sexta-feira, 16 de outubro de 2015

No termo do V centenário do nascimento de Santa Teresa

As comemorações centenárias de Santa Teresa de Ávila, preparadas desde o ano de 2009, iniciaram-se a 15 de outubro do ano transato e terminam hoje, dia 15 de outubro de 2015, em Ávila. E, por vontade do Papa Francisco, configuram o ano jubilar teresiano. Nele, os fiéis verdadeiramente arrependidos tiveram a oportunidade de obter a indulgência plenária, desde que observassem as condições do costume: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração pelas intenções do Santo Padre.
A ordem carmelita descalça, fundada por Teresa de Ávila, e a Fundação V Centenário, criada para comemorar os 500 anos do nascimento desta santa espanhola reconheceram publicamente esta graça papal. A este propósito, o Diretor-Geral daquela fundação declarou:
“Estamos num tempo especialmente dirigido à reconciliação, à solidariedade, à esperança e à justiça social, tudo valores que Teresa transportou e transporta na sua vida e no seu legado e que indubitavelmente identificam Teresa como a mulher e a Santa excecional e universal, cujo ensino e pensamento são plenamente contemporâneos”.

Por seu turno, o Diretor do Centro Internacional de Estudos Teresianos entende que a decisão papal “supõe um estímulo e um impulso à fé simples do povo, que em Teresa vai descobrindo um modelo apara a sua própria vida”.
Diversas iniciativas marcaram este V Centenário – Encontro Europeu de Jovens, congressos, exposições, concertos, entre tantas outras – envolvendo de facto pessoas dos cinco continentes, desejosas de testemunhar a figura, o espírito inquieto e o temperamento ativo da mística tão cara à Igreja e ao Magistério dos Pontífices – o grande trunfo da Reforma Católica. 
Por ocasião do Encontro Europeu de Jovens, realizado entre os dias 5 e 9 de agosto de 2015, o cardeal Secretário de estado de sua Santidade, Dom Pietro Parolin, assinou e remeteu uma mensagem papal ao presidente da Conferência Episcopal Espanhola com o seguinte teor:
O Papa Francisco saúda cordialmente os organizadores e os participantes no Encontro Europeu de Jovens, que se celebra em Ávila, para incremento, aprofundamento e testemunho da sua fé e do seu amor à Igreja, seguindo o exemplo e o ensinamento de Santa Teresa de Jesus, no V centenário do seu nascimento.
A expressão de Santa Teresa “em tempos difíceis, amigos fortes de Deus” tem uma ressonância especial quando se dirige aos jovens e à sua ânsia de verdade, bondade e beleza. Por isso, o Santo Padre os anima a não se conformarem com uma vida medíocre e sem aspirações e, em contrapartida, a crescerem numa profunda vida de amizade com Cristo, a tomar cada dia maior consciência do dom imenso recebido no batismo e na confirmação, que nos impulsiona a levar o amor de Cristo aos nossos semelhantes.
Sua Santidade, ao recordar-lhes a necessidade de crescer sempre no amor à Igreja e aos irmãos, roga-lhes que rezem por ele, ao mesmo tempo que, com afeto, os confia à proteção da Virgem Maria, implora sobre eles do fundo do coração a implorada Bênção Apostólica.

Francisco anunciou o início das celebrações dedicadas a esta insigne filha da Igreja de Espanha – beatificada em 1614, canonizada em 1622 e proclamada Doutora da Igreja por Paulo VI em 1970 –, em carta enviada ao Bispo de Ávila, Dom Jesús Garcia Burrillo, quando proclamou o Ano Jubilar Teresiano. Nesta carta, o Pontífice, definindo Teresa como “santa caminhante”, escrevia de entre outras palavras, as seguintes:
“Ao aproximar-se o V centenário do seu nascimento, dirijo o meu olhar àquela cidade para dar graças a Deus pelo dom desta grande mulher e encorajar os fiéis da amada Diocese de Ávila e todos os espanhóis a conhecer a história desta insigne fundadora, como também a ler os seus livros, que junto com as suas filhas nos numerosos conventos carmelitas espalhados no mundo, continuam a dizer-nos quem é, como foi Madre Teresa e o que ela pode ensinar-nos a nós homens e mulheres de hoje”.

