palavras, tem de conseguir descobrir como é formada as palavras surgidas,
de forma a conseguir decifrá-la. Assim, os métodos mistos tentam integrar o
método sintético e o método global, de sorte que tanto a análise como a síntese
fossem perspetivadas como processos contínuos.
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Na vertente dos métodos mistos, surge o método analítico-sintético, utilizado
na atualidade e presente na maioria dos manuais escolares do 1.º ano do 1.º
Ciclo do Ensino Básico. Pode ser aplicado de dois modos: partindo de palavras
ou frases, passando para a análise dos elementos que compõem as estruturas
linguísticas complexas (processo analítico ou global), dando azo ao método
analítico-sintético de orientação global; ou partindo das vogais, que são
associadas, em seguida, às consoantes, formando sílabas, que, combinadas,
originam as palavras (processo sintético), dando azo ao método analítico-sintético
de orientação sintética.
-
O Movimento
Escola Moderna (MEM) adota um método de alfabetização que consiste em
realizar como primeira abordagem o registo de produções orais e posterior
leitura pelo professor para levar os alunos a compreender que a escrita tem uma
função comunicativa e para que os ouvintes possam verificar se o que foi dito
corresponde ao registado. Inicia-se o processo com a recomposição do texto
recortado em palavras, combinatória de sílabas, substituição e comutação de
letras (atividades
para desenvolver outras competências necessárias à leitura). E recorre-se a instrumentos de
apoio com vista à sua influência positiva e porque permitem que o aluno tenha,
face às suas necessidades, o seu ritmo e realize na aula, durante o trabalho de
estudo autónomo, o treino pessoal indispensável. Usam-se suportes idênticos de
escrita e não manuais de leitura, pois ler é compreender o sentido dos escritos
sociais que nos envolvem. A compreensão surge na produção do trabalho que se
realiza em atos de escrita e leitura funcionais. Não se separam fala, escrita e
leitura; são atividades simultâneas que levam os alunos a criar e a desenvolver
comportamentos ativos de construção inteligente de significados; pela partilha,
os alunos apropriam-se da gramática do texto; realizam-se projetos que permitem
experimentar diferentes tipos de escrita; e os alunos ajudam o professor a
direcionar o trabalho a finalidades e estratégias que orientem à produção de
tipos de escrita e leitura diversificados.
***
Com
tudo isto, não se percebe como tantos/a alunos/as chegam ao 5.º ano a não saber
ler!
Pensar,
ouvir, falar, observar, ler, escrever, pesquisar, associar e contar ainda são competências
a adquirir e treinar na escola…
2021.09.22 – Louro de Carvalho
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