sexta-feira, 1 de abril de 2016

Dramáticas curiosidades a partir das Comissões Parlamentares de Inquérito

Está em curso o trabalho de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) ao caso Banif. E ainda a procissão praticamente não saiu do adro e já se registam curiosidades dramáticas nela reveladas que indicam o modo leviano e desastroso como os responsáveis financeiros lidam com o sistema financeiro e como os decisores políticos deixam arrastar o dinheiro dos contribuintes e de alguns investidores na enxurrada da administração incompetente e danosa.
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Só para recordar um pouco do que se passou com dois dos bancos portugueses cujo desfecho foi analisado em sede de CPI, registo alguns factos/posturas confessadas por alguns dos ouvidos na Assembleia da República em sede desta modalidade de comissão, cujo trabalho tem sido notável.
Assim, no caso do BPN, um dos inquiridos – o presidente executivo ao tempo do descalabro – estranhou por que motivo a sua gestão bancária não fora escrutinada pelo regulador; por sua vez, o presidente da SLN disse ter alertado o Banco de Portugal para situações de irregularidade, mas a supervisão não terá feito caso dos pretensos alertas; o banco central português e o Governo não terão aprovado o plano de reestruturação do BPN proposto pelo seu último presidente executivo, que – recorde-se – aceitara o cargo, mas não deixando depositadas as quantias que remuneravam a sua liderança; e, se, em geral, o banco central português era apontado como não tendo sido capaz de cumprir eficazmente as suas funções de supervisão e regulação, algumas vozes vinham em socorro da instituição alegando que não se pode penalizar o polícia e desculpar os transgressores. O banco foi objeto de nacionalização e a sua gestão entregue à CGD, que acabou por o alienar por 40 milhões ao BIC, com as consequências para o erário público que são do conhecimento de todos, embora não estejam terminadas as contas dos danos públicos causados.
Por seu turno, o BES, de quem se dizia que o único problema seria a exposição ao complexo grupo GES, tendo-se até escapulido à recapitalização, alegadamente desnecessária, com recurso às verbas disponibilizadas para o efeito pelo programa de ajustamento financeiro, teve o desfecho que todos conhecemos, embora sem a noção exata dos encargos finais para os contribuintes. E, embora o Governo tivesse reiteradamente afirmado o contrário, os prejuízos têm sido altamente gravosos para os subscritores do Fundo de Resolução, que não tiveram pedalada para aguentar outra Resolução, a do Banif, para os acionistas e alguns obligacionistas, para o erário público, enfim, direta e indiretamente para os contribuintes, que sustêm o Estado.
Mas, na CPI, houve revelações que raiam a impudência. Os administradores de topo não se envergonharam de negar ou minimizar as próprias responsabilidades, mas tiveram, por outro lado, o desplante de alijar as culpas para o administrador do pelouro afim. E um administrador de empresa lesada por financiamento de uma das unidades empresariais do GES apresentou a leviandade descarada de total confusão, amnésia, desmemória. Até se inventou a partir do seu nome um neologismo: o “bavismo”.  
Por seu turno, o governador do BdP (Banco de Portugal), que não roubou nada a ninguém, pelo que não podia ser acusado por manifestantes como o foi, desculpou-se com a falta de poderes legais, com o pudor de não poder arredar os gestores e com as constrições de Bruxelas e de Frankfurt.
E, com isto, o Novo Banco, resultante da resolução do BES, continua a esperar que apareçam pretendentes, estratégicos e/ou dispersos e até anónimos, para um casamento poligâmico. Talvez o salvador Sérgio Monteiro, recrutado nos últimos Governos da PaF pelas suas inquestionáveis competências (?!), venha resolver miraculosamente o processo que teima supinamente em marchar ao retardador.
