quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Ao agravamento da pandemia responde a declaração de calamidade

 

Ocorreu, neste dia 14 de outubro, uma sessão do Conselho de Ministros para discutir a conveniente resposta ao aumento dos contágios de covid-19, quando o número diário de novos casos suplanta os valores de abril, no pico da primeira vaga da pandemia.

A sessão estava agendada para o dia 15, mas foi antecipada, dado que o Primeiro-Ministro estará em Bruxelas, nesse dia, para apresentar o Plano de Recuperação e Resiliência.

Na verdade, desde o início de outubro, o número de contágios diários ultrapassou, de forma consistente, o aumento recorde que se registou nos últimos dias de março e nos primeiros dias de abril, pois a média semanal, que em outubro já está acima dos mil casos por dia, suplantou a que era, até agora, a pior semana da pandemia: 28 de março a 3 de abril. Porém, se os novos casos aumentaram imenso, os demais indicadores estão longe dos do estado de emergência, pois, na 2.ª semana de abril, a média dos 7 dias anteriores apontava para 32 mortes quando, agora, está nas 11. De modo similar acontece com os internamentos em cuidados intensivos, que chegaram a atingir a média de 255, no início de abril, ao passo que agora estão em cerca de 120.

Mesmo assim, neste contexto, o Governo vem reforçar as medidas de combate à pandemia de covid-19, passando todo o país do estado de contingência, em que se encontra, para o estado de calamidade, em que se encontrou imediatamente a seguir ao estado de emergência.  

É de recordar que a situação de calamidade é a situação de maior risco prevista na Lei de Bases da Proteção Civil (Lei n.º 27/2006), seguindo-se às situações de alerta e de contingência. Mas o Governo entendeu necessário proceder à sua declaração, o que implica uma série de novas medidas de mitigação, pelo facto de a situação de pandemia estar a registar em Portugal uma “evolução grave”, como afirmou Costa, nesta tarde, após a reunião do Conselho de Ministros. 

Como medidas inteiramente novas, o Governo, como anunciou o Primeiro-Ministro, vai apresentar no Parlamento uma proposta que torne obrigatório o uso de máscara nas ruas e agravará as multas por incumprimento até dez mil euros. Por outro lado, será de uso obrigatório a aplicação StayAwayCovid nalgumas circunstâncias, por exemplo para as forças de segurança, forças armadas, escolas e em ambiente laboral. Ademais, o número de participantes em eventos de natureza familiar, como casamentos ou batizados, terão uma lotação máxima de 50 participantes e estão proibidos os festejos académicos, como praxes de receção aos novos estudantes universitários, e os ajuntamentos na rua não poderão ter mais de cinco pessoas.

Em síntese, são oito as medidas novas para fazer face à “evolução grave” da pandemia: elevação do nível de alerta para estado de calamidade, habilitando o Governo a adotar, sempre que necessário, as medidas que se justifiquem para conter a pandemia, desde as questões de circulação a outras; proibição, a partir das 24 horas deste dia 14 de outubro, dos ajuntamentos de mais de cinco pessoas, aplicando-se o mesmo na restauração; limitação dos eventos de natureza familiar, como casamentos ou batizados, a um máximo de 50 participantes; proibição dos festejos académicos (por exemplo, praxes) em todos estabelecimentos de ensino; determinação às forças de segurança e ASAE do reforço de fiscalização na via pública e nos estabelecimentos comerciais e de restauração; agravamento até dez mil euros de coimas a pessoas coletivas que não cumpram as regras; viva recomendação a todos os cidadãos do uso de máscara comunitária na via pública sempre que haja outras pessoas na via pública e utilização da aplicação StayAwayCovid; e apresentação imediata na Assembleia da República de uma proposta de lei para que seja imposta obrigatoriedade de uso de máscara na via pública e as regras da utilização obrigatória da aplicação StayAwayCovid (de duvidosa constitucionalidade).

O Chefe do Governo aproveitou o ensejo para reiterar apelos à “responsabilidade individual”, pois “depende de cada um de nós o sucesso no combate à pandemia”.

No quadro dos comportamentos errados que têm agravado a pandemia, apontou “uma perceção errada nas camadas mais jovens” de que os riscos são “menores” e um certo “deslaçamento” da aplicação das regras impostas aos restaurantes. Com efeito, como disse, foram sendo atenuadas com o decorrer do tempo as regras nos estabelecimentos e restaurantes, sendo preciso avivar a memória para elas, visto que é preciso cumpri-las para evitar que esses estabelecimentos voltem a fechar portas. E, quanto às novas limitações nos eventos familiares (casamentos e batizados), afirmou que isso ocorre porque se tem verificado que “têm sido um foco de contaminação”. Porém, esclareceu que estas medidas “não se aplicam imediatamente, aplicam-se a todos os que sejam marcados a partir de hoje”, porque, “infelizmente, a covid não se afasta dos casamentos e dos batizados” e, assim, “os convidados têm de manter o recato”.

Interpelado pelos jornalistas, revelou algumas medidas que o Governo não tenciona tomar, pelo menos no imediato, a saber: fechar a fronteira com a Espanha; mudar as regras sobre o teletrabalho; e estabelecer novas medidas sobre horários laborais.

Garantiu que o SNS ainda está com capacidade de resposta e que até se pode “alargar o número de camas se tal se vier a justificar”, só havendo “situação de descontrolo quando não houver capacidade de resposta”. Todavia, em nome da responsabilidade individual, avisou:

Não podemos estar à espera de que seja o SNS a conter a pandemia. O que o SNS pode fazer é tratar quem está doente. O controlo da pandemia depende de nós individualmente e de todos nós em conjunto. Quando as pessoas chegam ao SNS, é porque já estão contaminadas ou porque já estão doentes.”.

