É este o postulado firmemente expresso
pelo representante da Santa Sé junto da ONU, em Nova Iorque, nestes dias, tendo
em linha de conta o pensamento corrente dos Sumos Pontífices do último quartel
do século XX e dos 15 anos deste século XXI, mormente o do papa Francisco.
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Os delegados dos
Estados-membros da ONU têm-se reunido, periodicamente, desde janeiro deste ano
de 2015, para a definição dos diferentes elementos que conformarão a Agenda
Pós-2015. A base dessa negociação é a proposta de 17 Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável (ODS) “universais e aplicáveis a todos os países”,
e das 169 metas correspondentes elaborada por Grupo de Trabalho Intergovernamental
e Aberto da Assembleia Geral das Nações Unidas,
composto por 30 membros e com a função de elaborar os ditos ODS,
recolhendo os contributos de 70 países.
Corresponde
esta agenda, com aqueles objetivos e metas, ao conjunto de programas, ações e
diretrizes por que se pautarão os trabalhos das Nações Unidas e de seus
países-membros rumo ao desenvolvimento sustentável.
O mandato de que os preditos delegados dispõem
foi-lhes conferido pelo documento “O
Futuro que Queremos”, que resultou da Conferência
Rio+20, realizada em 2012, e que estabeleceu que os Estados-membros da ONU
construíssem aquele conjunto de objetivos e metas, ampliando a experiência de
êxito dos Objetivos do Milénio (ODM). Assim, os objetivos do milénio serão a base
e o cerne da Agenda Pós-2015, devendo o horizonte temporal para o seu cumprimento
compreender o período de 2016 e 2030.
***
Com efeito, os dirigentes mundiais, reunidos na Cimeira do Milénio
em setembro de 2000, reafirmaram as suas obrigações comuns para com todas as
pessoas do mundo, especialmente as mais vulneráveis e, em particular, as crianças
a quem pertence o futuro. Neste sentido comprometeram-se a atingir um conjunto
de objetivos específicos, compaginados nos oito objetivos de desenvolvimento do milénio,
que irão guiar os seus esforços coletivos nos próximos anos no atinente ao
combate à pobreza e ao desenvolvimento sustentável, a saber:
Erradicar a pobreza extrema e a fome; alcançar
o ensino primário universal; promover
a igualdade de género e a autonomização da mulher; reduzir a mortalidade das crianças; melhorar a saúde materna; combater
o VIH/SIDA, a malária e outras doenças; garantir
a sustentabilidade ambiental; e criar
uma parceria global para o desenvolvimento.
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O foco no alcance dos ODM é uma prioridade efetiva. No entanto,
é necessária uma agenda que possibilite e facilite a sua consecução faseada, pelo
que têm vindo a ocorrer discussões sobre essa agenda. A Agenda de
Desenvolvimento Pós-2015 será definida pelos Estados-membros da ONU e
funcionará como um marco de ação para os esforços mundiais de desenvolvimento.
A agenda deve ser elaborada com base na Declaração do Milénio (DM) e nas conquistas dos ODM,
assim como tratar de desafios novos e emergentes. A redução da pobreza e a
proteção do nosso planeta devem estar no cerne da nova agenda de
desenvolvimento, fundamentada nos princípios dos direitos humanos, da igualdade e da sustentabilidade.
Uma das novidades dos ODS e das suas metas é o facto de se
aplicarem a todos os Estados-membros das Nações Unidas, o que reflete o
reconhecimento de que todos os países – desenvolvidos e em desenvolvimento –
têm desafios a superar quando o assunto é promoção do desenvolvimento sustentável
na sua tríplice dimensão: social, económica e ambiental.
Todavia, os elementos da Agenda Pós-2015 não se limitam aos
ODS, mas também se referem aos meios de implementação que permitirão a
materialização dos ODS e das suas metas. Esse debate engloba questões de
alcance sistémico, como o financiamento para o desenvolvimento, transferência
de tecnologia, capacitação técnica e comércio internacional. Além disso,
deverá ser definido, sob pena de ineficácia, o mecanismo de acompanhamento dos
ODS e das suas metas. Tal mecanismo deverá auxiliar os países a comunicar os seus
êxitos e identificar os seus desafios, ajudando-os a traçar estratégias que os
permitirão avançar em seus compromissos com o desenvolvimento sustentável.
As
negociações para a definição desta nova Agenda deverão culminar em cúpula de
alto nível, com a participação de Chefes de Estado e de Governo, a realizar-se
em setembro deste ano de 2015, na sede da ONU, em Nova Iorque. Este evento, que
ocorrerá à margem da Sessão de Abertura da 70.ª Assembleia Geral das Nações
Unidas, constituirá a ocasião privilegiada para os líderes do mundo anunciarem o
seu compromisso inequívoco com o desenvolvimento sustentável, com a redução das
desigualdades dentro dos países e entre eles, além da materialização do “Futuro que Queremos”.
A este respeito, A ONU vem conduzindo consultas
temáticas mundiais com a comunidade académica, meios de comunicação,
setor privado, empresários, sindicatos, sociedade civil e outros atores, para
discutir questões-chave relativas à Agenda de Desenvolvimento Pós-2015. Estas
consultas temáticas mundiais abrangem 11 áreas:
Educação; água; sustentabilidade ambiental; desigualdades; conflito, violência e desastres; saúde; governança; crescimento e emprego; dinâmica populacional; segurança alimentar e nutrição; e energia.