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Como se pode entreler acima, a CPI sobre o Banif já tem que se lhe diga. Em termos genéricos, já se sabe que o Governador Carlos Costa não quis entregar aos deputados o relatório da auditoria solicitada, aduzindo o dever bancário de confidencialidade. Porém, mais tarde, veio disponibilizar a entrega com a condição de os deputados assumirem o ónus da dispensa do segredo bancário. Também foi referido que o Governador do Banco de Portugal recusara, em fevereiro de 2014, fornecer informações ao Governo sobre o Plano de Contingência para salvar o Banif. Perante as críticas da então Ministra das Finanças pelo facto de alegadamente o BdP ainda não ter um plano para a respetiva instituição financeira, Carlos Costa informou em carta enviada a 12 daquele mês que, apesar de já ter elaborado a estratégia de emergência, não tinha intenção de a partilhar com o Governo por força da índole sigilosa da supervisão e da “extrema sensibilidade da informação” contida no plano em causa.
É de recordar que a história da travessia do deserto do Banif  começou em dezembro de 2012, quando o banco foi alvo de uma intervenção estatal, com uma injeção de capital de 1100 milhões de euros, vindo o caso a acabar por resultar num prejuízo, para já, de cerca de 2,9 mil milhões de euros para os cofres do Estado.
António Varela, que foi nomeado administrador por parte do Governo aquando da injeção de capital público no Banco, tendo depois da resolução passado a integrar a equipa do regulador, declarou à CPI que, antes de 2012, o Banco era mau, muito, muito mau. E esperava o que o desfecho fosse efetivamente mau, mas que não fosse tão mau como foi.
E sabe-se que, em dezembro de 2012, o BdP já admitia a necessidade de dividir o Banif em um banco bom e um banco mau, sendo o primeiro um banco de transição cuja administração seria entregue a uma equipa designada pelo banco central. O custo estimado da criação desse banco de transição orçaria ente 1900 milhões e 4000 milhões de euros e a sua venda ocorreria num prazo de dois a cinco anos, sendo que ao todo (criação do banco bom e responsabilidades perante acionistas e credores subordinados, que ficavam no “Banif mau”, que iria para liquidação) exigir-se-ia um esforço financeiro de 2500 milhões a 4000 milhões de euros.
Também Luís Amado, refere que a saúde financeira do Banif antes de 2012 era má e aponta a diferença de tratamento do BdP, do BCE e da DGComp para com o Banif antes das eleições legislativas de 4 de outubro e depois.
Esta diferença de tratamento das instâncias europeias e do regulador nacional fora antes fortemente criticada pelo último presidente executivo do Banif, que assevera que esse tratamento diferente para pior se acentuou depois da posse do XXI Governo.
Ademais, os administradores afirmam a perniciosidade da notícia da TVI que antecipava o encerramento do banco a muito curto prazo, bem como o mesmo anúncio e subsequente aconselhamento, por parte de balcões do Santander, a clientes no sentido de transferirem dinheiros do Banif para o Santander, já que seria este a comprar o Banco, ficando assim os dinheiros em maior segurança. Para o efeito, os declarantes na CPI sugeriam que o Ministério Público deveria inquirir sobre eventual ilícito criminal em tais factos, dado que deles resultou a transferência de mais de 900 mil euros de um banco para o outro em cinco dias.
Sabe-se também que foi aquela engenharia logística que inspirou a resolução do BES e não a do BES que influenciara a do Banif em 2015, como aduzia em tempos o governador do BdP.
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 Concluindo, deverá dizer-se que estes fenómenos nem são obra do acaso nem surgem de súbito nem são guiados por critérios humanistas.
Pelo contrário, estes factos revelam a premeditação/deliberação, nem sempre encapotada, de acabar com a subsistência dos pequenos e engrossar o poderio dos grandes; revelam que as instituições europeias não estão ao serviço de um ideal de Europa nem ao serviço de Estados ou de cidadãos; revelam a supremacia do poder financeiro sobre o poder político vergando sobre si o poder político e os legítimos direitos e interesses dos cidadãos contribuintes; e revelam que as instituições nem sempre se pautam pelos genuínos princípios do direito, mas rolam também ao sabor das influências de alguns e até em consonância com agendas político-partidárias.
Era desnecessário tentar iludir o povo em nome da discrição ou do dever de confidencialidade. Se não querem falar que não falem, mas que não mascarem a verdade. Nada que não venha a saber-se.

2016.04.01 – Louro de Carvalho

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