E sintetizando a mensagem de Teresa com o convite para serem, nas suas pegadas, peregrinos na estrada da alegria, da oração, da fraternidade e do tempo vivido como graça, advertiu: “É tempo de caminhar”.
Já o Papa Bento XVI, na Audiência Geral de 2 de fevereiro de 2011, no ciclo dedicado às grandes figuras da Igreja, recordou aos peregrinos e fiéis os traços mais marcantes da ínclita personalidade desta mulher, acima de tudo, amiga íntima de Deus:
“Em primeiro lugar, Santa Teresa propõe as virtudes evangélicas como base de toda a vida cristã e humana. Em particular, o desapego dos bens ou pobreza evangélica, e isto diz respeito a todos nós: o amor de uns pelos outros como elemento essencial da vida comunitária e social; a humildade como amor à verdade; a determinação como fruto da audácia cristã; a esperança teologal, que descreve como sede de água viva. Sem esquecer as virtudes humanas: afabilidade, veracidade, modéstia, cortesia, alegria, cultura”.

E, na Audiência Geral do passado dia 11 de março, Francisco recebeu a relíquia “bastão do peregrino”, de Santa Teresa, apresentada no contexto de uma mostra intitulada “Caminho da Luz”. E dirigiu a seguinte exortação aos jovens, aos enfermos e aos recém-casados:
“Durante este mês nós recordamos o quinto centenário do nascimento, em Ávila, de santa Teresa de Jesus. Queridos jovens, o seu vigor espiritual vos estimule a testemunhar com alegria a fé na vossa vida; a sua confiança em Cristo Salvador vos sustente, estimados enfermos, nos momentos de maior desânimo; e o seu apostolado incansável vos convide, prezados recém-casados, a pôr Cristo no âmago do vosso lar conjugal”.

Também, em carta que enviou ao Prepósito Geral da Ordem dos Irmãos Carmelitas Descalços 
da Bem-aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo, a 28 de março de 2015, dia do nascimento de Teresa, o Papa assegura a respeito da Santa:
“Era consciente de que nem a oração nem a missão se podiam manter sem uma autêntica vida comunitária. Por isso, o alicerce dos seus mosteiros foi a vida fraterna: “nesta casa… todas tem que ser amigas, todas se hão de querer, todas se hão de ajudar” (C 4,7). E teve o cuidado de avisar as suas religiosas sobre o perigo que corriam de puxar a atenção sobre si próprias na vida fraterna, que consiste “tudo, ou em grande parte, em perder o cuidado de nós mesmos e das nossas comodidades” (C 12,2) e de por tudo o que somos ao serviço dos outros. Para não correr este risco, a Santa de Ávila enaltece a suas irmãs, sobretudo, a virtude da humildade que não é retraimento exterior encolhimento interior da alma, mas conhecer o que cada um é capaz de fazer por si e Deus nele (Relações 28). O contrário é o que ela chama ‘honra negra’ (V 31,23), origem de murmurações, ciúmes e de críticas, que prejudicam seriamente a relação com os outros. A humildade teresiana é feita de autoaceitação, de consciência da própria dignidade, de audácia missionária, de agradecimento e de abandono em Deus.”   

Os festejos centenários nacionais, que a Ordem dos Carmelitas Descalços e a Diocese de Ávila organizaram, terminaram hoje em Ávila, na Praça de Santa Teresa, com a celebração eucarística presidida pelo arcebispo de Valladolid e presidente da Conferência Episcopal Espanhola, o cardeal Ricardo Blázquez.
A cerimónia foi de acesso livre até que todos os lugares estivessem ocupados, tendo sido dada prioridade de acesso à Praça às pessoas com dificuldade de locomoção. Foram disponibilizados aplicativos para serem descarregados nos iphones e smartphones, a fim de melhor se acompanharem os cânticos da celebração.
No final da Missa de conclusão, teve lugar a Procissão de Santa Teresa (com uma imagem do autor Gregorio Fernández), que teve o seguinte percurso: Calle San Segundo, Catedral, Calle Reyes Católicos, Plaza del Mercado Chico, Calle Vallespín, Calle La Dama, Calle Marcelino Santiago, Plaza Corral de Las Campanas, Calle Madre Soledad, Plaza de La Santa.
Pelas 22 horas, realizou-se um Concerto de Conclusão do V Centenário, organizado pela Prefeitura de Ávila, na Explanada del Lienzo Norte.
E, mais tarde, por volta das 23 horas e 55 minutos (22 e 55, hora de Lisboa), no mesmo local, realizou-se um Espetáculo Piromusical de Encerramento do V Centenário.
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Em Portugal, durante todo o ano, houve encontros de espiritualidade em várias localidades portuguesas, de que se destacam: Viana do Castelo, Coimbra, Faro, Beja. Braga, Bragança, Aveiro, Setúbal, Évora, Funchal, Heroísmo, Lisboa, Viseu e Porto.
Para além disso, tiveram lugar conferências, ciclos de cinema, workshops, peregrinações e congressos.
O ano de Santa Teresa português, que foi inaugurado em 15 de outubro de 2014, será encerrado neste outubro de 2015 com dois congressos na freguesia de Fátima, da diocese de Leiria-Fátima:
- Dias 15 a 18 – Congresso Carmelita Teresiano, em Fátima – Domus Carmeli;
- Dias 22 a 24 – Congresso Internacional no V Centenário de Santa Teresa – A Reforma Carmelita Descalça em Portugal, em Fátima – Domus Carmeli.
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Quem é Santa Teresa? Santa Teresa de Jesus, também conhecida como Santa Teresa de Ávila pela sua origem espanhola, foi uma freira carmelita, mística e santa católica do século XVI, importante pelas suas obras sobre a vida contemplativa através da oração mental e pela sua atuação durante a Contrarreforma, ou melhor, a Reforma católica. Foi também uma das reformadoras da Ordem Carmelita e é considerada a fundadora dos Carmelitas Descalços.
Teresa de Cepeda y Ahumada, nascida numa nobre família de Ávila, na Castela Velha, nasceu em 28 de março de 1515. Cedo começou a revelar um temperamento vivaz, fugindo de casa aos 7 anos para buscar o martírio entre os mouros da África, por amor de Cristo. Porém, aos 16 anos, começou a enamorar-se por um simples mortal. E o pai, por um compreensível ciúme e para protegê-la, confiou-a a um convento de freiras.
Contrariando os planos paternos, com a idade de 20 anos, decidiu ser freira. Houve poucos anos de vida regular, pois também cedeu a certa moda. As vozes interiores não lhe deram tréguas e sentindo um desejo sempre mais insistente de retornar ao primitivo rigor dos carmelitas, foi objeto de extraordinárias experiências místicas, traduzidas depois, por obediência, em vários tratados de oração mental, que obtiveram lugar relevante entre os clássicos da literatura espanhola.
Aos 40 anos, ocorre a grande viragem na vida desta imprevisível santa de ideias generosas. Depois das aflições interiores, dos escrúpulos e do que, na mística, se chama “noite dos sentidos” ou trevas interiores – a prova mais dura que a alma deve superar –, dá-se o encontro crucial com dois santos, Francisco de Borja e Pedro de Alcântara, que a recolocam no bom caminho, ou seja, na via da total confiança em Deus.
No ano de 1562, fundou, em Ávila, o convento descalço (ou reformado) sob o patrocínio de são José. Cinco anos depois, deu-se um outro encontro decisivo: com João da Cruz, o príncipe da Teologia Mística. Sem do os dois fadados para se entenderem, iniciou-se, assim, aquele singular conúbio, em meio de ardentíssimos arrebatamentos místicos e ocupações práticas do dia a dia, que fazem dela a 'santa do bom senso', a contemplativa imersa na realidade.
Ela possui a chave de acesso e ingresso entrar no Castelo interior da alma, “cuja porta de ingresso é a oração”, mas ao mesmo tempo sabe tratar egregiamente de matérias económicas. “Teresa” – confessa com argúcia e humildade – “sem a graça de Deus é uma pobre mulher; com a graça de Deus, uma força; com a graça de Deus e muito dinheiro, uma potência”. Viaja pela Espanha de lés a lés (era chamada a “freira viajante”) para erigir novos conventos reformados e revela-se uma hábil organizadora.
Escreve a história da sua própria vida num livro de confissões extraordinariamente sinceras:
“Como me mandaram escrever o meu modo de fazer oração e as graças que o Senhor me fez, eu queria que me tivessem concedido o poder de contar minuciosamente, e com clareza, os meus grandes pecados”.

Morreu em 4 de outubro de 1582, pronunciando as palavras: “Sou filha da Igreja”.
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Importa hoje ler a sua obra, que enche e disciplina o pensamento, agrada à sensibilidade e pode servir de orientação num mundo marcado pelo facilitismo, pelo conflito e pela ditadura do relativismo. E Teresa pode bem constituir uma referência para o papel da mulher na Sociedade e na Igreja de hoje.

2015.10.15 – Louro de Carvalho

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