sábado, 18 de julho de 2015

Sobre a identidade e reclassificação do “planeta” Plutão

Desde os tempos da escola primária – ainda não éramos básicos como agora – me ensinaram a papaguear os nove planetas do sistema solar: Mercúrio, Vénus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Úrano, Neptuno e Plutão. Eram astros ou corpos celestes redondos, sem luz própria e que tinham o movimento de translação em torno do Sol. Destes se distinguiam os satélites, que eram corpos celestes que orbitavam em torno de planeta e só indiretamente em volta do Sol. E, até 2006, ninguém ousou desfazer este encanto orbital e planetário.
Ora, Plutão fora o último destes corpos celestes a ser descoberto. E, como refere Anabela Natário, no Expresso on line, de 14 de julho, era o Planeta X. Porém, Venetia Burney, de 10 anos, disse ao avô que aquela massa fria e escura do sistema solar – que no passado dia 14 se pôde ver, pela primeira vez, a 12500 Km de distância – se devia chamar Plutão, que em inglês e em grego se escreve Pluto.
Aquela era uma menina interessada na mitologia greco-romana e, pelo avô materno Falconer Madan, em astronomia. Foi ele quem, há 85 anos, lhe falou na descoberta daquele objeto celeste e a fez madrinha de um dos planetas mais misteriosos para os humanos, até há pouco.
Venetia, filha de um reverendo que morreu cedo, não seguiu astronomia, estudou matemática e tornou-se professora e contabilista. Em 1987, ganhou um asteroide com o seu apelido de solteira: em sua honra, o 6235 foi batizado de Burney.
Com efeito, até 2006, Plutão era considerado o nono planeta do sistema solar, mas foi desclassificado. A massa de rocha e gelo passou a ser considerada um “planeta anão”, nesse ano, em que foi lançada a sonda que, no passado dia 14, pôs a NASA em festa por, ao fim de nove anos e meio, se aproximar do seu alvo de estudo.
Pelos vistos, a razão pela qual o planeta fora desclassificado era o seu pequeno tamanho, o que, na ocasião, me fez brincar com alguns dos homens meus amigos de tamanho reduzido dizendo-lhes que, mercê do seu tamanho, seriam desclassificados por analogia com o planeta anão. Ora, do meu ponto de vista, o tamanho não pode ser critério determinante de classificação identitária.
E os últimos factos parecem apontar para o juízo precipitado da IAU (União Astronómica Internacional), que, em sua Assembleia Geral de 24 de agosto de 2006, aprovou a resolução segundo a qual um planeta é um corpo celeste que está em órbita ao redor do Sol; tem forma determinada pelo equilíbrio hidrostático (arredondada) resultante do facto de que a sua força de gravidade supera as forças de coesão dos materiais que o constituem; e é um objeto de dimensão predominante entre os objetos que se encontram em órbitas vizinhas.
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Do seu lado, Venetia Phair (Phair é apelido de casada), desgostosa com a desclassificação, disse, aos 87 anos, em entrevista à BBC que, devido à sua idade, se mantivera em boa parte do tempo indiferente ao debate, mas que preferia que permanecesse um planeta. Entretanto, antes, contara:
“Consigo visualizar a mesa e a sala, mas lembro-me muito pouco da conversa. Sei que o meu avô ficou impressionado com o nome de Plutão”.
Por outro lado, a mencionada sonda norte-americana batizada de New Horizons (Novos Horizontes) viajou, primeiro, a bordo do foguete Atlas, até chegar a Júpiter; aí, fez da gravidade uma fisga para se lançar no espaço a alta velocidade. Percorreu quase cinco mil milhões de quilómetros a 49.570 km por hora, porém, as suas comunicações com a Terra demoram apenas quatro horas e meia a chegar. A New Horizons só voltou “a telefonar para casa”, como dizem os seus criadores, no dia 16. E os cientistas envolvidos aguardam com alguma ansiedade essa conversa, já que o espaço bate o futebol quando se fala no pode acontecer.
Já foi divulgada a primeira fotografia tirada pela câmara de alta resolução Lorri (Long Range Recconnaissance Imager). John Spencer, do Southwest Research Institute do Colorado, um dos parceiros da NASA nesta missão, afirmou:
“Neste momento, as imagens revelam apenas que Plutão é um planeta realmente esquisito. Tem algumas áreas muito escuras, outras extremamente claras, e não sabemos nada sobre o que são ainda”.
Certamente que era ainda mais esquisito quando o astrónomo norte-americano Clyde Tombaugh, o descobriu na esteira de Percival Lowell, fundador do observatório com o seu apelido, localizado no Arizona, desde 1894. As primeiras fotos de Plutão, ou Planeta X, foram captadas em janeiro de 1930, mas só foi anunciada oficialmente a sua descoberta em 13 de março de 1930. No dia seguinte, o diário inglês The Times deu a notícia que o avô de Venetia lhe leu ao pequeno-almoço.
Falconer Madan, bibliotecário da Universidade de Oxford, era amigo do astrónomo Herbert Hall Turner, que, por sua vez, telegrafou a ideia da menina aos colegas americanos de Lowell. O observatório, que abrira um concurso, recebeu mil sugestões. Todavia a de Venetia ganhou a votação interna, por unanimidade. E, no dia 1 de maio, deu-se o batismo oficial, passando o Planeta X a chamar-se Plutão.
Em casa de Venetia não caiu do ar esta ideia de batizar descobertas na via láctea: era já uma aptidão de família. O seu tio-avô Henry George Madan, irmão de Falconer, tinha sugerido e conseguido que seguissem a sugestão de dois nomes para os satélites de Marte recém-descobertos (em 1887): Deimus (Deimos) e Phobus (Fobos).
Em 2006 – ano triste para si devido à morte do marido, Edward Maxwell Phair, professor de Clássicas, com quem esteve casada quase seis décadas – Venetia ainda assistiu ao lançamento da New Horizons. Porém, três anos depois, foi a sua vez de partir, aos 90 anos, a quatro meses de fazer 91.
Venetia Burney é um dos 434.738 nomes que seguem no CD colocado a bordo da sonda News Horizons, os nomes de quem respondeu ao apelo da NASA e ganhou um certificado por isso.
Na sonda que de facto abre novos horizontes, viajam também duas bandeiras americanas e as cinzas de Clyde Tombaugh, que, tendo morrido com 90 anos, contava apenas 24 quando vislumbrou na escuridão do céu o “planeta” até então desconhecido.
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A partir de 2006, intensificou-se o debate à volta do “planeta” com o nome do deus dos mortos para os romanos. Agora, deu-se um passo para arrumar este assunto. Afinal, Plutão, atualmente dito “planeta anão" é ligeiramente maior do que se pensava – 2.370 quilómetros de diâmetro.
O seu tamanho tem sido debatido desde a sua descoberta em 1930. Bill McKinnon, da Universidade de Washington de St. Louis, um dos cientistas desta missão, sublinhou o entusiasmo dos cientistas por acabarem definitivamente com esta questão.
Por seu turno, Alan Stern, investigador principal da missão, referiu que sabiam, desde que projetaram o voo, que só se seria capaz de “estudar as pequenas luas em detalhe por apenas alguns dias antes da maior aproximação”.
O Expresso on line, de 16 de julho, refere que as fotos de Plutão reveladas pela sonda evidenciam a presença de enormes montanhas geladas no planeta, com mais de 3300 metros de altitude, permitindo também perceber que não existem crateras de impacto na superfície, o que levanta a hipótese de o planeta poder ser bastante mais novo do que outros do Sistema Solar.
Durante a conferência de imprensa realizada para a apresentação das novas imagens, os cientistas da NASA afirmaram que “esta é a primeira vez que vemos um mundo gelado a orbitar um planeta gelado”.
Na mesma reunião, a agência espacial norte-americana exibiu outras fotos pormenorizadas de Charon (a maior lua de Plutão), em que é possível ver que a sua superfície irregular, cheia de penhascos e vales.
Nos próximos 16 meses, a New Horizons continuará a enviar para Terra imagens de Plutão.
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Também o DN on line, de 16 de julho, dá conta de que “as regiões das Montanhas de Norgay e da Planície Sputnik, em Plutão, parte da forma de coração no pequeno planeta que já ficou famosa, podem agora ser vistas em pormenor numa animação da NASA criada a partir das fotografias mais próximas tiradas pela sonda New Horizons”. E podem observar-se as formações rochosas que os cientistas da NASA já chamaram de “intrigantes” e que serão ainda “dissecadas” por eles, faltando ainda receber a maioria dos dados captados pela New Horizons na sua maior aproximação a Plutão.
Segundo o Washington Post, a NASA estima que serão necessários ainda 16 meses para descarregar toda a informação que está nos bancos de memória do aparelho espacial.
O mesmo DN on line, de 17 de julho, assinala que, “depois de ter divulgado, na terça-feira, a primeira imagem da superfície de Plutão, que mostrava a existência de montanhas que se elevam a mais de três mil metros, a NASA mostrou, sexta-feira, uma nova fotografia enviada pela sonda New Horizons, que revela a existência de planícies geladas naquele planeta situado nos confins do sistema solar”.
Mais: “a equipa da missão New Horizons, que está fascinada com os novos dados recebidos, chamou a esta planície gelada Plain Sputnik, em homenagem ao primeiro satélite artificial enviado para o espaço pela União Soviética”. E, segundo a agência norte-americana, a planície fica a norte de uma cadeia de montanhas, numa região que vista do espaço tem o formato de um coração, que recebeu o nome Tombaugh Regio, já considerado um dos símbolos do planeta.
Jeffrey Moore, um dos cientistas da missão, disse que “esta não é uma área fácil de decifrar” e sublinhou que “a superfície desta área é relativamente recente, com menos de 100 milhões de anos, e, provavelmente, ainda está a ser moldada por processos geológicos”. Adiantou, ainda, que “a descoberta destas vastas planícies muito jovens, sem crateras, em Plutão ultrapassa todas as expectativas que havia antes da missão".

A IAU reconsiderará a sua posição e o Planeta X ou Plutão, maior do que se pensava, deixará de ser anão, passando o tamanho a não ser critério determinante de identificação/classificação?


2015.07.18 – Louro de Carvalho

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