Um casal foi
filmado a praticar relações sexuais na praia fluvial do Tabuão, a 10 de junho (de acordo
com informação do DN de 15 de junho), enquanto uma criança de seis anos, filha da mulher
de 41 anos, se mantinha sentada na relva ao lado, mostrando aparente
indiferença em relação ao comportamento dos dois adultos. As imagens,
recolhidas num vídeo de 10 minutos por um popular e publicadas no Facebook, rapidamente se tornaram
virais, acabando um “internauta” de Sines por as visualizar e ligar para o
posto da GNR de Paredes de Coura a denunciar o caso.
A
GNR levantou o auto de notícia e participou o caso à PJ (Polícia
Judiciária), por ser
crime público envolvendo uma menor e tendo o vídeo sido divulgado na internet.
A Comissão
de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Guimarães, no intuito de salvaguardar o superior interesse da criança,
promoveu o seu afastamento temporário, bem como o do irmão de 9 anos, com o consentimento
dos progenitores, mas recusando revelar a quem a entregou e, garantindo, no
entanto, que “os interesses dela foram salvaguardados em função de uma decisão
da Comissão que é, naturalmente, provisória”.
Pedro Ivo
Lobo, presidente da CPCJ, declarou, a este respeito, preferir defender “o direito
das crianças à privacidade”, considerando pouco relevante estar a menina entregue
“a familiares, a vizinhos ou a alguma instituição”, mas diz estar a ser seguido
o “quadro legal que envolve as três entidades competentes” – CPCJ, PJ e
Ministério Público (MP).
Tratando-se
de crime público a PJ teria de investigar e, segundo consta, terá identificado
os três intervenientes no vídeo (dois, pois a criança parecia indiferente
a tudo). Sabe-se também que a mulher tem
41 anos, reside num bairro social, em Guimarães, estava sinalizada pela CPCJ
daquele concelho há um ano, depois de lhe ter sido retirado um dos filhos, com
13 anos, que seria institucionalizado devido à falta de condições da mãe para
tomar conta dele. Mais: a mulher tem cinco filhos: dois maiores de idade, duma
primeira relação; e três menores (de 13, 9 e 6 anos), dum casamento que terminou há um ano, correndo o
risco de ficar sem a tutela dos outros dois filhos menores.
A
comunicação Social deu conta à opinião pública de que já há pessoas constituídas
arguidas, depois de o casal se ter deslocado às instalações da PJ de Braga,
onde continua a decorrer a investigação, para prestar esclarecimentos sobre o
que aconteceu no passado dia 10 de junho.
Fonte judicial terá adiantado que “o casal não
será presente a um juiz”, para primeiro interrogatório judicial, “uma vez que
já foram ouvidos na PJ”.
As
autoridades não revelam quem são os arguidos, mas dizia-se que o homem e a
mulher estão indiciados pelo crime de importunação sexual sobre menor de 14
anos – a criança tem seis – incorrendo numa pena que vai até três anos de
prisão. Fonte da PJ terá admitido que não deverá haver lugar a uma moldura penal
mais pesada, pois, segundo a análise das imagens, a criança “não sofreu qualquer
tipo de ato sexual de relevo”, embora o episódio se enquadre no crime de “abuso
sexual” por parte da mãe e do companheiro.
Também os
autores do vídeo e da sua publicação na Internet poderão ter de enfrentar a
justiça, pois, segundo fonte policial, incorrem no crime de devassa da vida
privada e de gravações ou fotografias ilícitas.
O processo
judicial corre no MP de Viana do Castelo.
***
Entretanto,
na última página do JN, do dia 16 de junho, vem a informação de que o MP abrira
“dois processos relacionados com o vídeo da mulher de Guimarães filmada a ter relações
sexuais à frente da filha de seis anos, na passada terça-feira em Paredes do
Coura” (Não terá
sido sexta-feira?). E da Procuradoria-Geral
Distrital do Porto (estamos a falar de distrito judicial) vem a indicação de que o caso pode integrar “a
prática de infração criminal de natureza pública, nomeadamente a de abuso
sexual de crianças” sob a forma de importunação.
