Muito
se tem falado sobre as novas disposições sobre a avaliação externa dos alunos no
ensino básico. A este respeito, o ME (Ministério da Educação) – invocando algumas razões de
peso, entre as quais o estreitamento curricular a que o mecanismo das provas
finais, como estava concebido, estava a conduzir a avaliação externa das
aprendizagens e que tentava as escolas a centrar o ensino nas disciplinas que
eram objeto de provas finais – anunciou a supressão das provas finais no final
do 2.º ciclo e do 3.º. Por outro lado, prometia estabelecer a prestação de
provas de aferição em anos intermédios em cada ciclo do ensino básico: 2.º, 5.º
e 8.º ano.
Tanto
as provas finais como as de aferição alargariam progressivamente o âmbito da
sua incidência, não se limitando às disciplinas de Português e de Matemática.
Embora
considere a legitimidade desta opção ministerial e a perfilhe na sua
globalidade, entendia e entendo que, neste ano letivo, ou não deveria inovação
nesta matéria ou então a inovação a fazer era a pura supressão das provas
finais no fim dos dois ciclos em causa.
Entretanto,
o arrastamento no tempo do mecanismo da produção legislativa atinente à matéria
tornou-se excessivo, seja porque o Conselho Nacional de Educação tinha proposto
soluções em contrário, seja porque o Conselho de Escolas se pronunciou contra
ou levantou dúvidas, seja porque a Presidência da República ousou intervir
através da assessoria para a educação. O certo é que o Decreto-Lei n.º 17/2016,
de 4 de abril, só entrou em vigor no passado dia 5 de abril, o dia seguinte ao
da sua publicação (cf art.º 7.º/1).
E o regime de transição nele
estabelecido (art.º 5.º) é totalmente irresponsável. Primeiro, as provas de
aferição não são obrigatórias no ano letivo em curso. Estaria de acordo. Porém,
tenho de afirmar que obrigar os diretores dos agrupamentos de escolas que,
ouvido o Conselho Pedagógico, comuniquem a decisão
especialmente fundamentada ao Júri Nacional de Exames até ao dia 29 de
abril (o
último dia útil do mês da publicação do decreto-lei) significa atirar a
responsabilidade da não aplicação das provas para as escolas. Ora, o que
justifica a sua não realização é a falta de tempo. Não se pode colocar o carro
à frente dos bois. Não é crível que o Governo quisesse que as escolas explicassem
aos alunos, aos pais e aos professores as vantagens, os mecanismos e os
procedimentos das provas antes da publicação do diploma legal. A lei só tem
eficácia depois da publicação. E a aplicação desta é complexa. O ME tem de
deixar de brincar com as escolas.
Também quero dizer que, apesar de
perceber que o ME queira fazer aferição no 2.º ano para que se possa analisar o
estado das aprendizagens neste momento da escolaridade, até porque é proibida a
retenção no 1.º ano, parece-me extemporânea a aplicação da prova neste ano,
dado que este nível etário se me afigura precoce para aprestação de uma prova.
Concordaria com ela no 3.º ano. E reitero a minha preferência pela aplicação
das provas de aferição nos anos de escolaridade estabelecidos (3.º
em vez do 2.º) pelo
mecanismo da amostragem.
Voltando ao regime de transição,
admito que fosse em tese possibilitada a sujeição a provas finais de Português
e de Matemática no 4.º ano e no 6.º, uma vez que já havia calendário. Todavia,
não deveriam ser os professores a elaborá-las nas escolas, embora sob a
estruturação plasmada no instrumento informativo fornecido pelo ME. Basta de
sobrecarregar as escolas e os professores.
***
Porém, o Decreto-lei vai muito
mais além, constituindo uma significativa alteração ao Decreto-Lei n.º
139/2012, de 5 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 91/2013,
de 10 de julho, e 176/2014, de 12 de dezembro. Assim:
Em todos os artigos onde se lia
“conhecimentos a adquirir e capacidades a desenvolver pelos alunos” passa a
ler-se “ensino e aprendizagens” ou “ensino e aprendizagem” ou ainda só
“aprendizagens”. E, quando se fala em “ensino”, acrescenta-se-lhe
“aprendizagem”.
Abandona-se a designação de disciplinas fundamentais e fala-se em
“conjunto de disciplinas” e recupera-se a expressão “áreas curriculares”.