A pari, a ONU vem a facilitar as
consultas
regionais e nacionais sobre a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015. As
Comissões Regionais da ONU convocaram e planeiam uma série de consultas
sub-regionais e regionais inclusivas, para desenvolver e articular perspetivas
regionais sobre a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015. A ONU também facilita
consultas nacionais em quase 100 países, com o objetivo de elaborar esta agenda.
Além disso, a
ONU promove os diálogos sobre a
implementação, com vista à criação de um fórum e oportunidades para se
contribuir com ideias e propostas específicas para a implementação da Agenda de
Desenvolvimento Pós-2015 nos âmbitos nacional e mundial. Estes diálogos sobre a
implementação abrangem seis áreas:
Localização da Agenda
de Desenvolvimento Pós-2015; ajuda ao reforço das capacidades e à construção das instituições
efetivas; monitorização participativa
e responsabilização/prestação de contas; parcerias com a sociedade civil; estreitamento dos laços com o setor privado; e cultura e desenvolvimento.
Entretanto, o acima referido Grupo de trabalho,
depois de 13 sessões, havidas entre março de
2013 e julho de 2014, chegou à formulação de uma proposta que contém os 17
Objetivos e as 169 metas, como já se indicou, envolvendo temáticas
diversificadas, como erradicação da pobreza, segurança alimentar e agricultura,
saúde, educação, igualdade de género, redução das desigualdades, energia, água
e saneamento, padrões sustentáveis de produção e de consumo, mudança do clima,
cidades sustentáveis, proteção e uso sustentável dos oceanos e dos ecossistemas
terrestres, crescimento económico inclusivo, infraestrutura e industrialização,
governança, e meios de implementação.
Transcrevem-se,
a seguir, os 17 objetivos de desenvolvimento sustentado, constantes da
mencionada proposta e que se espera serem aprovados e assumidos no próximo mês
de setembro:
1. Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em
todos os lugares.
2. Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e
melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável.
3. Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar
para todos, em todas as idades.
4. Assegurar a educação inclusiva e equitativa de
qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos.
5. Alcançar a igualdade de género e dar e reconhecer
poder e autonomia a todas as mulheres e meninas.
6. Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da
água e saneamento para todos.
7. Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e
a preço acessível à energia, para todos.
8. Promover o crescimento económico sustentado,
inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para
todos.
9. Construir infraestruturas resistentes, promover a
industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação.
10. Reduzir a desigualdade entre os países e dentro
deles.
11. Tornar as cidades e os diversos aglomerados humanos
inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.
12. Assegurar padrões de produção e consumo
sustentáveis.
13. Tomar medidas urgentes para combater a mudança do
clima e seus impactos.
14.
Conservação e uso sustentável dos oceanos, mares e dos recursos marinhos, para
o desenvolvimento sustentável.
15.
Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres,
gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e
reverter a degradação da terra, e estancar a perda de biodiversidade.
16.
Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável,
proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes,
responsáveis e inclusivas em todos os níveis.
17.
Fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o
desenvolvimento sustentável.
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A propósito de toda esta problemática, o representante da
Santa Sé junto da ONU defendeu uma visão de conjunto para erradicar a pobreza e
não apenas mais um aspeto do que outro devido aos interesses particulares de
cada país. Está em causa a dignidade da pessoa humana e
não os interesses e negócios.
Segundo
a oportuna divulgação da Rádio Vaticano sobre a posição defendida na sede das
Nações Unidas, onde estão a ser definidos os ODS da Agenda de Desenvolvimento
pós-2015, a delegação da Santa Sé centrou-se sobretudo nas “afirmações no
preâmbulo e na declaração da agenda pós-2015”,.
O diplomata
do Vaticano defendeu que “poderiam ter referido mais diretamente a importância
da integração e da indivisibilidade das três dimensões do desenvolvimento
sustentável: económica, social e ambiental”, uma vez que, “certamente, nenhum
desses pilares pode ser abordado separadamente”. E sublinhou que, “por exemplo,
a preferência pela proteção do ambiente ou pelo crescimento económico sem antes
considerar a dignidade da pessoa humana e o bem comum da sociedade no seu
conjunto contrastaria com a natureza da própria agenda.
Neste
contexto, o diplomata eclesiástico partilhou a afirmação de que para a ONU o
“maior desafio global” da humanidade é a erradicação da pobreza, na primeira
metade do século XXI, e defendeu que se desfaça a “tirania da miséria”
ampliando o horizonte do “desenvolvimento sustentável” para que “ninguém fique
para trás”.
Em nome da Santa Sé, o seu representante
declarou pretender-se também que se procure dar resposta “às exigências de
todas as nações e pessoas, em particular, dos pobres e dos mais vulneráveis”,
observando que estes propósitos devem ser acompanhado pelos objetivos éticos.
Ademais, a Santa Sé encorajou a “mobilização
de recursos financeiros e não financeiros”, através da ciência, tecnologia,
assistência, inovação, a favor dos países menos desenvolvidos – “dos que não
têm saída para o mar; das pequenas ilhas em desenvolvimento; dos países em
situações de conflito e pós-conflito” – e de todos aqueles que “se encontram em
situações particulares”.
É a postura
de quem pretende levar à prática a opção ecoeconómica da encíclica Laudato Si’, promovendo a guarda e o
cuidado da “Casa Comum”, não de forma desgarrada ou meramente ecológica, mas ao
serviço da sustentabilidade social, assente na inclusão e exigindo políticas
audazes na sequência da necessária mudança de paradigma. É a reperspetivação
assente na ética, reconhecendo a vez e a voz de todos!
2015.07.24
– Louro de Carvalho
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