A seguir,
pode ler-se que, “para já, apenas a mulher foi constituída arguida pela PJ”,
pois “o namorado alegou desconhecer que a menina estava ali”. Assim, é considerado
“testemunha”.
A par disto,
foi requerida, em articulação com a CPCJ de Guimarães, a “abertura de processo
judicial de promoção e proteção dos direitos da criança envolvida”.
***
Ninguém nos passa
procuração para zelar pelos direitos das mulheres ou acusar os homens. Não obstante,
impõe-se-nos o dever de atitude política cidadã.
Desde já me
pergunto porque é dada à e pela Comunicação Social pormenorizada identificação
da mulher e nada de relevante do coautor do presumido crime. Se é namorado,
deveria conhecer-se, por critérios de equidade, quem é, onde mora e o que faz. Ou,
por ser homem, terá direito à preservação da identidade? Uma relação sexual é
ação de duas pessoas, pelo menos.
Depois, a
mulher já foi constituída arguida, mas o “namorado” não. É que este alegou que
não sabia que a criança ali estava. Quer dizer que a criança apareceu ali de
repente, que a mulher a tinha escondida, que estava de olhos vendados por assim
ali ter chegado ou por a mulher lhe ter posto a venda de imediato? Fica para
testemunha para dizer o quê, se não viu que a criança ali estava. Se não viu a criança,
que viu? Viu a mulher? Certamente que não viu pessoas, árvores, relva, água,
pedras, rio… E ou viu o quê e quem? Será testemunha de quê ou de quem?
Podem dizer-me
que é a lei que determina que um alegado cúmplice, quando não é arguido, passa
automaticamente a testemunha. Se efetivamente assim for, esse ponto de lei não me
merece consideração, mas necessária mudança. E como é que a PJ acredita que o
homem não viu a criança ou que não sabia que era filha da senhora? Entrou de súpito
em aventura?
O arguido
pode escorar-se no silêncio e não falar. A testemunha tem de dizer a verdade e
só a verdade. Mas isso é depois de ajuramentada. E quem garante que esta
putativa testemunha vai dizer a verdade, se nem sequer viu a criança?
Por fim,
pergunto-me porque não foi requerido, de imediato, processo autónomo contra os
indivíduos que filmaram o ato e o postaram para as redes sociais. São valores
diversos que estão em jogo num mesmo episódio; devem ser protegidos em simultâneo.
É certo que não será fácil demonstrar atuação contra a privacidade de outrem,
uma vez que o caso que deu origem à filmagem fora praticado em sítio não reservado
– uma praia fluvial.
***
Por outro
lado, a disparidade de tratamento de homem e mulher no caso vertente, quanto a identificação
e constituição de arguido/a faz-me reportar a tempos que pensava ultrapassados.
Entre os judeus, o marido podia passar libelo de repúdio à esposa; mas a mulher
não procedia de igual modo para com o marido. Em caso de adultério, a mulher
seria lapidada; do cúmplice nem se falava. Coisa que até um criado considerado
demente estranhou, como se verá a seguir:
(Era o Sr. Joaquim um engraçado empregado
de seminário, mas com acentuada falha mental. Nos tempos livres convivia com os
alunos a quem divertia com histórias interessantes pelos comentários que
intercalavam. O presente discurso, de 1971, foi proferido, de cima duma pedra a
servir de púlpito, em momento em que os seminaristas esperavam o autocarro que
a associação do Coração de Jesus fretara para os transportar a cerimónia na
Catedral. Releva a coincidência que alguns estabeleceram, quem sabe se com
razão, entre a adúltera e Maria Madalena; e na sua “amência” denota a
perspicácia que não raro escapa aos inteligentes da ordem social. Transcreve-se
“ipsis verbis”, na linguagem beira-duriense, de acordo com os registos patentes
em velho caderno já coçado do tempo, apenas colocando pontuação pertinente e
aspando as palavras de significado dúbio a nível regional.)
Caríssimos irmãos, piedosos cristãos!
O Evangelho tem coisas
maravilhosas. E então o de São João é de se lhe tirar o chapéu, que é o que eu
faço sempre, porque eu não sou como os outros, os que não têm religião.
Vou falar-vos da
adúltera Madalena. Como sabeis, o adultério vai contra todas as leis divinas e
humanas, é um pecado muito grande, tão grande que nem cabe na terra nem no céu
nem no próprio inferno. Eu, meus irmãos, garanto-vos que, para bem da minha
alma, antes queria mil vezes ter relações com quinze raparigas solteiras uma
vez em cada mês, que uma só vez em dez anos com uma mulher casada.
Mas vamos ao ponto do
nosso sermão:
Um dia estava Nosso
Senhor a ensinar no templo de Jerusalém. As pessoas estavam “apalermadas” a
ouvi-lo. Ele falava muito bem, muito melhor que os senhores padres de agora:
alguns até nem sabem o que estão a dizer. E pregava de graça, ninguém tinha que
lhe pagar. Ele estava a ensinar.
De repente, ouviu-se
um barulho muito grande. O caso não era para tanto. Os sacerdotes traziam de
rastos uma mulher apanhada em "fragrante" adultério. O que é que os padres
andariam a fazer para a apanharem em "fragrante"! E o outro, o homem? Que eu
saiba a mulher, para fazer adultério, não estava sozinha, tinha que estar com
um homem! Já sei. Deixaram-no fugir por camaradagem: “Raspa-te, antes que seja
tarde”!
Pois aqueles homens,
que mal “ofegavam” por causa da pressa, por apanharem Jesus ainda a falar (para
lhe pregarem uma valente partida) e do cansaço, porque a mulher era pesada e
resistia, berraram:
– Mestre, nós
apanhámos esta mulher em "fragrante". Segundo a Lei de Moisés, ela deve morrer.
Temos de lhe “arrumar” com pedras. Tu que dizes?! Se ela não fosse apanhada,
não tinha mal, mas foi apanhada...
Nosso Senhor olhou bem
para ela e para eles. E disse:
– Aquele que estiver
sem pecado “arrume-lhe” a primeira pedra!
E agachou-se e pôs-se
a escrever com o dedo na areia. O que ele escrevia não sei. Eu não vi. E, se
visse, não me valia de nada: eu não sei ler, sou “alfabético”. Depois, ele estava a
escrever na areia dentro do templo. Aquilo era como a cabeça de muitos homens
de agora: cheia de areia.
Os homens olhavam,
espreitavam e iam saindo um de cada vez, quem sabe se a pensar nas malandrices
que tinham feito e que o Mestre estava a escrever no chão... Jesus ergueu-se e
viu que Madalena estava sozinha. Virou-se para ela e perguntou:
– Então, Madalena,
ninguém te “arrumou”?
– Não, Senhor! –
Respondeu Madalena – Ninguém me “arrumou”!
Então Jesus acabou:
– Pois não, Madalena,
ninguém te “arrumou”: o único que te podia “arrumar” era eu. Mas, já que
ninguém te “arrumou”, eu também não te “arrumo”. Madalena, vai em paz. Vai à
tua vida e não tornes a pecar!
E ela foi-se embora e
Nosso Senhor não lhe “arrumou”. Não lhe “arrumou” pedras, é claro!...
***
Parece que,
estando em junho de 2016, ainda não estamos no século XXI, terceiro milénio!
Será que, no
caso do par filmado em Paredes do Coura, o “namorado” ainda poderá alegar que
não estava lá? E, se alegar, será considerado deponente fidedigno por ser
homem? Não será, ao menos, tão sexopata como a mulher?
2016.06.18 – Louro de Carvalho
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