Acrescentam-se aos princípios
orientadores os seguintes:
“Promoção da capacidade reguladora dos
instrumentos de avaliação externa, através da sua utilização com objetivos de
aferição da forma como os alunos adquirem os conhecimentos e desenvolvem as
aprendizagens essenciais nos diversos domínios curriculares;
Valorização de uma intervenção atempada
e rigorosa, sustentada pela informação decorrente da avaliação externa, com
objetivos de aferição, no sentido de superar dificuldades nos diferentes
domínios curriculares;
Valorização da complementaridade entre
os processos de avaliação interna e externa das aprendizagens;
Reconhecimento da importância da
avaliação externa para efeitos de certificação e prosseguimento de estudos no
final do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário.
Deixam de constar no decreto-lei
as metas curriculares.
O artigo 23.º fica redigido nos
seguintes termos:
1 – A avaliação constitui um processo
regulador do ensino e da aprendizagem, que orienta o percurso escolar dos
alunos e certifica as aprendizagens desenvolvidas.
2 – A avaliação tem por objetivo central
a melhoria do ensino e da aprendizagem baseada num processo contínuo de intervenção
pedagógica.
3 – As diferentes formas de recolha de
informação sobre as aprendizagens, realizadas quer no âmbito da avaliação
interna, da responsabilidade dos professores e dos órgãos de gestão pedagógica
da escola, quer no âmbito da avaliação externa, da responsabilidade dos
serviços ou organismos do Ministério da Educação, prosseguem, de acordo com as
suas finalidades, os seguintes propósitos:
a)
Informar e sustentar intervenções pedagógicas, reajustando estratégias que
conduzam à melhoria da qualidade das aprendizagens, com vista à promoção do
sucesso escolar;
b)
Aferir a prossecução dos objetivos definidos no currículo;
c)
Certificar aprendizagens.
4 – Sem prejuízo das especificidades que
distinguem os processos de avaliação interna e externa das aprendizagens, no
que respeita ao desempenho dos alunos e ao desenvolvimento do currículo, a
análise dos dados recolhidos deve valorizar leituras de complementaridade, de
modo a potenciar a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem.
A
avaliação diagnóstica passa a realizar-se “sempre que seja considerado
oportuna, sendo essencial para fundamentar a definição de planos didáticos, de
estratégias de diferenciação pedagógica, de superação de eventuais dificuldades
dos alunos, de facilitação da sua integração escolar e de apoio à orientação
escolar e vocacional” (art.º
24.º B/1, novo; há também novos artigos: 24.º B e 24.º C).
O artigo 24.º passa a ter a
seguinte redação
1 – A avaliação interna das
aprendizagens, da responsabilidade dos professores e dos órgãos de gestão
pedagógica da escola, compreende as seguintes modalidades de avaliação:
a)
Diagnóstica;
b)
Formativa;
c)
Sumativa.
2 – A avaliação externa das
aprendizagens, da responsabilidade dos serviços ou organismos do Ministério da
Educação, compreende:
a)
Provas de aferição;
b)
Provas finais de ciclo;
c)
Exames finais nacionais.
E
recupera-se para a informação resultante da avaliação sumativa a atribuição de
menções qualitativas, acompanhadas de uma apreciação descritiva em todas as
áreas curriculares do 1.º ciclo. Porém, mantém-se que, nos 2.º e 3.º ciclos, a informação
resultante da avaliação sumativa se materializa numa escala numérica de 1 a 5,
em todas as disciplinas.
***
Como se vê, não é pouco. E tão
depressa! Ficou o normativo desligado da vinculação anterior a uma certa
corrente didático-pedagógica, fazendo-nos voltar facilmente a uma visão mais
arejada da ação pedagógica e não impedindo de regressar à conceção do DL n.º
139/2012, de 5 de julho, estribada na aquisição de conhecimentos e no
desenvolvimento de capacidades.
Aliás, nada tenho a objetar à
aprendizagem por competências desde que:
- Não nos atenhamos à noção de competência exigível para o desempenho
de funções mecanicistas sem o questionamento dos porquês, como muitos
empresários se limitam a exigir.
- Entendamos a competência como “o conhecimento em ação”
ou a “combinatória de conhecimentos, capacidades, aptidões e atitudes
apropriadas a situações específicas, requerendo também ‘a disposição para’ e ‘o
saber como’ aprender” (Comissão Europeia, 2004).
2016.03.07
– Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário