No passado dia 4 de junho, o Santo Padre Francisco recebeu em
audiência os participantes da Assembleia das Pontifícias Obras Missionárias e demais
colaboradores da Congregação para a Evangelização dos Povos – a quem agradeceu “pelo
seu precioso serviço à missão da Igreja, que é levar o Evangelho a cada criatura (Mc 16,15).
Fazem
parte do conjunto das POM (Pontifícias Obras Missionárias) a Pontifícia Obra
para a Propagação da Fé, a Pontifícia Obra de São Pedro Apóstolo, a Pontifícia
Obra para a Infância Missionária e a Pontifícia União Missionária. De
entre elas destaca-se – pela sua história e preponderância – a PUM (Pontifícia União Missionária),
em cujo centenário ocorreu a predita assembleia das POM.
***
Enquanto serviço especial das POM (Pontifícias Obras Missionárias), a PUM visa
a sensibilização, formação e informação missionária dos sacerdotes, religiosos
e religiosas, dos aspirantes ao sacerdócio e à vida religiosa, bem como das
demais pessoas que se implicam na animação e ministério pastoral da Igreja. O
resultado da atividade das outras POM dependerá, em muito, da vitalidade da PUM,
já que se deve sobretudo àqueles e àquelas a quem ela se dirige “a existência
constante de um vivo espírito missionário nas comunidades cristãs”. Como alma das outras Obras, leva as pessoas que a
integram a suscitar o espírito missionário nas comunidades cristãs e a incrementar
a cooperação missionária. Originariamente denominada UMC (União
Missionária do Clero: abriu-se aos religiosos e demais servidores da Igreja a 14.7.1949), a PUM almeja sobretudo “a cultura missionária dos
sacerdotes para, com o exemplo e a palavra, se interessarem pela Missão e
poderem iluminar o povo...” (Pe. Paulo Manna, o inspirador e fundador). Com efeito, o número dos que ignoram Cristo e não integram
formalmente a Igreja não para de aumentar, até quase duplicou desde o final do
Concílio Vaticano II. Ora, a urgência da missão torna-se agora mais evidente em
função e em prol desta imensa humanidade, amada pelo Pai a ponto de lhe enviar
o seu Filho. Em contrapartida, a nossa época oferece, neste âmbito, novas
oportunidades e campos de ação à Igreja, verdadeiros sinais dos tempos: a queda
de ideologias e sistemas políticos opressivos; o aparecimento dum mundo mais
unido, graças ao incremento das comunicações; a afirmação, crescente entre os
povos, dos reais valores evangélicos que Jesus encarnou na sua vida, como paz,
justiça, fraternidade, dedicação aos pequenos; e um tipo de desenvolvimento
económico e técnico sem alma, que vem criando, em contrapartida, a necessidade
da verdade sobre Deus, o homem e o significado da vida. Deus abre, pois, à
Igreja, os horizontes duma humanidade mais preparada para a sementeira evangélica,
como refere, na encíclica Redemptoris
Missio (Missão do Redentor), João
Paulo II, que sentia “chegado o momento de empenhar todas as forças eclesiais
na nova evangelização e na missão ad
gentes”. Assim, “nenhum crente, nenhuma instituição da Igreja pode
esquivar-se deste imperativo supremo: anunciar Cristo a todos os povos” (cf RM, 3). E à Igreja, que teve de sofrer por esta causa,
também lhe provoca sofrimentos a verificação da causa da falta de missionários:
a ignorância da dimensão missionária dos padres, que, absorvidos nas suas
múltiplas atividades pastorais, não percebem a urgência além de suas
fronteiras.
Por isso, os
factos fizeram conceber, “não sem uma inspiração do alto” (no dizer de Paulo
VI), a UMC ou PUM como estímulo a
todos os padres para socorrer as necessidades da missão. Em todo este processo
de maturação, foi providencial a colaboração de Dom Guido Conforti, Bispo Parma
e fundador dos Xaverianos, que foi o seu primeiro presidente, de 1917-1927. Em
1956, por ocasião dos seus 40 anos de existência, Pio XII elevou-a a PONTIFÍCIA
(28.10.1956). Paulo VI
diz que é “a alma das demais Obras Missionárias”, “apta para fomentar principalmente
uma intensa espiritualidade missionária” (Graves et
Increscentes, 27).
***
Sobre o fundador da PUM, o Beato Padre Paolo Manna (1872-1952) colhem-se alguns dados da biografia divulgada aquando da beatificação
por João Paulo II, a 4 de novembro de 2001.
