Espero não criar dúvidas. A última
semana em que houve dias de março não foi uma inteira “hebdómada”, pelo que
neste escrito me refiro à semana de 23 a 29, essa, sim, inteirinha. E foi cheia
de curiosidades políticas, curiosidades verdadeiramente anedóticas, se não jogassem
com a vida dos portugueses.
Os ricos deverão estar mais atentos, a
ver se não levam algum tombo, porque os “rapazes” lá de Lisboa – entre
compromissos com o DEO e com eleições – andam em roda livre: Cavaco não tem
informações sobre a matéria de novos cortes (e deveria ter; ou também irá, de
futuro, nalgum prefácio, acusar Passos Coelho de deslealdade democrática?); governo
presente algures, mas ausente em partes incertas, decide sem decidir;
parlamento vai balbuciando uns suspiros através de vozes ditas da oposição e
uns améns da situação; comentadores olham para o Passos de antes de eleições e
para o Passos de depois de eleições. E agora, será o de antes ou de depois?
Depois das legislativas de 2011, mas antes das europeias de 2014 e das
legislativas de 2015 – um duplo indefinido – corta, não; ajusta, sim! Os pobres
estão cada vez mais pobres, pois, aumentam-lhes uns cêntimos na pensão, mas
sobem-lhes euros no custo de vida, mesmo nos bens essenciais. As instituições
de beneficência estão cada vez mais magras: aumentam os utentes (nem todos
terão necessidade, mas…), surgem novos pobres, dos que antes estavam bem, e as
exigências burocráticas são maiores, ao serviço do Estado e de alguns dos
grandes. A classe média está em vias de desaparecimento: puxada pelos descontos
obrigatórios para segurança social e similares, que compram dívida pública com
o fruto da capitalização dos descontos dos trabalhadores; sobrecarregada com
impostos, taxas, sobretaxas e tarifas, esperança média de vida; cercada da
falta de condições de trabalho, apreensão sobre o futuro; vergastada com o
custo de vida excessivo – aguenta, aguenta… até quando?! Mas continua a fuga
aos impostos e a economia paralela, apesar do sorteio de carros topo de gama
pelo fisco! E os cardosos impostos da nossa Teodora: o cidadão guarda o salário e/ou
outros rendimentos numa conta poupança (para poupar quando não há dinheiro) e
será taxado pelos levantamentos, despesas, etc. – rica forma de o Estado poupar!
Mas atentemos nos itens da anedota. O
governo criou oficialmente uma fuga de
informação legítima: o Secretário de Estado da Administração Pública
convocou os jornalistas a quem revelou que, para satisfazer o documento de
estratégia orçamental (DEO) nos anos pós-troika, o governo estava estudar a
maneira de tornar definitiva a ora transitória contribuição extraordinária de
solidariedade dos pensionistas (CES) e uma redução adicional nos salários dos
trabalhadores da Administração Pública. Os senhores jornalistas podiam publicar
o conteúdo, mas não a fonte, escudando-se no pretexto de “fonte oficial” ou “fonte
governamental”.
O povo leu (não se confunda com o “povoléu”!) e os comentadores acionaram os botões. E o governo fala. Houve fuga
de informação, conluio de jornalistas – o que levou a uma tomada de posição
conjunta de jornais de referência a repor publicamente a verdade. Ministro da
Presidência não conhece qualquer documento, nada está sobre a mesa da discussão.
O que o governo está a fazer é cumprir o que manda o Tribunal Constitucional.
Mais: ficamos a saber que acabou a ditadura do Ministério das Finanças, pois, minister dixit, uma informação “oficial”
do Ministério das Finanças não vincula o governo (e nós a pensar que havia
solidariedade governamental: por isso é que, em 1993, aceitei que o Secretário
de Estado da Defesa Nacional inaugurasse uma escola; e, em 2011, vi o
Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional a inaugurar outra).
Mas o Senhor dos Passos Coelho
declarou que não, que nada estava decidido, porque isso só seria decidido com
ele e ele não tinha tomado posição sobre a matéria.
Portas e Maduro, em momentos
diferentes, clamaram que “foi um erro”, “que não devia ter acontecido” (Haverá
erros que possam ter acontecido?) “e pronto”!
Conclusão da anedota: a experiência
ensina que, se Coelho disser que não haverá cortes nas pensões e salários, é
porque vai haver.
Adicionalmente, dizem as más línguas
geralmente bem informadas que o Estado se prepara para uma emissão de dívida,
digo eu, discreta (eu li “clandestina”) de mais de um milhão de euros para
garantir à troika uma saída limpa. Afinal, em 2011, elegemos não uns
governantes, mas uns brincalhões. Mas, se Nadia Malanima, em 1972, cantava no
Festival de San Remo que “a vida é um jogo: / quem perde chora / e ri quem
ganha”, quem serei para a contrariar?
Mas uma coisa é exigível: que
trabalhadores e pensionistas possam ter, no início de cada ano, uma visão
aproximada do rendimento que podem auferir ao longo do ano. Imaginam um Estado
sem orçamento no princípio de ano?
Será que não estaremos a ser conduzidos
de forma capciosa para onde não queremos ir? Recordo que Hitler escreveu em
1925: “A crueldade impressiona. As pessoas querem ter medo de alguma coisa. As massas
precisam disso” (apud Canal
de História. As grandes profecias da
História. Clube do autor: 2011). Segundo alguns, o êxito do conglomerado ideológico do
Partido Nazi reside no facto de se alimentar dos medos das classes médias face
às incertezas sobre o futuro. Para conseguir o apoio da opinião pública, os nazis
difundiram a diabólica visão de Hitler através dos meios de comunicação social
alemães. A propaganda foi eficazmente feita através da rádio, do cinema e de
cartaz publicitário (ainda não havia a televisão, pelo menos em fase de generalização),
pois era necessário controlar a sociedade de massas (cf op cit). É certo que Hitler
morreu e não reencarnou na lusa pátria, mas não haverá novos perfis hitlerianos
disfarçados de democratas num hic et nunc
concreto algures em parte incerta da Europa ou do resto do mundo?
Cavaco Silva, em 9 de março de 2011,
pediu no Parlamento o sobressalto democrático…. Onde está Cavaco agora? E os rapazes
e raparigas do 12 de março?
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