sábado, 3 de outubro de 2015

Vamos votar!

Amanhã, é dia de eleições legislativas nacionais, isto é, vamos eleger os deputados à Assembleia da República. Trata-se do exercício de um direito cívico-político e do cumprimento de um dever para com a coletividade.
Na linha do direito cívico-político, o exercício deste direito realiza o homem enquanto animal político, que se revê como pessoa humana revestida da capacidade de participação que lhe é outorgada pela condição de dignidade humana e social; como dever cívico, quando um país se encontra em crise de identidade, soberania e governabilidade, votar assume o tónus de dever ético, de atitude moral.
Votar em eleições nacionais significa o contributo pessoal cidadão para a configuração de Portugal como “República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária” (vd CRP, art.º 1.º).
Votar em eleições nacionais é o modesto contributo de cada um para fazer, de dia para dia, de Portugal “um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democrática, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa” (vd CRP, art.º 2.º).
Cada voto compagina uma exigência modesta, mas lúcida e voluntariosa das liberdades, direitos e garantias (pessoais, de participação política, laborais), dos direitos e deveres económicos, sociais e culturais (direitos e deveres económicos, direitos e deveres sociais, direitos e deveres culturais), da definição e implantação de boas políticas agrícola, comercial e industrial, da edificação de um robusto e equânime sistema financeiro e fiscal e de uma sólida organização do poder político, que sirva a coletividade tendo como prioridade o bem comum concretizado no zelo pelo bem-estar dos cidadãos, na justa satisfação das populações e no desenvolvimento sustentável do país.
***
A este respeito, o Presidente da República, no fim do dia de reflexão estabelecido por lei, a seguir à campanha eleitoral, falou ao país, salientando a índole determinante desta escolha para o futuro do país – “o nosso futuro” e “o futuro dos nossos filhos”.
A sua alocução sublinha que “das eleições para a Assembleia da República dependerá a formação do novo Governo”, não sendo, na sua ótica, “admissíveis soluções governativas construídas à margem do Parlamento, dos resultados eleitorais e das forças partidárias”. É assim que o Presidente lê o art.º 187.º da CRP. Talvez esteja nestas poucas palavras uma pista para percebermos o que Sua Excelência tinha em vista quando referiu publicamente que sabia muito bem o que fazer nos dias a seguir às eleições, mas que não o dizia, ou quando se apresentou “insensível a quaisquer pressões, venham elas donde vierem”.
E, na sequência daquilo que disse ao povo quando marcou o dia destas eleições para o dia 4 de outubro, que “todos os atos eleitorais são importantes, mas este ato eleitoral é particularmente importante para o futuro de Portugal”, agora reiterou a asserção de que “as eleições de amanhã realizam-se numa altura crucial para o País”.
Podemos concordar ou não com a apreciação presidencial da campanha eleitoral. No entanto, podemos refletir sobre as reminiscências que ela deixou na nossa memória visual e auditiva e, com a nossa leitura dos materiais bibliográficos que temos em casa e com a nossa reflexão sobre eles, bem podemos suprir a eventual insuficiência de informação e esclarecimento da parte das diversas forças políticas.
E, seja como for, “temos à nossa frente desafios muito complexos, que exigem de todos um grande sentido de responsabilidade”.
O Presidente tem razão ao sublinhar que devemos “exercer um direito que só existe porque vivemos numa democracia”, que é “estável” e está “consolidada, semelhante às dos nossos parceiros da União Europeia”; e releva como “muitos povos do mundo gostariam de escolher o seu destino através do direito de voto”.
A participação em eleições exige a consciência da parte de todos nós de que o nosso voto “é uma afirmação de liberdade, um instrumento a que [os portugueses] não devem renunciar”. Por outro lado, o voto é um importante “contributo para o reforço da nossa democracia e para o prestígio de Portugal no mundo”.
Ainda temos, até perto das dezanove horas de amanhã, tempo de sair do nosso eventual estado de indecisão. É, pois, necessário atender às palavras do Presidente, que, mesmo que não tenha na devida conta o que é ser Presidente da República (vd CRP, art.º 1.º e art.º 11.º/1), porquanto não estará presente nas comemorações do dia da Republica (porque precisa de refletir, quando já sabe o que vai fazer; ou porque o que dissesse poderia ser entendido como tomada de posição sobre as eleições). Porém, tem razão quando avisa:
“A abstenção não é solução. Abster-se de votar é desistir do presente e abdicar do futuro. Quem opta pela abstenção, prescinde de ter uma voz ativa e de participar na construção de um Portugal mais desenvolvido e mais justo.”.
É pertinente o seu apelo aos portugueses para que “organizem as atividades que pensam realizar”, reservando “um espaço para o exercício do seu direito de voto”. Mais: face às previsões de mau tempo, o apelo do Presidente urge:
“Não faltem. É isso que vos peço. O futuro do País justifica que todos vão votar, mesmo que o tempo não ajude.”.
***
Vamos votar. O voto será uma exigência democrática de mais liberdade, mais segurança, mais saúde, mais educação, mais trabalho, mais cultura, mais ciência, mais segurança social, mais participação política.
Votar é afirmar-se “pessoa”. Votar é afirmar-se sociedade, afirmar-se comunidade.
Mas a democracia não se esgota no voto. Tem de continuar no trabalho, no pagamento equitativo e proporcionado de impostos e contribuições, na crítica oportuna, na participação associativa, na integração no clube ou no grupo, na resposta a inquérito público, na defesa dos pobres, na atenção aos sem vez e sem voz e na justiça social.

2015.10.03 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário