O Prémio Norte-Sul é uma
criação do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa que tem o propósito de promover,
em cada ano, a real proteção dos direitos humanos, da pluralidade democrática e
do fomento da solidariedade e cooperação entre o norte e o sul através do reconhecimento
do trabalho desenvolvido por duas individualidades – uma do norte, outra do sul
– de preferência, um homem e uma mulher. O prémio tem sido atribuído todos os
anos desde 1995, cinco anos depois da criação deste centro (em 1990), a duas personalidades
distintas que que tenham mostrado um empenho de excelência na eficaz prossecução
dos objetivos que materializam aquele propósito fundamental.
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O Prémio Norte-Sul de 2014 foi entregue, no passado dia 1 de
julho, em cerimónia realizada como habitualmente (esta
foi a XX cerimónia de entrega de prémios) na Sala do Senado da Assembleia da
República, em Lisboa, e contou com a presença do Presidente da República
Portuguesa, que presidiu, da Presidente da Assembleia da República Portuguesa, do
Secretário-geral do Conselho da Europa e do Presidente da Assembleia do
Conselho da Europa.
Desta vez, foi eleito o trabalho de Maura Lynch, freira missionária, médica-cirurgiã e obstetra, e do economista André
Azoulay, conselheiro de Sua Majestade o Rei de Marrocos, duas personalidades
que se distinguiram pelas suas abnegadas ações em prol do respeito e dignidade
da pessoa humana e pela promoção do diálogo intercultural entre os povos.
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Maura Lynch é uma
médica-cirurgiã e obstetra irlandesa, de 76 anos, que tem dedicado toda a
sua vida a promover e a proteger os direitos fundamentais dos mais
desfavorecidos, através da ação direta com as pessoas fragilizadas, da formação
de quadros e da criação de estruturas e equipamentos. Ao serviço das
Missionárias Médicas de Maria, Maura Lynch passou 20 anos em Angola e mais de
duas décadas no Uganda, onde ajudou a fundar uma clínica especializada na
realização de cirurgias vitais para tratar a fístula obstétrica, no hospital de
Kitovu, no sudoeste do país. Apesar da sua extensa carreira, continua a lutar
pelo direito das mulheres do Uganda ao acesso a todos os cuidados primários de
saúde, pela sua dignidade e, em muitos dos casos, pela própria sobrevivência.
Tendo decidido, aos 17 nos, o ingresso num
convento para profissão religiosa dos valores evangélicos – pobreza voluntária,
obediência inteira e castidade perpetua – percebeu, entretanto, que precisava de
se munir de outras ferramentas para o cumprimento cabal da sua missão religiosa
e missionária. Por isso, resolveu fazer o curso de medicina na especialidade de
obstetrícia.
Como a sua primeira missão a levou até Angola,
em 1967, teve de fazer um curso em Portugal no então Instituto de Higiene e Medicina
Tropical (hoje, ISCSP-Instituto Superior de Ciências
Sociais e Políticas, pertencente à Universidade de Lisboa), condição sine qua non para a obtenção de visto. Sendo
a única médica num hospital rural de duzentas camas no Chiulo, exercia as funções
de obstetra, pediatra e cirurgiã e tratava a tuberculose. Tirara o curso de
cirurgia em razão de ter encontrado muitos sinistrados da guerra e das minas.
Após 20 anos de permanência em Angola, foi
chamada para o Uganda, onde iniciou o tratamento e a prevenção da fístula
obstétrica (buraco cavado entre a vagina e a bexiga ou
o canal retal em razão dos partos feitos por intervenção do feiticeiro, no alinhamento
com a tradição ancestral), que impedia o controlo das fezes e das urinas. Fizera,
para isso, a formação na Nigéria, um dos países mais afetados. Ajudou, depois,
a formar um departamento para a realização de cirurgias à fístula obstétrica no
Hospital de Kitovu, no sudoeste do Uganda, promovendo a preparação de médicos
para o efeito e concitando o patrocínio da ONU para a formação de dois médicos
para um programa de tratamento da fístula obstétrica no Uíge, no nordeste de
Angola.
Calcula-se que cerca de 200 mil mulheres do
Uganda sofram de fístula obstétrica e que no mundo haja cerca de 2 milhões
destas mulheres sujeitas ao incómodo doloroso e mesmo à morte. Porém, as mulheres
que beneficiam do tratamento voltam a uma vida normal e alegram-se por poderem voltar
a dançar e a cantar com natural satisfação, deixando feliz a irmã Maura e/ou os
envolvidos no tratamento.
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André Azoulay, de 74
anos, é conselheiro sénior do Rei de Marrocos, desde 1991. E, paralelamente à
sua carreira em Economia, tem-se dedicado à promoção do diálogo entre culturas,
religiões, populações, mulheres e homens da bacia do Mediterrâneo. Foi
presidente da Fundação Euro-Mediterrânica
Anna Lindh para o Diálogo entre Culturas, entre 2008 e 2014. Além disso, é,
desde 2005, membro do “Grupo de Alto
Nível” da “Aliança das Civilizações”
das Nações Unidas. Preside ainda ao Comité Executivo da Fundação Três Culturas e Três Religiões, sediada em Sevilha,
Espanha, e é um dos fundadores do Grupo
Aladin, que atua para a promoção da compreensão mútua e das relações
interculturais entre a comunidade Islâmica e o resto do mundo.
Judeu, berbere e árabe, como
faz questão de salientar, trava combate em três frentes fundamentais: o diálogo
entre religiões e entre culturas, com vista a uma relação positiva e sadia; o
Estado da Palestina, na observação do princípio e do direito à autodeterminação
e independência dos povos e seu direito de possuir um território; e a crise
civilizacional das sociedades, que não diz respeito somente ao Mediterrâneo,
mas – “mais do que económica” – é uma “crise social, filosófica, ideológica e política”.
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O Conselho da Europa estende o seu convite a
todas as instituições governamentais centrais e locais – ligadas ao Centro
Norte-Sul do Conselho da Europa – aos seus membros, aos representantes dos órgãos
de comunicação social e das organizações governamentais regionais e
internacionais para que apresentem proposituras de potenciais candidatos ao
prémio.
Os potenciais
destinatários do prémio são: cidadãos considerados individualmente; grupos de
cidadãos; ou organizações – cujas atividades sejam consideradas dignas de
distinção nos seguintes âmbitos: proteção dos direitos humanos; defesa da democracia pluralista; promoção da consciência pública sobre temas como a
solidariedade global e a interdependência, bem como o reforço da parceria
Norte-Sul.
Os candidatos são
nomeados pelos seus feitos nos domínios cultural, institucional e político. Cada
candidatura deve ter um ficheiro de, no máximo cinco páginas, contendo a
seguinte informação: breve biografia do candidato (incluindo a identidade do candidato e as razões da
nomeação); Curriculum
Vitae detalhado (com os dados pessoais
do nomeado e uma descrição das atividades e feitos importantes); e documentos que
sustentem a candidatura, como, por exemplo, cartas, artigos de jornais,
publicações.
O júri é constituído pelo Presidente do
Conselho Executivo do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa, que preside,
pelos Membros do Gabinete do Centro Norte-Sul e pelo Secretário-geral do
Conselho da Europa.
O prémio é atribuído, como já foi referido, a
dois candidatos, um do hemisfério norte e outro do sul (preferencialmente uma mulher e um homem), que se tenham destacado ao longo do ano
numa ou mais categorias do prémio.
Antes da lista de candidatos chegar ao júri, é
enviada aos anteriores vencedores do prémio para que estes possam fazer uma
análise e uma pré-filtragem dos vários candidatos. Desta fase pré-eliminatória
sai um máximo de dez candidatos (cinco
do norte e outros tantos do sul), que
serão avaliados pelo júri.
O prémio, que é honorário, consiste num
troféu, fruto da criatividade de dois artistas, um do hemisfério norte, João
Murillo, e outro do hemisfério sul, Lívio de Morais. É uma escultura
constituída por três partes diferentes (dois
moldes e a base) que
depois são agrupadas, representando a união entre o Sul e o Norte. Cada um dos
escultores é responsável pelo design
de um molde e os moldes são esculpidos em dois tipos de pedra tradicional
portuguesa (Estremoz e Negrais), a base é feita em madeira africana (Tola).
Como curiosidade, diga-se que três
portugueses, Mário Soares (2001), António de Almeida Santos (2003) e
Jorge Sampaio (2009), têm
o seu nome inscrito na lista dos galardoados com o Prémio Norte-Sul.
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Além da entrega dos prémios, em que foi enaltecido
o trabalho de promoção do exercício dos direitos humanos quer individualmente considerados
– e com destaque para os direitos das mulheres pobres – quer considerados em relação
na sociedade ou entre os povos, a cerimónia salientou os 25 anos da fundação do
Centro Norte-Sul do Conselho da Europa. E, se é verdade, como veiculou alguma
Comunicação Social, que a sua continuidade estava posta em questão, o Presidente
da República não deixou de apelar para a atualidade e importância da sua existência
e ação:
Os tempos conturbados que vivemos – marcados
pelo aumento do radicalismo, da intolerância e da violência, e ilustrados pela
ocorrência, ainda este ano, de trágicos acontecimentos em Paris, Copenhaga,
Tunes e Sousse – reforçam a necessidade de continuar a promover o diálogo
intercultural, a democracia e os direitos humanos, bem como a sensibilização
para a realidade da interdependência global. O papel do Centro na promoção dos
valores e missão do Conselho da Europa mantém plena atualidade.
Neste contexto, ganha particular relevância a
necessidade de conferir uma voz e um papel mais ativo à sociedade civil e aos
seus setores mais frágeis, designadamente através do desenvolvimento de
políticas destinadas a promover uma melhor educação para a cidadania democrática
e a participação dos jovens na vida política.
E terminou com um apelo oportuno:
Gostaria de fazer um apelo
aos representantes diplomáticos hoje aqui presentes. Este apelo vai no sentido
de persuadirem as respetivas autoridades a ampliar esta dinâmica e este impacto
político, através de um mais forte apoio dos seus países a este importante
instrumento do Conselho da Europa que é o Centro Norte-Sul, deixando
naturalmente a cada um o melhor modo de contribuir para este fim.
Oxalá que a voz
presidencial desta vez ganhe vez, força e recetividade nesta Europa já tão
velha, cansada, descaraterizada e como que às apalpadelas num mundo conturbado,
mas onde ainda é possível fazer germinar a esperança!
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