O
Primeiro-Ministro de Portugal empreendeu, ontem, 11 de abril, uma breve visita
à Grécia, salientada pela comunicação social portuguesa e largamente ignorada pela imprensa e pelo povo gregos.
Entre os objetivos da visita, em que
António Costa se avistou com o Presidente da Grécia, Prokopis
K. Pavlopoulos, e trabalhou com o Primeiro-Ministro, Alexis Tsipras,
contava-se um encontro com um centro de refugiados e uma tomada de posição
conjunta face à orientação vigente na União Europeia em relação aos países
sujeitos a intervenção externa.
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O encontro de cerca de uma hora com os
ocupantes do campo de refugiados em Eleonas, perto de Atenas, serviu de ocasião
para Costa cumprimentar, fazer perguntas e explicar o que pretendia. Como não
pode por si abrir as fronteiras para a Alemanha, disponibilizou o nosso país
para acolher, de imediato, 1250 refugiados e, a prazo, até 9000.
Por todo o campo, dividido em zona
familiar, zona para homens e zona para mulheres, cada contentor aloja oito
pessoas. A uma mulher, com três crianças, o gerente do campo terá dito que, se
não gosta, se vá embora. E o que ela queria era precisamente ir para a Alemanha
ter com o marido que também fugiu da Síria e já conseguiu chegar a este país da
Europa com que grande parte dos refugiados sonha todos os dias.
A maior parte dos refugiados nem terá
percebido bem quem era o homem que os visitou e tentou oferecer-lhes
oportunidades noutra qualquer parte da Europa. Mas Costa sabe que “este é um
problema europeu”, um drama humano a que a Europa tem de dar resposta, “assegurando
proteção internacional a todos os que dela carecem, venham do Afeganistão ou da
Eritreia, para buscar a paz e uma oportunidade de refazerem as suas vidas”.
O Primeiro-Ministro de Portugal não está impressionado
com os esforços europeus em matéria de refugiados. A legislação europeia não
facilita uma resposta de forma ágil às necessidades das pessoas. Assim, levou
na carteira a vontade política e humanitária – também no interesse português – de
agilizar em formato bilateral os mecanismos de acolhimento.
Alexis Tsipras – que tem estado debaixo de fogo também
pela forma como lida com o problema – agradeceu a solidariedade expressa por
António Costa. Com efeito, a Grécia não estava preparada para lidar com a
avalanche de milhares e milhares de pessoas que nos últimos meses chegaram a
este país, que é uma das portas para a Europa.
Os últimos dados referem que estão a chegar cada vez
menos, talvez por via do recente acordo entre a UE e a Turquia. No entanto,
ainda há mais de 50 mil pessoas retidas na Grécia à espera que abram as
fronteiras. E, segundo a Amnistia Internacional, são refugiados que estão, nos
campos de Lesbos e Chios, a viver em condições desumanas.
Porém, em vez de tendas, Eleonas dispõe de postos de
atendimento médico, contentores e campos de futebol. Este é considerado um
centro de acolhimento modelo. E foi também por isso que o chefe do governo
grego quis levar António Costa ali e não a outro campo de refugiados.
Um homem de 26 anos, que fugiu das bombas e da guerra
da Síria com a mulher, quando descobriram que estava a caminho o primeiro filho
do casal, passou por Lesbos e diz que antes queria regressar a Alepo do que
voltar a viver naquele campo de refugiados, o de Lesbos, que já começa a ser
considerado a “Lampedusa” do mar Egeu. Agora está melhor, mas quer sair, para Alemanha,
Finlândia, Áustria... Não para Portugal.
Como este, muitos outros. É normal que aqueles que
palmilharam milhares e milhares de quilómetros com o intuito de chegar a um
país como referência tenham agora dificuldade em reorientar o seu trajeto”.
No campo de refugiados de Eleonas vivem cerca de 1400
pessoas, centenas de crianças. A acompanhar o Primeiro-Ministro de Portugal estiveram
Augusto Santos Silva, Ministro dos Negócios Estrangeiros, e Constança Urbano de
Sousa, Ministra da Administração Interna. Esta pegou ao colo uma criança e
depois seguiu o resto da visita de mão dada com ela. A seguir, juntaram-se mais
crianças à volta da Ministra. Mas, quando a ouviram dizer que, “se calhar, vou
ter de levá-las para Lisboa”, seguiram, cada uma para junto das suas famílias,
a cantarolar em inglês uma frase usual por aqueles lados: “Open the border!” (Abram as fronteiras).
***
Os meios de comunicação social portugueses acompanharam
atentamente os encontros de António Costa com o presidente grego e sobretudo
com o chefe do governo helénico em Atenas, ao invés dos órgãos de comunicação da
Grécia, alegadamente por estarem a lidar em regime de permanência com questões
de maior urgência, como a crise dos refugiados e a iminência de alcançar um
acordo com os credores.