Considerando que “mais do que a lei, mais do que a fiscalização das autoridades é a fiscalização da nossa própria consciência que se impõe”, apelou:

Motivemo-nos naquilo que tem de ser a prioridade muito clara: preservarmos a capacidade do nosso Serviço Nacional de Saúde, assegurar que as atividades letivas vão prosseguir ao longo de todo o ano letivo sem interrupções nem incidentes e que não vamos ter de tomar nenhuma medida que agrave a crise económica e social que estamos a viver e que tem consequências desde já muito pesadas no emprego e no rendimento das famílias.

Pedindo que se vença o cansaço pela determinação que é preciso ter para ganhar “esta maratona, que é longa e que só terminará quando houver um tratamento eficaz ou uma vacina suficientemente difundida para assegurar a imunização comunitária”, instou:

Apelo a todos a que adotemos estes comportamentos e é só para os enquadrar que elevamos a situação de alerta para calamidade, que reforçamos as coimas e que apresentaremos a proposta de lei à Assembleia da República para tornar obrigatório o uso da máscara ou da aplicação”.

Tratando-se de um vírus novo, que a ciência ainda conhece insuficientemente, designadamente sobre as sequelas que pode deixar na saúde de cada um que seja infetado, disse que, nesse desconhecimento, “não podemos desvalorizar o risco futuro para a saúde de cada um de nós”.

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A par destas medidas, foi publicada, neste dia 14, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 87/2020, de 14 de outubro, com as novas orientações e recomendações relativas à organização do trabalho na Administração Pública, que contempla o desfasamento de horários visando reduzir os riscos de transmissão de covid-19, definindo orientações para os empregadores públicos no sentido de serem implementadas regras de desfasamento dos horários de entrada e saída dos trabalhadores nos locais de trabalho, para diluir “aglomerações ou ajuntamentos de pessoas em horas de ponta concentradas”.

Neste contexto, o documento releva que “importa prever a possibilidade de adoção de outros métodos de trabalho, com vista à redução do contágio, como o regime de teletrabalho sempre que a natureza da atividade o permita e a constituição de equipas estáveis, de modo a restringir o contacto entre trabalhadores”. E vinca:

É necessário garantir que as orientações destinadas aos empregadores públicos são norteadas por um parâmetro de adequação e proporcionalidade, no sentido de serem definidas regras de duração mínima e máxima dos intervalos de desfasamento, bem como de periodicidade da alteração de horário e de garantia de um período de estabilidade.

Por fim, clarifica que “a alteração de horário não pode causar prejuízo sério ao trabalhador” e que importa “definir as categorias de trabalhadores que beneficiam de proteção em matéria de alteração de horários, de modo a garantir a proteção dos trabalhadores que fazem parte de grupos de risco ou que se encontram em situação mais vulnerável”.

Na conferência de imprensa subsequente ao Conselho de Ministros que aprovou o documento, a Ministra de Estado e da Presidência referiu que esta resolução contempla a aplicação das regras sobre o desfasamento de horários no setor privado, com as devidas adaptações, ao setor público.

Mais disse Mariana Vieira da Silva que as distinções são relativas ao tipo de serviço prestado, acrescentando, no entanto, não existir “nenhuma diferença substancial na aplicação das regras do desfasamento horário”. Assim, tal como prevê o Decreto-Lei n.º 79-A/2020, de 1 de outubro, sobre o desfasamento horário no setor privado, que obriga as empresas com mais de 50 trabalhadores a proceder a esta alteração, também o mesmo sucederá nos serviços públicos com mais de 50 funcionários. O empregador “pode alterar os horários de trabalho até ao limite máximo de uma hora, salvo se tal alteração causar prejuízo sério ao trabalhador”, mediante “consulta prévia aos trabalhadores envolvidos e à comissão de trabalhadores ou, na falta desta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais”. A alteração do horário deve ser comunicada ao trabalhador “com antecedência mínima de 5 dias relativamente ao início da sua aplicação”, prevendo-se as situações em que os trabalhadores estão dispensados de aceitar esta alteração de horário, bem como aquelas em que podem invocar prejuízo sério.

O diploma indica que as empresas devem privilegiar “a estabilidade dos horários” prevendo que o empregador não pode efetuar mais do que uma alteração por semana e que a alteração do horário de trabalho não pode exceder os limites máximos do período normal de trabalho nem a alteração da modalidade de trabalho de diurno para noturno e vice-versa.

A alteração ao horário não pode causar prejuízo sério ao trabalhador, designadamente, pela inexistência de transporte coletivo de passageiros que permita cumprir o horário de trabalho em razão do desfasamento ou pela necessidade de prestação de inadiável e imprescindível assistência à família, e deve “manter-se estável por períodos mínimos de uma semana, não podendo o empregador efetuar mais de uma alteração por semana”.

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Também a DGS atualizou a norma sobre a “Abordagem do Doente com Suspeita ou Infeção por SARS-CoV-2”, nos termos da qual um caso ligeiro ou um assintomático fará um isolamento de 10 dias. Isto desde que o doente não tenha estado a tomar medicamentos para a febre e apresente evolução positiva dos sintomas nos 3 dias que antecedem o fim do isolamento. Excetuam-se os doentes imunodeprimidos e os doentes graves, cujo isolamento será de 20 dias.

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Enfim, o vírus continua a ser forte e séria ameaça e exige cuidados redobrados, mas não pode impor o medo a ninguém!

2020.10.14 – Louro de Carvalho

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