Segundo o Diário de Notícias, de 21 de outubro,
vai ser inaugurado, na próxima sexta-feira, dia 24, em Lisboa, no bairro onde
ela viveu, um memorial em honra de Maria
de Lourdes Ruivo da Silva Matos Pintasilgo, a primeira e única primeira-ministra
portuguesa e forte candidata à Presidência da República nas eleições de 1985/86.
O memorial, constituído por um banco de jardim, um pinheiro e um
totem, a explicar quem foi Maria de Lourdes Pintassilgo, é da responsabilidade
da Câmara Municipal de Lisboa e da Junta de Freguesia de Arroios e ficará
instalado no Jardim dos Sabores, na interseção da Alameda Santo António dos
Capuchos com a Rua Doutor Almeida Amaral, ao Campo Mártires da Pátria.
A iniciativa, que surge para assinalar ao 10.º aniversário da
morte desta lutadora por grandes causas, aos 74 anos de idade, é uma boa
maneira de homenagear aquela que foi a primeira e única mulher que chefiou um
governo em Portugal – o V Governo Constitucional e o terceiro de iniciativa
presidencial, o governo dito dos 100 dias.
Esta homenagem é feita no primeiro Dia Municipal para a Igualdade,
criado no âmbito do IV Plano Nacional para a Igualdade 2011-2013. Em
declarações à agência Lusa, o vereador dos Direitos Sociais da Câmara de Lisboa
referiu que o município vai aproveitar a efeméride para “afirmar publicamente o
seu empenho nas questões da igualdade”.
Do programa de
atividades, além da homenagem, fazem parte o fórum “Conciliação, tempo e
pessoas”, que decorre no Museu do Fado entre as 09:30h e as 12:30, a marcha
pela igualdade no Parque das Nações, às 18:30h, e uma sopa para todos às 20:00h,
iniciativa integrada na campanha solidária 2014 da Comunidade Islâmica de
Lisboa, situada na Praça de Espanha.
***
Nasceu
na freguesia de São João, concelho de Abrantes a 18 de janeiro de 1930. Foi
engenheira química, dirigente eclesial e política. Maria de Lourdes Pintasilgo
foi a terceira mulher a desempenhar o cargo de primeiro-ministro na Europa,
depois da croata Savka Dabčeviƈ-Kučar e
dois meses depois da tomada de posse de Margaret Thatcher.
Era
filha de Jaime de Matos Pintasilgo, empresário
ligado à indústria de lanifícios da Covilhã, e de Amélia do Carmo Ruivo da
Silva, de Abrantes.
Com
a instalação da família em Lisboa, no ano de 1937, Maria de Lourdes realizou a
instrução primária no Colégio Garrett, na Av. Almirante Reis, ingressando, em
1940, no Liceu D. Filipa de Lencastre, onde terminou, em 1947, o curso liceal.
Em
1953, com 23 anos, concluiu a licenciatura em Engenharia Químico-industrial,
pelo Instituto Superior Técnico de Lisboa, numa época em que eram muito poucas
as mulheres que enveredavam pelas áreas da engenharia. Com a opção por este
curso, pretendia mostrar a acessibilidade às mulheres do desafio do mundo
industrial e da novidade da técnica.
Iniciou
a sua carreira profissional, em setembro de 1953, como investigadora na Junta
de energia Nuclear, com bolsa do Instituto de Alta Cultura. Em Julho de 1954, passou
a chefe de serviço no Departamento de Investigação e Desenvolvimento da CUF
(Companhia União Fabril), que admitiu pela 1.ª vez uma mulher nos seus quadros
técnicos superiores. Trabalhou sucessivamente nas fábricas do Barreiro e nos centros de investigação de
Sacavém e de Lisboa.
De
1 de setembro de 1954 e 30 de outubro de 1960, foi diretora de projetos no
Departamento de Estudos e Projetos da CUF, de que emergem a edição da revista Indústria e a organização dos Colóquios de Atualização Científica,
destinados aos quadros técnicos da empresa.
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Em termos
da militância católica:
Presidiu
à JUC/F (Juventude Universitária Católica Feminina), entre 1952 e 1956, e foi copresidente
do I Congresso Nacional da Juventude Universitária Católica, com Adérito Sedas
Nunes. Graças à projeção que, entretanto, granjeou no interior da ação católica
portuguesa, foi eleita, por aclamação, de 1956 a 1958, para o cargo de
presidente internacional da Pax Romana
– Movimento Internacional de Estudantes Católicos. No desempenho desse cargo
presidiu ao I Seminário de Estudantes Africanos, de 1957, no Gana, e à
Assembleia-Geral do movimento realizada em El Salvador. Em 1958, presidiu ao
Congresso Mundial de Estudantes e Intelectuais Católicos, realizado em Viena.