Parece que não teria sido assim, de
acordo com algumas opiniões, se o encontro tivesse acontecido há alguns meses, quando a
Grécia enchia manchetes de jornal e notícias de abertura em rádio e televisão em
toda a Europa, no auge da crise financeira. Refugiados constituem um drama, mas
a tudo os meios e comunicação social se habituam, sobretudo quando o drama
verdadeiramente não interessa aos países do poder, mas apenas o que
escandalosamente pode revelar a inépcia dos governos ou a corrupção que de
encoberta passa para a ribalta da cena pública. Ao contrário, outros admitem
que nada seria diferente, mesmo que dantes Portugal fosse, como hoje é, o
apenas outro Estado-membro da União Europeia, a par de Atenas, a ter um governo
de esquerda. Aduzem que mais nenhum outro governo da Europa – socialista,
centrista ou conservador – quer ser apreciado como ligado à Grécia e todos vêm
fazendo questão de se distanciarem alegando explicitamente que os seus países
não são a Grécia.
Em todo o caso, a visita do chefe do executivo português
ficou marcada pela assinatura de uma declaração conjunta contra a austeridade e sobre a crise dos refugiados, após um
encontro formal entre os dois governantes.
No significativo documento, os dois primeiros-ministros
criticam a receita política da União Europeia nos últimos anos e prometem
cooperação no âmbito da resposta à crise migratória.
Na conferência de imprensa conjunta, António Costa
afirmou o sentido dado ao texto:
“A declaração conjunta que hoje assinámos
significa a vontade de trabalharmos com 26 parceiros da União Europeia para
termos uma UE mais solidária, com uma economia com mais crescimento e criação
de emprego que reconcilie os europeus com o projeto [europeu]”.
Focando-se na necessidade de virar a página da
austeridade, o Primeiro-Ministro sustentou que só com o termo da prossecução
desta política europeia é que se torna possível melhorar significativamente a
competitividade e proceder à retoma da trajetória de crescimento nos dois
países. E apontou o dedo:
“Durante muito tempo a Europa neoliberal
queria impor um pensamento único, que não havia alternativas e agora está a
demonstrar o contrário Portugal, a Grécia e outros países.”
Costa também defendeu os dois países devem trabalhar
com a União Europeia de “forma construtiva” e não em termos de “confrontação”.
E sublinhou:
“Baixou a febre, mas a doença está lá.
Chama-se assimetria económica. (...) É preciso dar um novo impulso à
convergência entre as nossas economias e as economias mais desenvolvidas [da
zona euro].”.
Por seu turno, Alexis Tsipras afirmou que a Grécia
viveu, entre 2010 e 2015, uma “grande catástrofe”, mercê das políticas dos
anteriores governos, salientando que o país necessita de mais tempo para
terminar o programa de ajustamento. E declarou a este respeito:
“Temos que fazer o ajustamento da nossa
economia. Precisamos que nos cedam mais tempo para que possamos ultrapassar
isto e chegar a uma solução, para que possamos adquirir também uma vida normal
e que os mercados tenham confiança na nossa economia para termos desenvolvimento
económico”.
António Costa, embora reconheça que a Europa tirou a
lição dos erros do passado, dispondo hoje em dia de mais instrumentos comuns do
que há seis anos para enfrentar a crise, sublinhou que as diferenças persistem.
Por outro lado, admitiu que temos beneficiado “muito da nova atuação do BCE,
com a redução geral das taxas de juro”, todavia, não nos podemos deixar iludir
pensando “que essa redução significou a redução estrutural das assimetrias
entre as economias”.
E, referindo-se especificamente ao caso português,
declarou peremptoriamente que o fim do programa de ajustamento não correspondeu
à resolução dos problemas estruturais, pelo que está a ser preparado o Programa
Nacional de Reformas a apresentar a Bruxelas no final do mês de abril.
Tsipras, por sua vez, teceu loas à assinatura da
declaração conjunta com o Primeiro-Ministro português, frisando a sua correspondência
a uma nova visão para a Europa, declarando:
“Pensamos que este acordo bilateral foi
muito positivo, para que possamos voltar aos valores que defendemos e para que
haja uma luta comum que passe pela aposta noutra estratégia para enfrentar os
problemas económicos, que não seja através de mais medidas de austeridade”.
Relativamente à crise dos refugiados, Portugal e a
Grécia, como se disse, no documento assinado conjuntamente pelos dois chefes do
governo, enunciam a promessa de “cooperar para fazer com que a União Europeia
dê os passos necessários para a efetivação de uma política migratória efetiva
nas suas fronteiras externas”.
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Resta perguntar
que efeitos práticos advirão da declaração conjunta para os dois países.
É certo que
vale, pelo menos, como tomada de posição de dois países periféricos que
precisaram de intervenção externa. É uma clara manifestação de desconforto em relação
às diretrizes das todo-poderosas UE e zona Euro, que esmagam as economias dos países
do sul e constringem a sua produção legislativa e a política orçamental.
Entretanto, paira a dúvida sobre a sua
eficácia perante o monstro da indiferença do núcleo duro do diretório da Europa,
secundado pelos países mais ricos. Depois, os países da declaração de
desconforto são apenas dois países, que são de pequena dimensão e com governação,
embora ainda pouco duradoura, politicamente desalinhada – incapazes de fazer
engrossar a onda.
Quanto aos refugiados, Costa disse tudo.
À UE falta vontade política e superabunda a burocracia entediante e criadora de
dificuldades se efeitos para a defesa e segurança.
A UE é também culpada pelo que vem acontecendo,
mas não arrependida. Faz bem de Pilatos!
2016.04.12 –
Louro de Carvalho
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