Nasceu em
Avelino (Itália), a 16 de
janeiro de 1872. Frequentada a escola primária e o ensino técnico em Nápoles, prosseguiu
os estudos a Roma. Enquanto frequentava a Universidade Gregoriana para estudos
de Filosofia, em setembro de 1891, entrou no Seminário do Instituto para as
Missões Estrangeiras em Milão, a cursar Teologia, tendo sido ordenado sacerdote
no dia 19 de maio de 1894, na Catedral de Milão.
A 27 de setembro de 1895, partiu para a Missão de
Toungoo, na Birmânia Oriental (hoje, Myanmar), onde
trabalhou em três períodos durante uma década até que, em 1907, se repatriou
definitivamente, mercê de grave enfermidade.
De 1909 em diante, por mais de 40 anos, dedicou-se com
todas as forças, mediante os escritos e obras, à difusão da ideia missionária
no meio do povo e do clero. Para “resolver do modo mais radical possível o
problema da cooperação dos católicos no apostolado”, fundou, com a aprovação e
Bento XV, a 31 de outubro 1916, a
União Missionária do Clero, hoje presente em todo o mundo católico e que inclui
nas suas fileiras, seminaristas, religiosos, religiosas, leigos e leigas, elevada
por Pio XII a Pontifícia (PUM), em 1956,
tornando-se a 4.ª das POM, ao lado da Obra da Propagação da Fé, da Obra da
Infância Missionária e da Obra de São Pedro Apóstolo – estas já Pontifícias,
desde 1922.
Como diretor de Le
Missioni Cattoliche desde 1909, fundou, em 1914, o folheto popular de
grande difusão Propaganda Missionária
e, em 1919, Itália Missionária,
dedicada à juventude.
Por incumbência da Sagrada Congregação de Propaganda Fide, abriu em Ducenta (Caserta), para um maior desenvolvimento missionário do Sul da
Itália, o Seminário Meridional Sagrado
Coração, para as Missões Estrangeiras, projeto que encorajava desde há
muito tempo.
Em 1924, foi eleito Superior-Geral do Instituto para
as Missões Estrangeiras de Milão, que em 1926, pela união com o Seminário
Missionário de Roma, por vontade de Pio XI, se tornou o PIME (Pontifício Instituto para as Missões Estrangeiras). Por
mandato da Assembleia Geral do PIME (1934), participou,
em 1936, na fundação das Missionárias da
Imaculada.
De 1937 a 1941, a Sagrada Congregação de Propaganda Fide nomeou-o chefe do Secretariado Internacional da União
Missionária do Clero. E, quando, em 1943, foi erigida a Província
Meridional do PIME, Padre Manna tornou-se o seu primeiro Superior, transferindo-se
assim para Ducenta, onde fundou Venga il
tuo Regno, publicação missionária para as famílias.
Além disso o fundador da UMC escreveu vários opúsculos
e livros, que deixaram uma marca duradoura, como Operarii autem pauci, I
Fratelli separati e noi, Le nostre
Chiese e la propagazione del Vangelo e Virtù
Apostoliche. Apresentou propostas inovadoras acerca dos métodos missionários,
antecipando o Concílio Vaticano II. Destas obras permanece, sobretudo, o exemplo
duma vida animada por uma paixão missionária total que provação alguma ou
doença jamais diminuiu, por mais que o tenha feito sofrer. G. B. Tragella, seu
primeiro biógrafo, definiu-o justamente como “uma alma de fogo”. O seu lema – “Toda a Igreja, para o mundo inteiro!” –
acompanhou-o até ao fim. Falecido em Nápoles, a 15 de setembro de 1952, os seus
restos mortais repousam em Ducenta, no “seu Seminário”, que em 13 de dezembro
de 1990 foi visitado pelo Papa João Paulo II.
Os procedimentos para a Causa de Beatificação,
iniciados em Nápoles, em 1971, concluíram-se em Roma, a 24 de abril de 2001,
com o decreto pontifício sobre o milagre atribuído ao Beato.
Foi
beatificado com outros sete Bem-Aventurados. O Papa São João Paulo II disse na
homilia da Celebração Eucarística disse:
“Também no
Padre Paulo Manna nós percebemos um reflexo especial da glória de Deus. Ele
consumiu a inteira existência pela causa missionária. Em todas as páginas dos
seus escritos sobressai viva a pessoa de Jesus, centro da vida e razão de ser
da Missão. Numa das suas Lettere ai
Missionari (cartas aos missionários), afirma: ‘O missionário, de facto, não
é nada, se não se revestir da pessoa de Jesus Cristo.[...] Só o missionário que
copia fielmente Jesus Cristo em si mesmo [...] pode reproduzir a Sua imagem nas
almas dos outros’ (Lettere 6). Na realidade, não existe Missão sem santidade,
como insisti na Encíclica Redemptoris
Missio (A Missão do Redentor): ‘A espiritualidade da Igreja é um caminho
para a santidade. Faz-se necessário suscitar um novo ardor de santidade entre
os missionários e em toda a comunidade cristã’ (RM, 90). [...] O exemplo deles
e a sua poderosa intercessão proclamam, com efeito, o anúncio da salvação
oferecida por Deus a todas as pessoas em Cristo. Acolhamos o testemunho deles,
servindo, de nossa parte a Deus, ‘de modo louvável e digno’, para caminhar,
assim, sem impedimentos, para os bens prometidos (cf Coleta). Amém!”.
***
No seu discurso de 4 de junho, Francisco
reconhece que o Espírito
Santo, através da intuição de Paulo Manna e da mediação da Sé Apostólica,
conduziu a Igreja a “uma consciência sempre maior da própria natureza missionária,
que amadureceu a partir do Concílio Vaticano II”. Paulo Manna, no dizer do
Papa, “compreendeu muito bem que formar e educar no mistério da Igreja e na sua
intrínseca vocação missionária é uma finalidade que diz respeito a todo o povo
de Deus, na variedade dos estados de vida e dos ministérios”. A este propósito,
o fundador da Obra pronunciava-se no II Congresso Internacional da UMC nos seguintes
termos:
“Das tarefas da União Missionária,
algumas são de natureza cultural, outras de natureza espiritual, outras para finalidades
práticas e organizativas. A União Missionária tem a tarefa de iluminar,
inflamar, agir organizando os sacerdotes, e através deles, todos os fiéis, com
vista às missões”.
Todavia,
formar bispos e padres para a missão não significava reduzir a PUM a uma
realidade meramente clerical, mas torná-la apoio à hierarquia no serviço à missionariedade
da Igreja, própria de todos: fiéis e pastores, casados e virgens consagrados,
Igreja universal e Igrejas particulares. Oferecendo este serviço com a caridade
que lhe é própria, os Pastores mantêm a Igreja, sempre e em toda a parte, em
estado de missão, que é, em última análise, obra de Deus, participada por todos
os fiéis, graças ao Batismo, à Confirmação e à Eucaristia.
Na ótica
papal, é a missão que faz a Igreja e “a mantém fiel ao desejo salvífico de Deus”.
Por consequência, embora seja importante a preocupação com a arrecadação e
distribuição das ajudas económicas administradas em favor de tantas igrejas e
cristãos necessitados, é necessário não se limitar a Obra somente a este aspeto.
A este respeito, o Pontífice adverte:
“Necessita-se de uma ‘mística’.
Devemos crescer em paixão evangelizadora. Eu tenho medo – confesso – de que a vossa
obra permaneça muito organizacional, perfeitamente organizativa, mas sem
paixão. Isso até uma ONG pode fazer, mas vocês não são uma ONG! A União sem paixão
não serve; sem ‘mística’ não serve. E, se devemos sacrificar algo,
sacrifiquemos a organização, prossigamos com a mística dos Santos.”.
Segundo o
Papa, a União Missionária necessita da mística dos Santos e dos Mártires, que
motiva o generoso trabalho de formação permanente para a missão, que não é um
curso apenas intelectual, mas que tem de ser efetivamente inserido nesta onda
de paixão missionária, testemunho e martírio. E as Igrejas de recente formação “poderão
transmitir às Igrejas de antiga fundação, às vezes sobrecarregadas pela sua
história e um pouco cansadas, o ardor da fé jovem, o testemunho da esperança
cristã, amparada pela coragem admirável do martírio”.
Na sequência
deste raciocínio validado pela sua visão e pela experiência da Igreja,
Francisco encoraja os participantes na predita assembleia e, mediante eles,
todos os cristãos a servirem “com grande amor as Igrejas que, graças aos
mártires, nos testemunham como o Evangelho nos torna partícipes da vida de
Deus, e a fazerem-no por atração e não por proselitismo”.
E,
aproveitando o ensejo, o Papa pretende que o Ano Santo da Misericórdia incuta e
reforce nos cristãos “o ardor missionário que consumia o beato Paulo Manna e do
qual surgiu a Pontifícia União Missionária, para continuar hoje a fazer arder,
apaixonar, renovar, repensar e reformar o serviço que esta Obra é chamada a
oferecer a toda a Igreja”.
É um
ensinamento colocado à disposição de todos a contrariar o cristianismo que passa
pela Europa, pela tona e sem força como o café descafeinado (mas muito cremoso) ou a censurar os cristãos “múmia”, imóveis
e incaraterísticos (“parados…
não fazem mal, mas também não fazem bem”)!
2016.06.08 – Louro de Carvalho
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