Soube
sempre articular a atividade profissional com o seu compromisso cristão e com a
intervenção cívica e política. A dimensão de crente foi indissociável dos seus
empenhamentos sociais, sendo o horizonte da justiça a sua grande ambição
política. Em 1957, depois de uma passagem pelos Estados Unidos da América,
fundou em Portugal, com Teresa Santa Clara Gomes, o movimento internacional do Graal.
Entre 1964 e 1969, enquanto vice-presidente internacional do movimento, foi
coordenadora de programas de formação e de projetos-piloto nos domínios da
emancipação da mulher, do desenvolvimento, da ação sociocultural e de uma
evangelização enraizada no tempo. Representou o Graal em múltiplas atividades
internacionais, nomeadamente no III Congresso Mundial do Apostolado dos Leigos,
realizado em Roma, em 1967. Paulo VI designou-a representante da Igreja
Católica num grupo de ligação ecuménica ao Conselho Mundial das Igrejas, entre
1966 e 1970. No Graal em Portugal foi mentora dos projetos: Rede Lien (1989-2004); Trabalho e Família – Responsabilidade Total
(2001-2002), no âmbito da iniciativa comunitária EQUAL (2000-2001); Para uma Sociedade Ativa (1996-2000), no
âmbito do IV Programa para a Igualdade de Oportunidades entre Mulheres e Homens
da Comissão Europeia, com o apoio do Programa Emprego/ Eixo Now (1999-2000); e Banco de Tempo (desde 2001), com o apoio
da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (2001-2203) e Comissão
para a Igualdade e Direitos das Mulheres (2003).
Politicamente:
Tendo
recusado, em novembro de 1969, o convite de Marcelo Caetano, para integrar a
lista de deputados à Assembleia Nacional, aceitou, no entanto, o cargo de procuradora
à Câmara Corporativa, de 1969 a
1974, na Secção XII – Interesses de ordem administrativa, 1.ª Subsecção:
Política e Administração Geral, tendo sido a 1.ª mulher a exercer funções nesta
secção. Nesta qualidade, assinou com “voto de vencida” vários pareceres
relativos a candentes questões como a liberdade de imprensa, o modelo de
desenvolvimento económico e as alterações à Constituição de 1973.
Entretanto,
de 13.05.1970 a 23.09.1973, trabalhou como consultora do Secretário de Estado
do Trabalho e Previdência, do Ministério das Corporações e Previdência Social.
Presidiu ainda, ao Grupo de Trabalho para a Participação da Mulher na Vida
Económica e Social. No exercício dessas funções, integrou a Delegação Portuguesa
à Assembleia Geral da ONU, tendo aí realizado cinco intervenções, subordinadas
às problemáticas seguintes: o direito dos
povos à autodeterminação (novembro de 1971), a juventude (dezembro de 1972), a
condição feminina (novembro de 1972), a
situação social no mundo (outubro de 1971) e a liberdade religiosa (dezembro de 1972).
Manteve-se
no Ministério das Corporações e Previdência Social até à instituição da
Comissão para a Política Social relativa à Mulher, por decreto n.º 482/73, de
27 de setembro, a que presidiu. Esta comissão passou, com o decreto-lei n.º
47/75, de 1 de fevereiro, a ser referenciada como Comissão da Condição
Feminina, agora dotada de autonomia administrativa. Lourdes Pintasilgo presidiu
à referida Comissão desde 23.11.1973, interrompendo o exercício do cargo para
integrar alguns Governos Provisórios, após a revolução de abril.
***
A
obra publicada de Pintasilgo é variada – desde livros, ensaios, relatórios,
conferências, e prefácios, até um vasto número de artigos em jornais e revistas.
As principais temáticas por si abordadas respeitam: à participação das mulheres
no desenvolvimento/qualidade de vida, na cultura e na política; a renovação da
teoria e prática políticas; a espiritualidade e o compromisso cristãos. São de
realçar: Sulcos do nosso querer comum (Porto, Ed. Afrontamento,1980); Imaginar
a Igreja (Lisboa, Ed. Multinova, 1980); Les nouveaux féminismes:
question pour les chrétiens? (Paris, Éditions du Cerf, 1980); As
dimensões da mudança (Porto, Ed. Afrontamento, 1985); Os novos
feminismos: interrogação para os cristãos. Lisboa, Moraes, 1981; O
Graal, um movimento do nosso tempo (Porto, 1984 – Separata de Igreja
e Missão, 2.ª série, ano 15); Dimensões da mudança. Prefácio de
Eduardo Prado Coelho. 2.ª ed., Porto, Afrontamento, 1985: As minhas
respostas (Lisboa, Ed. D. Quixote, 1985).
Prefaciou
a 2.ª e a 3.ª edição das Novas Cartas Portuguesas, de Maria Isabel
Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa (respetivamente em 1974
e 1980). Em 1999, prefaciou a obra de Maria Regina Tavares da Silva, A
Mulher – Bibliografia Portuguesa Anotada (1518-1998). A escrita e as suas
investigações caraterizam-se pela criação de alternativas aos paradigmas
existentes, pela proposta de diálogo interdisciplinar e pela independência na
reflexão política; e originaram longas entrevistas e debates em que ela se
destacou como grande pensadora e comunicadora à escala internacional.
***
A
ela, enquanto primeira-ministra devem os professores (efetivos) o
descongelamento das fases de progressão na carreira e todos a valorização
material da função docente, pelo decreto-lei n.º 513-M1/79, de 27 de dezembro.
Os professores provisórios, através do decreto-lei n.º 519-T1/79, de 29 de
dezembro, tiveram com ela a possibilidade de celebrar com o Ministério da
Educação contratos de trabalho plurianuais e ascender à profissionalização em
exercício (em substituição do estágio clássico). Também foi ela quem
estabeleceu a gratuitidade dos transportes escolares para o ensino obrigatório.
Como
membro de governos,
Este
vulto feminino da democracia exerceu o cargo de secretária
de Estado da Segurança Social no I Governo Provisório e foi ministra dos
Assuntos Sociais nos II e III Governos Provisórios, entre 17.07.1974 e
25.03.1975. O programa de ação que concebeu para aquele Ministério mereceu a
classificação de programa-modelo, por parte do Secretariado do Desenvolvimento
Social para a Europa, da ONU. Introduziu, no programa daquele ministério, a
aplicação do princípio da universalidade das prestações sociais do Estado.
Entre maio e setembro de 1975, foi ainda designada membro eleito do Conselho de
Imprensa. E, em 01.05.1975, retomou a presidência da Comissão da Condição
Feminina, permanecendo em funções até à tomada de posse como embaixadora junto
da UNESCO.
Internacionalmente,
Desempenhou
vários cargos e funções, de que se destacam: membro do conselho diretivo do World Policy Institute da New School
of Social Research, em Nova Iorque (1982); membro do Conselho de Interação de Ex-Chefes de Governo (1983), criado por Kurt Waldheim, Leopold
Senghor e Helmut Schmit, ocupando a sua vice-presidência entre 1988 e 1993, por
designação do Comité Executivo; membro do conselho diretivo da Universidade das Nações, entre 1983 a 1989,
por designação do Secretário-Geral da ONU, do Diretor-geral da UNESCO e
da Santa Sé; membro do Conselho da Ciência e da Tecnologia ao Serviço do Desenvolvimento
(de
1989 a 1991), eleita pela Assembleia Geral da ONU; membro do Grupo de Peritos da OCDE sobre A Mudança Estrutural e o Emprego
das Mulheres (1990-1991), a convite do Secretário-Geral daquela organização; conselheira especial do Reitor da
Universidade das Nações Unidas (entre 1990 e 1992); presidente do Grupo de Peritos do Conselho da Europa sobre Igualdade e
Democracia
(de 1992 a 1994); presidente da Comissão Mundial
Independente sobre a População e Qualidade de Vida (entre 1992 a 1997), por convite conjunto dos Governos da
Holanda, Suécia, Noruega, Alemanha, Canadá, Reino Unido e Japão da ONU, do
Banco Mundial e de várias Fundações Americanas; presidente do conselho diretivo do WIDER/UNU,
Instituto Mundial de Investigação sobre Desenvolvimento Económico da Universidade das
Nações Unidas (entre 1993 e 1998); e presidente do Comité dos Sábios (entre 1995 e 1996), a convite do Presidente da Comissão Europeia.
***
E
foi assim – muito mais se poderia dizer dela – este Membro da Pax Christi (1984) e do Movimento Internacional de Mulheres
Cristãs, a quem muitos portugueses não deram o devido apreço, mas que a justiça
da História não vai esquecer.
Fontes:
- DN, 21 de outubro;
- http://www.portugal.gov.pt/pt/o-governo/arquivo-historico/governos-constitucionais/gc05/programa-do-governo/programa-do-governo-constitucional-5.aspx;
- http://pt.wikipedia.org/wiki/Maria_de_Lourdes_Pintasilgo
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